JAIME
O broche que prendia o manto de Sor Bryden Tully era um peixe negro, forjado em jato e em ouro. Seu anel era cruel e cinzento.
Acima disso ele usava perneiras, gorjal, manoplas, ombreiras e polainas de aço enegrecido, nenhuma peça nem metade tão escura quanto o olhar em seu rosto enquanto esperava por Jaime Lannister no final da ponte levadiça, sozinho em um corcel castanho ajaezado em vermelho e azul.
Ele não me ama. O Tully tinha um rosto desgastado, profundamente enrugado e queimado pelo vento, debaixo de um coque de um duro cabelo grisalho, mas Jaime ainda podia ver o grande cavaleiro que uma vez havia encantado um escudeiro com os contos dos Reis Nove Centavos. Os cascos de Honra batiam contra as tabuas da ponte levadiça. Jaime tinha pensado muito se deveria usar sua armadura de ouro ou a branca para este encontro; no fim ele escolheu um manto de couro e uma capa escarlate.
Ele parou a uma certa distancia de Sir Bryden e inclinou a cabeça para o homem mais velho.
— Regicida. — Disse Tully.
Assim ele faria desse nome à primeira palavra a sair de sua boca, o que faria Jaime o xingar de diversas formas, mas ele estava resolvido a manter a calma.
— Peixe Negro, — ele respondeu. — Obrigado por vir.
— Eu suponho que você voltou para cumprir os juramentos que fez a minha sobrinha, — Sor Bryden disse. — Se bem me lembro, você prometeu a Catelyn suas filhas em troca de sua liberdade. Sua boca se apertou. E ainda assim, eu não vejo as garotas, onde elas estão?
Ele vai me fazer dizer isto?
— Eu não as tenho.
— Que pena. Você deseja retornar ao seu cativeiro? Sua cela antiga ainda está disponível. Pusemos junco fresco no chão.
E um agradável balde novo pra eu cagar, não duvido.
— Foi atencioso da sua parte, sor, mas eu temo que devo recusar. Eu prefiro o conforto do meu velho pavilhão.
— Enquanto Catelyn desfruta o conforto de seu túmulo.
Eu não tive nada com a morte da Senhora Catelyn, poderia ter dito, e suas filhas foram embora antes que eu chegasse a Porto Real. Estava na ponta da língua para falar de Brienne e da espada que tinha dado a ela, mas Peixe Negro estava olhando para ele da mesma maneira que Eddard Stark tinha o olhado quando o encontrou no Trono de Ferro com o sangue do Rei Louco sob sua lâmina.
— Eu vim pra falar da vida, não da morte. Daqueles que não precisam morrer, mas devem...
— A menos que eu o entregue Correrio. É aqui que vocês ameaçam enforcar Edmure? — Sob suas sobrancelhas espessas, os olhos do Tully eram pedras. — Meu sobrinho está condenado a morte não importa o que eu faça. Então o enforque e esteja acabado com ele. Eu espero que Edmure esteja tão cansado de ficar de pé sobre aquelas forcas como eu estou de vê-lo lá.
Ryman Frey é um idiota. Seu teatro com Edmure e a forca só tinha feito Peixe Nnegro mais obstinado, isto estava claro.
— Você mantém a Senhora Sybelle Westerling e três de seus filhos.
Eu vou devolver o seu sobrinho em troca delas.
— Como você devolveu as filhas da Senhora Catelyn?
Jaime não se permitiu ser provocado.
— Uma velha mulher e três crianças pelo seu senhor. Isso é um negócio melhor do que você poderia ter esperado.
Sor Bryden deu um sorriso duro.
— A você não falta valor, Regicida. Negociação com perjúrios é como construir sobre areia movediça, embora Cat deveria ter pensado melhor ao confiar em pessoas como você.
Era em Tyron que ela confiava, Jaime quase disse. O duende a enganou também.
— As promessas que fiz a Senhora Catelyn foram arrancadas com uma lamina no pescoço.
— E o juramento que fez a Aerys?
Ele sentiu seus dedos fantasmas coçando.
— Aerys não faz parte disso. Você vai trocar os Westerlings por Edmure?
— Não. Meu rei confiou sua rainha a minha guarda, e eu jurei mantê-la segura. Eu não vou entregá-la a armadilha de um Frey.
— A garota foi perdoada. Nenhum mal acontecerá a ela, você tem a minha palavra nisso.
— Sua palavra de honra? — Sor Bryden ergueu uma sobrancelha. — Você ao menos sabe o que é honra?
Um cavalo.
— Eu farei qualquer juramento que você quiser.
— Me poupe Regicida.
