CAPÍTULO 27


SÓ OS BONS MORREM JOVENS




Junho de 1994


Parecia bem apropriado o escritório da Sapatos Steve Madden ter o formato de uma caixa de sapatos. Na verdade, havia duas caixas de sapatos: uma estava no fundo, com nove por 18 metros, ocupada por uma fábrica minúscula, consistindo num punhado de máquinas antiquadas de fabricação de sapatos, operadas por mais ou menos dez empregados falantes de espanhol, que compartilhavam um único visto americano e não pagavam nem 1 dólar de imposto; e havia a caixa de sapatos na frente, do mesmo tamanho, ocupada pela administração da empresa, sendo a maioria garotas pós-adolescentes ou com 20 e poucos anos, todas com cabelo multicolorido e piercings visíveis no corpo em tanta quantidade que significavam algo como: “Sim, meu clitóris também tem um piercing, e também meus mamilos!”.

Enquanto essas lunáticas zanzavam pelo escritório, equilibrando-se em cima de sapatos de plataforma de 15 centímetros – todos com a etiqueta Steve Madden –, música hip-hop ecoava, incenso de maconha queimava, um monte de telefones tocava, inúmeros novos modelos de sapatos eram desenhados e um amontoado de líderes religiosos vestidos de maneira tradicional realizava rituais de limpeza... e de alguma forma isso tudo parecia funcionar. A única coisa que faltava era uma curandeira autêntica realizando vodus, apesar de eu ter certeza de que isso viria em breve.

De qualquer forma, em frente à mencionada caixa de sapatos da frente, havia uma caixa de sapatos ainda menor – esta talvez de três por seis metros –, que era onde Steve, também conhecido como o Sapateiro, tinha seu escritório. E nas últimas quatro semanas, desde a metade de maio, era onde ficava meu escritório também. O Sapateiro e eu nos sentávamos em lados opostos de uma mesa de fórmica preta, a qual, como tudo mais neste lugar, estava coberta de sapatos.

Nesse momento específico, eu me perguntava por que toda jovem nos Estados Unidos ficava maluca por esses sapatos, que, para mim, eram horríveis. Qualquer que fosse o motivo, não havia como negar que éramos uma empresa ligada ao produto. Havia sapatos por todo lado, principalmente no escritório de Steve, onde estavam espalhados no chão, pendurados no teto e empilhados sobre mesas dobráveis simples e prateleiras de fórmica brancas, que os faziam parecer ainda mais feios.

E havia mais sapatos no peitoril da janela atrás de Steve, em pilhas tão altas que mal permitiam ver uma janela triste que dava para o estacionamento triste, o qual, reconhecidamente, combinava bem com essa parte triste do Queens, ou seja, o centro triste de Woodside. Estava mais ou menos 3,5 quilômetros a leste de Manhattan, onde um homem com meus gostos “um tanto” refinados se adaptava muito melhor.

Apesar disso, dinheiro era dinheiro, e, por algum motivo inexplicável, essa minúscula empresa estava a caminho de ganhar quantias absurdas. Assim, era ali que Janet e eu penduraríamos nossos chapéus por certo tempo. Ela ficava logo ali no corredor, numa sala separada. E, sim, Janet também estava rodeada de sapatos.

Era uma manhã de segunda, e o Sapateiro e eu estávamos em nosso escritório infestado por sapatos, bebendo café. Acompanhando-nos estava Gary Deluca, que, assim como hoje, era o novo diretor de operações da empresa, não tendo substituído ninguém em particular, pois até aquele momento a empresa vinha sendo administrada em piloto automático. Também na sala estava John Basile, o diretor de produção da empresa havia um bom tempo, que tinha função dupla, também como gerente de vendas.

Era um tanto irônico, pensei, mas, vestidos daquela forma, nunca ninguém adivinharia que estávamos construindo a maior empresa de sapatos femininos do mundo. Éramos uma gentalha: eu, vestido como um jogador de golfe; Steve, como um mendigo; Gary, como um empresário conservador; e John Basile, um pelancudo com 30 e poucos anos, nariz bulboso, crânio careca e feições gordas e rechonchudas, vestido como um entregador de pizza, trajando jeans claros e uma camiseta larga. Eu gostava muito de John. Ele era um talento nato e, apesar de católico, abençoado com uma ética no trabalho verdadeiramente protestante – o que quer que isso significasse – e tinha uma verdadeira visão macro.

