- As mãos tremiam. Entre dentes, tiritando, deu à telefonista o número do cartão, o de Roger Hudson, e esperou.

Após o que pareceu uma eternidade, Dana ouviu a voz de Cesar - Residência dos Hudsons.

- Cesar! Preciso falar com o Sr Hudson. - A voz saiu engasgada.

- Srta. Evans?

- Depressa, Cesar, depressa!

Um minuto depois, ouvia a voz de Roger Hudson.

- Dana?

- Roger! - Lágrimas escorriam-lhe pelas faces. - Ele… ele está morto. Eles o as… assassinaram e à sua amiga.

- Como? Meu Deus, Dana. Não sei o que… Você está ferida?

- Não… mas eles estão tentando me matar - Agora, escute com muita atenção. Tem um avião da Air France que parte para Washington à meia-noite. Vou conseguir uma reserva para você nele.

Não se deixe ser seguida até o aeroporto. Não tome um táxi aí. Vá direto para o Hotel Metropol. O hotel tem ônibus direto até o aeroporto que sai regularmente. Pegue um. Misture-se à multidão. Estarei à sua espera quando chegar a Washington. Pelo amor de Deus, se cuide!

- Vou me cuidar, Roger. Obr… obrigada.

Desligou o telefone. Ficou ali parada por um instante, incapaz de mover-se.

Não conseguia tirar da mente as sangrentas imagens de Shdanoff e sua amiga. Sorveu um longo hausto de ar, retirou-se da cabine, passou pelo recepcionista desconfiado e saiu para a noite congelante.

Um táxi parou na curva perto dela, e o motorista disse-lhe algo em russo.

- Nyet - respondeu Dana. Pôs-se a correr pela rua. Precisava primeiro voltar ao seu hotel.

Depois que desligou o telefone, Roger Hudson foi correndo ao quarto onde Pamela se vestia para o jantar - Dana acabou de ligar de Moscou. Descobriu por que os Winthrops foram assassinados. Ela está em apuros.

Pamela disse:..

- Então temos de cuidar dela já. - Ficou pensativa por um momento e acrescentou em seguida: - Roger.. diga-Lhes que façam parecer um acidente.

Em Raven Hill, na Inglaterra, uma placa de PROIBIDA A ENTRADA em letras vermelhas e uma alta cerca de ferro excluíam o mundo dos hectares florestais da sucursal da FRA no Reino Unido. Atrás da base estreitamente vigiada, uma série de antenas rastreadoras por satélite monitorava as comunicações a cabo e de ondas curtas que passavam pela Grã-Bretanha.

Numa casa de concreto, no centro do complexo industrial, quatro homens olhavam com atenção uma grande tela.

- Amplie a imagem dela, Scotty Eles viram quando a imagem da televisão transferiu-se de um apartamento em Brighton enquanto a antena se movia. Um momento depois, surgiu na tela grande uma imagem de Dana entrando em seu quarto no Hotel Soyuz.

- Ela voltou. - Viram-na lavar apressada as mãos para tirar o sangue e começar a despir-se.

- Ei, lá vamos nós de novo - disse um dos homens, abrindo um largo sorriso.

Ficaram todos de olhos grudados em Dana tirando a roupa.

- Cara, com certeza eu gostaria de dar uma bimbada naquilo.

Outro homem entrou esbaforido na sala.

- Acho que não, a não ser que você agora esteja metido em necrofilia, Charlie.

- De que é que está falando?

- Ela vai sofrer um acidente fatal.

Dana terminou de vestir-se e conferiu as horas no relógio de pulso. Ainda tinha muito tempo para pegar o ônibus do Metropol para o aeroporto. Com ansiedade cada vez maior, desceu correndo a escada até o vestíbulo. A mulher gorda não estava em nenhum lugar à vista.

Saiu para a rua. Parecia impossível, mas o frio ficara ainda mais intenso. O vento era um misterioso e implacável espírito feminino com seus lamentos uivantes. Um táxi parou diante dela.

- Taksi?

Não tome um táxi aí. Vá direto para o Hotel Metropol. O hotel tem ônibus direto até o aeroporto que sai regularmente.

- Nyet.

Saiu andando pela rua glacial. Multidões passavam aos empurrões por ela, apressando-se para o calor de suas casas ou escritórios. Ao aproximar-se de uma esquina movimentada, esperando para atravessar, ela sentiu um violento tranco por trás e saiu voando para a rua diante de um caminhão que vinha em sua direção. Escorregou num pedaço de gelo e caiu de costas, erguendo os olhos horrorizada enquanto o imenso caminhão acelerava para cima dela.

No último segundo, o motorista de rosto lívido conseguiu girar o volante para que o meio exato na parte mais alta debaixo do caminhão passasse acima de Dana. Ela ficou deitada ali na escuridão por um momento, os ouvidos ensurdecidos pelo rugido do motor, e as correntes estrondosas batendo nos imensos pneus.

De repente, voltou a ver o céu. O caminhão tinha ido. Sentou-se, grogue.

Pessoas ajudaram-na a levantar-se. Ela olhou em volta à procura de quem a empurrara, mas podia ter sido qualquer um na multidão. Inspirou profundamente e tentou recuperar o controle. Pessoas a cercavam e gritavam-lhe em russo. Começaram a pressioná-la, fazendo com que entrasse em pânico.

- Hotel Metropol? - disse Dana, esperançosa.

Um grupo de rapazes tinha se aproximado.

- Claro. A gente leva você até lá.

O saguão do Metropol estava abençoadamente quente, cheio de turistas e homens de negócios. Misture-se às multidões. Estarei a sua espera quando chegar a Washington.

Dana perguntou a um mensageiro:

- A que horas sai o próximo ônibus para o aeroporto?

- Em trinta minutos.

- Obrigada.

Sentou-se numa poltrona, ofegante, tentando varrer o horror indizível da mente. Sentia-se tomada de pavor. Quem estava tentando matá-la e por quê? E Kemal estava seguro?

O mensageiro aproximou-se e avisou que o ônibus tinha chegado.

Foi a primeira a entrar. Ocupou um assento nos fundos e examinou os rostos dos passageiros. Havia turistas de meia dúzia de países; europeus, asiáticos, africanos e alguns americanos. Um homem num assento da outra fileira a fitava.

Ele parece conhecido, pensou Dana. Será que está me seguindo? Começou a sentir falta de ar.

Uma hora depois, quando o ônibus parou no SheremetyevoII, Dana foi a última a desembarcar. Entrou correndo no prédio do terminal e foi para o balcão da Air France.

- Posso ajudá-la?

- Tem uma reserva para Dana Evans? - perguntou, prendendo a respiração.

Diga sim, diga sim, diga sim…

A funcionária folheou alguns papéis.

- Sim. Aqui está sua passagem. Paga com antecedência.

Abençoado Roger.

- Obrigada.

- O avião está no horário. É o vôo 220. Partirá dentro de uma hora e dez minutos.

- Tem algum salão de espera onde eu possa descansar? E Dana quase acrescentou: Com um monte de gente?

- No fim do corredor, à direita.

- Obrigada.

O salão estava cheio. Nada ali parecia fora do comum ou ameaçador. Dana sentou-se numa poltrona. Em pouco tempo, estaria a caminho dos Estados Unidos e da segurança.

- Todos os passageiros do vôo 220 da Air France para Washington devem se dirigir agora para o Portão 3. Por favor, tenham à mão seus passaportes e tíquetes de embarque.

Dana levantou-se e foi para o Portão 3. Um homem que a vigiava de um balcão da Aerollot falou no telefone celular - O alvo está se dirigindo para o portão de embarque.

Roger Hudson pegou o telefone e ligou para um número.

- Ela está no vôo 220 da Air France. Quero que a peguem no aeroporto.

- Como deseja que a gente a liquide, senhor?

- Eu sugeriria um acidente de atropelamento e fuga.

Eles seguiam por um céu de brigadeiro, num vôo suave e regular, a 13.500m. Não havia uma única poltrona vazia no avião.

Um americano sentara-se junto a Dana.

- Gregory Price - ele se apresentou. - Trabalho no ramo de madeiras. - De seus quarenta anos, tinha um longo rosto aquilino, luminosos olhos cinzentos e um bigode. - Mas que país esse que acabamos de deixar, hem?

O único propósito da existência de Krasnoyarsk-26 é fazer plutônio, o ingrediente básico nas armas atômicas.

- Com certeza, os russos são diferentes de nós, mas a gente se acostuma com eles depois de algum tempo.

Cem mil cientistas e técnicos moram e trabalham aqui.

- Claro que não cozinham como os franceses. Quando venho para cá a negócios, trago meu próprio pacote de guloseimas.

Não podem sair. Não podem receber visitantes. São obrigados a desligar se completamente do resto do mundo exterior.

- Estava na Rússia a negócios?

Dana trouxe a si mesma para o presente.

- Férias.