— Eu quero. Suspenda suas bandeiras e abra seus portões que eu concederei aos seus homens suas vidas. Aqueles que quiserem permanecer em Correrio em serviço de Lorde Emmon poderá fazê-lo. O resto será livre para ir onde quiserem, embora eu vá exigir que entreguem suas armas e armaduras.
— Eu me pergunto, quão longe eles chegarão desarmados antes dos “bandidos” caírem sobre eles. Você não ousaria permitir que eles se unissem à Lorde Beric, ambos sabemos disso. E quanto a mim? Serei exibido em Porto Real para morrer como Eddard Stark?
— Eu vou lhe permitir vestir o negro. O bastardo de Stark é o Lorde Comandante na Muralha.
Peixe Negro estreitou os olhos.
— O seu pai fez arranjo para isso também? Catelyn nunca confiou no menino, se bem me lembro, não mais do que ela confiava em Theon Greyjoy. E parece que ela estava certa sobre os dois. Não sor, eu acho que não. Eu morrerei quente, se te agrada, com uma espada na mão correndo vermelho com o sangue do leão.
— Sangue Tully também corre vermelho, — Jaime o lembrou. — Se você não entregar o castelo, eu irei arrasá-lo. Centenas irão morrer.
— Centenas dos meus, milhares dos seus.
— Sua guarnição perecerá até o último homem.
— Eu conheço este som. Você o cantou ao som de “As Chuvas de Castemare”? Antes meus homens morrerão lutando sobre seus pés do que de joelhos sob o machado de um carrasco.
Isto não está indo bem.
— Este desafio de nada serve, sor. A guerra acabou, e seu Jovem Lobo está morto.
— Assassinado na violação sagrada de todas as leis de hospitalidade.
— Trabalho de Frey, não meu.
— Chame isso como quiser. Isto fede a Tywin Lannister.
Jaime não podia negar isso.
— Meu pai está morto também.
— Que o Pai o julgue com justiça.
Agora, há uma perspectiva terrível.
— Eu teria matado Robb Stark no Bosque dos Murmúrios, se eu pudesse ter chegado até ele. Alguns tolos ficaram em meu caminho. Por acaso importa como o garoto pereceu? Ele não ficará menos morto, e seu reino morreu junto com ele.
— Você deve ser cego, assim como aleijado, sor. Levante os olhos e você verá que o lobo gigante ainda voa acima de nossas paredes.
— Eu o tenho visto. Ele parece solitário. Harrenhal caiu. Guardamar e Lagoa da Donzela também. Os Brackens têm se ajoelhado, e eles tem Tyto Blackwood encurralado no Bosque dos Murmúrios. Piper, Vance, Mooton, todos os seus aliados se renderam. Apenas Correrio permanece. Nós temos vinte vezes o seu número.
— Vinte vezes homens requerem vinte vezes comida. Quão bem provisionado você está, meu lorde?
— Bem o suficiente para sentar aqui até os fins dos dias se precisar, enquanto você passa fome dentro de suas paredes. — Ele disse a mentira tão corajosamente quanto podia e esperava que seu rosto não o traísse.
Peixe-negro não estava convencido.
— O fim dos seus dias talvez. Nossos próprios abastecimentos são amplos, embora temo que não deixamos muita coisa nos campos para nossos visitantes.
— Nós podemos trazer comidas das Gêmeas, — Jaime disse. — Ou sobre as colinas do oeste, se chegar a isso.
— Se você diz. Longe de mim questionar a palavra de um tão honrado cavaleiro.
O desprezo em sua voz fez Jaime se arrepiar.
— Existe um meio mais rápido de decidir o assunto. Um único combate. Meu campeão contra o seu.
— Eu estava me perguntando quando você chegaria a isso. Sor Brynden gargalhou. Quem seria? Strongboar? Addam Marbrand? Walder Negro, Frey? Ele se inclinou para frente. Porque não eu e você, sor?
Essa teria sido uma doce luta um dia, Jaime pensou, forragens para os cantores.
— Quando a Senhora Catelyn me libertou, ela me fez jurar não erguer armas novamente contra os Stark ou os Tully.
— Um juramento muito conveniente, sor.
Seu rosto escureceu.
— Você esta me chamando de covarde?
— Não. Eu estou te chamando de aleijado. — Peixe Negro acenou com a cabeça para a mão dourada de Jaime. — Nós dois sabemos que você não pode lutar com isso.
