CAPÍTULO 8


- O que acha, Inglês?

- Acho que vai haver uma tempestade.

- Quando?

- Antes do pôr-do-sol.

Era quase meio-dia e os dois estavam em pé no tombadilho da galera, sob um céu de chumbo. Era o segundo dia ao mar.

- Se este navio fosse seu, o que você faria?

- A que distância estamos do nosso ponto de chegada? perguntou Blackthorne.

- Chegaremos depois do pôr-do-sol.

- A que distância estamos da terra mais próxima?

- Quatro ou cinco horas, Inglês. Mas correr para um abrigo vai nos custar meio dia e não posso me permitir isso. O que você faria?

Blackthorne pensou um instante. Durante a primeira noite a galera rumara velozmente para o sul, seguindo a costa leste da península de Izu, ajudada pela grande vela do mastro no meio do navio. Quando passaram diante do cabo mais ao sul, cabo Ito, Rodrigues estabelecera a rota oeste-sul-oeste, e trocara a segurança da costa por mar aberto, rumando para o cabo Shinto, a duzentas milhas.

- Normalmente numa galera como esta acompanhamos a costa, por segurança - dissera Rodrigues -, mas isso toma tempo demais e o tempo é importante. Toranaga me pediu que levasse Toady a Anjiro e voltasse. Rapidamente. Há um prêmio para mim se formos bem rápidos. Um dos pilotos deles seria exatamente tão bom quanto eu num trajeto curto como este, mas o pobre filho de uma puta morreria de medo de levar um daimio tão importante quanto o Toady, particularmente longe da vista de terra. Eles não são de oceano, os japoneses. Ótimos piratas, lutadores e marinheiros costeiros. Mas o mar alto os assusta. O velho taicum até fez uma lei dizendo que os poucos navios oceânicos japoneses viajem sempre com pilotos portugueses a bordo. Essa lei ainda está em vigor.

- Por que ele fez isso?

Rodrigues dera de ombros.

- Talvez alguém lhe tenha sugerido.

- Quem?

- O seu portulano roubado, Inglês, o português. De quem era?

- Não sei. Não havia nome nele, nenhuma assinatura.

- Onde o conseguiu?

- Do mercador-chefe da Companhia Holandesa das índias Orientais.

- De onde ele conseguiu?

Blackthorne sacudira os ombros. A risada de Rodrigues não continha humor.

- Bem, nunca esperei que você me dissesse, mas seja quem for que o tenha roubado e vendido, espero que queime no fogo do inferno para sempre!

- Você é empregado desse Toranaga, Rodrigues?

- Não. Estávamos só visitando Osaka, o meu capitão e eu. Isto foi só um favor para Toranaga. Meu capitão me ofereceu voluntariamente. Sou piloto do... - Rodrigues se detivera. - Sempre esqueço que você é inimigo, Inglês.

- Portugal e Inglaterra foram aliados durante séculos.

- Mas agora não somos. Vá lá para baixo, Inglês. Você está cansado, eu também, e homens cansados cometem erros. Volte para o convés quando estiver descansado.

Blackthorne descera para a cabina do piloto e se deitara no beliche. O portulano de Rodrigues para a viagem encontrava-se sobre a arca que estava presa ao tabique do mesmo modo que a cadeira do piloto no tombadilho. O livro tinha capa de couro e era muito usado, mas Blackthorne não o abriu.

- Por que deixá-lo aí? - havia perguntado antes.

- Se não deixar, você vai procurá-lo. Mas estando aí você não o tocará, nem o olhará, sem ser convidado. Você é um piloto, não um mercador ou soldado corrupto e ladrão.

- Vou lê-lo. Você faria isso.

- Não sem ser convidado, Inglês. Nenhum piloto faria isso. Nem eu faria!

Blackthorne olhara o livro um instante, depois fechara os olhos. Dormiu profundamente, aquele dia todo e parte da noite. Faltava pouco para o amanhecer quando despertou, como sempre. Levou tempo para se acostumar ao movimento desajeitado da galera e à batida do tambor que mantinha os remos movendo-se como um só. Estava confortavelmente deitado de costas, os braços sob a cabeça. Pensou no seu navio e afastou a preocupação quanto ao que aconteceria quando chegassem a Osaka. Uma coisa de cada vez. Pense em Felicity, em Tudor, no lar. Não, agora não.

Pense que se os outros portugueses são como Rodrigues, você tem uma boa chance agora. Vai pegar um navio de volta para casa. Pilotos não são inimigos, e dane-se o resto! Mas você não pode dizer isso, mocinho. Você é inglês, o herege odiado e anticristo. Os católicos são os donos deste mundo. Eram os donos. Agora, nós e os holandeses vamos esmagá-los.

Que absurdo tudo isso! Católicos, protestantes, calvinistas, luteranos e todas as outras merdas iguais. Você devia ter nascido católico. Foi só o destino que levou seu pai para a Holanda, onde conheceu uma mulher, Anneke van Croste, que se tornou mulher dele, e onde viu católicos espanhóis, padres espanhóis e a Inquisição pela primeira vez. Ainda bem que ele abriu os olhos, pensou Blackthorne. Ainda bem que os meus estão abertos.

