O disparo explodiu a cinco metros do helicóptero. Eles podiam ver o rosto do piloto. O artilheiro tornou a carregar. O helicóptero subiu e desapareceu no céu de Madrid.

O que virá em seguida?, especulou o tenente.


Às onze horas da manhã, Megan Scott apresentou-se na sala de recepção da prisão. Estava abatida e pálida.

- Quero falar com o diretor de la Fuente.

- Tem um encontro marcado?

- Não, mas…

- Lamento muito, mas o diretor não receberá ninguém esta manhã. Se telefonar esta tarde…

- Avise-o que é Megan Scott.

O homem examinou-a mais atentamente.

"Então esta é a rica americana que está tentando libertar Jaime Miró. Eu não me importaria se ela trabalhasse em mim por algumas noites."

- Está bem. Vou avisá-lo que está aqui.

Cinco minutos depois, Megan estava sentada na sala do diretor de la Fuente. Alguns dirigentes da prisão também estavam ali.

- Em que posso ajudá-la, Senhorita Scott?

- Eu gostaria de ver Jaime Miró.

O diretor suspirou.

- Lamento, mas não é possível.

- Mas estou…

- Senhorita Scott, todos sabemos quem é. Se pudéssemos atendê-la, garanto que teríamos o maior prazer - disse com um sorriso. - Nós, espanhóis, somos muito compreensivos. E também somos sentimentais, de vez em quando não hesitamos em ignorar determinados regulamentos. - O sorriso desapareceu. - Mas não hoje, Senhorita Scott. De jeito nenhum. Este dia é muito especial. Levamos anos para capturar o homem que deseja ver. Por isso, hoje é o dia em que todos os regulamentos estão em vigor. Agora, só quem pode ver Jaime Miró é seu Deus… se é que ele tem algum.

Megan estava desesperada.

- Eu não poderia… vê-lo apenas por um instante?

Um dos membros da diretoria da prisão, comovido pela angústia de Megan, sentiu-se tentado a interferir. Mas se conteve.

- Sinto muito, mas não é possível - respondeu o diretor de la Fuente.

- Poderia mandar um recado para ele?

A voz de Megan era trêmula.

- Mandaria um recado para um morto. - O diretor olhou para o relógio. - Ele tem menos de uma hora para viver.

- Mas ele está apelando da sentença. Uma comissão de juízes não está se reunindo para…

- O apelo foi rejeitado. Recebi o comunicado há 15 minutos. A execução vai ocorrer. E agora, se me dá licença…

Ela levantou-se, e os outros seguiram seu exemplo.

Megan olhou ao redor, deparando com rostos frios. Estremeceu.

- Que Deus tenha misericórdia de todos vocês - murmurou ela.

Eles ficaram observando, em silêncio, enquanto Megan deixava a sala.


Dez minutos antes do meio-dia a porta da cela de Jaime Miró foi aberta. O diretor Gomez de la Fuente, acompanhado por seus dois assistentes, Molinas e Arrango, e pelo Dr. Miguel Anunción, entraram na cela. Quatro guardas armados mantinham-se de prontidão no corredor.

- Está na hora - disse o diretor.

Jaime levantou-se. Estava algemado, os pés acorrentados.

- Torci para que se atrasasse. - Ele exibia um ar de dignidade que o diretor de la Fuente não podia deixar de admirar.

"Em outro tempo, em outras circunstâncias, poderíamos ser amigos", pensou.

Jaime saiu para o corredor deserto, os movimentos desajeitados, por causa das correntes nos pés. Foi escoltado pelos guardas, Molinas e Arrango.

- O garrote? - perguntou ele.

O diretor acenou com a cabeça.

- O garrote.

Terrivelmente doloroso, desumano, ainda bem que a execução ocorreria numa cela fechada, longe dos olhos do público e da imprensa, pensou o diretor.

O grupo avançou pelo corredor. Podiam ouvir o brado da multidão na rua lá fora:

- Jaime… Jaime… Jaime…

Era uma explosão de mil gargantas, tornando-se cada vez mais alto.

- Estão chamando por você - disse Pedro Arrango.

- Nada disso. Estão chamando a si mesmos. Chamando por liberdade. Amanhã eles terão outro nome. Eu posso morrer… mas sempre haverá outro nome.

Eles passaram por duas portas de segurança e chegaram a uma pequena câmara na extremidade do corredor, com uma porta de ferro verde. Um padre com uma batina preta surgiu de uma curva do corredor.