Ele lançou-lhe um olhar surpreso.

- Mas é uma péssima época para tirar férias na Rússia.

Quando a comissária de bordo atravessou o corredor com um cardápio, ela começou a recusar delicadamente, mas então percebeu que estava faminta.

Não se lembrava da última vez em que comera.

Gregory Price ofereceu-Lhe:

- Se quiser uma dose de conhaque, tenho a coisa autêntica aqui comigo, senhorita.

- Não, obrigada. - Deu uma olhada no relógio de pulso.

Iam aterrissar em menos de uma hora.

Quando o vôo 220 da Air France pousou no Aeroporto Dulles, quatro homens olhavam com atenção a aeromoça abrir a porta do avião e os passageiros começarem a descer. Ficaram ali, confiantes, sabendo que não havia como ela escapar Um deles disse:

- Trouxe a hipodérmica?

- Sim.

- Leve-a para o Parque de Rock Creek. O chefe quer um atropelamento e fuga.

- Certo.

Voltaram os olhos para a porta. Passageiros desciam em grupos do avião, com grossas roupas de lã, parkas, protetores para os ouvidos, cachecóis e luvas. Por fim, cessou o fluxo de passageiros.

Um dos homens franziu as sobrancelhas.

- Vou lá ver o que a está detendo.

Foi até o avião e entrou. A tripulação trabalhava ocupada na limpeza. O homem atravessou o corredor entre as poltronas. Abriu as portas dos banheiros. Vazios. Avançou às pressas de volta para a entrada e perguntou a uma comissária d bordo:

- Onde Dana Evans estava sentada? A comissária de bordo pareceu surpresa.

- Dana Evans? Quer dizer, a apresentadora da TV?

- É.

- Ela não estava neste vôo. Quem dera que estivesse. Eu adoraria tê-la conhecido pessoalmente.

Gregory Price dizia a Dana:

- Sabe o que é fantástico no ramo de madeiras, senhorita? Seu produto cresce sozinho. Sim, basta ficar sentado por perto e ver a Mãe Natureza fazer tudo por você.

Uma voz chegou pelo alto-falante.

- Vamos aterrissar no Aeroporto de Chicago dentro de alguns minutos. Por favor, queiram apertar o cinto de segurança e pôr o encosto da poltrona na vertical.

A mulher do outro lado do corredor disse, com cinismo:

- É, ponha o encosto bem na vertical. Eu é que não ia querer estar inclinada quando morresse.

A palavra “morrer” provocou-lhe um sobressalto. Podia ouvir o barulho das balas ricocheteando na parede do hotel e sentir a mão forte atirando-a na direção do caminhão que se aproximava. Estremeceu ao pensar nas duas escapadas por um triz por que passara.

Horas antes, sentada no salão de espera do Aeroporto Sheremetyevo II, dissera a si mesma que tudo ia acabar bem.

Os mocinhos vão vencer. Mas alguma coisa relacionada a uma conversa que teve com alguém a incomodava. A pessoa dissera alguma coisa inquietante, mas que fugira de sua mente.

Teria sido numa conversa com Matt? Tim Drew? O comissário Shdanoff?

Quanto mais Dana tentava se lembrar, mais aquilo escapava dela.

Uma comissária de bordo anunciou no alto-falante:

- O vôo 220 da Aír France está pronto para partir para Washington, capital.

Por favor, tenham à mão seus passaportes e tíquetes de embarque.

Dana levantou-se e dirigiu-se para o portão. Quando começou a mostrar o tíquete ao guarda, lembrou-se de repente do que fora. A última conversa com Sasha Shdanoff.

Ninguém sabe que estou aqui. É o Que a gente chama de uma “casa segura”.

Roger Hudson foi o único a quem Dana disse onde ficava o esconderijo de Sasha Shdanoff. E logo depois disso Shdanoff fora assassinado. Desde o início Roger Hudson tinha feito alusões sutis a alguma ligação sombria entre Taylor Winthrop e a Rússia.

Quando estive em Moscou havia um rumor de que Winthrop estava envolvido em algum tipo de acordo secreto com os russos…

Pouco antes de Taylor Winthrop tornar se nosso embaixador na Rússia, ele disse a amigos íntimos que estava se retirando definitivamente da vida pública…

Foi Winthrop quem pressionou o presidente para nomeá-lo embaixador…

Ela havia contado a Roger e Pamela todos os seus passos.

Eles a haviam espionado o tempo todo. E só poderia haver uma razão:

Roger Hudson era o sócio misterioso de Taylor Winthrop.

Quando o vôo da American Airlines pousou no Aeroporto O’Hare em Chicago, Dana esforçou-se por ver pela janela alguma coisa suspeita.

Nada. Tudo tranqüilo. Respirou fundo e iniciou a descida. Tinha os nervos em fogo. Conseguiu manter o máximo de passageiros à sua volta enquanto entrava no terminal, ficando com a multidão conversadora.

Precisava dar um telefonema urgente. Durante o vôo, uma coisa terrível lhe ocorrera, que fazia seu próprio perigo parecer insignificante. Kemal. E se estivesse em perigo por causa dela? Não podia suportar a idéia de que alguma coisa acontecesse a ele. Precisava de alguém para protegê-lo.

Imediatamente pensou em Jack Stone. Ele trabalhava numa organização poderosa o bastante para dar o tipo de proteção que ela e Kemal precisavam, e tinha certeza que ele conseguiria arranjar. Fora solidário com ela desde o início. Ele não é realmente um deles.

Estou tentando ficar fora do circuito. Posso ajudá-la melhor assim, se entende o que quero dizer.

Dana dirigiu-se para um canto deserto do terminal, procurou na bolsa e pegou o número particular que Jack Stone tinha lhe dado. Telefonou para ele, que respondeu de imediato.

- Jack Stone.

- É Dana Evans. Estou em apuros. Preciso de ajuda.

- Que está acontecendo?

Dana percebeu preocupação em sua voz.

- Não posso falar disso agora, mas algumas pessoas estão atrás de mim, tentando me matar - Quem?

- Não sei. Mas é com meu filho que estou preocupada.

Pode me ajudar a conseguir alguém para protegê-lo? Ele respondeu no mesmo instante.

- Verei o que posso fazer. Ele está em casa agora?

- Está.

- Vou mandar alguém lá. Mas, e você? Disse que tem alguém querendo matá-la?

- Tem. Eles… já tentaram duas vezes.

Houve um silêncio momentâneo.

- Vou dar uma examinada e ver o que posso fazer. Onde você está?

- No terminal da American Airlines no O’Hare, e não sei se posso sair daqui.

- Fique onde está. Vou arranjar alguém para protegê-la.

Enquanto isso, deixe de se preocupar com Kemal.

Dana sentiu uma onda de profundo alívio.

- Obrigada. Obrigada. - E desligou o telefone.

Em seu escritório na FRA, Jack Stone repôs o receptor no Lugar. Apertou o botão do interfone.

- O alvo acabou de ligar. Está no terminal da American Airlines no O’Hare.

Agarre-a.

- Sim, senhor.

Jack Stone perguntou:

- Quando o general Booster volta do Extremo Oriente?

- Esta tarde. - bem, vamos acabar logo com esse inferno antes que ele descubra o que está acontecendo.

O celular de Dana tocou.

- Jeff!

- Alô, querida. - E o som de sua voz parecia uma manta em volta dela, aquecendo-a.

- Oh, Jeff! - Dana percebeu que tremia.

- Como você está?

Como estou? Fugindo para salvar a vida. Mas não podia dizer-Lhe isso.

Ele não tinha como ajudá-la, não naquele momento. Era tarde demais.

- Es… estou bem, querido.

- Onde está agora, sua viajante do mundo?

- Em Chicago. Volto para Washington amanhã. -Quando vai ficar comigo?

- Como… vai Rachel?

- Parece que está se recuperando bem.

- Sinto sua falta.

A porta do quarto de Rachel abriu-se e ela entrou na sala de estar. Pôs-se a chamar por Jeff e parou ao ver que ele estava ao telefone.

- Sinto sua falta mais do que pode imaginar - disse Jeff.

- Oh, eu o amo tanto. - Um homem por perto parecia encará-la. O coração de Dana começou a martelar. - Querido, se… se alguma coisa me acontecer… lembre-se sempre que eu…

Jeff alarmou-se no mesmo instante.

- Que quer dizer com se alguma coisa lhe acontecer?

- Nada. Eu… não posso falar disso agora, mas… tenho certeza que tudo vai acabar bem.

- Dana, não pode deixar que nada lhe aconteça! Preciso de você. Eu te amo mais que qualquer pessoa que já amei em toda a minha vida. Não suportaria perder você.

Rachel ouviu por um momento mais longo, depois voltou em silêncio para o quarto e fechou a porta.