— Eu tinha duas mãos. Será que você jogaria sua vida fora por orgulho? — Uma voz dentro dele sussurrou. — Alguns podem dizer que um aleijado e um velho estão bem combinados. Liberte-me de meu voto à Senhora Catelyn e eu irei encontrá-lo espada a espada. Se eu ganhar, Correrrio é nossa. Se você me vencer, levantaremos o cerco.
Sir Brynden riu de novo.
— Por mais que eu goste da chance de tomar essa espada dourada de você e cortar o seu coração negro, suas promessas são inúteis. Eu ganharia nada com sua morte, exceto o prazer de matar você, e não vou arriscar a minha vida por isso, por menor que possa ser o risco.
Foi uma coisa boa Jaime não usar uma espada, de outra forma ele teria rasgado sua lamina e se Sor Brynden não o matasse, os arqueiros na parede certamente o fariam.
— Ah algum termo que você irá aceitar? — Ele exigiu de Peixe Negro.
— De você? — Sir Brynden deu de ombros. — Não.
— Porque você sequer chegou a tratar comigo?
— Um cerco é um mortalmente maçante. Eu queria ver este seus tocos e ouvir quaisquer desculpas que você teria a oferecer por sua mais recente barbaridade. Elas são mais fracas do que eu esperava. Você sempre me decepciona Regicida.
Peixe Negro girou em sua égua e trotou em direção a Correrio. A ponte levadiça desceu rapidamente, seus picos de ferro causando estragos no chão lamacento.
Jaime virou a cabeça de Honra para a longa viagem de volta para as linhas de cerco Lannister. Ele podia sentir os olhos sobre ele. Os homens de Tully em suas ameias, os Freys do outro lado do rio. Se eles não forem cegos, irão todos saber que ele jogou minha oferta em minha cara. Ele precisaria arrasar o castelo. Bem, o que é mais uma promessa quebrada para o Peixe Negro? Apenas mais merda no balde. Jaime resolveu ser o primeiro homem nas ameias. E com essa minha mão de ouro, provavelmente o primeiro a cair.
De volta ao acampamento, Pequeno Lew segurou suas rédeas enquanto Peck deu-lhe uma mão para ajudá-lo a descer da sela. Será que eles pensam que sou tão aleijado que não posso desmontar sozinho?
— Como você se saiu, meu senhor? — Perguntou seu primo, Sor Daven.
— Ninguém colocou uma flecha na garupa do meu cavalo. De outra forma haveria pouco para distinguir-me de Sor Ryman. — Ele fez uma careta. — Portanto, agora ele precisa fazer o Ramo Vermelho ficar mais vermelho. Culpe a si mesmo por isso, Peixe Negro, você me deixou uma pequena escolha. Monte um conselho de guerra. Sor Addam, Strongboar, Forley Prester, os nossos senhores dos rios... E os nossos amigos dos Frey.
Ser Ryman, Lord Emmon, e quem mais eles se importarem em trazer.
Eles se reuniram rapidamente. Lorde Piper e ambos os Lorde Vance vieram falar pelos arrependidos senhores do Tridente, cuja lealdade em breve seria posta a prova. O oeste foi representado por Sor Daven, Javali Forte, Addam Marbrand, e Forley Prester. Lorde Emmon Frey juntou-se a eles, com sua esposa. A Senhora Genna reivindicou sua cadeira com um olhar que desafiou qualquer homem ali para questionar sua presença.
Ninguém fez. Os Freys enviaram Sor Walder Rivers, conhecido como
“Bastardo Walder” e Edwyn, o primogênito de Sir Ryman, um homem pálido e delgado, com um nariz comprimido e cabelos lisos e escuros. Sob um manto azul, Edwyn usava um gibão de couro de bezerro cinza, finamente bordadas com arabescos ornados trabalhados no couro.
— Eu falo pela Casa Frey, — ele anunciou. — Meu pai está indisposto esta manhã.
Sor Daven suspirou.
— Ele está bêbado ou apenas enjoado pelo vinho da noite anterior?
Edwyn enrijeceu a boca, como um avarento.
— Lorde Jaime, — ele disse. — Preciso sofrer tanta descortesia?
— Isso é verdade? — Jaime perguntou a ele. — Seu pai está bêbado?
Frey apertou seus lábios e olhou Sor Ilyn Payne, que estava de pé ao lado da tenda, em sua malha enferrujada, sua espada cutucando sobre um ombro.
— Ele... Meu pai tem um estomago ruim, meu senhor. Vinho tinto o ajuda em sua digestão.
— Ele deve estar digerindo um sangrento mamute! — disse Sor Daven.
Javali Forte e Senhora Genna riram.
— Já chega. — Disse Jaime. — Nós temos um castelo a vencer.