Mas, ah, ele era também um cuspidor de primeira linha, o que significava que, sempre que se empolgava – ou simplesmente estivesse tentando expor suas ideias –, era melhor estar usando um casaco de chuva ou pelo menos estar a 30 graus da direção da sua boca. E, com frequência, sua saliva era acompanhada por gestos exagerados, a maioria relacionada ao Sapateiro ser um puta cara medroso que não queria receber pedidos grandes das lojas.

Nesse exato momento, ele estava em meio a uma argumentação desse tipo: “Quer dizer, caralho, como você vai fazer esta empresa crescer, Steve, se não me deixa tirar pedidos para as porras dos sapatos? Jordan, você sabe do que estou falando! Bosta, como posso fazer” – Merda! Os bs do Cuspidor eram as consoantes mais fatais, e ele acabara de me atingir na testa! – “contratos com as lojas de departamentos quando não tenho produtos para entregar?”. O Cuspidor fez uma pausa e olhou para mim, confuso, perguntando-se por que eu havia colocado as mãos na cabeça e parecia estar cheirando as palmas delas.

Ergui-me da cadeira, andei para trás de Steve, procurando me proteger das gotas de saliva, e falei: “A verdade é que entendo ambas as posições. Não é diferente do negócio de corretagem. Steve quer realizar as coisas de maneira conservadora e não ter muitos sapatos no estoque, e você quer ir pras cabeças e ter produtos para vender. E a resposta é... ambos estão certos e ambos estão errados, tudo depende de os sapatos venderem ou não. Se vendem, você é um gênio, e vamos ganhar uma tonelada de dinheiro, mas, se estiver errado, e eles não venderem, estamos fodidos e ficaremos sentados sobre uma pilha inútil de merda que não conseguiremos vender para ninguém”.

“Isso não é verdade”, argumentou o Cuspidor. “Sempre podemos jogar os sapatos para a Marshall’s ou a TJ Maxx ou outra cadeia de liquidação qualquer.”

Steve girou sua cadeira e disse para mim: “John não está descrevendo todo o cenário. Sim, podemos vender todos os sapatos que quisermos para gente como a Marshall’s e a TJ Maxx; mas, se fizermos isso, destruímos nossos acordos com lojas de departamentos e lojas especializadas”. Agora Steve olhou para o Cuspidor diretamente nos olhos e falou: “Precisamos proteger a marca, John. Você não entende isso”.

Disse o Cuspidor: “Lógico que entendo. Mas também temos de fazer a marca crescer, e não podemos fazer isso se nossos clientes vão a lojas de departamentos e não conseguem encontrar nossos sapatos”. Agora o Cuspidor franziu o cenho com desprezo e encarou o Sapateiro. “E, se deixarmos isso por sua conta”, cuspiu o Cuspidor, “esta será uma operação de fundo de quintal para sempre. Apenas cagões.” Ele virou-se diretamente para mim, e eu me protegi. “Vou te contar, Jordan”, sua bola de cuspe não me atingiu por questão de dez graus, “graças a Deus você está aqui, porque esse cara é um medroso do caralho, e estou de saco cheio dessa bichice. Temos os sapatos mais legais do país, e não posso tirar pedidos porque este cara não me deixa produzir a mercadoria. Vou te dizer, é uma puta tragédia grega.”

Steve falou: “John, sabe quantas empresas faliram por operar da forma que você quer? Precisamos ser bem cautelosos até que tenhamos mais lojas próprias; então aí poderemos levar nossas promoções porta a porta, sem corromper a marca. Não há como você me convencer do contrário”.