Dana e Jeff continuaram conversando mais uns dez minutos. Quando Dana por fim desligou, sentiu-se melhor. Fico feliz por ter tido uma chance de me despedir. Ergueu os olhos e viu o homem encarando-a. É impossível que um dos homens de Jackstonee tenha chegado tão rápido. Preciso sair daqui. Sentiu o pânico avolumar-se.

O vizinho de Dana bateu na porta de seu apartamento. A Sra.

Daley abriu-a.

- Alô.

- Mantenha Kemal em casa. Vamos precisar dele.

- Vou cuidar disso. - A Sra. Daley fechou a porta e chamou Kemal. - Seu mingau de aveia está quase pronto, querido.

Entrou na cozinha, pegou o mingau no fogão e abriu uma gaveta embaixo no armário cheia de invólucros de drogas rotulados “BuSpar”. Espalhadas no fundo da gaveta, havia dezenas de embalagens vazias. A Sra. Daley abriu dois novos invólucros, hesitou e acrescentou em seguida um terceiro.

Misturou o pó no mingau, polvilhou com um pouco de açúcar e levou-o para a sala de jantar. Kemal saiu do quarto.

- Que bom que veio, meu amor. O mingau está quente.

- Não estou com muita fome.

- Você precisa comer, Kemal. -A voz foi incisiva, de uma maneira que o assustou. - Não quer que a Srta. Dana fique decepcionada com você, quer?

- Não.

- Ótimo. Aposto que pode limpar o prato pela Srta. Dana.

Kemal sentou-se e começou a comer Ele deve dormir por umas seis horas, calculou a Sra. Daley.

Depois vou ver o que querem que eu faça com ele.

Dana disparou pelo aeroporto até passar por uma loja de roupas. Preciso esconder minha identidade. Entrou e olhou em volta.

Tudo parecia normal. Os fregueses ocupavam-se com a compra de artigos e os vendedores cuidavam deles. Nesse momento, Dana olhou para fora da loja e sentiu um arrepio da cabeça aos pés. Dois homens haviam-se colocado em cada lado da entrada. Um deles com um walkie-talkie.

Como descobriram que ela estava em Chicago? Dana tentava controlar o pânico. Virou-se para a vendedora:

- Tem outra saída aqui?

A vendedora balançou a cabeça.

- Lamento, senhorita. Mas é só para funcionários.

Tinha a garganta seca. Deu mais uma olhada nos homens.

Preciso fugir, pensou Dana, desesperada. Tem de haver um jeito.

De repente, pegou um vestido da prateleira e pôs-se a dirigir-se para a entrada.

- Espere aí! - chamou a vendedora. - Não pode…

Dana aproximava-se da porta e os dois homens começaram a avançar em sua direção. Quando ela a cruzou, o sensor da etiqueta do vestido disparou um alarme. Um guarda da loja chegou correndo. Os dois homens se entreolharam e recuaram.

- Só um minuto, senhorita - disse o guarda. - Terá de entrar na loja comigo.

- Por quê? - protestou Dana.

- Porque furto é contra a lei. - O guarda pegou o braço de Dana e puxou-a de volta para dentro da loja. Os homens ficaram do lado de fora, frustrados.

Dana sorriu para o guarda.

- Tudo bem. Reconheço. Eu estava furtando. Leve-me em cana.

Os fregueses começavam a parar para ver o que acontecia.

O gerente aproximou-se correndo.

- Que foi que houve?

- Peguei esta mulher tentando roubar este vestido… - bem, receio que teremos de chamar a polí… - Ele virou-se e reconheceu Dana. - Meu Deus! É Dana Evans.

Sussurros ondularam-se pelo bando de gente cada vez maior.

- É Dana Evans…

- Vemos você no noticiário toda noite…

- Lembra das suas transmissões da guerra…? O gerente disse:

- Mil desculpas, Srta. Evans. É óbvio que deve ter havido um engano.

- Não, não - apressou-se a dizer Dana. - Eu ia furtar mesmo. - Estendeu as mãos. - Podem me prender O gerente sorriu.

- Mas nem em sonho. Pode ficar com o vestido, Srta.

Evans, com os nossos cumprimentos. Muito nos lisonjeia que tenha gostado dele.

Dana arregalou os olhos para ele.

- Não vai me prender?

Ele abriu um sorriso de um lado a outro do rosto.

- Vou-lhe fazer uma proposta. Troco o vestido por um autógrafo. Somos grandes fãs seus.

Uma das mulheres parada ali exclamou:

- Eu também!

- Pode me dar um autógrafo?

Mais pessoas aproximavam-se.

- Olhe! É Dana Evans.

- Pode me dar seu autógrafo, Srta. Evans?

- Meu marido e eu não perdíamos uma só noite quando você estava em Sarajevo.

- Você fez mesmo a guerra parecer viva.

- Eu também gostaria de um autógrafo.

Parada ali, ela sentia o desespero intensificar-se a cada segundo. Os dois homens continuavam lá fora, à espera.

A mente de Dana disparava. Ela virou-se para a multidão e sorriu.

- Já sei o que vou fazer. Vamos lá para fora, no ar livre, que darei um autógrafo a cada um de vocês.

Ouviram-se gritinhos de excitação.

Dana entregou o vestido ao gerente.

- Guarde-o. Obrigada. - Foi avançando para a porta, seguida pelos fãs. Os dois homens do lado de fora recuaram, confusos, quando o bando de gente acotovelou-se perto deles.

Dana virou-se para os fãs:

- Quem é o primeiro? - Todos a comprimiam, estendendo canetas e pedaços de papel.

Diante deles, os homens pareciam sem graça. Enquanto assinava os autógrafos, Dana continuou movendo-se para a saída do terminal. A multidão seguia atrás. Um táxi parou na curva, deixando um passageiro.

Dana virou-se para a multidão.

- Obrigada. Agora tenho de ir embora. - Entrou de um salto no carro e, um instante depois, o táxi desaparecia no tráfego.

Jack Stone falava ao telefone com Roger Hudson.

- Sr Hudson, ela conseguiu escapar da gente, mas…

- Porra! Não quero saber disso. Quero ela fora de cena… já!

- Não se preocupe, senhor. Temos o número da placa. Ela não pode ir muito longe.

- Não me decepcionem mais uma vez. - Roger Hudson bateu-lhe o telefone na cara.

A Carson Pirie Scott be Company, no coração do centro comercial e de diversões de Chicago, estava cheia de compradores. No balcão de lenços de cabeça, uma vendedora terminava de embrulhar um pacote para Dana.

- Vai pagar em dinheiro ou cheque?

- Dinheiro. - Era um absurdo deixar uma pista escrita.

Ela pegou o pacote e já ia quase chegando à saída quando parou, cheia de medo. Viu dois homens diferentes parados diante da porta com walkietalkies.

Olhou para eles, a boca de repente seca. Voltou-se e correu de volta até o balcão.

A vendedora perguntou:

- Precisa de mais alguma coisa, senhorita?

- Não. Eu… - Olhou em volta, desesperada. - Tem outra porta de saída aqui?

- Ah, sim, temos várias entradas.

Não adianta, pensou Dana. Devem estar todas vigiadas. Desta vez, não ia conseguir escapar Reparou numa compradora com um casacão verde surrado, olhando para um lenço num mostruário de vidro.

- Lindos, não? - exclamou Dana.

A mulher sorriu.

- São mesmo.

Os homens do lado de fora olhavam atentos as duas conversando.

Entreolharam-se e encolheram os ombros. Tinham todas as saídas cobertas.

Dentro, Dana dizia:

- Eu gostaria deste casaco que está usando. É da minha cor preferida exata.

- Receio que esta coisa velha esteja muito gasta. O seu é muito bonito.

Os dois homens diante da porta não tiravam os olhos das duas.

- A droga do frio está de rachar - queixou-se um deles.

- Tomara que a maldita saia logo dali e a gente acabe logo com isso.

O companheiro fez que sim com a cabeça.

- Ela não tem como conseguir… - Interrompeu-se quando viu as duas mulheres na loja começarem a trocar os casacos. Abriu um largo sorriso. - Nossa, veja como ela está tentando se livrar. As duas estão trocando os casacos. Que grande imbecil.

As duas mulheres desapareceram por um momento atrás do cabide de roupas. Um dos homens falou no walkie-talkie.

- O alvo trocou seu casacão vermelho por um verde…

Espere aí. Ela está indo para a saída quatro. Pegue-a lá.

Na saída quatro, dois homens a esperavam. Momentos depois, um deles falou no celular - Pegamos ela. Traga o carro.

Viram quando ela saiu pela porta para o ar frio. Apertou o casacão verde em volta do corpo e seguiu pela rua. Eles a cercaram. Ao chegar a uma esquina, quando ela ia fazer sinal para chamar um táxi, os homens agarraram-lhe os braços.

- Você não precisa de táxi. Temos um carro bonito à espera.

Ela olhou para eles, atônita.

- Quem são vocês? De que estão falando? Um dos homens a encarava.

- Você não é Dana Evans.