Quando seu pai armava um conselho, ele deixava seus capitães falarem primeiro. Jaime resolveu fazer o mesmo. — Como devemos proceder?
— Enforque Edmure Tully, para começar. — Exortou Lorde Emmon Frey. — Isto irá ensinar a Sor Bryden que nós realmente queremos dizer o que dizemos. Se enviarmos a cabeça de Edmure a seu tio, pode convencê-lo a ceder.
— Brynden Peixe Negro não é movido tão facilmente. — Disse Karyl Vance, o senhor do Pouso do Viajante, tinha um melancólico olhar. A marca de nascença da cor de vinho cobria seu pescoço e um lado do rosto.
Seu próprio irmão não conseguiu move-lo para uma cama de casal.
Sor Daven balançou a cabeça desgrenhada.
— Temos que demolir as paredes, como eu venho dizendo o tempo todo. Torres de cerco, escadas de escalada, e um aríete para quebrar o portão, isto é o que precisamos aqui.
— Eu liderarei o ataque, — disse Javali Forte. — De ao peixe o sabor do aço e do fogo, isso é o que eu digo.
— Eles são meus muros, — Protestou Lorde Emmon. — E este é o meu portão que você irá quebrar. Ele tirou um pergaminho novamente de sua manga. Rei Tommen pessoalmente me deu...
— Nós todos vimos seu papel, tio. — Retrucou Edwyn Frey. — Porque você não vai e balançe-o para o Peixe Negro para ver se funciona?
— Demolir as muralhas será um negócio sangrento, — disse Addam Marbrand. — Proponho esperarmos uma noite sem lua e enviarmos uma dúzia de homens escolhidos pelo rio em um barco com remos abafados. Eles podem escalar os muros com cordas e ganchos, e abrir os portões a partir do interior. Eu os liderarei, se o conselho desejar.
— Loucura, — declarou o bastardo, Walder Rivers. — Sor Bryden não é homem para ser enganado com esses truques.
— O Peixe Negro é o obstáculo, — concordou Edwyn Frey. — Seu elmo tem uma truta preta na crista que o faz fácil de achar ao longe. Eu proponho que movamos nossas torres de cerco para perto, enchemos de arqueiros, e fingimos um ataque contra os portões. Isso vai trazer Sor Bryden para as ameias, cristas e tal. Deixe que cada arqueiro lancem seus dardos como um solo da noite, e fazerem da crista sua marca. Uma vez que Sor Bryden morra, Correrrio é nossa.
— Minha. — Canalizou Lorde Emmon. — Correrrio é minha.
A marca de nascença de Lord Karyl escureceu.
— O Solo da noite será sua própria contribuição, Edwyin? Um veneno mortal, não duvido. Peixe Negro merece uma morte nobre, e eu sou o homem que dará a ele. — Javali Forte bateu com o punho na mesa — Vou desafiá-lo para um combate. Maça, machado ou espada longa, não farei distinção. O velho será minha carne.
— Porque ele se dignaria a aceitar seu desafio, sor? — Perguntou Sor Forley Prester. — O que ele poderia ganhar com tal duelo? Vamos levantar o cerco se ele conseguir ganhar? Eu não acredito nisso. Nem ele.
Um único combate não iria conseguir nada.
— Eu conheço Bryden Tully desde que éramos escudeiros juntos, em serviço de Lorde Darry, — disse Norbert Vance, o cego Lorde de Atranta. — Se agradar aos meus senhores, deixem-me ir e falar com ele e tentar fazê-lo entender o desespero de sua posição.
— Ele entende isso bem o suficiente, — disse Lord Piper. Ele era um baixo, roliço homem de cabelo vermelho selvagem, o pai de um dos escudeiros de Jaime. A semelhança com o menino era inconfundível. — O
homem não é estúpido, Nobert. Eles têm olhos... E muito senso para ceder a coisas como essas. Ele fez um gesto obsceno em direção a Edwyn Frey e Walder Rivers.
Edwyn arrepiou.
— Se meu senhor de Piper pretende implicar...
— Eu não implico Frey. Eu digo o que quero dizer diretamente, como um homem honesto. Mas o que você saberia dos costumes dos homens honestos? Você é um traiçoeiro mentiroso, como todos os seus parentes.
Prefiro beber uma caneca de mijo do que pegar a palavra de qualquer um Frey. Ele se inclinou sobre a mesa, onde está Marq? Responda-me isso. O que você fez com meu filho? Ele era um convidado em seu maldito casamento.
— E nosso honrado convidado ele deve permanecer, — disse Edwyn. — Até que você prove sua lealdade para Vossa Graça, Rei Tommen.