O Cuspidor sentou-se, relutante. Tive de admitir que fiquei bastante impressionado com o desempenho de Steve, não apenas hoje, mas nas últimas quatro semanas. Sim, Steve também era um Lobo em Pele de Cordeiro. Apesar de sua aparência, ele era um líder nato – abençoado com todos os dons naturais, em especial com a habilidade de inspirar lealdade entre seus empregados. Na verdade, assim como na Stratton, todos na Steve Madden orgulhavam-se de ser parte de um culto. O maior problema do Sapateiro, contudo, era sua recusa de delegar responsabilidades. Havia uma parte de Steve que ainda era um sapateirozinho à moda antiga, o que, na verdade, era sua grande virtude e seu maior defeito. A empresa estava faturando apenas 5 milhões de dólares nesse momento, portanto ele podia ficar feliz. Mas isso estava prestes a mudar. Apenas um ano antes, a empresa faturava um milhão. Estávamos planejando faturar 20 milhões de dólares no ano seguinte.

Era a isso que eu estava dando atenção nas últimas quatro semanas. Contratar Gary Deluca fora apenas o primeiro passo. Meu objetivo era que a empresa se mantivesse sem nenhum de nós. Assim, Steve e eu precisávamos criar um setor de design e uma equipe operacional de primeira linha. Mas ser apressado era o caminho para o desastre. Além do mais, primeiro precisávamos ganhar controle sobre as operações, que eram um desastre completo.

Virei-me para Gary e falei: “Sei que é seu primeiro dia, mas estou interessado em ouvir o que você acha. Dê-me sua opinião, e seja honesto, se concorda com Steve ou não”.

Ao ouvirem isso, tanto o Cuspidor como o Sapateiro viraram-se para o novo diretor de operações da empresa, que disse: “Bem, entendo ambos os argumentos” – ahhh, muito bem, bastante diplomático –, “mas minha opinião sobre isso é muito mais um ponto de vista operacional do que qualquer outra coisa. Na verdade, muito disso, devo dizer, é uma questão de margem bruta, é claro que depois das liquidações, e como isso se relaciona ao número de vezes por ano que planejamos girar nosso estoque”. Gary acenou com a cabeça, impressionado com sua própria sagacidade. “Há questões complexas aqui relativas a modalidades de remessa, considerando-se como e onde planejamos entregar nossos produtos... quantos intermediários, por assim dizer. Logicamente, vou precisar fazer uma análise mais detalhada do custo real dos produtos vendidos, incluindo impostos e fretes, que não devem ser ignorados. Pretendo fazer isso desde já e então produzir uma planilha detalhada, a qual poderemos discutir na próxima reunião de diretoria, que deve ser em...”

Ah, meu Jesus Cristinho! Ele estava papagaiando para cima da gente! Eu não tinha paciência para pessoas operacionais e toda essa bosta inútil pela qual pareciam ter tanto apreço. Detalhes! Detalhes! Olhei para Steve. Ele era ainda menos tolerante do que eu nesses assuntos e estava visivelmente afundado na cadeira. Seu queixo estava um pouco acima dos ombros e a boca, escancarada.

“... o que, mais do que qualquer coisa”, continuou o Papagaio, “tem a ver com a eficiência de nossa operação de pegar, empacotar e remeter. A chave aqui é...”

Foi então que o Cuspidor ergueu-se de sua cadeira e cortou o Papagaio. “Que caralho você está falando?”, cuspiu o Cuspidor. “Apenas quero vender as porras dos sapatos! Não dou a mínima para sobre como você os leva para as lojas! E não preciso de uma merda de uma planilha para me dizer que, se faço sapatos por 12 pratas e vendo por 30, estou ganhando dinheiro, porra! Caralho!” Agora o Cuspidor dirigia-se para mim com dois passos gigantes. Pelo canto dos olhos podia ver Steve dando um sorriso forçado.

O Cuspidor falou: “Jordan, você precisa tomar uma decisão aqui. Você é o único a quem Steve escuta”. Fez uma pausa e enxugou a baba do queixo redondo. “Quero fazer esta empresa crescer para vocês, mas estou de mãos atadas...”

“Está bem!”, falei, cortando o Cuspidor. Virei-me para o Papagaio e disse: “Vá pedir para Janet colocar Elliot Lavigne no telefone. Ele está nos Hamptons”. Virei-me para Steve e comentei: “Quero ouvir a opinião de Elliot sobre isso antes de tomarmos uma decisão. Sei que há uma solução para a questão e, se alguém a tem, é Elliot”. E, além do mais, pensei, enquanto aguardamos Janet colocá-lo na linha, terei uma chance de contar minha história heroica novamente.

