CAPÍTULO TREZE
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Aterrissamos suavemente em Sardy Field ao meio-dia e vinte e cinco, hora local. Stephan para o avião bem perto do terminal principal, e pela janela vejo uma grande minivan VW nos esperando.
— Belo pouso.
Christian sorri e aperta a mão de Stephan quando estamos nos preparando para deixar a aeronave.
— É tudo uma questão de altitude e densidade, senhor. — Stephan retribui o sorriso. — Beighley é muito eficiente nos cálculos.
Christian acena com a cabeça para a copiloto de Stephan.
— Foi cravado, Beighley. Um pouso perfeito.
— Obrigada, senhor. — Ela sorri orgulhosa.
— Aproveitem o fim de semana, Sr. e Sra. Grey. Voltamos a nos ver amanhã.
Stephan se afasta, abrindo caminho para desembarcarmos, e, tomando minha mão, Christian me conduz pela escada da aeronave. Lá embaixo, Taylor já está à nossa espera, junto ao veículo.
— Minivan? — pergunta Christian, surpreso, quando Taylor abre a porta do carro.
Taylor esboça um sorriso contrito e dá de ombros ligeiramente.
— Em cima da hora, eu sei — diz Christian, perdoando-o de imediato. Taylor retorna ao avião para apanhar nossa bagagem.
— Quer dar uns amassos nos fundos do carro? — murmura Christian em meu ouvido, um lampejo malicioso nos olhos.
Dou uma risadinha. Quem é este homem, e o que ele fez com o Sr. Super Irritado dos últimos dias?
— Andem, vocês dois. Entrem logo — diz Mia às nossas costas, parecendo impaciente ao lado de Ethan.
Entramos no carro e nos acomodamos no banco traseiro. Eu me aconchego contra o corpo de Christian, e ele passa o braço por cima do encosto do meu assento.
— Confortável? — murmura ele, enquanto Mia e Ethan se sentam à nossa frente.
— Sim.
Sorrio, e ele me beija na testa. E, por algum motivo insondável, hoje me sinto tímida na sua presença. Por quê? Por causa de ontem à noite? Por não estarmos sozinhos? Não consigo identificar o motivo.
Elliot e Kate são os últimos a entrar, e Taylor abre o porta-malas para colocar as bagagens. Cinco minutos depois, estamos a caminho.
Rumamos para Aspen, e aproveito para apreciar a paisagem lá fora. As árvores estão verdes, mas um indício do outono que se aproxima insinua-se aqui e ali, nas pontas amareladas das folhas. O céu é de um azul cristalino, embora algumas nuvens escuras insinuem-se na direção do oeste. Ao nosso redor, para todos os lados, veem-se as Montanhas Rochosas, o pico mais alto bem à nossa frente. As montanhas estão verdes e viçosas, e os picos mais altos têm neve no topo — igual às montanhas que as crianças costumam desenhar.
Estamos no playground de inverno dos ricos e famosos. E eu possuo uma casa aqui. Mal posso acreditar. Lá do fundo da minha mente, brota o conhecido mal-estar que sempre se evidencia quando tento me acostumar à fortuna de Christian, fazendo com que eu me sinta culpada. O que eu fiz para merecer um estilo de vida como esse? Nada, não fiz nada a não ser me apaixonar.
— Já esteve em Aspen antes, Ana? — pergunta Ethan, virando-se para mim e interrompendo minha divagação.
— Não, primeira vez. E você?
— Kate e eu sempre vínhamos aqui na adolescência. Meu pai é um ótimo esquiador. Minha mãe, nem tanto.
— Estou torcendo para que meu marido me ensine a esquiar. — E olho para Christian de relance.
— Não conte com isso — murmura ele.
— Não vou me sair tão mal!
— Você pode acabar quebrando o pescoço. — Seu sorriso desaparece.
Ah. Não quero discutir e azedar seu bom humor, então mudo de assunto.
— Há quanto tempo você tem essa casa?
— Quase dois anos. Agora é sua também, Sra. Grey — responde ele, com suavidade.
— Eu sei — sussurro.
Por algum motivo, porém, não me sinto inteiramente convencida. Aproximando-me mais de Christian, beijo a linha do seu maxilar e me aconchego novamente ao seu lado, ouvindo-o rir e brincar com Ethan e Elliot. Mia entra na conversa de tempos em tempos, mas Kate se mantém quieta, e me pergunto se ela está pensando em Jack Hyde ou alguma outra coisa. Então eu me lembro: Aspen… A casa que Christian possui aqui foi reformada por Gia Matteo e reconstruída por Elliot. Será que é isso que a está preocupando? Não posso perguntar nada na frente de Elliot, dada sua história com Gia. Será que Kate sabe da ligação entre Gia e a casa? Franzo o cenho, imaginando qual será o motivo da preocupação de minha amiga, e decido que vamos conversar quando estivermos sozinhas.
Passamos pelo centro de Aspen, e me sinto revitalizada à medida que conheço o visual da cidade. Vejo-me diante de prédios baixos com tijolinhos vermelhos na sua maioria, chalés em estilo suíço e numerosas casas da virada do século pintadas em cores divertidas. Há também uma boa quantidade de bancos e lojas de grife, indicando a afluência da população local. É óbvio que Christian se encaixa perfeitamente neste lugar.
— Por que você escolheu Aspen? — pergunto.
— O quê? — Ele me olha sem entender.
— Para ter uma segunda casa.
— Meus pais costumavam nos trazer aqui quando éramos pequenos. Foi onde aprendi a esquiar, e gosto do lugar. Espero que você goste também… senão, a gente vende a casa e escolhe outra cidade.
Simples assim!
Ele pega uma mecha solta do meu cabelo e a coloca atrás da minha orelha.