- Graças a Deus que cheguei a tempo. Vim dar os últimos sacramentos ao condenado.

Quando ele se encaminhou para Miró, dois guardas bloquearam-lhe a passagem.

- Lamento, padre - disse o diretor de la Fuente -, mas ninguém chega perto dele.

- Mas eu sou…

- Se quer dar os últimos sacramentos, terá de fazê-lo através de portas fechadas. E agora saia da frente, por favor.

Um guarda abriu a porta verde. Parado lá dentro, ao lado de uma cadeira presa no chão, com grossas tiras saindo dos braços, estava um homem enorme, usando uma meia máscara. O garrote estava em suas mãos.

O diretor acenou com a cabeça para Molinas, Arrango e o médico, que entraram na sala atrás de Jaime. Os guardas ficaram no lado de fora. A porta verde foi fechada e trancada.

Lá dentro, os assistentes Molinas e Arrando levaram Jaime para a cadeira. Tiraram-lhe as algemas, amarraram-no na cadeira com as tiras de couro, enquanto o Dr. Anunción e o diretor de la Fuente observavam. Através da porta fechada, mal podiam ouvir o murmúrio do padre. De la Fuente olhou para Jaime e encolheu os ombros.

- Não tem importância. Deus compreenderá o que ele está dizendo.

O gigante com o garrote colocou-se atrás de Jaime. O diretor Gomez de la Fuente perguntou:

- Quer um pano para cobrir o rosto?

- Não.

O diretor olhou para o gigante e acenou com a cabeça. O homem levantou o garrote e estendeu-o para a frente.

Os guardas junto da porta podiam ouvir os gritos da multidão na rua.

- Querem saber de uma coisa? - resmungou um dos guardas. - Eu gostaria de estar lá fora com eles.

Cinco minutos depois, a porta verde foi aberta.

- Tragam o saco para o corpo - disse o Dr. Anunción.


De acordo com as instruções, o corpo de Jaime Miró saiu por uma porta nos fundos da prisão. O saco foi jogado na traseira de um furgão sem qualquer identificação. Mas no momento em que o veículo deixou a área da prisão, a multidão na rua adiantou-se, como se atraída por algum ímã místico.

- Jaime… Jaime…

Mas os gritos eram mais suaves agora. Homens e mulheres choravam, seus filhos olhavam espantados, sem entenderem o que se passava. O furgão passou pela multidão e finalmente alcançaram a estrada.

- Meu Deus! - murmurou o motorista. - Foi fantástico. O cara devia ter alguma coisa.

- É verdade. E milhares de pessoas sabiam disso!


Às duas horas daquela tarde, o diretor Gomez de la Fuente e seus dois assistentes, Juanito Molinas e Pedro Arrango, entraram no gabinete do primeiro-ministro.

- Quero dar-lhes meus parabéns - disse o primeiro-ministro. - A execução foi perfeita.

- Senhor primeiro-ministro, não estamos aqui para receber os parabéns - disse o diretor. - Viemos apresentar nossos pedidos de demissão.

Martínez ficou espantado.

- Eu… eu não compreendo. O que…

- É uma questão de humanidade, Excelência. Acabamos de ver um homem morrer. Talvez ele merecesse morrer. Mas não daquele jeito. Foi… bárbaro. Não quero mais fazer parte disso ou de qualquer outra coisa parecida, e meus colegas pensam da mesma maneira.

- Talvez devessem pensar mais um pouco no assunto. Suas pensões…

- Temos de viver com nossas consciências. - O diretor de la Fuente entregou três cartas ao primeiro-ministro. - Aqui estão nossas renúncias.


Ao anoitecer, o furgão cruzou a fronteira com a França e seguiu para a aldeia de Bidache, perto de Bayonne. Parou diante de uma casa de fazenda imaculada.

- É aqui. Vamos nos livrar do corpo antes que comece a feder.

A porta da casa foi aberta por uma mulher de cinquenta e poucos anos.

- Vocês o trouxeram?

- Trouxemos, madame. Onde gostaria que o deixássemos?

- Na sala de visitas, por favor.

- Pois não, madame. Eu… ahn… não esperaria muito tempo para enterrá-lo. Entende o que estou querendo dizer?

Ela observou os dois homens carregarem o saco com o corpo para o interior da casa e largarem-no no chão da sala.