- Bem, claro que não.

Os homens entreolharam-se, soltaram a mulher e correram de volta para a loja. Um deles apertou o botão do walkietalkie.

- Alvo errado. Alvo errado. Está me ouvindo? Quando todos entraram juntos na loja, Dana já havia desaparecido.

Ela tinha sido tomada por um pesadelo vivo, colhida num mundo hostil, com inimigos desconhecidos tentando matá-la. Enredara-se numa teia de horror, quase paralisada de medo.

Quando desceu do táxi, pôs-se a andar rápido, tentando não correr e chamar a atenção para si, sem a menor idéia do lugar a que se dirigia.

Passou por uma loja com uma placa: Sede de Trajes de Época, Fantasias, Perucas e Maquilagem.

- Posso ajudá-la?

Sim. Chame a polícia. Diga a eles que alguém está tentando me matar.

- Senhorita? -há… sim. Eu gostaria de experimentar uma peruca loura.

- Por aqui, por favor Momentos depois, Dana via sua imagem como loura no espelho.

- É impressionante como muda sua aparência.

Espero.

Fora da loja, ela acenou para um táxi.

- Aeroporto O’Hare. - Preciso chegar a Kemal.

Quando o telefone tocou, Rachel atendeu.

- Alô… Dr Young? O resultado final do teste? Jeff viu a repentina tensão em seu rosto.

- Pode me dizer pelo telefone. Só um minuto. - Ela olhou para Jeff; respirou fundo e levou o telefone para o quarto.

Ele ouviu a voz dela, enfraquecida.

- Vá em frente, doutor Houve um silêncio que durou três longos minutos, e quando Jeff; preocupado, ia levantar-se para ir até o quarto, Rachel saiu, com um brilho no rosto que ele nunca vira antes.

- Funcionou! - Ela estava quase sem ar de tanta emoção. - Jeff, o câncer regrediu. A nova terapia deu certo!

- Graças a Deus! Mas isso é maravilhoso, Rachel.

- Ele quer que eu fique aqui por mais algumas semanas, mas a crise passou - disse Rachel, a voz cheia de vitorioso entusiasmo.

- Vamos sair para comemorar - disse Jeff. - Fico com você até…

- Não.

- Não… o quê?

- Não preciso mais de você, Jeff.

- Eu sei, e fico feliz por nós…

- Você não entende. Quero que vá embora.

Ele olhou para ela, surpreso.

- Por quê…?

- Meu doce e querido Jeff. Não quero magoá-lo, mas agora que a doença regrediu, significa que vou voltar a trabalhar. É a minha vida. É o que sou.

Vou telefonar e ver quais os trabalhos em oferta. Eu me senti presa numa armadilha aqui com você.

Obrigada por me ajudar, Jeff: Realmente sou muito grata a você.

Mas chegou a hora de nos despedirmos. Tenho certeza que Dana sente a sua falta. Sendo assim, por que simplesmente não vai embora, querido?

Jeff encarou-a alguns instantes e fez que sim com a cabeça.

- Está bem.

Rachel viu-o entrar no quarto e começar a arrumar a mala.

Vinte minutos depois, quando ele saiu com a mala na mão, encontrou-a falando ao telefone. -…e voltei ao mundo real, Betty. Já posso começar a trabalhar daqui a algumas semanas… Eu sei. Não é maravilhoso?

Jeff ficou parado ali, esperando para despedir-se. Rachel deulhe um aceno com a mão e voltou para o telefone.

- Vou lhe dizer o que eu quero… me arranje uma filmagem num país tropical…

Rachel viu Jeff cruzar a porta. Devagar, deixou o telefone Cair. Foi até a janela e olhou o único homem que amara em toda a vida sair dela para sempre.

As palavras do Dr Young ainda lhe soavam na cabeça.

- Srta. Stevens, lamento muito, mas tenho más notícias.

O tratamento não funcionou… Ocorreu uma metástase do câncer.. muito disseminada. Receio que seja terminal… talvez apenas mais um ou dois meses…

Rachel lembrou-se do diretor de Hollywood, Roderick Marshall, dizendolhe: “Fico feliz que tenha vindo. Vou fazer de você uma grande estrela.” E quando o excruciante rio vermelho de dor começou mais uma vez a destruir seu corpo, ela pensou: Roderick Marshall teria se orgulhado de mim.

Quando o avião de Dana aterrissou, o Aeroporto Dulles em Washington estava apinhado de passageiros à espera da bagagem. Ela passou pelas esteiras, saiu direto na rua e tomou um dos táxis diante da entrada. Não viu nenhum homem com aparência suspeita, mas seus nervos uivavam. Pegou o estojo de maquilagem na bolsa e olhou no pequeno espelho para tranqüilizar-se. A peruca loura dava-Lhe uma aparência completamente diferente. Terá de funcionar por ora, pensou. Preciso chegar a Kemal.

Kemal abriu os olhos devagar, despertado pelo barulho de vozes que chegavam através da porta do escritório que era o seu quarto. Sentia-se grogue.

- O garoto continua dormindo - ouviu a Sra. Daley dizer - Eu o droguei..

Um homem respondeu:

- Vamos ter de acordá-lo.

A voz de um segundo homem disse:

- Talvez fosse melhor se o levássemos dormindo.

- Podia liquidar ele aqui mesmo - disse a Sra. Daley. E depois se livrar do corpo.

Kemal de repente ficou totalmente desperto.

- Temos de mantê-lo vivo por algum tempo. Eles vão usálo como ísca para agarrar a tal de Evans.

Kemal sentou-se, prestando atenção, o coração martelando.

Onde ela está?

- Não sabemos ao certo. Mas sabemos que ela deve estar vindo para cá a fim de pegar o garoto.

Kemal saltou da cama. Ficou parado por um momento, rígido de medo. A mulher em quem confiava queria matá-lo.

Pizda! Não ia ser assim tão fácil, jurou a si mesmo. Eles não conseguiram me matar em Sarajevo. Não vão me matar aqui. Pôs-se freneticamente a vestir suas roupas. Quando pegou o braço artificial na cadeira, a prótese escorregou-lhe da mão e caiu no chão com o que lhe pareceu uma queda estrondosa. Ficou imóvel. Os homens do lado de fora continuavam conversando. Não tinham ouvido o barulho. Kemal prendeu o braço e acabou dE vestir-se depressa.

Abriu a janela e foi golpeado por uma lufada de ar gelado Seu sobretudo estava no outro quarto. Saiu pelo parapeito da janela só com um paletó fino, os dentes tiritando. Uma escada de incêndio percorria o prédio de cima a baixo, e ele agarrou-se a ela, cuidadosamente, para abaixar-se e ficar fora da visão pela janela da sala de estar Ao chegar à calçada, olhou para o relógio de pulso. Eram 2:45 da tarde. De algum modo, tinha dormido mais da metadE do dia. Pôs-se a correr - Vamos amarrar o garoto, só para o caso de…

Um dos homens abriu a porta do quarto e olhou em volta surpreso.

- Ei, ele fugiu!

Os dois homens e a Sra. Daley correram apressados até a janela aberta, a tempo de ver Kemal disparando a toda velocidade pela rua.

- Peguem ele!

Kemal corria como num pesadelo; as pernas ficando cada vez mais fracas e elásticas passo após passo. Cada respiração era uma facada no peito. Se eu conseguir chegar à escola antes de fecharen os portões às três da tarde, pensou, ficarei seguro. Eles não vão ousar me machucar com todos os outros garotos em volta.

O sinal de trânsito à frente mudou para vermelho. Kemal ignorou-o, lançou-se como uma flecha e atravessou a rua, esquivando-se de carros, alheio ao barulho das buzinas e ao rangido de freios dos automóveis.

Chegou ao outro lado da rua E continuou correndo.

A Srta. Kelly pode chamar a polícia, e eles vão proteger Dana.

Começava a ficar sem fôlego, e sentia um aperto no peito.

Deu mais uma olhada no relógio: 2:55. Ergueu os olhos. Viu a escola logo adiante. Faltam só mais dois quarteirões para chegar.

Estou a salvo, pensou Kemal. Ainda não acabaram as aulas.

Um minuto depois, chegava ao portão da frente. Parou diante dele e fitou, incrédulo. Estava trancado. De repente, por detrás, sentiu um pulso de ferro no ombro.

- Hoje é sábado, idiota.

- Pare aqui - disse Dana. O táxi estava a dois quarteirões de seu apartamento. Ela viu-o se afastando. Seguiu a pé devagar, o corpo tenso, cada sentido alerta, vistoriando minuciosamente as ruas com os olhos, à procura de qualquer coisa fora do comum. Tinha certeza que Kemal estava a salvo. Jack Stone o protegeria.