— Você está linda hoje — murmura Christian.
Fico vermelha. Estou vestindo apenas meu uniforme de viagem: calça jeans e camiseta, com um leve casaco azul-marinho. Droga. Por que ele me deixa tímida?
Ele me dá um beijo terno, doce e apaixonado.
Taylor, ao volante, começa a sair da cidade e a subir o outro lado do vale, pegando uma estrada sinuosa por entre as montanhas. Quanto mais subimos, mais entusiasmada eu fico; Christian, ao contrário, está cada vez mais tenso.
— O que foi? — pergunto ao contornarmos uma curva.
— Espero que você goste — diz ele, baixinho. — Chegamos.
Taylor reduz e atravessa uma entrada de pedras vermelhas, cinzentas e bege. Ele segue adiante até finalmente parar em frente à imponente casa. Com uma porta no centro da fachada simétrica e telhados altos e pontudos, é uma construção em madeira escura e pedras da mesma mistura de tonalidades da entrada. Uma casa impressionante — moderna e severa, bem ao estilo de Christian.
— Nosso lar — balbucia ele enquanto nossos hóspedes descem da minivan.
— Promissor.
— Venha. Vamos entrar.
Em seus olhos há um brilho de empolgação e ansiedade ao mesmo tempo, como se ele fosse me mostrar seu projeto de ciências ou coisa parecida.
Mia sobe correndo os degraus até a porta principal, onde uma mulher nos espera. Ela é bem pequena, e seu cabelo negro está salpicado de fios grisalhos. Mia joga os braços em volta do pescoço da mulher e lhe dá um abraço apertado.
— Quem é aquela? — pergunto, enquanto Christian me ajuda a sair do veículo.
— A Sra. Bentley. Ela mora aqui com o marido. Eles tomam conta da casa.
Puta merda… mais funcionários?
Mia está fazendo as apresentações: Ethan, e depois Kate. Elliot também abraça a Sra. Bentley. Taylor tira as bagagens do carro, e Christian me pega pela mão e me conduz até a porta da casa.
— Bem-vindo de volta, Sr. Grey. — A Sra. Bentley sorri.
— Carmella, esta é minha mulher, Anastasia — anuncia Christian, orgulhoso. Sua língua acaricia meu nome, fazendo meu coração bater mais forte.
— Sra. Grey. — A Sra. Bentley acena respeitosamente com a cabeça.
Estendo a mão e nos cumprimentamos. Não me surpreende que ela seja muito mais formal com Christian do que com o resto da família.
— Espero que tenham feito uma boa viagem. Parece que o tempo vai ficar bom durante todo o fim de semana, mas não tenho certeza. — Ela aponta para as nuvens escuras que se acumulam atrás de nós. — Quando quiserem o almoço, é só falar. — Ela sorri novamente, os olhos escuros brilhando, e me sinto imediatamente bem na sua presença.
— Venha cá. — Christian me pega e me levanta no colo.
— O que você está fazendo? — exclamo.
— Estreando mais um lugar nosso, Sra. Grey.
Abro um sorriso, e ele me carrega para o interior da ampla entrada, onde, após um breve beijo, coloca-me gentilmente no piso de madeira. A decoração é sóbria e lembra a sala do apartamento do Escala — paredes totalmente brancas, madeira escura e obras de arte abstrata contemporânea. Entramos em uma grande sala de estar com três sofás de couro branco em torno de uma lareira de pedra que predomina no ambiente. A única cor vem das almofadas macias espalhadas pelos sofás. Mia pega a mão de Ethan e o arrasta para dentro da casa. Christian estreita os olhos e aperta os lábios ao vê-los se afastando. Então balança a cabeça com desdém e se vira para mim.
Kate dá um assovio alto.
— Lindo lugar.
Dou uma olhada ao redor e vejo Elliot ajudando Taylor com nossa bagagem. Mais uma vez me pergunto se ela sabe que tem a mão de Gia aqui.
— Tour? — sugere Christian.
Seja lá o que o tenha incomodado em relação a Mia e Ethan, Christian já esqueceu. Ele irradia entusiasmo — ou seria ansiedade? Difícil dizer.
— Claro.
Uma vez mais me sinto esmagada diante de tanta riqueza. Quanto será que custou esta casa? E eu não contribuí com nada. Por um instante sou transportada de volta para a primeira vez que Christian me levou ao Escala. Também me senti oprimida na ocasião. Você já se acostumou àquele apartamento, meu inconsciente sussurra para mim com acidez.
Christian franze o cenho, mas pega minha mão e me leva para conhecer os outros cômodos. A cozinha ultramoderna é toda feita de bancadas de mármore claro e armários pretos. Há uma adega impressionante, e uma ampla sala no andar de baixo, com TV de plasma, sofás confortáveis… e uma mesa de sinuca. Olho pasma para a mesa, e fico vermelha ao ser flagrada por Christian.
— Quer jogar? — pergunta ele, com um brilho malicioso no olhar.
Balanço a cabeça em negativa, e sua expressão parece ficar carregada mais uma vez. Ele pega minha mão de novo e me leva para o primeiro andar. Há quatro quartos lá em cima, e todos são suítes.
A suíte principal é uma coisa do outro mundo. A cama é imensa, maior do que a da nossa casa, e fica de frente para uma enorme janela envidraçada com vista para Aspen e para as montanhas verdejantes.
— É a Montanha de Ajax; ou Montanha de Aspen, se preferir — diz Christian, observando-me temeroso. Ele está parado à porta, os polegares enfiados nos bolsos da sua calça jeans preta.
Faço um gesto de concordância com a cabeça.
— Você está muito quieta — murmura ele.