— Cinco cavaleiros e vinte homens armados foram com Marq para as Gêmeas. — Disse Piper. — Eles são seus convidados também, Frey?
— Alguns dos cavaleiros, talvez. Aos outros foram servidos nada mais do que mereciam. Você faria bem em guardar sua língua traidora, Piper, a menos que você queira que seu herdeiro retorne em pedaços.
Os conselhos de meu pai nunca chegaram a isso, Jaime pensou quando Piper veio cambaleado para seus pés.
— Diga isso com uma espada em suas mãos, Frey. — O pequeno homem rosnou. — Ou você só luta com manchas de merda?
O rosto do Frey empalideceu. Ao lado dele Walder Rivers se ergueu.
— Edwyn não é homem de espada... Mas eu sou Piper. Se você tiver mais observações para fazer vamos lá fora fazê-las.
— Este é um conselho de guerra, não uma guerra, — Jaime lembrou a eles. — Sentem-se, os dois.
Nenhum homem se moveu.
— Agora!
Walder Rivers sentou-se. Lord Piper não era tão fácil de comover.
Ele resmungou uma maldição e saiu da tenda.
— Eu devo enviar homens atrás dele e arrasta-lo de volta, meu senhor? — Sor Daven perguntou a Jaime.
— Envie Sor Ilyn, — exortou Edwyn Frey. — Nós só precisamos de sua cabeça.
Karyl Vance se virou para Jaime.
— Lord Piper falou de tristeza. Marq é seu primogênito. Os cavaleiros que o acompanharam até as Gêmeas eram sobrinhos e primos.
— Traidores e rebeldes, todos, você quer dizer, — disse Edwyn Frey.
Jaime lhe lançou um olhar frio.
— As Gêmeas pegaram a causa do Jovem Lobo também, — ele lembrou ao Frey. — Então você o traiu. Isso faz de você duas vezes mais traidor que Piper. — Ele gostou de ver o fino sorriso de Edwyn morrer. Eu tenho tido conselho suficiente por um dia, decidiu. — Estamos acabados.
Vejam suas preparações, meus senhores. Nós atacaremos na primeira luz.
O vento soprava do norte quando os senhores deixaram a tenda.
Jaime podia sentir o mau cheiro do acampamento Frey além do Pedregoso.
Do outro lado da água Edmure Tully ficou abandonado na forca no alto do cadafalso cinza, com uma corda em seu pescoço.
Sua tia partiu depois, seu marido em seus calcanhares.
— Lorde Sobrinho, — Emmon protestou. — Este ataque a meu lugar... Você não deve fazer isso. — Quando ele engoliu, a maça em sua garganta se moveu para baixo e para cima. — Você não deve... Eu o proíbo.
— Ele tinha mastigado folhamarga outra vez; espuma rosada brilhava em seus lábios. — O castelo é meu, eu tenho o pergaminho. Assinado pelo rei.
Pelo pequeno Tommen. Eu sou o senhor legal de Correrrio, e...
— Não por muito tempo enquanto Edmure Tully vive, — disse a Senhora Genna. — Ele é macio de coração e de cabeça, eu sei, mas vivo o homem ainda é um perigo. O que você pretende fazer sobre isso, Jaime?
— É Peixe Negro que é perigoso, não Edmure.
— Deixem Edmure comigo. Sor Lyle, Sor Ilyn. Assistam-me se quiser. É hora de eu pagar uma visita para aquelas forcas.
O Pedregoso era mais profundo e mais rápido que o Ramo Vermelho, e o vau mais próximo estava a léguas de distancia. A balsa tinha acabado de começar a cruzar o rio com Walder Rivers e Edwyn Frey quando Jaime e seus homens chegaram ao rio. Enquanto aguardavam seu retorno, Jaime disse a eles o que queria. Sor Ilyn cuspiu no rio.
Quando os três desceram da balsa na margem norte, uma camponesa bêbada se ofereceu para agradar a Javali Forte com sua boca.
— Aqui, divirta-se meu amigo, — Sor Lyle disse, empurrando-a para Sor Ilyn. Rindo, a mulher moveu-se para beijar Payne nos lábios, em seguida viu seus olhos e se encolheu.
O caminho entre as cocheiras eram primitivos, de lama marrom, misturado com esterco de cavalo e marcado tanto por cascos como por botas.
Em todos os lugares Jaime viu as torres gêmeas da Casa Frey exibidas em escudos e flâmulas azul e cinza, juntamente com casas menores juramentadas a Coroa: A garça de Erenford, o tridente de Haigh, os três raminhos de viscos de Lord Charlton. A chegada do Regicida não passou despercebida. Uma velha vendendo leitões em uma cesta parou para encará-lo, um cavaleiro com uma cara meio-familiar se colocou em um joelho, e dois homens mijando em uma vala viraram-se pulverizando entre si.