Depois foi para o convés. Rodrigues estava sentado na sua cadeira, os olhos estriados de vermelho pela falta de sono, dois marujos japoneses ao leme como antes.

- Posso pegar este turno para você?

- Como se sente, Inglês?

- Descansado. Posso pegar o turno para você? - Blackthorne viu Rodrigues medindo-o. - Eu o acordo se o vento mudar, ou outra coisa acontecer.

- Obrigado, Inglês. Sim, vou dormir um pouco. Mantenha esta rota. Quando virar a ampulheta, vá quatro graus mais para oeste, na virada seguinte, mais seis, sempre para oeste. Terá que apontar a nova rota na bússola para o timoneiro. Wakarimasu ka?

- Hai! - Blackthorne riu. - Quatro pontos para oeste.

- Desça, piloto, o seu beliche é confortável.

Mas Vasco Rodrigues não desceu. Simplesmente puxou a sua capa mais para junto do corpo e instalou-se mais profundamente na cadeira do convés. Pouco antes da virada da ampulheta, despertou momentaneamente, examinou a mudança de rota sem se mover e imediatamente caiu no sono de novo. Uma hora, quando o vento virou, ele despertou e, vendo que não havia perigo, novamente adormeceu.

Hiromatsu e Yabu vieram ao convés durante a manhã.

Backthorne notou a surpresa deles ao vê-lo pilotando o navio e Rodrigues dormindo. Não falaram com ele, mas voltaram à conversa que estavam tendo e, mais tarde, desceram novamente.

Por volta do meio-dia Rodrigues se levantou da cadeira de convés para olhar na direção nordeste, farejando o vento, todos os sentidos concentrados. Os dois homens estudaram o mar, o céu e as nuvens invasoras.

- O que você faria, Inglês, se este fosse o seu navio? -

disse Rodrigues novamente.

- Eu escaparia para a costa se soubesse onde ela está, para o ponto mais próximo. Esta nave não vai agüentar muita água e há uma tempestade bem ali. A umas quatro horas daqui.

- Não pode ser taifun - resmungou Rodrigues.

- O quê?

- Taifun. São imensos vendavais, as piores tempestades que você jamais viu. Mas não estamos na época de taifun.

- Quando é a época?

- Não é agora, inimigo. - Rodrigues riu. - Não, não agora. Mas isso poderia ser mau o bastante, de modo que vou aceitar o seu conselho. Mude a rota para norte.

Enquanto Blackthorne mostrava o novo curso e o timoneiro virava o navio com destreza, Rodrigues foi até a amurada e gritou para o capitão:

- Isogi! Capitão-san. Wakarimasu ka?

- Isogi, hai!

- O que é isso? Apresse-se?

Os cantos dos olhos de Rodrigues se enrugaram, risonhos.

- Não faz mal que você saiba um pouco de japonês, hein? Claro, Inglês, "isogi" quer dizer "apressar-se". Tudo de que você precisa aqui são umas dez palavras e então você pode fazer esses sodomitas cagarem se quiser. Se forem as palavras certas, é claro, e se eles estiverem com disposição. Vou descer agora, para comer alguma coisa.

- Você também cozinha?

- No Japão, todo homem civilizado tem que cozinhar, ou tem que treinar pessoalmente um dos macacos para cozinhar, senão morre de fome. Tudo o que comem é peixe cru e verduras cruas num vinagre doce de conserva. Mas a vida aqui pode ser incrível se você souber como.

- "Incrível" é bom ou mau?

- Na maioria das vezes é muito bom, mas às vezes é terrivelmente mau. Tudo depende de como a gente se sente, e você faz perguntas demais. - Rodrigues foi lá para baixo. Trancou a porta de sua cabina o cuidadosamente examinou o fecho da sua arca. O fio de cabelo que colocara sutilmente continuava lá. E um fio semelhante, igualmente invisível para qualquer um menos para ele, que colocara na capa do portulano, também permanecia intacto.

Não se pode ser cuidadoso demais neste mundo, pensou Rodrigues. Será que há algum perigo em que ele saiba que você é o piloto da Nao del Trato, o grande Navio Negro que vem de Macau este ano? Talvez. Porque então você teria que explicar que o navio é um leviatã, um dos maiores e mais ricos navios do mundo, mais de mil e seiscentas toneladas. Você poderia se sentir tentado a falar-lhe sobre a carga, sobre comércio e sobre Macau, e todo tipo de coisas esclarecedoras que são muitíssimo particulares e muitíssimo secretas. Mas estamos em guerra, nós contra os ingleses o holandeses.

Abriu o fecho bem oleado e tirou seu portulano particular para verificar algumas posições para a enseada mais próxima e seus olhos viram o pacote lacrado que o Padre Sebastio lhe dera pouco antes de deixarem Anjiro. Será que isso contém os portulanos do inglês? - perguntou a si mesmo novamente.