Ah, mas não tive a chance. O Papagaio estava de volta em menos de 20 segundos, e logo em seguida o telefone tocou. “Ei, amigo, como tá?”, falou Elliot Lavigne pelo viva-voz.

“Estou bem”, respondeu o herói dele. “Mas, mais importante, como você está, e como estão suas costelas?”

“Estou me recuperando”, respondeu Elliot, que estava sóbrio havia quase seis semanas, um recorde mundial para ele. “Espero voltar ao trabalho em algumas semanas. Mas diga lá.”

Rapidamente entrei em detalhes, tomando cuidado para não lhe contar de quem eram as opiniões... para não influenciar sua decisão. Por ironia, não fazia a menor diferença. Quando terminei, ele já o sabia. “A verdade é”, disse o sóbrio Elliot, “que toda essa coisa de não poder vender sua marca em lojas de liquidações é um exagero que não condiz com a realidade. Toda grande marca limpa seu estoque morto através de cadeias de desconto. É uma necessidade. Entre em qualquer TJ Maxx ou Marshall’s e você verá as grandes marcas... Ralph Lauren, Calvin Klein, Donna Karan e Perry Ellis também. Não há como existir sem os descontos, a não ser que se tenha as suas próprias lojas de fábrica, o que ainda é um pouco cedo para vocês. Mas se deve tomar cuidado quando se negocia com eles. Vende-se aos poucos para eles, porque, se as lojas de departamento descobrirem que seus produtos estão sempre lá, vocês terão problemas.”

“De qualquer forma”, continuou Elliot, “John está quase totalmente certo; não se pode crescer a não ser que haja produtos para vender. Veja, as lojas de departamentos nunca irão levá-los a sério se não tiverem a certeza de que vocês podem entregar-lhes os bens. E, mesmo que sejam famosos, e sei que são, os compradores não irão comprar, a não ser que estejam convencidos de que vocês podem entregar os sapatos, e sei que a reputação de vocês é de que não podem. Vocês têm de agir rapidamente. Sei que essa é uma das razões para ter contratado Gary, o que foi definitivamente um passo na direção certa.”

Olhei para Gary para ver se ele estava contente, mas não estava. Seu rosto ainda estava paralisado, impassível. Essa gente das operações era um bando estranho; eram jogadores de beisebol conservadores, rebatendo bolinhas o jogo todo, mas nunca batendo com força para fazer home runs. A possibilidade de eu ser um deles me dava vontade de cometer suicídio.

Elliot continuou: “Como eu estava dizendo, supondo que coloquem suas operações em ordem, John ainda está apenas metade certo. Steve tem de considerar um cenário maior aqui, que é proteger a marca. Não se enganem, gente... no final das contas, a marca é tudo. Se estragar isso, acabou. Posso dar-lhes um monte de exemplos de marcas que foram quentes num período e então destruíram seu nome ao vender para lojas de desconto. Agora suas etiquetas são encontradas no mercado das pulgas”. Elliot fez uma pausa, deixando suas palavras serem absorvidas.

Olhei para Steve e ele estava desmoronado na cadeira: a simples ideia de o nome Steve Madden – seu próprio nome! – ser sinônimo das palavras pulgas e mercado literalmente o deixou sem ar. Olhei para o Cuspidor; ele estava inclinado para a frente na sua cadeira, como se estivesse se preparando para pular através do telefone para estrangular Elliot. Então olhei para Gary, que ainda estava impassível.

Elliot prosseguiu: “A meta principal deve ser licenciar o nome Steve Madden. Então podem relaxar e receber os royalties. A primeira coisa deve ser cintos e bolsas, depois artigos esportivos e óculos de sol, e então tudo o mais... e a última parada são perfumes, quando então terão chegado lá. E nunca chegarão lá se tudo for feito como John quer. Sem ofensa, John, mas é assim que funciona. Vocês estão pensando nas condições atuais, enquanto estão quentes. Eventualmente esfriarão, e quando menos esperarem algo não venderá bem, e irão se afundar até os joelhos em um sapato idiota que só as malucas hippies usarão. Então serão forçados a ir para o lado negro da força e colocar os sapatos onde eles não deveriam estar”.