Quando chegou à esquina de seu prédio, evitou a entrada da frente e entrou na viela paralela que levava aos fundos. Tudo deserto. Entrou pela porta de serviço e subiu a escada sem fazer barulho. Chegou ao segundo andar, começou a atravessar o corredor e de repente parou. A porta de seu apartamento estava aberta. Dana foi instantaneamente inundada pelo medo.

Avançou veloz para a porta e entrou correndo.

- Kemal!

Ninguém. Dana lançou-se com ímpeto pelo apartamento, frenética, imaginando o que poderia ter acontecido. Onde estava Jackstone? Onde estava Kemal? Na cozinha, a gaveta de um armário estava caída no chão e o conteúdo se espalhara. Havia dezenas de pequenas embalagens, algumas cheias, outras vazias. Curiosa, ela pegou uma e examinou-a. O rótulo dizia:

Comprimidos BuSpar l5mg, com NDC D087 D822-32 assinalado.

Que era aquilo? A Sra. Daley vinha tomando drogas ou dando-as para Kemal? Poderia ter alguma coisa a ver com a mudança de comportamento dele? Dana pôs uma das embalagens no bolso do sobretudo.

Cheia de pavor, saiu do apartamento. Fez o mesmo caminho de volta, saindo na viela e seguindo para a rua. Ao virar a esquina, um homem escondido atrás de uma árvore falou num walkie-talkie ao comparsa na esquina defronte.

Diante de Dana, ficava a Farmácia Washington. Ela entrou.

- Ah, Srta. Evans. Posso ajudá-la? - perguntou o farmacêutico.

- Sim, Coquina. Estou curiosa sobre isso. - Tirou da bolsa o saquinho.

O farmacêutico deu uma olhada.

- BuSpar: É um agente ansiolítico. Cristal branco, solúvel em água.

- Para que serve? - perguntou Dana.

- É um relaxante. Tem um efeíto calmante. Claro, quando tomado em doses maiores pode causar sonolência e fadiga.

Ele está dormindo. Quer que eu o acorde? Quando chegou da escola, se sentia tão cansado que achei que um sono lhe faria bem…

Então aquilo explicava o que vinha acontecendo. E foi Pamela Hudson quem tinha enviado a Sra. Daley e pus Kemal nas mãos daquela megera, pensou Dana. Sentiu náuseas no estômago. Olhou para o farmacêutico.

- Obrigada, Coquina.

- Foi um prazer, Srta. Evans.

Dana saiu pela porta direto na rua. Os dois homens se aproximavam dela.

- Srta. Evans, poderíamos lhe falar um min…

Dana virou-se e correu. Os homens vinham em sua cola.

Chegou à esquina da rua Dois. Um policial no meio do cruzamento dirigia o tráfego intenso.

Dana correu para a rua em direção a ele.

- Ei! Volte, senhorita.

Dana continuou aproximando-se.

- Está atravessando o sinal vermelho! Não me ouviu? Volte!

Os dois homens esperavam na esquina, olhando com atenção.

- É surda? - gritou o policial.

- Feche a matraca! - Deu um tapa com força na face do policial. O guarda, furioso, segurou-lhe o braço.

- Está presa, dona.

Empurrou-a de volta para a calçada, mantendo-a segura, enquanto falava pelo rádio.

- Preciso de um preto-e-branco.

Os dois homens parados se entreolharam, sem saber o que fazer Dana lançou-lhes um olhar do outro lado e sorriu. Ouviu-se o som de uma sirene próxima e, alguns instantes depois, um carro de polícia parou diante deles.

Impotentes, os dois homens olharam quando a puseram no banco de trás da radiopatrulha e o carro afastou-se.

Na delegacia de polícia, Dana perguntou:

- Tenho direito a um telefonema, certo?

- Certo - respondeu o sargento, que lhe entregou um telefone. Ela fez uma chamada.

A uns dez quarteirões dali, o homem que segurava Kemal pela gola da camisa empurrava-o em direção a uma limusine à espera na curva, o motor ligado.

- Por favor! Por favor, me solte - implorou Kemal.

- Feche o bico, garoto.

Quatro fuzileiros navais passavam naquele momento.

- Não quero ir pro beco com você - berrou Kemal.

O homem lançou-lhe um olhar perplexo.

- Como?

- Por favor, não me obrigue a ir pro beco. - Kemal virou-se para os fuzileiros. - Ele quer me pagar cinco dólares pra ir ao beco com ele. Eu não quero ir. Os fuzileiros pararam, encarando o homem.

- Por que, seu pervertido imundo…

O homem recuou.

- Não, não. Espere um minuto. Vocês não entendem…

Um dos fuzileiros disse, sorrindo abertamente.

- Entendemos, sim, meu chapa. Tire as mãos do garoto.

- Cercaram o homem. Ele ergueu as mãos para defender-se.

Kemal aproveitou e saiu correndo a toda.

Um garoto de entrega de encomendas descia de uma bicicleta e dirigia-se para uma casa. Kemal saltou na bicicleta e afastou-se, pedalando furiosamente. O homem viu, frustrado, quando ele contornou a esquina e desapareceu.

Na delegacia de polícia, a porta da cela abriu-se com um rangido.

- Está livre para sair, Srta. Evans. Foi liberada sob fiança.

Matt! O telefonema funcionou, pensou Dana, alegre. Ele não perdeu tempo.

Quando pisou no saguão da recepção, parou em choque.

Um dos homens a esperava ali.

Sorriu para ela e disse:

- Está livre, irmâ. Vamos.

Agarrou-a com força pelo braço e pôs-se a conduzi-la para a rua. Quando saíram, o homem parou, aturdido. Diante da delegacia, uma equipe completa da WTN.

- Olhe para cá, Dana…

- Dana, é verdade que você deu um tapa na cara de um policial…?

- Ele a molestou…?

- Vai abrir processo…?

O homem foi se encolhendo e afastando, cobrindo o rosto.

- Qual o problema? - chamou Dana. - Não quer que tirem sua foto?

Ele fugiu.

Matt Baker surgiu ao lado de Dana.

- Vamos dar o fora dessa barulheira infernal.

No prédio da Wtn, Elliot Cromwell, Matt Baker e Abbe Lasmann ouviam em chocado silêncio, já há meia hora, a história de Dana. -…e a FRA também está envolvida. Por isso é que o general Booster tentou me impedir de investigar - Estou aturdido - disse Elliot Cromwell. - Como todos nós pudemos ter nos enganado tanto e por tanto tempo a respeito de Taylor Winthrop? Acho que devíamos informar à Casa Branca sobre o que está acontecendo.

Vamos pedir a eles que comuniquem ao procurador-geral e ao FBI.

- Elliot, até agora só temos minha palavra contra a de Roger Hudson - disse Dana. - Em quem você acha que vão acreditar?

Abbe Lasmann perguntou:

- Não temos nenhuma prova?

- O irmão de Shdanoff está vivo. Tenho certeza que falará. Assim que puxarmos o primeiro fio, toda a história se desenredará.

Matt Baker inspirou fundo e lançou um olhar de admiração a Dana.

- Quando você sai em busca de uma matéria, sai mesmo em busca de uma matéria.

- Matt, que vamos fazer em relação a Kemal? Não sei aonde procurar..

- Não se preocupe - disse Matt, implacável. - Vamos encontrá-lo.

Enquanto isso, temos de arranjar um lugar para você se esconder onde ninguém possa encontrar Abbe Lasmann ofereceu-se.

- Pode usar meu apartamento. Ninguém vai procurar você lá.

- Obrigada. - Dana virou-se para Matt. - Sobre Kemal…

- Vamos pôr o FBI nisso já. Mandarei o motorista levar você ao apartamento de Abbe. Agora a coisa está sob nosso controle, Dana. Tudo vai ficar bem. Telefono para você assim que souber de alguma coisa.

Kemal pedalava pelas ruas cobertas de gelo, ansioso, olhando para trás sem parar. Nenhum sinal do homem que o agarrara.

Preciso chegar até Dana, pensava, desesperadamente. Não posso deixar que eles a machuquem. O problema era que o estúdio ficava no outro extremo do centro da cidade.

Quando chegou a um ponto de ônibus, desceu da bicicleta e largou-a na grama. Ao ver um ônibus se aproximando, apalpou os bolsos e se deu conta de que não tinha um tostão.

Virou-se para um passante.

- Com licença, poderia me dar um…

- Suma daqui, garoto.

Kemal tentou uma mulher que se aproximava.

- Com licença, preciso de dinheiro para a passagem e… - A mulher apertou o passo e afastou-se.

Kemal ficou ali no frio, sem sobretudo, tremendo. Ninguém parecia ligar.

Tenho de arranjar o dinheiro da passagem, pensou.

Arrancou o braço artificial e estendeu-o no gramado. Quando o homem seguinte passou, Kemal estendeu o toco e disse:

- Com licença, senhor. Poderia me dar o dinheiro para uma passagem de ônibus?

O homem parou.

- Claro, filho - e estendeu um dólar a Kemal.

- Obrigado.