Sopesou o pacote e olhou os lacres jesuítas, altamente tentado a rompê-los. Blackthorne lhe contara que a esquadra holandesa viera pelo estreito de Magalhães e pouca coisa mais. O inglês faz muitas perguntas e não fala nada voluntariamente, pensou Rodrigues. É astuto, inteligente e perigoso.

Será que isto são os portulanos dele ou não? Se forem, que serventia têm para os santos padres?

Estremeceu ao pensar em jesuítas, franciscanos, dominicanos, em todos os monges e padres e na Inquisição. Há padres bons e maus, na maior parte maus, mas ainda assim são padres. A Igreja tem que ter padres, e sem eles para interceder por nós somos ovelhas perdidas neste mundo satânico. Oh, Nossa Senhora, proteja-me do mal e dos maus padres!

Ainda na enseada de Anjiro, Rodrigues estava na sua cabina com Blackthorne, quando a porta se abrira e o Padre Sebastio entrara sem ser convidado. Os dois tinham comido e bebido, e as sobras ainda se encontravam nas tigelas de madeira.

- Você reparte o pão com hereges? - perguntara o padre.

- É perigoso comer com eles. São infectos. Ele lhe disse que é pirata?

- É cristão ser cavalheiro com os inimigos, padre. Quando estive nas mãos deles, foram justos comigo. Só estou retribuindo a caridade deles. - Havia se ajoelhado e beijado a cruz do padre. Depois se levantara e, oferecendo vinho, dissera: - Em que posso ajudá-lo?

- Quero ir para Osaka. No navio.

- Vou perguntar a eles imediatamente. - Saíra, perguntara ao capitão, e a solicitação subira gradualmente até Toda Hiromatsu, que respondera que Toranaga não dissera nada sobre levar um padre estrangeiro de Anjiro, de modo que lamentava não poder levar o padre estrangeiro de Anjiro.

O Padre Sebastio quisera conversar em particular com ele, então mandara o inglês para o convés e depois, na intimidade da cabina, o padre lhe exibira o pacote lacrado.

- Gostaria que entregasse isto ao padre-lnspetor.

- Não sei se Sua Eminência ainda estará em Osaka quando eu chegar lá. - Rodrigues não gostava de ser portador de segredos jesuítas. - Talvez eu tenha que voltar para Nagasaki. Meu capitão-mor pode ter me deixado ordens.

- Então entregue ao Padre Alvito. Certifique-se de que vai entregar isto apenas nas mãos dele.

- Muito bem - dissera ele.

- Quando foi que se confessou pela última vez, meu filho?

- No domingo, padre.

- Gostaria de se confessar agora?

- Sim, obrigado. - Ficara agradecido de que o padre lhe perguntasse, pois nunca se sabia quando é que a vida da gente dependia do mar, e depois da confissão se sentira muito melhor, como sempre.

Agora na cabina, Rodrigues recolocou o pacote no lugar, enormemente tentado. Por que o Padre Alvito? O Padre Martim Alvito era o principal negociador comercial e fora intérprete pessoal do taicum durante muitos anos e, por isso, íntimo da maioria dos daimios influentes. O Padre Alvito se alternava entre Nagasaki e Osaka e era um dos pouquíssimos homens, e o único europeu, que tivera acesso ao taicum a qualquer momento - um homem enormemente inteligente, que falava um japonês perfeito e conhecia mais sobre eles e seu modo de vida do que qualquer outro homem na Ásia. Agora era o mediador português mais influente junto ao conselho de regentes, junto a Ishido e Toranaga em particular.

Só os jesuítas para colocar um de seus homens numa posição vital assim, pensou Rodrigues com admiração. Certamente não fosse pela Companhia de Jesus a torrente da heresia nunca teria parado, Portugal e Espanha poderiam ter-se tornado protestantes e teríamos perdido nossa alma imortal para sempre. Minha Nossa Senhora!

- Por que você pensa em padres o tempo todo? - perguntou Rodrigues a si mesmo em voz alta. - Sabe que isso o deixa nervoso! - Sim. Mas ainda assim, por que o Padre Alvito? Se o pacote contém os portulanos, destina-se a um dos daimios cristãos, a Ishido, a Toranaga? Ou simplesmente a Sua Eminência, o padre-lnspetor? Ou ao meu capitão-mor? Ou os portulanos serão enviados a Roma, para os espanhóis? Por que o Padre Alvito?

O Padre Sebastio poderia facilmente ter dito que o entregasse a qualquer um dos outros jesuítas.

E por que Toranaga quer o inglês?

No meu coração sei que devo matar Blackthorne. É o inimigo, é um herege. Mas há alguma coisa mais. Tenho a sensação de que esse inglês é um perigo para todos nós. Por que devo pensar isso? É um piloto, um ótimo piloto. Forte, inteligente. Um bom homem. Não há nada com que se preocupar. Então por que estou com medo? Gosto muito dele, mas sinto que deveria matá-lo rapidamente, e quanto mais depressa melhor. Não por raiva. Só para nos proteger. Por quê? Tenho medo dele.