Nesse momento, Steve interrompeu. “É exatamente o que estou dizendo, Elliot. Se eu deixar John fazer o que quer, acabaremos com um estoque cheio de sapatos e sem dinheiro no banco. Não serei o próximo Sam & Libby.”

Elliot riu. “É simples. Sem saber tudo sobre a empresa, posso apostar que o volume das vendas vem de um punhado de sapatos, três ou quatro provavelmente, e não são aqueles ridículos com os saltos de 20 centímetros, pontas de metal e zíperes. Com esses sapatos vocês criam o mito de que se é jovem e atual e toda essa merda. Mas a realidade é que dificilmente vendem algum desses sapatos cocota, exceto talvez para algumas xaropes lá de Greenwich Village e dentro do escritório de vocês. Onde vocês realmente ganharão dinheiro é nos sapatos básicos, os do dia a dia, como o Mary Lou e o Marilyn, certo?”

Olhei para Steve e o Cuspidor, e ambos estavam com a cabeça jogada para o lado, os lábios comprimidos e os olhos escancarados. Após alguns segundos de silêncio, Elliot falou: “Vou entender a falta de resposta como um sim”. Steve respondeu: “Você está certo, Elliot. Não vendemos muitos dos sapatos malucos, mas é por eles que somos conhecidos”.

“É exatamente assim que deve ser”, disse Elliot, que seis semanas atrás não conseguia juntar duas palavras sem babar. “Não é nada diferente daquela alta-costura que se vê nas passarelas de Milão. Ninguém realmente compra aquele lixo, mas é o que cria a imagem. Assim, a solução é realmente só ir pras cabeças com artigos conservadores, e somente com as cores mais agradáveis. Estou falando sobre sapatos que vocês sabem que irão vender, aqueles que se vendem em qualquer estação. Mas sob nenhuma circunstância arrisquem uma boa grana num sapato perigoso, mesmo que estejam pessoalmente apaixonados por ele, e mesmo que apresente bons resultados em pesquisas de mercado. Sejam sempre cautelosos com qualquer coisa que não seja um sucesso garantido. Se algum sapato realmente vender muito e vocês ficarem sem estoque, isso o deixará muito mais quente. Se produzirem no México, conseguirão ser mais rápidos na reposição que a concorrência.

“E nas raras ocasiões em que forem de cabeça e errarem, então despejem os sapatos nas liquidações e assumam a perda. A primeira perda é a melhor perda nesse negócio. A última coisa que se quer é um estoque cheio de produtos parados. Vocês precisam também começar a fazer parcerias com lojas de departamentos. Deixe-as saber que vocês garantem seus sapatos, que se eles não venderem terão o preço de saldo. Eles podem colocar seus sapatos à venda e ainda assim manter as margens de lucro. Façam isso e verão as lojas de departamentos liquidando o lixo para vocês.

“Outra coisa que preciso dizer: vocês devem abrir as lojas Steven Madden o mais rápido possível. Vocês são produtores, portanto podem ter todo o lucro atacadista e o lucro de venda. E também é a melhor forma de movimentar o estoque parado: colocar coisas à venda em suas próprias lojas. Assim vocês não arriscam destruir a marca. E aí está a resposta”, disse Elliot Lavigne. “Vocês estão a caminho das estrelas. Sigam esse programa e não há como perder.”

Corri o olhar pela sala, e todos concordaram.

E por que não iriam? Quem podia argumentar contra tal lógica? Era triste, pensei, que um cara tão astuto quanto Elliot jogasse sua vida fora por causa das drogas. Sério. Não havia nada mais triste do que talento desperdiçado, havia? Ah, Elliot estava sóbrio agora, mas eu não tinha dúvidas de que, assim que suas costelas estivessem curadas e ele estivesse de volta à ativa, seu vício retornaria com tudo. Esse era o problema de alguém como Elliot, que se recusava a aceitar o fato de que as drogas o estragavam.

De qualquer forma, eu tinha coisas para fazer em número suficiente para manter cinco pessoas ocupadas. Ainda estava tramando a destruição de Victor Wang; ainda tinha de negociar com Danny, que estava ficando louco na Stratton; tinha assuntos com Gary Kaminsky, que, como fiquei sabendo, passava boa parte do dia ao telefone com Saurel, na Suíça; e ainda tinha o agente especial Coleman pairando por perto com suas intimações. Então pensar sobre a sobriedade de Elliot era perda de tempo.