— É lindo, Christian. — E subitamente estou morrendo de vontade de voltar para o Escala.
Em cinco largos passos ele chega perto de mim, pega meu queixo e puxa meu lábio inferior, para soltá-lo dos meus dentes.
— O que foi? — pergunta ele, seu olhar procurando o meu.
— Você é muito rico.
— Sou.
— Às vezes eu fico surpresa com a sua fortuna.
— Nossa fortuna.
— Nossa fortuna — murmuro, como um autômato.
— Por favor, Ana, não fique preocupada com isso. É só uma casa.
— E o que a Gia fez aqui exatamente?
— A Gia? — Ele ergue as sobrancelhas em sinal de surpresa.
— É. Ela projetou a reforma da casa, não foi?
— Sim, foi. Ela reprojetou a sala lá de baixo, e Elliot providenciou a construção. — Ele passa os dedos pelo cabelo e franze a testa. — Por que você está perguntando sobre a Gia?
— Você sabia que ela teve um caso com o Elliot?
Christian me fita por um instante, sua expressão indecifrável.
— Elliot já transou com metade de Seattle, Ana.
Solto uma exclamação.
— A maioria mulheres, pelo que eu sei — completa ele, de brincadeira. Acho que Christian está se divertindo com a minha expressão de choque.
— Não!
Ele confirma com a cabeça.
— Não tenho nada a ver com isso. — E levanta as palmas das mãos num gesto de defesa.
— Acho que Kate não sabe disso.
— Ele não deve divulgar muito essa informação. E Kate parece bastante segura.
Estou chocada. O doce e despretensioso Elliot, com seus olhos azuis e seu cabelo louro? Fico olhando para Christian sem acreditar.
Ele inclina a cabeça para o lado, observando-me.
— Mas aposto que isso não tem a ver só com a promiscuidade da Gia ou do Elliot.
— Eu sei. Desculpe. Depois de tudo o que aconteceu essa semana, eu só…
Encolho os ombros, sentindo vontade de chorar de repente. Christian parece relaxar, aliviado. Puxando-me para si, ele me abraça bem apertado, o nariz no meu cabelo.
— Eu sei. Me desculpe também. Vamos relaxar e nos divertir, que tal? Você pode ficar aqui e ler, ver um daqueles programas de TV horrorosos, fazer compras, caminhadas… até pescar. O que quiser. E esqueça o que eu disse sobre Elliot. Foi indiscrição minha.
— De certa maneira explica por que ele está sempre provocando você — murmuro, aninhando-me em seu peito.
— Ele não faz ideia do meu passado. Eu já disse a você, minha família achava que eu era gay. Celibatário, mas gay.
Dou uma risada e começo a relaxar nos braços dele.
— Eu achei que você fosse celibatário. Como me enganei.
Envolvo-o em meus braços, admirada ao pensar em como é ridícula a ideia de Christian ser gay.
— Sra. Grey, está rindo de mim?
— Um pouquinho, talvez — admito. — Sabe, o que eu não entendo é por que você tem esta casa aqui.
— Como assim? — Ele beija meu cabelo.
— Você tem o barco, e eu entendo, e também o apartamento de Nova York, por causa dos negócios; mas por que aqui? E você nem dividia este lugar com outra pessoa.
Christian fica imóvel e em silêncio por um bom tempo.
— Eu estava esperando por você — diz ele suavemente, os olhos cinzentos escuros e luminosos.
— Isso… isso é uma coisa linda de se dizer.
— Mas é verdade. Só que eu não sabia na época. — Ele sorri timidamente.
— Estou feliz que você tenha esperado.
— Você valeu a espera, Sra. Grey. — Ele ergue meu queixo com a ponta do dedo, abaixa-se e me beija com ternura.
— Você também. — Sorrio. — Mas acho que eu trapaceei. Nem esperei tanto tempo por você.
Ele ri.
— Sou um prêmio tão bom assim?
— Christian, você é um prêmio de loteria, a cura para o câncer e os três desejos que o Aladim pediu ao gênio: tudo isso junto.
Ele levanta uma sobrancelha.
— Quando você vai perceber isso? — reclamo. — Você era um ótimo partido. E nem estou me referindo a isso. — Faço um gesto em volta, indicando o ambiente luxuoso. — Eu me refiro a isto aqui. — E coloco a mão sobre o seu coração. Seus olhos se abrem mais. Meu marido confiante e sensual desapareceu para dar lugar ao meu menino perdido. — Acredite em mim, Christian, por favor – sussurro, e seguro seu rosto, puxando sua boca para a minha.
Ele solta um gemido, não sei se por causa do que eu disse ou por ser sua costumeira reação primitiva. Eu o quero, meus lábios beijando os seus, minha língua invadindo sua boca.
Quando estamos os dois sem fôlego, ele se afasta e me lança um olhar duvidoso.
— Quando é que você vai enfiar de vez nessa sua cabeça dura que eu amo você? — pergunto, exasperada.
Ele engole em seco.
— Algum dia.
Já é um progresso. Sorrio, e sou recompensada com seu sorriso tímido.
— Venha. Vamos almoçar. Os outros devem estar se perguntando onde fomos parar. Podemos discutir o que vamos fazer.
* * *
— AH, NÃO! — EXCLAMA Kate de repente.
Todos os olhares se voltam para ela.
— Olhem — diz ela, apontando para a ampla janela.
Lá fora, a chuva começou a cair torrencialmente. Estamos sentados ao redor da mesa de madeira escura da cozinha, e acabamos de consumir um banquete italiano de antepasto misto, preparado pela Sra. Bentley, mais uma ou duas garrafas de Frascati. Estou me sentindo saciada, e também um pouco tonta por causa do álcool.