— Sor Jaime, — alguém chamou atrás dele, mas ele seguiu em frente sem se virar. Em torno dele ele vislumbrou os rostos dos homens que haviam feito o seu melhor para matá-lo no Bosque dos Murmúrios, onde os Freys lutaram sob as bandeiras do Lobo Gigante de Robb Stark. Sua mão de ouro pendurava-se pesada em seu lado.
O grande pavilhão retangular de Ryman Frey era maior no campo; suas paredes de lona cinza foram feitas de quadrados costurados para assemelhar-se a pedras, e seus dois picos evocava as Gêmeas. Longe de estar indisposto, Lorde Ryman estava desfrutando algum entretenimento. O som do riso de uma mulher embriagada vinha de dentro da tenda, misturada com a melodia de uma harpa e a voz de um cantor. Eu lidarei com você mais tarde, sor, Jaime pensou. Walder Rivers permaneceu diante de sua própria modesta tenda, conversando com dois homens armados. Seu escudo trazia as armas da Casa Frey com as cores invertidas, e uma curva vermelha sinistra do outro lado das torres. Quando o bastardo viu Jaime, ele franziu a testa. Aí está um frio olhar suspeito se eu alguma vez vi um. Este ai é mais perigoso do que qualquer um de seus legítimos irmãos.
A forca havia sido levantada a três metros do chão. Dois lanceiros foram postados ao pé da escada.
— Você não pode ir lá em cima sem a permissão de Lorde Ryman,— disse a Jaime.
— Isso diz que eu posso, Jaime bateu no punho de sua espada com um dedo. A questão é, para passar eu terei que ir sobre o seu cadáver?
O lanceiro arredou para o lado.
No topo da forca, o Senhor de Correrrio ficou olhando para a armadilha abaixo dele. Seus pés estavam pretos e cheios de lama, sua perna estava nua. Edmure vestia uma túnica de seda suja listrada em vermelho e azul, e um laço de corda de cânhamo.
Ao som dos passos de Jaime, ele levantou sua cabeça e passou a língua sobre seus lábios rachados.
— Regicida? — A visão de Sor Ilyn fez seus olhos se arregalarem.
— Melhor uma espada que uma corda. Faça-o Payne.
— Sor Ilyn, — disse Jaime. — Você ouviu Lorde Tully. Faça.
O silencioso cavaleiro agarrou sua espada larga com as mãos. Longa e pesada ela era, e afiada como um metal comum podia ser. Os lábios rachados de Edmure moveram-se silenciosamente. Quando Sor Ilyn levou a lamina para trás, ele fechou seus olhos. O curso teria todo o peso de Payne.
— Não! Pare! NÃO! — Edwyn Frey chegou ofegante a vista. — Meu pai esta vindo. Mais rápido que pode. Jaime, você deve...
— “Meu senhor” me serviria melhor, Frey, — disse Jaime. — E você faria bem em omitir a maior parte dos discursos que você dirige a mim.
Sor Ryman veio subindo os degraus da forca na companhia de uma meretriz com cabelos de palha tão bêbada quanto ele estava. Seu vestido era amarrado na frente, mas alguém tinha desfeito os laços do umbigo, então seus seios estavam saindo. Eles eram grandes e pesados, com grotescos mamilos marrons. Em sua cabeça um diadema de bronze, martelado e com pontas tortas, esculpidas com runas e unidas com pequenas espadas negras.
Quando ela viu Jaime, riu.
— Quem nos sete infernos é esse ai?
— O Lorde Comandante da Guarda Real, — Jaime respondeu com fria cortesia. — Eu talvez pergunte o mesmo de você, senhora.
— Senhora? Eu não sou uma senhora. Eu sou a rainha.
— Minha irmã ficará surpresa ao ouvir isso.
— Lorde Ryman me coroou ele mesmo. — Ela apertou seus quadris largos. — Eu sou a rainha das prostitutas.
Não, Jaime pensou, minha doce irmã tem este título também.
Sor Ryman encontrou sua língua.
— Cale a Boca. Lorde Jaime não quer ouvir alguns disparates de prostituta.
Este Frey era um homem atarracado com um rosto largo, olhos pequenos e um conjunto carnudo e macio de queixos. Seu hálito tinha o fedor do vinho e de cebolas.
— Fazendo rainhas, Sor Ryman? — Jaime perguntou suavemente.
Estúpido. Tão estúpido quanto este negócio com Lorde Edmure.