Tinha assuntos urgentes para discutir com Steve durante o almoço, e depois precisava pegar um helicóptero até os Hamptons para ver a Duquesa e Chandler. Sob tais circunstâncias, eu diria que a dosagem apropriada de metaqualona deveria ser pequena, talvez 250 miligramas, ou um Lude, tomado agora, 30 minutos antes do almoço, que me daria a viagem correta para curtir minha comida e me permitir escapar das garras do Sapateiro, sóbrio havia quase cinco anos. Um estraga-prazeres.

Então eu cheiraria algumas carreiras de coca um pouco antes de assumir os controles do helicóptero. Afinal de contas, sempre pilotei melhor quando o efeito dos Ludes estava diminuindo, mas ainda tentando sair da minha própria pele num estado de paranoia induzido pela coca.


ALMOÇO SOB O efeito de um único Lude! Um barato inofensivo durante a refeição nas entranhas de Corona, Queens. Como a maioria dos bairros originalmente italianos, era ainda uma fortaleza mafiosa, e em cada fortaleza havia sempre um restaurante italiano cujo proprietário era um “homem do maior respeito” na região. E, sem medo de errar, tinha a melhor comida italiana em quilômetros. No Harlem, era o Rao. Em Corona, era o restaurante Park Side.

Ao contrário do Rao, o Park Side era um local grande, para o povo. A decoração era bonita, com alguns tons de nogueira lisa, espelhos esfumaçados, flores e samambaias perfeitamente cortadas. O bar era a cara da Máfia (literalmente!) e a comida era de matar (literalmente!).

O dono do Park Side era Tony Federici, um verdadeiro homem de respeito. Não surpreendentemente, ele era bem famoso, mas para mim era apenas o melhor anfitrião de todos os cinco bairros de Nova York. Quase sempre podia-se encontrar Tony zanzando pelo restaurante num avental de cozinha, segurando um jarro de Chianti feito em casa numa mão e uma bandeja de pimenta assada na outra.

O Sapateiro e eu estávamos sentados numa mesa no fabuloso jardim. Nesse momento conversávamos sobre a ideia de ele substituir Elliot como meu laranja principal.

“Em princípio, não vejo nenhum problema quanto a isso”, eu falava para o voraz Sapateiro, que ficara obcecado com a atividade de laranja, “mas tenho duas preocupações. A primeira é como você irá me devolver a porra do dinheiro sem deixar rastros. É dinheiro pra caralho, Sapateiro. E minha segunda preocupação é que você já é laranja da Monroe Parker, e não quero pisar nos calos deles.” Balancei a cabeça para causar efeito. “Um laranja é uma coisa muito pessoal, portanto preciso jogar limpo com Alan e Brian.”

O Sapateiro concordou. “Entendo o que está dizendo, e, quanto à devolução de dinheiro, não será problema. Posso fazer isso através das ações da Steve Madden. Sempre que vender as ações que estiver mantendo para você, vou pagar a mais por elas. No papel, eu te devo mais de 4 milhões de dólares, por isso tenho um motivo legítimo para lhe enviar cheques. E, no final das contas, os números serão tão grandes que ninguém será capaz de rastreá-los, certo?”

Não é má idéia, pensei, principalmente se redigíssemos uma espécie de contrato de consultoria em que Steve me pagaria todo ano por ajudá-lo a administrar a Sapatos Steve Madden. Mas o fato de Steve estar “laranjando” 1,5 milhão de ações da Steve Madden para mim criava um problema mais preocupante, qual seja, Steve não possuía quase nenhuma ação de sua própria empresa. Era algo que precisava ser retificado agora, antes que criasse problemas à frente quando Steve percebesse que eu estava ganhando dezenas de milhões, e ele, apenas milhões. Então sorri e falei: “Vamos pensar em alguma coisa para esse esquema. Acho que usar as ações da Madden é uma ideia muito boa, pelo menos de início, mas chegamos a um tema mais importante, que é você não ter titularidade na empresa. Precisamos te dar mais ações antes que as coisas comecem realmente a crescer. Você tem apenas 300 mil ações, certo?”.