O que fazer? Deixá-lo nas mãos de Deus? A tempestade está se aproximando e vai ser péssima.

- Deus me amaldiçoe e à minha falta de miolos! Por que não tenho mais facilidade em saber o que fazer?

A tempestade chegou antes do pôr-do-sol e reteve-os em mar alto. A terra estava a dez milhas de distância. A baía para onde se precipitavam ficava em frente e era abrigo suficiente. Não havia bancos de areia ou recifes entre os quais navegar, mas dez milhas eram dez milhas e o mar estava se avolumando rapidamente, impelido pelo vento saturado de chuva.

A ventania soprava de nordeste, atingindo-os a estibordo, e mudava perversamente de direção, quando rajadas se lançavam em torvelinho de leste e de norte, desordenadamente, o mar bravíssimo. A rota era noroeste, de modo que estavam bem em meio às vagas, balançando furiosamente, ora na depressão entre duas ondas, ora na crista. A galera era de estrutura rasa e fora construída para velocidade e águas calmas, e embora os remadores fossem resolutos e muito disciplinados, era difícil manter os remos no mar e o impulso regular.

- Você terá que fixar- os remos e correr com o vento - gritou Blackthorne.

- Talvez, mas ainda não! Onde estão os seus cojones, Inglês?

- Estão onde devem estar, por Deus, e onde quero que fiquem!

Os dois homens sabiam que se virassem contra o vento nunca poderiam avançar contra a tempestade, de modo que a maré e o vento os levariam para longe do refúgio e para alto-mar. Se corressem com o vento, a maré e o vento os levariam para longe do refúgio e para alto-mar igualmente, só que mais depressa. Ao sul ficava a Grande Fossa. Não havia terra ao sul por mil milhas, ou, se não se tivesse sorte, por mil léguas.

Estavam presos a cordas amarradas à bitácula e satisfeitos de si quando o convés arfou e jogou. Os dois se agarraram às amuradas e montaram nelas.

Até o momento, a água ainda não chegara a bordo. O navio estava pesadamente carregado e afundava mais na água do que qualquer um dos dois gostaria. Rodrigues se preparara adequadamente nas horas de espera. Fora tudo fixado com sarrafos, os homens prevenidos. Hiromatsu e Yabu disseram que ficariam embaixo por um tempo, mas depois vieram para o convés. Rodrigues dera de ombros e lhes dissera claramente que seria muito perigoso. Tinha certeza de que não compreenderam.

- O que é que eles vão fazer? - perguntara Blackthorne.

- Quem é que sabe, Inglês? Mas não vão chorar de medo, pode ter certeza.

No poço do convés principal, os remadores davam duro. Normalmente haveria dois homens em cada remo, mas Rodrigues ordenara três, por uma questão de força, segurança e velocidade.

Havia outros esperando sob os conveses para render esses remadores quando ele desse ordem. Na coberta de proa o capitão mestre dos remos era experimentado e sua batida era lenta, sincronizada com as ondas. A galera continuava avançando, embora a cada momento a batida parecesse mais pronunciada e o restabelecimento da normalidade mais lento. Depois as rajadas se tornaram intermitentes e fizeram o mestre dos remos perder o ritmo.

- Atenção à frente! - gritaram Blackthorne e Rodrigues quase no mesmo fôlego. A galera jogou com violência, vinte remos impeliram o ar em vez de o mar e foi o caos a bordo. O primeiro vagalhão abalroara o navio e a amurada de bombordo fora arrastada pela água.

- Vá lá para a frente! - ordenou Rodrigues. - Faça-os armar os remos a meia altura de cada lado! Minha Nossa Senhora, depressa, depressa!

Blackthorne sabia que sem a corda salva-vidas poderia facilmente ser lançado ao mar. Mas os remos tinham que ser armados ou estariam todos perdidos.

Soltou o nó e investiu com dificuldade pelo convés escorregadio e nauseante, descendo a escadinha para o convés principal.

Abruptamente a galera deu uma guinada e ele foi arrastado para baixo, suas pernas levadas por alguns remadores que também haviam soltado as cordas de segurança para tentar, arduamente, controlar os remos. A amurada estava sob água e um homem foi lançado ao mar. Blackthorne deixou-se ir também. Sua mão agarrou a amurada, seus tendões se estiraram, mas ele agüentou; depois a outra mão alcançou a borda e, sufocando, ele forçou o corpo para trás. Seus pés encontraram o convés e ele se sacudiu, agradecendo a Deus, e pensando: lá se foi a sua sétima vida. Alban Caradoc sempre dissera que um bom piloto tinha que ser como um gato, exceto que tinha que ter no mínimo dez vidas, enquanto um gato se satisfazia com nove.