— Eu dei o aviso a Peixe Negro. Eu disse a ele que Edmure morreria a menos que ele entregasse o castelo. Eu tinha essa forca construída, para mostrar a ele que Sor Ryman Frey não faz ameaças vazias. Em Guardamar meu filho Walder fez o mesmo com Patrek Mallister e Lorde Jason dobrou os joelhos, mas... Peixe Negro é um homem frio, ele nos recusou então...
—... Você enforcou Lorde Edmure?
O homem avermelhou.
— Meu senhor avô... Se pendurarmos o homem, nós não teremos refém, sor. Você considerou isso?
— Somente tolos fazem tratos que não estão preparados para cumprirem. Se eu tratasse de bater em você a menos que você calasse sua boca, e você resolvesse falar, o que você acha que eu faria?
— Sor, você não entend…
Jaime bateu nele. Foi um golpe de costas da mão feita com a mão de ouro, mas a força dele enviou Sor Ryman tropeçando para trás para os braços de sua prostituta.
— Você tem uma cabeça gorda, Sor Ryman. E um pescoço grosso também. Sor Ilyn, quantos golpes você levaria para decepar o pescoço?
Sor Ilyn colocou um único dedo contra seu nariz.
Jaime riu.
— Você esta se vangloriando. Eu digo três.
Ryman Frey ficou de joelhos.
— Eu não fiz nada…
— Além de beber e prostituir. Eu sei.
— Eu sou herdeiro do Gargalo, você não pode...
— Eu avisei você sobre falar. — Jaime observou o homem ficando pálido. Um beberrão, um tolo, um covarde. Sor Walder devia ter melhor resistência que esse, ou os Frey estão acabados.
— Você está destituído, sor.
— Destituído?
— Você me ouviu. Vá embora.
— Mas… Aonde eu devo ir?
— Para o inferno ou para casa, como você preferir. Desde que você não esteja no acampamento quando o sol nascer. Você talvez leve sua rainha das prostitutas, mas não a coroa dela. — Jaime virou de Sor Ryman para seu filho. Edwyn, eu estou dando a você o comando de seu pai. Tente não ser tão estúpido quanto ele.
— Isso não deve ser muito difícil, meu senhor.
— Envie uma palavra para Lorde Walder. A coroa requer todos os seus prisioneiros. — Jaime acenou com sua mão de ouro.
—Sor Lyle, tragam-no.
Edmure Tully desabou de bruços quando a lamina de Sor Ilyn partiu a corda em dois. Um pé de cânhamo ainda estava pendurado da corda em seu pescoço. Javali Forte agarrou o final dela e puxou para seus pés.
— Um peixe em uma coleira, — ele disse rindo. — Aí esta uma visão que eu nunca vi antes.
Os Freys se afastaram para deixá-lo passar. Uma multidão se reuniu abaixo do andaime, incluindo uma dúzia de seguidores do campo em vários estados de desordem. Jaime notou um homem segurando uma harpa.
— Você, cantor, venha comigo.
O homem tirou o chapéu.
— Como meu senhor ordena.
Ninguém disse uma palavra enquanto caminhavam de volta para a balsa, com o cantor de Sor Ryman trilhando atrás deles. Mas quando eles impeliram para fora da margem do rio em direção para o lado sul de Pedregoso, Edmure Tully agarrou Jaime pelo braço.
— Por quê?
Um Lannister sempre paga suas dívidas, ele pensou, e você é a única moeda que me sobrou.
— Considere um presente de casamento.
Edmure olhou para ele com cautelosos olhos.
— Um… Presente de casamento?
— Eu fui informado que sua esposa é bonita. Ela teria que ser para você ir para a cama com ela enquanto sua irmã e seu rei estavam sendo assassinados.
— Eu nunca soube, — Edmure lambeu os lábios rachados. — Havia violonistas fora do quarto de dormir.
— E a Senhora Roslin estava distraindo você.
— Ela... Eles a fizeram fazer isso, Lorde Walter e o resto. Roslin nunca quis... Ela chorou, mas eu pensei que era…
— O sinal de sua masculinidade desenfreada? Sim, isso faria qualquer mulher chorar, eu tenho certeza.
— Ela está carregando meu filho.
Não, Jaime pensou, esta é sua morte que esta crescendo dentro da barriga dela. De volta em seu pavilhão, ele dispensou Javali Forte e Sor Ilyn, mas não o cantor.
— Eu talvez precise de uma curta canção, — ele disse ao homem. —Lew, aqueça um pouco de água para o banho do meu convidado. Pia, encontre para ele alguma roupa limpa. Nada com leões, se puder. Peck, vinho para Lorde Tully. Você esta com fome meu senhor?
