CAPÍTULO 16
COMPORTAMENTO RELAPSO
Se eu ganhava 1 milhão de dólares por semana e o americano padrão, mil dólares por semana, então 20 mil dólares que eu gastasse com algo equivalia a 20 dólares sendo gastos pelo americano padrão, certo?
Havia-se passado uma hora, e eu estava na suíte presidencial do Hotel Dorchester quando esse pensamento fabuloso surgiu borbulhando em minha mente. Na verdade, a ideia fazia muito sentido, tanto que peguei o telefone, liguei para Janet, acordei-a de um sono profundo e falei calmamente: “Quero que você envie George até o muquifo do Alan e peça para ele pegar 20 Ludes para mim, então o mande voando para cá no próximo Concorde, está bem?”. Só depois é que me dei conta de que em Bayside eram quatro da manhã, no horário de Janet.
Mas meu acesso de culpa durou pouco; afinal de contas, não era a primeira vez que fazia algo assim com ela, e tinha uma ligeira suspeita de que não seria a última. De qualquer forma, se eu lhe pagava cinco vezes o salário-base de assistentes pessoais, no fundo não havia adquirido o direito de acordá-la no meio da noite? Ou, pelo menos, não ganhara o direito de acordá-la em razão do amor e da gentileza que sempre dediquei a ela, como o pai que ela nunca teve? (Outra racionalização maravilhosa!)
Obviamente, sem perder um segundo, Janet estava agora bem desperta e pronta para agradar. Ela respondeu com carinho: “Sem problema; tenho certeza de que o próximo Concorde sai amanhã de manhã bem cedo. Vou fazer com que George esteja nele. Mas não tenho de mandá-lo até a casa de Alan. Tenho um estoque de emergência para você aqui no meu apartamento”. Fez uma breve pausa, então completou: “De onde você está me ligando, do quarto do hotel?”.
Antes de responder que sim, fiquei me perguntando o que se podia pensar de um homem que ligava para sua assistente e solicitava o uso de transporte supersônico para saciar seu vício furioso de drogas e seu desejo óbvio de se autodestruir, sem dar a mínima para isso. Era algo que me incomodava, então preferi não insistir nesse pensamento por muito tempo. Disse para Janet: “É, estou no quarto. De onde mais estaria ligando para você, pentelha, de um daqueles telefones públicos vermelhos em Picadilly Circus?”.
“Vai se foder!”, gritou. “Estava apenas querendo saber.” Então mudou seu tom para um esperançoso e perguntou: “Gostou mais desse quarto do que daquele na Suíça?”.
“Sim... é muito melhor, querida. Não é exatamente do meu gosto, mas tudo é novo e bonito. Você mandou bem.”
Fiz uma pausa e aguardei sua resposta, mas não houve nenhuma. Caramba! Ela queria uma descrição pormenorizada do quarto... sua emoção vicária do dia. Que saco ela era! Sorri para o telefone e falei: “De qualquer forma, como estava dizendo, o quarto é bem legal. De acordo com o gerente, é decorado à moda tradicional britânica... o que quer que essa merda signifique! Mas o quarto é bem legal, principalmente a cama. É enorme, com montes de tecidos azuis por todo lado. Os britânicos devem gostar de azul, acho. E também devem gostar muito de travesseiros, porque o quarto tem milhares deles.
“E o resto do lugar é cheio de todo tipo de porcaria britânica. Há uma mesa de jantar enorme com um daqueles candelabros prateados. Parece Liberace. O quarto de Danny é no lado oposto da minha suíte, mas ele está vagabundeando pelas ruas de Londres nesse momento... como aquela música ‘Werewolves of London’.1
“E é isso. Não tenho mais nenhuma informação, além de minha localização precisa, a qual tenho certeza de que você gostaria de saber. Então, vou lhe dizer antes que pergunte: estou em pé na varanda do quarto, olhando para o Hyde Park enquanto converso com você. Mas não consigo ver muita coisa. Tem muito fog. Está feliz agora?”
“Ahã”, foi tudo que ela disse.
“Quanto custa o quarto? Não olhei quando entrei.”
“Nove mil libras por noite, que dá mais ou menos 13 mil dólares. Mas parece que vale a pena, certo?”
Fiquei pensando sobre a pergunta. Era um mistério para mim por que eu sempre me sentia compelido a reservar a suíte presidencial, não importando quão absurdo fosse o preço. Tinha certeza de que tinha algo a ver com Richard Gere no filme Uma linda mulher, um dos meus favoritos. Mas era mais complexo do que isso. Era aquela sensação que eu sempre tinha ao me dirigir ao balcão de entrada de um hotel chique e disparar aquelas palavras mágicas: “Meu nome é Jordan Belfort, e estou aqui para ficar na suíte presidencial”. Bem... sabia que isso se devia a eu ser um babaquinha inseguro, mas que se dane!