Um homem estava a seus pés e ele o arrancou ao repuxo do mar, segurou-o até que estivesse a salvo, depois ajudou-o a voltar a seu lugar. Olhou para trás para amaldiçoar Rodrigues por deixar o timão escapar-lhe das mãos. Rodrigues acenou, apontou e gritou, o grito engolido por uma lufada. Blackthorne viu que a rota havia mudado. Agora estavam quase contra o vento, e percebeu que a guinada fora planejada. É prudente, pensou. Isso nos dará um intervalo para nos organizarmos, mas o bastardo poderia ter me prevenido. Não gosto de perder vidas desnecessariamente.

Respondeu ao aceno e se lançou ao trabalho de recompor os remadores. A voga se interrompera totalmente, exceto pelos dois remos mais à frente, que os mantinham contra o vento. Com sinais e berros, Blackthorne conseguiu que armassem os remos, dobrou os homens que estavam trabalhando, e foi novamente para a popa. Os homens eram estóicos e embora alguns estivessem muito enjoados ficaram e esperaram pela ordem seguinte. A baía estava mais próxima, mas ainda parecia a um milhão de léguas de distância. Para nordeste o céu estava escuro. A chuva açoitava-os e as rajadas de vento se tornavam mais fortes. No Erasmus Blackthorne não se teria preocupado. Poderiam ter atingido a enseada com facilidade ou poderiam ter voltado despreocupadamente para a rota real, avançando para o seu ponto de chegada correto. Seu navio fora construído e mastreado para enfrentar o vento. Esta galera não.

- O que acha, Inglês?

- Faça o que quiser, não importa o que eu pense - gritou ele contra o vento. - Mas o navio não vai agüentar muita água e iremos para o fundo como uma pedra, e na próxima vez que eu for até a proa, avise-me que está pondo o navio contra o vento. Melhor ainda: ponha-o a barlavento enquanto eu estiver com a minha corda e então nós dois chegaremos a porto seguro.

- Foi a mão de Deus, Inglês. Uma onda lhe deu um empurrão na traseira e fê-lo girar.

- Isso quase me atirou ao mar.

- Eu vi. - Blackthorne estava medindo o desvio. - Se permanecermos neste curso, nunca chegaremos à baía. Passaremos velozmente pelo promontório a uma milha ou mais.

- Vou ficar contra o vento. Depois, quando o tempo estiver adequado, vamos nos arremessar para a praia. Sabe nadar?

- Sim.

- Bom. Eu nunca aprendi. Perigoso demais. Melhor afundar rapidamente do que aos poucos, hein? - Rodrigues estremeceu involuntariamente. - Bendita Nossa Senhora, proteja-me de um túmulo de água! Esta porca barriguda e prostituta deste navio vai chegar à enseada esta noite! Tem que chegar. Meu nariz diz que se virarmos e corrermos, vamos nos atrapalhar. Estamos carregados demais.

- Alivie a carga. Atire-a ao mar.

- O Rei Toady nunca concordaria. Tem que chegar com ela, senão não faz diferença que chegue.

- Pergunte-lhe.

- Nossa Senhora, você é surdo? Eu lhe disse! Sei que ele não concordará! - Rodrigues aproximou-se mais do timoneiro e certificou-se de que ele compreendera que devia manter-se contra o vento de qualquer jeito.

- Vigie-os, Inglês! Você está com o comando. - Desamarrou a sua corda e desceu a escadinha pisando firme. Os remadores olharam-no atentamente enquanto ele se dirigia ao capitão-san no convés de popa para explicar por meio de sinais e com palavras o plano que tinha em mente. Hiromatsu e Yabu vieram ao convés. O capitão-san explicou-lhes o plano. Estavam ambos pálidos, mas permaneciam impassíveis e não haviam vomitado. Olharam na direção da terra, através da chuva, sacudiram os ombros e foram para baixo novamente.

Blackthorne contemplava a baía a bombordo. Sabia que o plano era perigoso. Teriam que esperar até passar pelo promontório, depois teriam que se pôr a sotavento, virar para noroeste novamente e lutar pela vida. A vela não os ajudaria. Teria que ser a força deles somente. O lado meridional da baía era todo denteado de rochedos e recifes. Se eles calculassem mal o tempo, seriam atirados contra a praia ali e destroçados.

- Inglês, ponha-se à proa!

O português estava fazendo-lhe sinais. Postou-se na proa.

- E quanto à vela? - gritou Rodrigues.

- Não. Vai prejudicar mais do que ajudar.

- Fique aqui, então. Se a batida do capitão enfraquecer, ou se o perdermos, você toma o lugar dele. Está certo?

- Nunca manobrei um destes antes, nunca controlei remos. Mas tentarei.

Rodrigues olhou em direção à terra. O promontório aparecia e desaparecia na chuva impulsora. Logo teria que investir. Os vagalhões estavam crescendo e já havia jatos de espuma desprendendo-se das cristas. A corrida entre os promontórios parecia péssima. Esta vai ser imunda, pensou ele. Depois cuspiu e decidiu-se.

- Vá para a popa, Inglês. Pegue o leme. Quando eu fizer sinal, vá oeste-norte-oeste para aquele ponto. Está vendo?

- Sim.