Quando o homem se afastou, Kemal pôs rápido o braço de volta. Um ônibus aproximava-se, a apenas um quarteirão do ponto. Consegui, ele pensou, jubiloso. Nesse momento, sentiu uma fisgada na nuca. Ao começar a voltar-se para ver o que ocorrera, tudo ficou obscuro. Dentro de sua cabeça, uma voz gritava: Não! Não! Kemal desabou no chão, inconsciente.

Os passantes iam-se juntando.

- Que foi que houve?

- Ele desmaiou?

- Ele está bem?

- Meu filho é diabético - disse o homem. - Vou cuidar dele. - Levantou Kemal e carregou-o para uma limusine à espera.

O apartamento de Abbe Lasmann ficava na parte noroeste de Washington.

Era grande e confortavelmente decorado com móveis e tapetes brancos.

Sozinha no apartamento, andando de um lado para o outro em pânico, Dana esperava o telefone tocar. Kemal deve estar bem. Não há motivo algum para o machucarem. Ele vai ficar ótimo. Onde está? Por que não consigo encontrá-lo?

Quando o telefone tocou, assustou-a. Ela pegou-o num salto.

- Alô.

Caiu a ligação.

Tocou mais uma vez e Dana percebeu que era o celular Sentiu uma repentina sensação de alívio. Apertou o botão.

- Jeff?

A voz de Roger Hudson saiu com toda a calma:

- Temos andado à sua procura, Dana. Estou com Kemal aqui.

Ela ficou imobilizada, sem poder falar. Acabou sussurrando.

- Roger..

- Receio não poder controlar os homens aqui por muito mais tempo. Eles querem cortar o braço bom de Kemal. Devo deixar que façam isso?

- Não! - Foi um grito estridente. - Que… que é que você quer?

- Só quero falar com você - disse Roger Hudson, ponderado. - Quero que venha até aqui em casa, e que venha sozinha. Se trouxer alguém, não me responsabilizarei pelo que acontecer a Kemal.

- Roger..

- Espero-a aqui em meia hora. - A ligação caiu.

Dana ficou ali, entorpecida de medo. Nada pode acontecer a Kemal. Nada pode acontecer a Kemal. Socou as teclas do número do telefone de Matt Baker. A voz gravada dele surgiu no aparelho.

- Você ligou para o escritório de Matt Baker. No momento não estou, mas deixe um recado que ligarei de volta o mais rápido possível.

Veio o ruído de um sinal eletrônico.

- Matt, eu… eu acabei de receber um telefonema de Roger Hudson. Ele está com Kemal preso em sua casa. Leve a polícia.

Depressa!

Dana desligou o celular e dirigiu-se à porta.

Abbe Lasmann punha algumas cartas na mesa de Matt Baker quando viu a luz de recados piscando na secretária dele. Apertou o botão para ouvir a gravação de Dana. Ficou ali um momento, prestando atenção. Depois sorriu e apertou o botão APAGAR MENSAGENS.

Assim que o avião pousou no Aeroporto Dulles, Jeff telefonou para Dana.

Durante todo o vôo, não tirara da cabeça aquele tom estranho na voz dela, aquele perturbador “Se alguma coisa me acontecer”. O telefone celular dela continuava tocando.

Nada. Em seguida, Jeff tentou o apartamento. Nenhuma resposta. Decidiu entrar num táxi e deu ao motorista o endereço da WTN.

Quando ia entrar no escritório de Matt, Abbe lhe disse:

- Ora, Jeff! Que bom vê-lo de novo.

- Obrigado, Abbe. - E entrou no escritório de Matt Baker.

- Então está de volta - disse Matt. - Como vai Rachel? A pergunta desviou Jeff por um instante.

- Vai bem - disse ele, desligado. - Onde está Dana? Não está respondendo ao celular, nem ninguém atendeu no apartamento.

- Meu Deus, você não sabe o que ela tem sofrido, sabe?

- Me diga - disse Jeff, veemente.

No escritório da recepção, Abbe encostou o ouvido na porta fechada. Só conseguia ouvir trechos da conversa… atentados contra a vida dela…

Sasha Shdanoff… Krasnoyarsk…

Kemal… Roger Hudson…”

Abbe tinha ouvido o bastante. Foi correndo à sua mesa e pegou o telefone.

Um instante depois, falava com Roger Hudson.

Dentro do escritório, Jeff ouvia atento tudo que Matt lhe dizia, estupidificado.

- Não dá para acreditar nisso…

- É tudo verdade - garantiu-lhe Matt Baker. - Dana está no apartamento de Abbe. Vou mandar Abbe telefonar para lá de novo. -Apertou o botão do telefone interno, mas, antes que pudesse falar, ouviu a voz de Abbe. -…e Jeff Connors está aqui. À procura de Dana. Acho que seria melhor você tirá-la do meu apartamento. Eles na certa devem ir para lá… Certo.

Cuidarei disso, Sr Hudson. Se…

Abbe ouviu um ruído e voltou-se. Parados no limiar da porta, Jeff Connors e Matt Baker a encaravam, chocados.

- Sua filha da mãe… - disse Matt.

Jeff virou-se para Matt, frenético.

- Tenho de chegar correndo à casa de Hudson. Preciso de um carro.

Matt Baker olhou pela janela.

- Jamais chegará lá a tempo. O tráfego está de pára-choque contra párachoque.

Do heliporto no telhado, ouviram o som do helicóptero da WTN pousar.

Os dois homens entreolharam-se.

Dana conseguiu parar um táxi diante do apartamento de Abbe Lasmann, mas o percurso até a casa de Hudson parecia durar uma eternidade. O tráfego nas ruas escorregadias era horrendo. A idéia de que se atrasaria e chegaria tarde demais aterrorizava-a.

- Depressa - implorou ao motorista.

Ele lançou-Lhe um olhar pelo espelho retrovisor - Senhora, não sou um avião.

Dana recostou-se, cheia de ansiedade, pensando no que a aguardava adiante. A essa altura Matt teria recebido seu recado e chamado a polícia.

Quando eu chegar lá, a polícia também deverá estar. Se ainda não estiver, posso ganhar tempo até chegarem. Abriu a bolsa. Ainda guardava a lata de aerossol de pimenta. Que bom. Não pretendia dar moleza a Roger e Pamela. À medida que o táxi se aproximava da casa dos Hudsons, Dana lançava olhares pela janela, à procura de alguma atividade policial. Nada.

Quando chegaram e subiram a entrada para carros, ela viu tudo deserto. O medo a sufocava.

Lembrou-se da primeira vez em que tinha ido ali. Como Roger e Pamela lhe haviam parecido maravilhosos. E no entanto eram monstros traidores, assassinos. Tinham Kemal. Um ódio superpoderoso inundou-a.

- Quer que eu espere? - perguntava-Lhe o motorista do táxi.

- Não. - Dana pagou, subiu os degraus diante da casa e tocou a campainha, o coração disparado. Cesar abriu a porta. Quando a viu, seu rosto iluminou-se.

- Srta. Evans.

E com um ímpeto de emoção, Dana percebeu que tinha um aliado.

Estendeu-lhe a mão.

- Cesar

Ele tomou-a em sua manzorra.

- Fico feliz em vê-la, Srta. Evans - disse Cesar - Eu fico feliz em vê-lo. - E dizia-o com sinceridade. Tinha certeza que Cesar a ajudaria. A única questão era saber quando se aproximar dele.

Olhou em volta. - Cesar..

- O Sr Hudson a espera no escritório, Srta. Evans.

- Certo.

Dana seguiu Cesar pelo longo corredor, lembrando as coisas incríveis que haviam acontecido desde que entrara pela primeira vez naquele vestíbulo.

Chegaram ao escritório. Sentado à sua mesa, Roger juntava alguns papéis.

- Srta. Evans - disse Cesar.

Roger ergueu os olhos. Dana viu Cesar afastar-se. Sentiu-se tentada a chamá-lo de volta.

- Bem, Dana. Entre.

Ela entrou, olhou para Roger e foi tomada por uma fúria cegante.

- Onde está Kemal?

- Ah, aquele garoto tão querido - disse Roger - A polícia está vindo para cá, Roger. Se você fizer qualquer coisa a algum de nós…

- Oh, não creio que devamos nos preocupar com a polícia, Dana. - Aproximou-se dela e, antes que soubesse o que ele fazia, já Lhe arrancara a bolsa e começava a vasculhá-la. Pamela me disse que você tem um aerossol de pimenta. Tem andado muito ocupada, não é, Dana? - Pegou a lata de aerossol, ergueu-a e borrifou o conteúdo no rosto de Dana. Ela gritou com a dor ardente. - Oh, ainda não sabe o que é a dor, minha cara, mas lhe garanto que vai descobrir Lágrimas escorriam pelo rosto de Dana.

Ela tentava retirar o líquido com as mãos. Educadamente, Roger esperou que terminasse e depois borrifou-lhe mais uma vez o rosto.