— Lá se vai nossa caminhada — murmura Elliot, mas parece até aliviado.
Kate faz cara feia para ele. Sem dúvida, tem alguma coisa esquisita entre os dois. Eles têm agido naturalmente com todos em volta, mas não um com o outro.
— Podíamos ir até o centro — intervém Mia.
Ethan lança um sorriso amarelo para ela.
— Clima perfeito para pescar — sugere Christian.
— Eu fico com a pescaria — diz Ethan.
— Vamos nos dividir. — Mia bate palmas. — Meninas, compras; rapazes, programas chatos ao ar livre.
Olho de relance para Kate, que observa Mia com ar tolerante. Pescar ou fazer compras? Puxa, que escolha.
— Ana, o que você quer fazer? — pergunta Christian.
— Qualquer coisa — minto.
Kate captura meu olhar e mexe os lábios: “compras”. Talvez ela queira conversar.
— Mas eu ficaria feliz em sair para as compras.
Dou um sorriso torto para Kate e Mia. Christian sorri amarelo. Ele sabe que eu detesto fazer compras.
— Posso ficar aqui com você, se quiser — murmura ele, e alguma coisa sombria se contorce em meu ventre devido ao seu tom de voz.
— Não, pode ir pescar — respondo.
Christian precisa de um tempo com os rapazes.
— Bem, então vai ser isso — fala Kate, deixando a mesa.
— Taylor vai acompanhar vocês — diz Christian, e é um fato: sem espaço para discussão.
— Não precisamos de babá — retruca Kate, com audácia; sempre direta.
Coloco a mão no braço dela.
— Kate, é melhor o Taylor ir conosco.
Ela franze a testa e depois dá de ombros. Pela primeira vez na vida, consegue segurar a língua.
Sorrio timidamente para Christian, mas sua expressão permanece impassível. Ai, espero que ele não esteja com raiva de Kate.
Elliot franze o cenho.
— Preciso buscar uma bateria para o meu relógio no centro.
Ele olha de relance para Kate, e percebo que fica levemente vermelho. Ela não nota porque está deliberadamente ignorando-o.
— Vá no Audi, Elliot. Quando você voltar a gente vai pescar — diz Christian.
— Tudo bem — murmura Elliot, mas parece distraído. — Boa ideia.
* * *
— AQUI.
Pegando minha mão, Mia me puxa para dentro de uma butique toda decorada com seda cor-de-rosa e mobília rústica em decapê, ao estilo francês. Kate entra atrás de nós e Taylor fica esperando do lado de fora, protegendo-se da chuva sob a marquise. No sistema de som da loja, Aretha canta “Say a Little Prayer” a plenos pulmões. Adoro essa música. Acho que vou colocar no iPod de Christian.
— Vai ficar incrível em você, Ana. — Mia está segurando um vestido de tecido metalizado. — Tome, experimente.
— Hmm… é curto demais.
— Vai ficar fantástico em você. Christian vai amar.
— Você acha?
Mia abre um largo sorriso.
— Ana, suas pernas são de dar inveja, e se a gente sair para dançar hoje à noite — ela sorri, farejando uma presa fácil —, você vai ficar sexy para o seu marido.
Pisco os olhos várias vezes seguidas, ligeiramente chocada. Vamos sair para dançar? Eu não saio para dançar.
Kate ri da expressão no meu rosto. Ela parece mais relaxada agora que está longe de Elliot.
— Podíamos treinar uns passinhos para hoje à noite — diz ela.
— Vá experimentar — ordena Mia.
E eu me encaminho relutante para a cabine de prova.
* * *
ENQUANTO ESPERO KATE e Mia saírem dos provadores, passeio pela loja; vou até a vitrine e fico olhando para a rua lá fora, distraidamente. O pot-pourri de música soul continua: agora Dionne Warwick está cantando “Walk on By”. Outra música maravilhosa — uma das preferidas da minha mãe. Olho rapidamente para o vestido em minhas mãos. Vestido talvez seja um exagero. É muito curto e de costas nuas, mas um achado, segundo Mia, perfeito para passar a noite toda dançando. Supostamente, também preciso de sapatos novos e um grande e volumoso colar, e é isso que vamos procurar agora. Revirando os olhos em desdém, penso novamente que sou muito sortuda por ter Caroline Acton como minha personal shopper.
Algo lá fora me chama a atenção: Elliot. Ele apareceu do outro lado da arborizada rua principal, saindo de um vistoso Audi, e agora corre para dentro de uma loja parecendo que vai se abrigar da chuva. Acho que é uma joalheria… talvez ele esteja procurando a tal bateria para relógio. Ele ressurge alguns minutos depois, mas não sozinho: com uma mulher.
Puta merda! Ele está conversando com a Gia! O que ela está fazendo aqui?
Enquanto assisto à cena, eles se abraçam rapidamente e ela joga a cabeça para trás, rindo animadamente de algo que ele diz. Ele a beija no rosto e corre de volta para o carro. Ela se vira e segue pela rua, e eu fico olhando-a boquiaberta. O que foi isso? Viro-me, inquieta, na direção dos provadores, mas ainda não há nenhum sinal de Kate ou Mia.
Dou uma olhada para Taylor, que ainda está à espera lá fora. Ele encontra meu olhar e dá de ombros. Mais um que testemunhou o rápido encontro de Elliot. Fico vermelha, constrangida por ter sido flagrada bisbilhotando. Virando-me, vejo Mia e Kate voltando, ambas rindo. Kate me olha intrigada.
— O que aconteceu, Ana? — pergunta ela. — Desistiu do vestido? Ficou sensacional em você.
— Hmmm… não.
— Está tudo bem? — Ela arregala os olhos.