Com sarcasmo, falei: “Obrigado por me lembrar da taxa de câmbio, srta. Banqueira Internacional. Quase havia me esquecido. De qualquer forma, o quarto é definitivamente uma pechincha a 13 mil pratas por noite. Mas acho que devia vir com um escravo por esse preço, não?”.
“Vou tentar achar um para você”, disse Janet. “Mas, mesmo assim, consegui para você um checkout mais tarde, assim temos de pagar apenas por uma noite. Vê como sempre cuido do seu dinheiro? A propósito, como está a tia de Nadine?”
No mesmo instante entrei no modo paranoia: avaliei a possibilidade de nossa conversa telefônica estar grampeada. Teria o FBI a audácia de escutar o telefone de Janet? Não, era inconcebível! Havia um custo alto para se grampear o telefone de alguém que não discutisse nada significativo pela linha, a não ser, é lógico, que os federais tivessem a intenção de me prender por ser um depravado sexual ou um viciado em drogas do inferno. Mas e os britânicos? Seria possível a MI6 estar me seguindo por um crime que eu ainda não havia cometido? Não, também inconcebível! Eles estavam bem ocupados com o IRA, não? Por que dariam a mínima para o Lobo de Wall Street e seus planos diabólicos de corromper uma professora aposentada? Eles não fariam isso. Concluindo que nossa conversa estava segura, respondi: “Está muito bem. Acabei de deixá-la em seu flat. É assim que chamam apartamentos aqui, Janet”.
“Não me diga, Sherlock”, disse a insolente.
“Ah, desculpe-me. Não sabia que você era uma pessoa tão viajada, caralho. De qualquer forma, preciso ficar em Londres mais um dia. Tenho alguns negócios aqui. Então reserve mais uma noite no hotel e faça com que o avião esteja me aguardando no Heathrow na manhã de sexta. E diga ao piloto que será uma ida e volta no mesmo dia. Patricia retornará na mesma tarde, está bem?”
Com seu típico sarcasmo, Janet disse: “Farei o que você mandar, chefe”, por que sempre tanto desprezo por essa palavra, chefe?, “mas não entendo por que você precisa mentir para mim sobre o motivo de ficar mais um dia em Londres”.
Como ela ficara sabendo? Era tão óbvio que eu queria tomar Ludes sozinho... longe dos olhos curiosos dos banqueiros suíços? Não, era apenas porque Janet me conhecia muito bem. Ela era como a Duquesa quanto a isso. Mas, como mentia menos para Janet do que para minha esposa, ela era muito melhor em prever quando eu estava disposto a fazer algo ruim.
Ainda assim, senti-me obrigado a mentir. “Nem vou me dignar a responder. Mas, já que trouxe o assunto à tona, posso aproveitar você. Acontece que há uma danceteria em Londres realmente louca chamada Annabelle’s. Supostamente, é impossível entrar lá. Consiga-me a melhor mesa para amanhã à noite e diga-lhes que quero três garrafas de Cristal me aguardando no gelo. Se tiver algum problema...”
“Por favor, não me insulte”, interrompeu Janet. “Sua mesa estará aguardando-o, Sir Belfort. Apenas não esqueça que sei de onde você veio, e Bayside não é exatamente famosa por sua realeza. Quer que eu faça algo mais ou está tudo ajeitado para amanhã à noite?”
“Ahhhhh, você é uma diabinha, Janet! Sabe... eu estava realmente tentando virar uma nova página na minha vida com as mulheres, mas, já que você colocou a ideia na minha cabeça... por que não me manda duas Blue Chips, uma para mim e outra para Danny? Ou, agora que estou pensando nisso, é melhor mandar três... apenas para o caso de uma ser presa! Nunca se sabe o que irá acontecer nesses países estrangeiros.
“De qualquer forma, vou desligar! Vou descer para fazer um pouco de musculação, e depois irei até a Bond Street fazer algumas comprinhas. Isso deverá deixar meu pai feliz quando receber a conta no próximo mês! Agora, rápido, antes que eu desligue, fale para mim que chefe incrível eu sou e diga-me quanto você me ama e sente saudades de mim!”
Sem emoção: “Você é o melhor chefe de todo este mundo e te amo... e sinto muitas saudades de você... e não consigo viver sem você”.
“Bem, é o que pensei”, respondi condescendente. Então bati o telefone na cara dela sem me despedir.
1 Música de Warren Zevon, “Lobisomens de Londres”. (N. T.)