Dana soluçava.

- Quero ver Kemal.

- Claro que quer. E Kemal quer ver você. O garoto está aterrorizado, Dana.

Nunca vi ninguém tão aterrorizado. Sabe que vai morrer, e eu Lhe disse que você também ia morrer. Acha que foi inteligente, não, Dana? A verdade é que você foi uma ingênua. Nós a estávamos usando. Sabíamos que alguém no governo russo tinha conhecimento do que fazíamos e ia nos denunciar Mas não conseguimos descobrir quem era. Mas você fez esse favor para nós, não foi?

A lembrança dos corpos ensangüentados de Sasha Shdanoff e sua amiga passou como um clarão na mente de Dana.

- Sasha Shdanoff e o irmão dele, Boris, foram muito inteligentes. Ainda não encontramos Boris, mas logo o encontraremos.

- Roger, Kemal não tem nada a ver com isso. Deixe-o…

- Acho que não, Dana. Comecei a me preocupar quando você conheceu a pobre malfadada Joan Sinisi. Ela ouviu por acaso Taylor falando do plano russo. Ele temia mandar matá-la porque ela estava ligada a ele. Então a despediu. Quando ela entrou com um processo por demissão injusta, ele fez um acordo, com a condição de que ela jamais discutisse o assunto.

Roger Hudson exalou um suspiro. - Portanto, receio que seja você a verdadeira responsável pelo acidente de Joan Sinisi.

- Roger, Jack Stone sabe…

Roger Hudson balançou a cabeça.

- Jack Stone e seus homens têm vigiado cada passo seu.

Podíamos ter-nos livrado de você a qualquer momento, mas esperamos até conseguir a informação de que precisávamos. Realmente, não temos mais necessidade de você.

- Quero ver Kemal.

- Tarde demais. Receio que o pobre Kemal tenha sofrido um acidente.

Dana lançou-lhe um olhar horrorizado.

- Que foi que vocês…?

- Pamela e eu decidimos que um pequeno incêndio era a melhor maneira de pôr fim à lamentável vidinha de Kemal. Por isso, o mandamos de volta para a escola. Travessura dele, forçar a entrada na escola num sábado. Era simplesmente pequeno o bastante para passar pela janela do porão.

Ela foi tomada de cima a baixo por um ódio cegante.

- Seu monstro insensível. Jamais vai sair impune disso.

- Você me decepciona, Dana. Recorrendo a clichês? O que não entende é que já saímos impunes disso. - Ele voltou para a escrivaninha e apertou um botão. Um momento depois, surgiu Cesar - Sim, Sr Hudson.

- Quero que cuide da Srta. Evans. E cuide para que ela ainda esteja viva quando acontecer o acidente.

- Sim, Sr Hudson.

Cesar era um deles. Dana não podia acreditar - Roger, me escute…

Cesar pegou-a pelo braço e pôs-se a retirá-la do escritório.

- Roger…

- Adeus, Dana.

Cesar apertou o punho no braço de Dana, levou-a depressa pelo corredor, a cozinha, e saíram para a lateral da casa, onde havia uma limusine estacionada.

O helicóptero da WTN aproximava-se da propriedade dos Hudsons.

Jeff disse ao piloto, Norman Bronson:

- Pode descer no gramado e… - Interrompeu-se ao olhar para baixo e ver Cesar pondo Dana numa limusine. - Não! Espere um minuto - disse.

A limusine começou a sair pela entrada da garagem, dirigindo-se para a rua.

- Que quer que eu faça?

- Siga-os.

Na limusine, Dana disse.

- Você não quer fazer isso, Cesar. Eu…

- Cale a boca, Srta. Evans.

- Cesar, me escute. Você não precisa dessas pessoas. São assassinos. Você é um homem decente. Não deixe o Sr. Hudson obrigá-lo a fazer coisas que…

- O Sr Hudson não está me forçando a fazer nada. Faço isso pela Sra.

Hudson. - Olhou para Dana pelo espelho retrovisor e abriu um largo sorriso. - A Sra. Hudson cuida muito bem de mim.

Dana examinou-o, estupefata. Não posso deixar que isso aconteça.

Para onde está me levando?

- Ao Parque Rock Creek. - Não precisou acrescentar: Onde vou matá-la.

Numa caminhonete espaçosa, Roger Hudson, Pamela, Jackstonee e a Sra.

Daley dirigiam-se para o Aeroporto Nacional de Washington.

- O avião já está pronto. O piloto tem o plano de vôo para Moscou - disse Jack Stone.

Pamela Hudson comentou:…

- Deus, detesto clima glacial. Espero que aquela cadela queime no inferno por me fazer passar por isso.

- E Kemal? - perguntou Roger Hudson.

- O incêndio na escola vai ser ateado em vinte minutos.

O garoto está no porão. Profundamente sedado.

Dana ia ficando cada vez mais desesperada. Aproximavam-se do Parque Rock Creek e o tráfego começava a reduzir Kemal está aterrorizado, Dana.

Nunca vi ninguém tão aterrorizado. Sabe que vai morrer, e eu lhe disse que você também ia morrer.

No helicóptero que seguia de cima a limusine, Norman Bronson disse:

- Ele vai fazer a curva, Jeff. Parece que está indo para o Parque Rock Creek.

- Não o perca de vista.

Na FRA, o general Booster entrou enfurecido em seu escritório.

- Que diabos está acontecendo aqui? - perguntou a um dos ajudantes.

- Eu lhe disse, general. Enquanto esteve fora, Jack Stone recrutou alguns dos nossos melhores homens, e eles entraram numa grande empreitada com Roger Hudson. O alvo é Dana Evans. Olhe isso. - O ajudante abriu uma tela em seu computador e, um minuto depois, apareceu uma foto de Dana nua, entrando no chuveiro no Hotel Breidenbacher Hof.

A expressão no rosto do general Booster endureceu-se.

- Meu Deus! - Voltou-se para o ajudante. - Onde está Jack Stone?

- Partiu. Vai deixar o país com os Hudsons.

O general Booster retrucou asperamente:

- Ligue-me com o Aeroporto Nacional.

No helicóptero, Norman Bronson olhou para baixo e disse:

- Estão indo mesmo para o parque, Jeff. Assim que entrarem debaixo daquelas árvores, vamos perdê-los de vista.

Jeff exortou-o:

- Temos de detê-los. Pode pousar defronte deles na estrada?

- Claro.

- Faça isso.

Norman Bronson empurrou os controles à frente e o helicóptero começou a descer. Sobrevoou a limusine e pôs-se a baixar delicadamente. Pousou vinte metros à frente da limusine. Eles ouviram os pneus chiando até o carro parar.

- Desligue os motores - disse Jeff.

- Não podemos fazer isso. Vamos ficar à mercê do cara.

- Desligue.

Norman Bronson olhou para Jeff.

- Tem certeza que sabe o que está fazendo?

- Não.

O piloto suspirou e desligou a ignição. As imensas pás do helicóptero começaram a diminuir a velocidade da rotação até pararem.

Cesar abrira a porta de trás da limusine.

- Seu amigo está tentando nos causar problema - disse a Dana. - Curvou-se e, com o punho fechado, desferiu o primeiro golpe, acertando-lhe o queixo.

Ela caiu de costas no assento, inconsciente. Cesar levantou-se e partiu para cima do helicóptero.

- Aí vem ele - disse Norman Bronson, nervoso. - Meu Deus, esse cara é um gigante!

Cesar aproximava-se do helicóptero, o rosto cheio de expectativa.

- Jeff; ele deve ter um revólver. Vai nos matar Jeff berrou pela janela:

- Você e seus chefes vão para a prisão, idiota.

Cesar começou a apertar mais o passo.

- Acabou tudo pra vocês. Faria melhor desistindo.

Cesar estava a dez metros do helicóptero.

- Vai virar boi de piranha na cadeia.

Cinco metros.

- Vai adorar isso, não, Cesar?

Cesar agora corria. Dois metros.

Jeff apertou com força o polegar no botão do arranque e as imensas pás do helicóptero puseram-se a girar devagar. Cesar não prestou atenção, pois tinha os olhos fixos em Jeff, o rosto cheio de ódio. As lâminas começaram a girar cada vez mais rápido. Quando Cesar lançou-se para a porta do helicóptero, compreendeu de repente o que acontecia, embora fosse tarde demais. Ouviu-se um alto chape, e Jeff fechou os olhos. As partes externa e interna do helicóptero ficaram no mesmo instante cobertas de sangue.

- Vou vomitar - disse Norman Bronson. Desligou a ignição.

Jeff deu uma olhada no corpo decapitado no chão, saltou do helicóptero e saiu disparado para a limusine. Abriu a porta.

Dana estava inconsciente.