- Não hesite e mantenha esse curso. Observe-me com atenção. Este sinal significa virar a bombordo, este para trás, este mantenha o passo.

- Muito bem.

- Pela Virgem, você vai esperar as minhas ordens e obedecer a elas?

- Quer que eu pegue o leme ou não?

Rodrigues sabia que estava numa armadilha.

- Tenho que confiar em você, Inglês, e detesto isso. Vá para a popa. - Viu Blackthorne ler o que ele tinha por trás dos olhos e se afastar. Depois mudou de idéia e chamou por ele: - Ei, seu pirata arrogante! Vá com Deus!

Blackthorne voltou-se, agradecido:

- Você também, espanhol!

- Mijo em todos os espanhóis e longa vida para Portugal!

- Mantenha o passo!

Atingiram a enseada, mas sem Rodrigues. Foi atirado ao mar quando a sua corda se partiu.

O navio estava prestes a se pôr em segurança, quando o vagalhão veio de norte e, embora tivessem agüentado muita água até então, inclusive perdendo o capitão japonês, agora foram inundados e impelidos para trás, na direção da praia infestada de rochedos.

Blackthorne viu quando Rodrigues se foi e ficou a olhá-lo, ofegando, e debatendo-se no mar encrespado. A tempestade e a maré haviam-nos levado bem longe para o lado sul da baía e estavam quase sobre os rochedos, todos a bordo sabendo que o navio estava perdido.

Quando Rodrigues foi varrido para o lado, Blackthorne atirou-lhe um salva-vidas de madeira. O português debateu-se na direção do salva-vidas mas o mar arrastou-o para fora do seu alcance. Um remo espatifou-se contra ele, que o agarrou. A chuva golpeava com violência e a última coisa que Blackthorne viu de Rodrigues foi um braço e o remo quebrado e, bem à frente, a rebentação enfurecida contra a praia atormentada. Poderia ter mergulhado, nadado até ele e sobrevivido, talvez, havia tempo, talvez, mas seu primeiro e último dever era para com o navio e seu navio estava em perigo.

Então, deu as costas a Rodrigues.

O vagalhão levara alguns remadores consigo e outros estavam lutando para preencher os lugares vazios. Um imediato havia bravamente desatado a corda de segurança. Saltou para a coberta de proa, se amarrou e reiniciou a batida. O líder do cantochão também recomeçou, os remadores tentaram impor ordem ao caos.

- Isogiiiiiiii! - gritou Blackthorne, lembrando-se da palavra. Atirou seu peso sobre o leme para ajudar a pôr a proa mais contra o vento, depois foi para a amurada e bateu o tempo, gritando um-dois-um-dois e tentando encorajar a tripulação.

- Vamos, seus bastardos, puuuuuuuuuxem!

A galera estava sobre os rochedos, pelo menos os rochedos estavam bem junto à popa, a bombordo e a estibordo. Os remos afundavam e puxavam, mas o navio continuava não fazendo caminho, o vento e a maré venciam, arrastando-o sensivelmente para trás.

- Vamos, puxem, seus bastardos! - gritou novamente Blackthorne, a mão batendo a cadência.

Os remadores extraíram forças dele. Primeiro agüentaram a parada com o mar. Depois conquistaram-no. O navio afastou-se dos rochedos. Blackthorne manteve o curso para a praia a sotavento. Pouco depois encontravam-se em águas mais calmas. O vendaval continuava, mas bem acima deles. A tempestade continuava, mas longe, em alto-mar.

- Lancem a âncora de estibordo!

Ninguém compreendeu as palavras, mas todos os marujos sabiam o que ele queria. Correram para cumprir a ordem. A âncora desceu com estrépito. Ele deixou o navio adernar levemente para testar a firmeza do leito marítimo, e o imediato e os remadores compreenderam a manobra.

- Lancem a âncora de bombordo!

Quando o navio ficou em segurança, ele olhou em direção à popa. A linha da praia mal podia ser vista através da chuva. Ele avaliou o mar e considerou as possibilidades.

O portulano português está lá embaixo, pensou, extenuado. Posso pilotar o navio até Osaka. Poderia pilotá-lo de volta a Anjiro. Mas você agiu corretamente desobedecendo a ele? Não desobedeci a Rodrigues. Eu estava no tombadilho. Sozinho.

- Vire para sul - gritara Rodrigues quando o vento e a maré os lançaram perigosamente perto das rochas. - Vire e corra com o vento!

- Não! - gritara ele de volta, acreditando que a única chance que tinham era tentar atingir a enseada e que em mar aberto estariam perdidos. - A gente consegue!

- Deus o amaldiçoe, vai matar a todos nós!

Mas não matei ninguém, pensou Blackthorne. Rodrigues, você sabia e eu sabia que a responsabilidade de decidir era minha - se houvesse tempo para uma decisão. Eu estava certo. O navio está salvo. Nada mais importa.