— Tudo ótimo. Vamos pagar? — E me dirijo para o caixa junto com Mia, que escolheu duas saias.
— Boa tarde, madame. — A jovem vendedora, com a maior quantidade de brilho nos lábios que já vi em toda a minha vida, sorri para mim. — São oitocentos e cinquenta dólares.
O quê? Por este pedacinho de pano?! Fico um instante absorvendo a informação, e depois entrego obedientemente meu cartão Amex preto.
— Sra. Grey — ronrona a Srta. Brilho Labial.
Durante as duas horas seguintes, acompanho Kate e Mia em um estado de torpor, brigando internamente comigo mesma. Será que devo contar para Kate? Meu inconsciente balança a cabeça em negativa com firmeza. Sim, devo contar. Não, não devo. Pode ter sido apenas um encontro inocente. Merda. O que eu faço agora?
* * *
— E AÍ, GOSTOU do sapato, Ana? — pergunta Mia, as mãos na cintura.
— Hum… gostei, claro.
Acabo comprando um par de sapatos Manolo Blahnik incrivelmente altos com tiras que parecem feitas de espelhos. Combinam admiravelmente bem com o vestido e deixam Christian menos rico em pouco mais que mil dólares. Tenho mais sorte com o longo colar de prata que Kate insiste que eu compre; apenas oitenta e quatro dólares, uma pechincha.
— Já se acostumou a ter dinheiro? — pergunta Kate, sem soar indelicada, quando voltamos para o carro. Mia já está bem à nossa frente.
— Você sabe que não sou assim, Kate. Fico um pouco desconfortável com tudo isso. Mas pelo que me dizem, faz parte do pacote. — Contraio os lábios, e ela passa o braço em volta de mim.
— Você vai se acostumar, Ana — diz ela, solidária. — Vai ficar linda.
— Kate, como vai a sua relação com o Elliot? — pergunto.
Seus grandes olhos azuis se viram de súbito para mim.
Ah, não.
Ela balança a cabeça.
— Não quero falar sobre isso agora. — Kate aponta para Mia com a cabeça. — Mas as coisas estão… — Ela não termina a frase.
É um comportamento nada típico da tenaz Kate. Merda. Eu sabia que tinha alguma coisa errada. Será que conto para ela o que eu vi? Mas o que foi que eu vi, afinal? Elliot e a Srta. Predadora-Sexual-Bem-Produzida conversando e se abraçando, e um beijo no rosto. São apenas velhos amigos, não são? Não, não vou contar nada para ela. Não agora. Faço um gesto afirmativo com a cabeça, como quem diz “eu compreendo perfeitamente e vou respeitar sua privacidade”. Ela pega a minha mão e a aperta, agradecida, e lá está: um breve lampejo de dor e mágoa nos seus olhos, mas que ela rapidamente afasta com uma piscadela. Sinto uma vontade repentina de proteger minha querida amiga. O que será que Elliot Mulherengo Grey está aprontando?
* * *
DE VOLTA À CASA, Kate decide que merecemos uns coquetéis após nossa tarde de extravagância consumista e prepara daiquiris de morango para nós. Aconchegamo-nos nos sofás da sala de estar, em frente ao fogo da lareira.
— Elliot tem andado meio distante ultimamente — murmura Kate, fitando as chamas. Finalmente temos um momento a sós, pois Mia está guardando suas compras.
— Ah, é?
— E eu acho que me ferrei por ter ferrado você.
— Você ouviu alguma coisa sobre isso?
— Ouvi. Christian ligou para o Elliot; e Elliot me ligou.
Reviro os olhos. Ah, Christian, Christian, Christian.
— Lamento. O Christian é… superprotetor. Você não via o Elliot desde o Escândalo dos Drinques?
— Não.
— Ah.
— Eu realmente gosto dele, Ana — sussurra ela.
E por um terrível momento eu acho que ela vai começar a chorar. Isso não combina com Kate. Será que essa crise significa a volta do pijama cor-de-rosa? Ela se vira para mim.
— Eu me apaixonei por ele. No início pensei que fosse só pelo sexo maravilhoso. Mas ele é charmoso, bondoso, carinhoso e divertido. Eu podia nos imaginar envelhecendo juntos; você sabe… filhos, netos… o pacote completo.
— Felizes para sempre — sussurro.
Ela confirma tristemente.
— Talvez vocês devam conversar. Tente arranjar um tempinho a sós com ele aqui. Descubra o que o está incomodando.
Ou quem o está incomodando, meu inconsciente retruca. Eu o enxoto logo, chocada com a insistência dos meus próprios pensamentos.
— Que tal vocês fazerem uma caminhada amanhã de manhã?
— Vamos ver.
— Kate, odeio ver você assim.
Ela abre um sorriso débil, e eu me inclino para abraçá-la. Decido não comentar nada sobre Gia, embora eu talvez fale sobre isso com Elliot. Como é que ele brinca com os sentimentos da minha amiga desse jeito?
Mia volta, e nossa conversa passa para terrenos mais seguros.
* * *
O FOGO CHIA e cospe centelhas quando coloco o último pedaço de madeira. Quase não temos mais lenha. Ainda que seja verão, o calor da lareira é muito bem-vindo em um dia úmido como este.
— Você sabe onde podemos encontrar mais lenha? — pergunto a Mia, que saboreia seu daiquiri.
— Acho que fica na garagem.
— Vou lá buscar. Aproveito e exploro um pouco mais a casa.
A chuva já está mais fraca quando me aventuro lá fora e me dirijo à garagem anexa à casa, cujo espaço pode abrigar até três carros. A porta lateral está destrancada; eu entro, acendendo a luz para me tirar da escuridão. As lâmpadas fluorescentes dão o ar de sua graça com um ruído sibilante.