Steve aquiesceu. “E algumas milhares de opções sobre ações; por volta disso.”

“Está certo, bem, como seu parceiro de esquemas em geral, recomendo fortemente que adquira para si um milhão de opções sobre ações com 50% de desconto no mercado corrente. É o correto a se fazer, sobretudo porque você e eu iremos dividi-las por igual, que é o mais correto de tudo. Vamos mantê-las em seu nome, para que a NASDAQ não estranhe, e, quando chegar a hora de vender, você apenas me devolverá junto com tudo o mais.”

O Mestre Sapateiro sorriu e estendeu a mão na minha direção. “Não sei como te agradecer, JB. Nunca disse nada, mas isso tem definitivamente me incomodado um pouco. Sabia que, quando chegasse a hora, ajeitaríamos as coisas.” Então ele se levantou da cadeira, assim como eu, e nos abraçamos à moda da Máfia, o que, num restaurante como aquele, não causava o menor espanto a nenhum cliente.

Quando nos sentamos novamente, Steve falou: “Mas por que não adquirimos um milhão e meio, em vez disso? 750 para cada um”.

“Não”, respondi, sentindo um formigamento agradável na ponta dos dez dedos das mãos. “Não gosto de trabalhar com números ímpares. Dá azar. Vamos apenas arredondar para dois milhões. Além do mais, é mais fácil de controlar... um milhão de opções para cada um.”

“Feito!”, concordou o Sapateiro. “E, já que você é o maior acionista da empresa, talvez devamos pular a encheção de uma reunião de diretoria. É tudo estritamente legítimo, certo?”

“Bem”, respondi, coçando o queixo pensativamente, “como seu parceiro de esquemas, recomendo muito que evite usar a palavra legítimo, exceto sob as circunstâncias mais terríveis. Mas, já que mencionou o assunto, irei contra todos aqui e darei minha aprovação total a esta transação. Além do mais, isso é algo que devemos fazer, para que não seja nossa culpa. Iremos camuflar tudo com uma aparência de jogo limpo.”

“Concordo”, disse o feliz Sapateiro. “Não depende de nós. Há forças estranhas trabalhando aqui bem maiores que um humilde Sapateiro e um não tão humilde Lobo de Wall Street.”

“Gosto da forma como você pensa, Sapateiro. Ligue para os advogados quando voltar para o escritório e diga-lhes para antedatar as atas da última reunião de diretoria. Se colocarem dificuldades, diga-lhes que me telefonem.”

“Sem problemas”, disse o Sapateiro, que acabara de aumentar sua fortuna em 400%. Então abaixou a voz e passou para um tom conspiratório. “Ouça... se você quiser, nem precisa contar a Danny sobre isso.” Ele sorriu de maneira diabólica. “Se ele me perguntar, vou dizer-lhe que são todas minhas.”

Puta merda! Que traidor do caralho era esse cara! Será que ele achava que isso me faria respeitá-lo mais? Mas guardei esse pensamento para mim. “Vou falar uma verdade”, disse eu, “não estou feliz com a forma como Danny está conduzindo as coisas no momento. Ele pensa como o Cuspidor quanto a manter estoque. Quando saí da Stratton, faltavam para a firma alguns milhões de dólares em ações. Agora está praticamente sem nada. É uma baita vergonha.” Balancei a cabeça, sério. “De qualquer forma, a Stratton está ganhando mais dinheiro agora do que nunca, que é o que acontece quando se negocia a longo prazo. Mas Danny ficou vulnerável.” Dei de ombros. “Que seja. Cansei de me preocupar com isso. Sem contar que ainda posso tirá-lo do jogo.”

Steve deu de ombros. “Não quero que me entenda mal” – Ah, é mesmo? Como mais eu poderia entender isso, seu traidor cuzão? –, “mas é apenas que você e eu vamos passar os próximos cinco anos construindo esta empresa. Sabe, Brian e Allan não vão muito com a cara de Danny também. Nem Loewenstern e Bronson. Pelo menos foi o que ouvi falar. No fim, você terá de deixar esses caras seguirem seus rumos. Eles sempre serão leais a você, mas querem fazer seus próprios negócios, longe de Danny.”