- Obrigada.

- De nada.

Ela ficou parada, observando o furgão afastar-se.

Outra mulher veio dos fundos da casa e correu para o saco.

Abriu-o rapidamente.

Jaime Miró estava encolhido lá dentro, sorrindo.

- Aquele garrote podia ter me deixado com torcicolo.

- Vinho branco ou tinto? - perguntou Megan.


Capítulo 43


No Aeroporto Barajas em Madrid, o ex-diretor Gomez de la Fuente, seus dois assistentes, Molinas e Arrango, o Dr. Anunción e o gigante que vestira a máscara estavam no salão de espera para viajar.

- Ainda acho que estão cometendo um erro ao não irem comigo para Costa Rica - disse de la Fuente. - Com cinco milhões de dólares poderiam comprar toda a porra do país.

Molinas sacudiu a cabeça.

- Arrango e eu vamos para a Suíça. Estou cansado do sol. Vamos comprar algumas dezenas de bonequinhas de neve.

- Eu também - disse o gigante. Eles viraram-se para Miguel Anunción.

- O que vai fazer, doutor?

- Vou para Bangladesh.

- O quê?

- Isso mesmo. Usarei o dinheiro para abrir um hospital. Pensei muito a esse respeito, antes de aceitar a oferta de Megan Scott. Cheguei à conclusão de que se pudesse salvar uma porção de vidas inocentes por deixar um terrorista viver, então seria uma boa troca. Além do mais, devo lhes dizer, eu gostava de Jaime Miró.


Capítulo 44


Fora uma estação das melhores na região rural da França, proporcionando aos fazendeiros colheitas abundantes.

"Eu gostaria que todos os anos pudessem ser tão maravilhosos como este", pensou Rubio Arzano. Fora um bom ano sob mais que um aspecto.

Primeiro, seu casamento, depois, há um ano, o nascimento dos gêmeos. Quem jamais sonhou que um homem pudesse ser tão feliz?

Estava começando a chover. Rubio fez a volta com o trator e seguiu para o celeiro. Pensou nos gêmeos. O menino seria grande e robusto. Mas a menina… Ela seria impossível.

Vai dar trabalho a seu homem, pensou Rubio, sorrindo. Saíu à mãe.

Ele deixou o trator no celeiro e foi para a casa, sentindo a chuva fria no rosto. Abriu a porta e entrou.

- Chegou bem na hora - disse Lucia. - O jantar está pronto.


A reverenda madre Betina despertou com a premonição de que alguma coisa maravilhosa estava prestes a acontecer.

"Mas é claro que muitas coisas boas já aconteceram", pensou ela. O convento Cisterciense fora reaberto há bastante tempo, sob a proteção do rei Don Juan Carlos. Irmã Graciela e as outras freiras levadas para Madrid estavam de volta ao convento, sãs e salvas, refugiando-se mais uma vez na abençoada solidão e silêncio.

Pouco depois do desjejum, a reverenda madre entrou em sua sala e parou abruptamente, aturdida. Em sua mesa, faiscando com um brilho ofuscante, estava a cruz de ouro.

Foi considerado um milagre.


Posfácio


Em 1978, Madrid tentou comprar a paz, oferecendo aos bascos uma autonomia limitada, permitindo-lhes que tivessem sua bandeira, sua língua e um departamento de polícia basco. A ETA respondeu com o assassinato de Constantin Ortin Gil, o governador militar de Madrid, e depois de Luis Carrero Blanco, o homem escolhido por Franco para seu sucessor.

A escala de violência continua.

Num período de três anos, terroristas da ETA mataram mais de seiscentas pessoas. O massacre continua, e a retaliação da polícia tem sido igualmente brutal.

Não faz muitos anos, a ETA continuava com a simpatia dos dois milhões e meio de bascos, mas o terrorismo continuado minou o apoio. Em Bilbao, o próprio coração do país basco, cem mil pessoas saíram às ruas para uma manifestação contra a ETA. O povo espanhol sente que chegou o momento para a paz, o momento para curar as feridas.

A OPUS DEI está mais poderosa do que nunca, mas poucas pessoas se mostram dispostas a discutir o assunto.

Quanto aos conventos Cistercienses da Estrita Observância, há hoje 54, espalhados pelo mundo, sete deles na Espanha.

O antigo ritual de eterno silêncio e isolamento permanece inalterado.

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