Há um carro na garagem, e percebo que é o Audi que Elliot usou hoje à tarde. Há ainda duas motos de neve. Porém, o que realmente me chama a atenção são as duas motos de trilha, ambas 125cc. Vêm à minha mente recordações de Ethan corajosamente se esforçando para me ensinar como pilotar, no verão passado. Inconscientemente, esfrego o braço no local onde me machuquei feio ao sofrer uma queda.
— Sabe dirigir isso? — pergunta Elliot atrás de mim.
Eu me viro.
— Você já voltou.
— Parece que sim. — Ele sorri, e percebo que Christian me responderia a mesma coisa; mas sem o sorriso largo e encantador. — E então? — insiste ele.
Galinha!
— Mais ou menos.
— Quer dar uma volta?
Dou uma fungada.
— Hmm, não… Acho que o Christian não ficaria muito feliz se eu saísse.
— Ele não está aqui.
Elliot abre um sorriso forçado — ah, é uma característica da família — e acena com o braço, indicando que estamos sozinhos. Ele vai até a moto mais próxima e passa a longa perna, coberta pela calça jeans, por sobre o selim, montando e agarrando a direção.
— Christian tem, hã… certos problemas em relação à minha segurança. Prefiro não ir.
— Você sempre faz o que ele diz?
Elliot revela uma centelha maliciosa nos seus olhos azul-bebê, e tenho um vislumbre do bad boy… o bad boy por quem Kate se apaixonou. O bad boy de Detroit.
— Não. — Levanto uma sobrancelha em sinal de advertência para ele. — Mas estou tentando mudar isso. Ele já tem muita coisa com que se preocupar, não precisa me incluir na lista. Ele já voltou?
— Não sei.
— Vocês não foram pescar?
Ele balança a cabeça em negativa.
— Eu tinha uns assuntos para resolver no centro.
Assuntos! Puta merda — um assunto com uma loura perua! Inspiro profundamente e o encaro, pasma.
— Se você não quer andar de moto, o que está fazendo na garagem? — pergunta Elliot, intrigado.
— Estou procurando lenha para a lareira.
— Aí está você. Ah, Elliot; você já voltou. — É Kate, nos interrompendo.
— Oi, baby. — Ele abre um largo sorriso.
— Pegou algum peixe?
Observo a reação dele.
— Não. Tinha umas coisas para resolver na cidade. — E, por um breve instante, eu percebo um lampejo de incerteza cruzar seu rosto.
Ah, merda.
— Vim ver por que a Ana estava demorando. — Kate olha para nós, confusa.
— Estávamos só batendo papo — diz Elliot, e sinto certa tensão entre os dois.
É então que ouvimos um carro chegando lá fora. Ah! É Christian. Graças a Deus. O mecanismo automático do portão da garagem chia alto, nos assustando, e o portão sobe lentamente, revelando Christian e Ethan, que descarregam um caminhão plataforma preto. Christian para o que está fazendo quando nos vê de pé ali dentro.
— Estão montando uma banda de garagem? — pergunta ele ironicamente, e entra, vindo direto até mim.
Sorrio. Estou aliviada em vê-lo. Por baixo da capa impermeável ele está usando o macacão que lhe vendi quando eu trabalhava na Clayton’s.
— Oi — diz ele, olhando curioso para mim e ignorando Kate e Elliot.
— Oi. Belo macacão.
— Cheio de bolsos. Muito prático para pescar. — Sua voz é suave e sedutora, apenas para meus ouvidos, e, quando ele me fita, sua expressão é apaixonada.
Fico vermelha, e ele sorri — um sorriso enorme, aberto, que diz “sou todo seu”.
— Você se molhou — murmuro.
— Estava chovendo. O que vocês estão fazendo na garagem? — Finalmente ele reparou que não estamos sozinhos.
— Ana veio pegar lenha. — Elliot levanta uma sobrancelha. De algum modo, ele faz com que a frase soe maliciosa. — Eu tentei convencê-la a dar uma volta. — Ele é um mestre na arte do duplo sentido.
O rosto de Christian se fecha, e meu coração para de bater.
— Ela não quis. Disse que você não ia gostar — continua Elliot, num tom gentil e sem insinuações.
O olhar cinzento de Christian se volta para mim.
— Ah, foi? — murmura ele.
— Escutem, eu adoraria continuar essa discussão sobre o que a Ana disse, mas será que podemos voltar para dentro de casa? — pede Kate.
Ela se curva, apanha duas achas de lenha e gira nos calcanhares, dirigindo-se ruidosamente ao portão. Ah, que merda. Kate está irritada — mas sei que não é comigo. Elliot dá um suspiro e, sem dizer uma palavra, vai atrás dela. Eu os acompanho com o olhar, mas Christian me distrai.
— Você sabe pilotar uma moto? — pergunta ele, a voz exalando descrédito.
— Não muito bem. Ethan me ensinou.
Seus olhos esfriam imediatamente.
— Você fez bem em não sair de moto hoje — continua ele, a voz mais isenta. — O solo está muito duro no momento, e por causa da chuva ficou escorregadio e traiçoeiro.
— Onde eu coloco o material de pesca? — grita Ethan lá de fora.
— Deixe aí, Ethan. Taylor cuida disso.
— E o peixe? — continua ele, num tom levemente zombeteiro.
— Você pegou um peixe? — pergunto, surpresa.
— Eu não. O Kavanagh. — E Christian faz beicinho… um beicinho lindo.
Caio na risada.
— A Sra. Bentley vai cuidar do peixe — grita ele em resposta.
Ethan ri e se dirige à casa.
— Sra. Grey, está rindo de mim?