- Dana… Querida…

Ela abriu lentamente os olhos. Viu Jeff e murmurou:

- Kemal…

A limusine ainda estava a mais de três quilômetros da Escola Preparatória Lincoln quando Jeff berrou:

- Olhem. - Diante deles, à distância, viram a fumaça começando a escurecer o céu.

- Eles estão pondo fogo na escola - disse Dana, com um grito agudo. - Kemal está lá. No porão. Oh, meu Deus.

Momentos depois, a limusine alcançou a escola. Do prédio erguia-se uma densa nuvem de fumaça. Vários bombeiros trabalhavam para debelar o fogo.

Jeff saltou do carro e dirigiu-se para a escola. Um bombeiro deteve-o.

- Não pode se aproximar mais, senhor.

- Tem alguém dentro? - perguntou Jeff.

- Não. Acabamos de arrombar a porta da frente.

- Tem um garoto no porão.

Antes que alguém pudesse impedi-lo, Jeff correu em direção à porta da frente arrombada e entrou a toda. No corredor cheio de fumaça, tentou berrar o nome de Kemal, mas só saiu uma tosse. Pôs um lenço no nariz e atravessou às pressas o corredor até a escada que levava ao porão. A fumaça era acre e densa. Jeff desceu tateando pela escada e apoiando-se no corrimão.

- Kemal! - gritou. Nenhuma resposta. - Kemal! Silêncio. Jeff vislumbrou uma forma vaga no outro lado do porão. Seguiu para lá, tentando não respirar, os pulmões ardendo.

Quase tropeçou e caiu sobre Kemal. Sacudiu-o. - Kemal! O garoto estava inconsciente. Com um enorme esforço, Jeff pegou-o no colo e pôs-se a carregá-lo para a escada. Cambaleava, como se embriagado, pela rodopiante nuvem negra, levando Kemal nos braços. Quando chegou à escada, meio o carregava e meio o arrastava. Sufocado e cego pela fumaça, ouviu vozes distantes, perdeu os sentidos.

O general Booster falava ao telefone com Nathan Novero, o administrador do Aeroporto Nacional de Washington.

- Roger Hudson guarda seu avião aí?

- Sim, general. Na verdade, a aeronave se encontra aqui agora. Acho que acabaram de liberar a pista para eles decolarem.

- Aborte.

- Como?

- Chame a torre e aborte.

- Sim, senhor - Nathan Novero chamou a torre. Torre, aborte a decolagem do Gulfstream R3487.

O controlador do tráfego aéreo disse:

- Eles já estão taxiando na pista.

- Cancele a desobstrução para decolagem.

- Sim, senhor - O controlador do tráfego aéreo pegou o microfone. -Torre para Gulfstream R3487. Sua decolagem foi abortada. Retorne ao terminal.

Roger Hudson entrou na cabine.

- Que diabo é isso?

- Deve ser algum tipo de adiamento - disse o piloto. Teremos de retornar ao…

- Não! - interrompeu Pamela Hudson. - Prossiga.

- Com todo o devido respeito, Sra. Hudson, eu perderia meu brevê de piloto se…

Jack Stone aproximou-se do piloto com uma arma apontada para sua cabeça.

- Decole. Vamos para a Rússia.

O piloto sorveu um longo hausto de ar - Sim, senhor.

O avião acelerou e deslizou a grande velocidade pela pista; vinte segundos depois, estava no ar. O administrador do aeroporto viu, consternado, o Gulfstream elevar-se cada vez mais céu afora.

- Meu Deus! Ele violou as…

Ao telefone, o general Booster perguntava, insistente.

- Que está acontecendo? Você os deteve?

- Não, senhor. Eles… eles simplesmente acabaram de levantar vôo. Não temos como fazê-los…

E, naquele momento, o céu explodiu. Sob os olhos da equipe de terra horrorizada, partes do Gulfstream começaram a despencar pelas nuvens em pedaços incandescentes. Parecia continuar explodindo por toda a eternidade.

Na ponta extrema do campo, Boris Shdanoff olhou atento por um longo tempo. Por fim, voltou-se e afastou-se.

A mãe de Dana deu uma mordida numa fatia do bolo de casamento.

- Doce demais. Excessivamente doce. Quando eu era mais jovem e cozinhava, meus bolos derretiam na boca. Não é verdade, querida? “Se derretiam na boca” talvez fosse a última frase que passaria pela mente de Dana, mas não era importante.

- Com certeza, mãe - disse ela, com um sorriso afetuoso.

A cerimônia de casamento foi realizada por um juiz na Prefeitura. Dana convidou a mãe na última hora, após um telefonema.

- Querida, acabei não me casando com aquele homem medonho. Você e Kemal tinham razão sobre ele, por isso voltei para Las Vegas.

- Que aconteceu, mãe?

- Descobri que ele já era casado. A esposa também não gostava dele.

- Sinto muito, mãe.

- Pois é, aqui estou eu mais uma vez sozinha.

Solidão era a insinuação. Por isso Dana a convidou para o casamento.

Vendo a mãe conversar com Kemal e até se lembrar de seu nome, ela sorriu. Ainda vamos transformá-la numa avó. Sua felicidade parecia imensa demais para absorver.

Estar casada com Jeff era um abençoado milagre, mas havia mais.

Após o incêndio, Jeff e Kemal haviam ficado um breve período no hospital para tratamento de inalação de fumaça. Enquanto estiveram lá, uma enfermeira contou a uma repórter as aventuras de Kemal e a matéria foi captada pela mídia. O retrato dele apareceu em todos os jornais e sua história foi contada na televisão. Escreviam um livro sobre suas experiências e falava-se até em uma série de televisão.

- Mas só se for estrelada por mim - insistiu Kemal, que se tornou o herói da escola.

Quando se realizou a cerimônia de adoção, metade dos colegas de escola de Kemal esteve presente para aplaudi-lo.

- Agora sou mesmo adotado, hem?

- Você é adotado mesmo - disseram Dana e Jeff. - Pertencemos um ao outro.

- Jóia. Espere até Ricky Underwood saber disso. Ah-ah! O terrível pesadelo do mês anterior foi aos poucos se dissipando. Os três agora eram uma família, e o lar, um porto seguro.

Não preciso mais de aventuras, pensou Dana. Já tive o suficiente para durar o resto da vida. Certa manhã, anunciou:

- Acabei de achar um apartamento esplêndido para nós quatro.

- Quer dizer nós três - corrigiu-a Jeff.

- Não - disse Dana, tranqüila. - Nós quatro.

Jeff fitava-a.

- Ela quer dizer que vai ter um bebê - explicou Kemal.

- Espero que seja um menino. Podemos lançar bolas na cesta.

Mais boas notícias chegariam. O programa de estréia do Linha do Crime, “História de Roger Hudson, uma conspiração assassina”, recebeu aclamação da crítica e índices de audiência fenomenais. Matt Baker e Elliot Cromwell não se continham de felicidade.

- É melhor arranjar um lugar para pôr o seu Emmy - disse Elliot Cromwell a Dana.

Houve apenas uma nota consternadora. Rachel Stevens sucumbira ao câncer. A notícia saiu publicada nos jornais, e Dana e Jeff ficaram sabendo do que tinha acontecido. Mas, quando a matéria apareceu no teleprompter, Dana olhou-a e engasgou-se.

- Não posso ler isso - sussurrou a Richard Melton. E ele a leu.

Descanse em paz.

Transmitiam o noticiário das onze horas. -…e em Spokane, estado de Washington, um guarda foi acusado pelo assassinato de uma prostituta de dezesseis anos, e é suspeito da morte de outras dezesseis… Na Sicília, o corpo de Malcolm Beaumont, setenta anos, herdeiro de uma fortuna em aço, foi encontrado afogado numa piscina.

Beaumont estava em lua-de-mel com a esposa de 25 anos, e acompanhado por dois irmãos da noiva. Agora, a meteorologia com Marvin Greer.

Quando terminou a transmissão, Dana foi até a sala de Matt Baker - Tem uma coisa me incomodando, Matt.

- Que é? Me diga que eu a elimino.

- Sabe a matéria daquele milionário de setenta anos que foi encontrado afogado numa piscina durante a lua-de-mel com a noiva de 25 anos? Não acha que foi terrivelmente conveniente?


NOTA DO AUTOR


Esta é uma obra de ficção, mas a cidade subterrânea secreta de Krasnoyarsk-26 é real, uma das treze cidades secretas dedicadas à produção nuclear. Krasnoyarsk-26 está situada na Sibéria Central, a 3.000 km de Moscou, e desde sua criação, em 1958, produziu mais de 45 toneladas de armas a base de plutônio.

Embora dois de seus reatores de produção de plutônio tenham sido desativados em 1992, um permanece ativo, produzindo atualmente meia tonelada de plutônio por ano, que pode ser usado na fabricação de bombas atômicas.

Roubos de plutônio têm sido relatados, e o Departamento de Energia dos EUA está trabalhando com o governo russo no aumento das medidas de segurança para proteger o material nuclear.

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