Acenou para o imediato, que veio correndo da coberta de proa. Os dois timoneiros estavam prostrados, braços e pernas quase arrancados das juntas. Os remadores pareciam cadáveres, caídos sobre os remos. Outros, igualmente enfraquecidos, vieram lá de baixo para ajudar. Hiromatsu e Yabu, ambos muito abalados, foram ajudados a subir ao convés, mas uma vez chegados lá, mantiveram-se ambos eretos.

- Hai, Anjin-san? - perguntou o imediato. Era um homem de meia-idade, com os dentes brancos e fortes e um rosto largo e castigado pelo tempo. Tinha uma contusão lívida marcando-lhe a face no ponto onde o mar o havia martelado contra a amurada.

- Você agiu muito bem - disse Blackthorne, não se importando com o fato de que suas palavras não seriam compreendidas. Sabia que o tom seria claro, assim como o seu sorriso.

- Sim, muito bem. Você é capitão-san agora. Wakarimasu? Você! Capitão-san!

O homem arregalou os olhos para ele, boquiaberto, depois curvou-se para dissimular tanto a surpresa quanto o prazer.

- Wakarimasu, Anjin-san. Hai. Arigato goziemashita.

- Ouça, capitão-san - disse Blackthorne -, dê comida e bebida aos homens. Comida quente. Vamos passar a noite aqui. - Por meio de sinais, fê-lo compreender.

Imediatamente o novo capitão se virou e gritou com nova autoridade. Imediatamente os marujos correram para obedecer-lhe. Muito orgulhoso, o novo capitão olhou para o tombadilho.

Gostaria de poder falar a sua língua bárbara, pensou, feliz. Então poderia agradecer-lhe, Anjin-san, por ter salvado o navio e a vida do nosso Senhor Hiromatsu. A sua mágica deu-nos novas forças. Sem ela não teríamos escapado. Você talvez seja pirata, mas é um grande marujo, e enquanto for o piloto eu lhe obedecerei com a minha vida. Não sou digno de ser capitão, mas tentarei merecer a sua confiança.

- O que quer que eu faça em seguida? - perguntou.

Blackthorne estava olhando por cima do costado. O leito marítimo estava turvo. Mentalmente tomou algumas posições e quando teve certeza de que as âncoras não haviam se soltado e o mar era seguro, disse:

- Desça o esquife. E arrume um bom remador.

Novamente com sinais e palavras, Blackthorne fê-lo compreender. O esquife foi descido e tripulado imediatamente.

Blackthorne dirigiu-se para a amurada e teria descido pelo costado se uma voz áspera não o detivesse. Olhou em torno. Hiromatsu estava ali, com Yabu ao lado.

O velho estava muito contundido em torno do pescoço e nos ombros, mas ainda segurava a espada comprida. Yabu punha sangue pelo nariz, tinha o rosto machucado, o quimono manchado,e tentava estancar o fluxo com um pedacinho de pano. Estavam ambos impassíveis, aparentemente inconscientes dos próprios ferimentos e do vento frio.

Blackthorne curvou-se polidamente.

- Hai, Toda-sama?

As palavras ásperas se repetiram, o velho apontou com a espada para o esquife e balançou a cabeça.

- Rodrigu-san lá! Blackthorne apontou para a praia ao sul como resposta. - Vou olhar!

- Iyé! - Hiromatsu meneou a cabeça de novo e falou, visivelmente recusando a sua permissão por causa do perigo.

- Sou Anjin-san deste puto deste navio e se quero ir até a praia, vou até a praia. - Blackthorne manteve a voz muito polida, mas forte, e era igualmente óbvio o que queria dizer. - Sei que esse esquife não vai agüentar nesse mar. Hai! Mas vou até a praia naquele ponto. Está vendo aquele ponto, Hiromatsu-sama?

Ao lado daquela pequena rocha. Vou começar a contornar o promontório ali. Não tenho pressa de morrer e não tenho lugar algum para onde fugir. Quero recuperar o corpo de Rodrigu-san. - Passou uma perna por sobre o costado. A espada embainhada moveu-se uma fração. Ele gelou. Mas seu olhar fixo estava tranqüilo, o rosto decidido.

Hiromatsu encontrava-se num dilema. Podia compreender que o pirata queria encontrar o corpo de Rodrigu-san, mas era perigoso ir até lá, e o Senhor Toranaga lhe dissera que levasse o bárbaro em segurança, portanto ele seria levado em segurança. Estava igualmente claro que o homem pretendia ir.

Vira-o durante a tempestade, em pé no convés inclinado, como um kami maligno do mar, destemido, em seu elemento, fazendo parte da tempestade, e pensara com severidade: é melhor ter esse homem e todos os bárbaros como ele em terra, onde podemos lidar com eles. No mar estamos em suas mãos.