— Com certeza. Você está todo molhado… Vou preparar um banho.
— Desde que você me acompanhe.
Ele se inclina e me beija.
* * *
NO BANHEIRO DA SUÍTE, encho a enorme banheira oval e despejo na água um gel caro de banho, que começa a formar espuma imediatamente. O aroma é divino… jasmim, acho. De volta ao quarto, vou pendurar o tal vestido enquanto a banheira enche.
— Você se divertiu? — pergunta Christian, surgindo no quarto descalço e vestindo apenas uma camiseta e uma calça de moletom. Ele fecha a porta ao entrar.
— Sim — murmuro, admirando-o.
Senti falta dele. Que ridículo — quanto tempo faz, algumas horas?
Ele inclina a cabeça para o lado e me observa.
— O que foi?
— Estava pensando em como senti sua falta hoje.
— Você fala como se sofresse de amor, Sra. Grey.
— Eu sofri, Sr. Grey.
Ele se aproxima e para na minha frente.
— O que você comprou? — sussurra ele, e sei que é para mudar de assunto.
— Um vestido, um par de sapatos e um colar. Torrei o seu dinheiro. — Ergo um olhar culpado para ele.
Ele acha engraçado.
— Que bom — murmura ele, e coloca uma mecha do meu cabelo atrás da minha orelha. — E pela bilionésima vez: é o nosso dinheiro.
Ele puxa meu queixo, fazendo-me parar de morder o lábio, e corre o dedo indicador pela minha camiseta, passando pelo esterno, por entre os meus seios, descendo pela minha barriga até a bainha.
— Você não vai precisar disso no banho — sussurra ele, e, pegando a minha camiseta pela barra, ele a puxa para cima, lentamente. — Levante os braços.
Obedeço, sem desviar os olhos dos seus, e ele joga minha camiseta no chão.
— Achei que fôssemos só tomar um banho. — Minha pulsação acelera.
— Primeiro eu quero deixar você bem suja. Também senti saudades.
Ele se inclina e me beija.
* * *
— MERDA, A ÁGUA!
Levanto o corpo com certa dificuldade, toda desorientada após o orgasmo.
Ele não me solta.
— Christian, a banheira! — Olho para ele; estou deitada sobre seu peito.
Ele ri.
— Relaxe. Tem um sistema de escoamento. — Ele gira o corpo na cama e me dá um selinho. — Vou lá fechar a torneira.
Com movimentos graciosos, ele desce da cama e vai até o banheiro. Sigo-o com os olhos, observando-o com avidez. Hmm… meu marido, nu e logo logo molhado. Pulo para fora da cama.
* * *
ESTAMOS SENTADOS UM em cada ponta da banheira, que encheu demais — tanto que, sempre que nos mexemos, a água transborda pelas laterais e se esparrama no chão. Muito esbanjador. Ainda mais esbanjador é ver Christian lavando meus pés, massageando-os, puxando meus dedos de leve. Ele beija cada dedo e morde delicadamente o mindinho.
— Aaah!
Eu sinto ali, na minha virilha.
— Assim? — sussurra ele.
— Hmm — balbucio incoerentemente.
Ele recomeça a massagem. Ah, é tão bom. Fecho os olhos.
— Eu vi Gia quando fomos à cidade — murmuro.
— É mesmo? Acho que ela tem casa aqui — diz ele, indiferente. Não está nem um pouco interessado.
— Ela estava com Elliot.
Ele interrompe a massagem. Isso lhe despertou a atenção. Quando abro os olhos, sua cabeça está inclinada para o lado, como se não entendesse.
— Como assim com Elliot? — pergunta Christian, mais perplexo do que preocupado.
Descrevo a cena que vi.
— Ana, eles são só amigos. Acho que o Elliot está bem empolgado com Kate. — Depois de uma pausa, ele acrescenta, mais baixo: — Na verdade, eu sei que ele está bem empolgado com ela. — E me lança um olhar do tipo não-me-pergunte-por-quê.
— Kate é deslumbrante — rebato, defendendo minha amiga.
Christian bufa em desdém.
— Ainda fico feliz por ter sido você quem foi ao meu escritório.
Ele beija meu dedão, solta meu pé esquerdo e pega o direito, para então recomeçar todo o processo de massagem. Seus dedos são tão fortes e flexíveis que relaxo novamente. Não quero brigar por causa de Kate. Fecho os olhos e deixo suas mãos operarem sua mágica nos meus pés.
* * *
OLHO BOQUIABERTA PARA mim mesma, refletida no espelho de corpo inteiro: não me reconheço na beldade que me encara do outro lado. Kate hoje se esmerou e brincou de Barbie comigo, me penteando e me maquiando. Meu cabelo está volumoso e liso, meus olhos delineados com lápis, minha boca de um vermelho vivo. Eu fiquei… gostosa. Sou só pernas, principalmente nos Manolos altíssimos e no meu vestido indecentemente curto. Preciso da aprovação de Christian, embora eu tenha uma terrível sensação de que ele não vai gostar de ver tanta exposição da minha carne. Tendo em vista nossa entente cordiale, decido consultá-lo. Pego meu BlackBerry.
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De: Anastasia Grey
Assunto: Minha bunda está muito grande nesse vestido?
Data: 27 de agosto de 2011 18:53 Hora local
Para: Christian Grey
Sr. Grey,
Preciso do seu aconselhamento de moda.
Bj,
Sra. G.
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De: Christian Grey
Assunto: Maravilha
Data: 27 de agosto de 2011 18:55 Hora local
Para: Anastasia Grey
Sra. Grey,
Duvido muito.
Mas vou aí averiguar e examinar sua bunda em detalhes, só para ter certeza.
Ansiosamente,
Sr. G.