Edmure negou com a cabeça, mas seus olhos ainda estavam desconfiados.
Jaime se sentou em um banquinho enquanto Tully tinha seu banho.
A sujeira saia em nuvens cinzas.
— Depois que você tiver comido, um de meus homens escoltará você até Correrrio. O que acontece depois disso depende de você.
— O que você quer dizer?
— Seu tio é um homem velho. Valente, sim, mas a melhor parte de sua vida acabou. Ele não tem nenhuma noiva para lamentar por ele, nenhum filho para defender. Uma boa morte é tudo o que Peixe Negro pode esperar...
Mas você tem anos pela frente, Edmure. E você é o senhor legítimo da Casa Tully, não ele. Seu tio deve servir a seu prazer. O destino de Correrrio está em suas mãos.
Edmure o encarou.
— O destino de Correrrio...
— Entregue o castelo e ninguém morre. Seu pequeno povo pode ir em paz ou ficar para servir Lorde Emmon. A Sor Bryden será permitido vestir o negro, juntamente com a quantidade de militares que preferir se juntar a ele. Você também, se a Muralha apelar por você. Ou você pode ir para o Rochedo Casterly como meu cativo e desfrutar de todos os confortos e cortesias que convém a um refém da sua classificação. Eu enviarei sua esposa para se juntar a você, se você quiser. Se seu filho for um garoto, ele irá servir a Casa Lannister como um Pagem ou Escudeiro, e quando ele se tornar cavaleiro, lhe daremos algumas terras. Se Roslin te der uma filha, eu a verei com um bom dote quando tiver idade suficiente para casar. A você mesmo pode até ser concedida liberdade condicional, uma vez que a guerra estiver acabada. Tudo o que você precisa fazer é entregar o castelo.
Edmure levantou suas mãos da banheira e observou a água correr por entre seus dedos.
— E se eu não entregar o castelo?
Será que você vai me fazer dizer as palavras? Pia estava junto à aba da tenda com o braço cheio de roupas. Seus escudeiros estavam ouvindo também, assim como o cantor. Deixe-os ouvir, Jaime pensou, deixe o mundo ouvir. Não fará diferença alguma. Ele forçou a si mesmo um sorriso.
— Você tem visto nossos números, Edmure. Você já viu as escadas, as torres, os trabucos e os aríetes. Assim que eu der o comando, minha vanguarda irá pontear o seu fosso e quebrar o seu portão. Centenas morrerão, a maioria de seu próprio povo. Seus ex-juramentados farão parte da minha primeira onda de ataque, assim você vai começar o dia matando pais e irmãos daqueles que morreram por você nas Gêmeas. A segunda onda será Freys, eu tenho destes de sobra. Minha retaguarda seguirá quando seus arqueiros ficarem em falta de flechas, e seus cavaleiros tão cansados que nem poderão levantar as laminas. Quando o castelo cair, todos aqueles que estiverem dentro serão postos a espadas. Seu rebanho será massacrado, suas florestas dos deuses serão derrubadas, suas guardas e torres irão queimar. Eu colocarei suas muralhas a baixo, e desviarei o Pedregoso sobre as ruínas.
Depois que eu terminar, nenhum homem jamais saberá que um castelo alguma vez ficava aqui. — Jaime ficou de pé. — Sua esposa talvez vá parir depois disso. Você vai querer seu filho, eu espero. Eu vou mandá-lo a você quando ele nascer. Com uma catapulta.
Silencio seguiu seu discurso. Edmure sentado em sua banheira. Pia agarrando as roupas contra seus seios. O cantor reforçou uma corda em sua harpa. Pequeno Lew escavava um naco de pão para fazer uma trincheira, fingindo que não tinha ouvido. Com uma catapulta, Jaime pensou. Se sua tia estivesse estado lá, ela ainda diria que Tyrion era filho de Tywin?
Edmure Tully finalmente encontrou sua voz.
— Eu poderia sair dessa banheira e matá-lo onde você está, Regicida.
— Você poderia tentar.
Jaime esperou. Quando Edmure não fez movimento para se erguer, ele disse
— Eu deixarei você para aproveitar sua comida. Cantor, cante para nosso convidado enquanto ele come. Você conhece a musica, eu acredito.
— Aquela sobre a chuva? Sim, meu senhor, eu a conheço.
Edmure parecia ver o homem pela primeira vez.
— Não. Ele não! Tire ele de perto de mim.
— Por quê? É só uma canção, — disse Jaime. Ele não pode ter uma voz tão ruim.