Podia ver que o pirata estava impaciente. Como são insultantes, disse a si mesmo. Ainda assim eu devia agradecer-lhe. Todos estão dizendo que foi o único responsável por trazer o navio para a enseada, que Rodrigu-anjin perdeu a coragem e deixou que fôssemos carregados para longe da costa, mas você manteve o curso. Sim. Se tivéssemos rumado para o largo certamente teríamos soçobrado e então eu teria falhado a meu amo. Oh! Buda, proteja-me disso! Sentia doer todas as juntas. Estava exausto devido ao esforço que lhe fora exigido para permanecer estóico diante de seus homens, de Yabu, da tripulação, e mesmo do bárbaro. Oh! Buda. Estou tão cansado. Gostaria de poder deitar num banho, ficar lá um bom tempo... e ter um dia de sossego, sem sofrimento. Só um dia. Pare com esses seus estúpidos pensamentos de mulher! Você sofre há quase sessenta anos. O que é o sofrimento para um homem? Um privilégio! Dissimular a dor é a medida de um homem. Agradeça a Buda por ainda estar vivo para proteger seu amo, quando você deveria estar morto uma centena de vezes. Agradeço a Buda. Mas odeio o mar. Odeio o frio. E odeio a dor.

- Fique onde está, Anjin-san - disse, apontando com a bainha da espada para ser mais claro, desanimadamente divertido com o fogo de um azul gelado nos olhos do homem. Quando teve certeza de que o homem compreendera, deu uma olhada no imediato. - Onde estamos? De quem é este feudo?

- Não sei, senhor. Acho que estamos em algum ponto da província de Ise. Poderíamos mandar alguém à aldeia mais próxima.

- Você pode nos pilotar até Osaka?

- Desde que fiquemos muito perto da praia, senhor, e que vamos lentamente, com grande cautela. Não conheço estas águas e nunca poderia garantir a sua segurança. Não tenho conhecimento suficiente e não há ninguém a bordo, senhor, que tenha. Exceto esse piloto. Se dependesse de mim, eu o aconselharia a ir por terra. Poderíamos conseguir-lhe cavalos ou palanquins.

Hiromatsu sacudiu a cabeça irascivelmente. Ir por terra estava fora de questão. Tomaria tempo demais o caminho era montanhoso e havia poucas estradas - e teriam que atravessar muitos territórios controlados por aliados de Ishido, o inimigo.

Além desse perigo, havia também os numerosos grupos de bandidos, que infestavam os desfiladeiros. Isso significava que ele teria que levar todos os seus homens. Poderia abrir caminho a força entre os bandidos, certamente, mas nunca conseguiria forçar uma passagem se Ishido ou seus aliados resolvessem impedi-lo. Tudo isso o atrasaria ainda mais, e suas ordens eram entregar a carga, o bárbaro e Yabu, rapidamente e em segurança.

- Se acompanharmos a costa, quanto tempo levaremos?

- Não sei, senhor. Quatro ou cinco dias, talvez mais. Eu

me sentiria muito inseguro, não sou capitão, sinto muito.

O que significa, pensou Hiromatsu, que preciso da cooperação deste bárbaro. Para impedi-lo de ir até a praia, terei que mandar amarrá-lo. E quem sabe se, amarrado, ele vai cooperar?

- Quanto tempo teremos que ficar aqui?

- O piloto disse a noite toda.

- A tempestade terá acabado então?

- É o que deve acontecer, senhor, mas nunca se sabe.

Hiromatsu estudou a costa montanhosa, depois o piloto, vacilando.

- Posso oferecer uma sugestão, Hiromatsu-san? - disse Yabu.

- Sim, sim, naturalmente - disse o outro com impaciência.

- Como parece que precisamos da cooperação do piloto para nos levar a Osaka, por que não deixá-lo ir até a praia, mas com homens para protegê-lo, e ordenar que voltem antes do pôr-do-sol? Quanto a ir por terra, concordo que seria perigoso demais para o senhor. Eu nunca me perdoaria se alguma coisa lhe acontecesse. Uma vez que a tempestade se dissipe, o senhor estará mais seguro no navio e chegará a Osaka muito mais depressa, neh? Com certeza, pelo crepúsculo de amanhã.

Relutante, Hiromatsu assentiu.

- Muito bem. - Chamou um samurai com um gesto. -Takatashi-san! Pegue seis homens e vá com o piloto. Traga o corpo do português de volta se conseguirem encontrá-lo. Mas se um cílio que seja deste bárbaro for lesado você e os seus homens cometerão seppuku imediatamente.

- Sim, senhor.

- E mande dois homens à aldeia mais próxima para descobrir onde é, exatamente, que estamos e no feudo de quem.

- Sim, senhor.

- Com a sua permissão, Hiromatsu-san, vou comandar o destacamento até a praia - disse Yabu. - Se chegássemos a Osaka sem o pirata, eu ficaria tão envergonhado que me sentiria obrigado a me matar. Gostaria de ter a honra de executar as suas ordens.

Hiromatsu assentiu, intimamente surpreso de que Yabu resolvesse enfrentar por si um perigo como aquele. E desceu para o convés inferior.

Quando Blackthorne entendeu que Yabu ia até a praia com ele, sua pulsação se acelerou. Eu tinha esquecido Pieterzoon, a minha tripulação, o buraco - e os gritos, Omi ou qualquer parte do que aconteceu. Cuidado com a sua vida, bastardo.


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