Christian Grey,
CEO, Grey Enterprises Holdings & Fiscalização de Bundas, Inc.
Ainda estou lendo o e-mail quando a porta do quarto se abre e Christian para estático na soleira. Seu queixo cai e seus olhos se arregalam.
Puta merda… ou ele gostou muito ou odiou.
— E então? — sussurro.
— Ana, você está… Uau.
— Você gostou?
— Gostei, acho que sim.
Sua voz está um pouco rouca. Lentamente, ele entra no quarto e fecha a porta. Está usando uma calça jeans preta e uma camisa branca, com um casaco preto. E está divino. Ele vem devagar até mim, mas logo que chega perto, coloca as mãos nos meus ombros e me faz girar, de forma que eu fique de frente para o espelho, e se coloca atrás de mim. Meu olhar encontra o dele no espelho, e então ele baixa o olhar para as minhas costas nuas, fascinado. Seu dedo desliza pela minha coluna e chega até a beirada do vestido, logo abaixo da cintura, onde minha pele clara encontra o tecido prateado.
— Isso mostra demais — murmura ele.
Sua mão desliza mais para baixo, pela minha bunda, até minhas coxas descobertas. Ele faz uma pausa, os olhos cinzentos ardendo intensamente, parecendo quase azuis. Então, lentamente, seus dedos percorrem o caminho inverso até a bainha da saia.
Observo seus compridos dedos se movimentarem com suavidade, roçando minha pele de forma provocante; sinto o arrepio que sua mão vai despertando por onde passa, e minha boca se abre involuntariamente.
— Isso aqui não está longe… — ele toca a bainha do vestido e depois sobe os dedos — daqui — sussurra.
Inspiro fundo quando seus dedos acariciam meu sexo, movendo-se sensualmente por sobre a minha calcinha, sentindo-me, estimulando-me.
— E isso quer dizer que… — sussurro.
— Quer dizer que… que isso aqui não está longe… — seus dedos deslizam sobre a minha calcinha, e um deles entra por baixo do tecido, acariciando minha pele macia e umedecida — … daqui. E mais um pouco… daqui. — Ele enfia um dedo em mim.
Solto uma exclamação e um gemido baixo.
— Isso é meu — sussurra ele no meu ouvido. Fechando os olhos, ele lentamente tira e põe o dedo. — Não quero que ninguém mais veja.
Minha respiração fica entrecortada e entra no ritmo que ele impõe. Olhando-o pelo espelho, fazendo isso… é mais que erótico.
— Então, seja uma boa menina e não se abaixe, e vai ficar tudo bem.
— Você aprova? — murmuro.
— Não, mas não vou impedi-la de usar o vestido. Você está deslumbrante, Anastasia.
Ele tira o dedo bruscamente, deixando-me sedenta por mais, e se coloca diante de mim. A ponta do seu dedo invasor toca meu lábio inferior. Instintivamente o beijo, e, como recompensa, ganho um sorriso largo e malicioso. Ele então chupa o próprio dedo, e pela sua expressão vejo que meu sabor é bom… delicioso. Fico vermelha. Será que sempre vou ficar chocada quando ele fizer isso?
Ele pega minha mão.
— Venha, vamos gozar o fim de semana — ordena ele suavemente.
Eu ia replicar que estava quase gozando, mas, diante do que aconteceu no quarto de jogos ontem, decido me conter.
* * *
ESTAMOS ESPERANDO A sobremesa em um restaurante luxuoso e exclusivo no centro da cidade. Até o momento a noite foi bem animada, e Mia insiste em esticarmos nosso programa em uma boate. Neste exato instante ela está quieta, para variar um pouco, absorvendo cada palavra dita por Ethan, que conversa com Christian. Mia está obviamente encantada por Ethan, e ele está… bem, é difícil dizer. Não sei se eles são apenas amigos ou se há algo mais ali.
Christian parece à vontade. Ele conversa animadamente com Ethan. É evidente que a tarde de pesca criou um elo entre os dois. A conversa gira principalmente em torno de psicologia. Por incrível que pareça, Christian parece o mais entendido. Ouço vagamente a conversa dos dois, e dou uma fungada triste ao perceber que o conhecimento demonstrado por Christian é resultado de sua experiência com tantos psicanalistas.
Você é a melhor terapia. Essas palavras, sussurradas por ele enquanto fazíamos amor certa vez, ecoam em minha mente. Será que sou mesmo? Ah, Christian, espero que sim.
Olho de relance para Kate. Ela está linda; como sempre, aliás. Ela e Elliot estão menos entusiasmados. Ele parece nervoso, suas piadas um pouco altas demais e sua risada, um pouco forçada. Será que eles brigaram? O que será que o está incomodando? Será aquela mulher? Meu coração se aperta quando penso que ele pode vir a magoar a minha melhor amiga. Olho para a entrada, meio que esperando ver Gia cruzando o restaurante em nossa direção, rebolando afetadamente seu traseiro elegante. Minha mente está me pregando peças; suspeito de que seja a quantidade de álcool que ingeri. Começo a sentir dor de cabeça.
De repente, Elliot nos pega de surpresa ao se levantar, empurrando a cadeira para trás ruidosamente pelo chão de cerâmica. Todos os olhos se voltam para ele, que fita Kate por um momento para depois se ajoelhar ao lado dela.
Ai. Meu. Deus.
Ele pega a mão dela, e o silêncio cai como um cobertor sobre o restaurante inteiro, todos parando de comer, parando de falar, parando de andar para olhar.
— Minha linda Kate, eu amo você. Sua graça, sua beleza e sua determinação são únicas, e você conquistou meu coração. Passe o resto da vida comigo. Case comigo.
Puta merda!