Naquele instante vi Tony Federici vindo em nossa direção, trajando seu uniforme branco de chef e carregando um jarro de Chianti. Assim, levantei-me para cumprimentá-lo. “Ei, Tony, como está?” Matou alguém recentemente?, pensei.

Apontei para Steve e falei: “Gostaria que você conhecesse um grande amigo meu. Este é Steve Madden. Somos sócios numa empresa de sapatos lá em Woodside”.

Steve imediatamente ergueu-se da cadeira e, com um sorriso sincero, disse: “Ei, Tony Valente! Tony Corona! Ouvi falar de você! Quer dizer, fui criado em Long Island, mas mesmo lá todo mundo ouviu falar de Tony Valente! É um prazer conhecê-lo!”.

Com isso, Steve estendeu a mão para seu recém-descoberto amigo, Tony Valente Corona, que odiava aquele apelido.

Bem, havia muitas formas de se fazer as coisas, pensei, e essa era uma delas. Talvez Tony fosse gentil e permitisse a Steve a honra de manter seus testículos ligados ao corpo, para que pudesse ser enterrado com eles.

Vi a mão ossuda e pálida do Mestre Sapateiro suspensa no ar, na expectativa, esperando ser agarrada por uma mão em retorno, que não aparecia. Então olhei para o rosto de Tony. Ele parecia estar sorrindo, apesar de seu sorriso ser do tipo que um carcereiro sádico ofereceria a um condenado à morte ao perguntar: “O que gostaria de comer em sua última refeição?”.

Por fim, Tony estendeu a mão, embora de maneira frouxa. “Sim, prazer em te conhecer”, falou um impassível Tony. Seus olhos castanho-escuros eram como dois raios mortais.

“É legal conhecê-lo também, Tony Valente”, disse o cada vez mais morto Sapateiro. “Ouvi falar muito bem deste restaurante, e pretendo vir muito aqui. Se eu ligar para fazer uma reserva, vou apenas dizer que sou um amigo de Tony Valente Corona! Tudo bem?”

“Tudo bem, então!”, falei com um sorriso nervoso. “Acho que é melhor voltarmos aos negócios, Steve.” Então me virei para Tony e disse: “Obrigado por vir nos cumprimentar. Foi bom te ver, como sempre”. Revirei os olhos e balancei a cabeça como se dissesse: “Não ligue para meu amigo; ele tem síndrome de Tourette”.

Tony franziu o nariz duas vezes e seguiu seu rumo, provavelmente até o fim da rua, para o clube social local, onde tomaria um café expresso enquanto ordenava a execução de Steve.

Sentei-me e balancei a cabeça, sério. “Caralho, qual o seu problema, Sapateiro? Ninguém o chama de Tony Valente! Ninguém! Quero dizer, você é um homem morto, porra.”

“Do que está falando?”, respondeu o Sapateiro ingênuo. “O cara me adorou, não?” Então jogou a cabeça para o lado, nervoso, e completou: “Ou estou totalmente por fora aqui?”.

De repente, Alfredo, o enorme maître, veio até nós. “Há um telefonema para o senhor”, disse Alfredo Montanha. “O senhor pode atender ali na frente, no bar. Não há ninguém por perto.” Ele sorriu.

Uh-oh! Eles estavam me responsabilizando pelas ações de meu amigo! Isso era coisa da Máfia, impossível para um judeu como eu compreender totalmente as nuanças. A essência era eu ter trazido o Sapateiro para dentro desse restaurante! Eu dera meu aval e agora sofreria as consequências pela insolência dele. Sorri para Alfredo Montanha e lhe agradeci. Então pedi licença e dirigi-me para o bar... ou talvez para o congelador de carne.

Quando cheguei ao telefone, fiz uma pausa e olhei ao redor. “Alô?”, falei, cético, esperando ouvir nada além de um toque de discar e então sentir um garrote no meu pescoço.

“Oi, sou eu”, disse Janet. “Você parece estranho; qual o problema?”

“Nada, Janet. O que você quer?” Meu tom era um pouco mais rude que o normal. Talvez o Lude estivesse perdendo o efeito.

“Desculpe-me por existir, caralho!”, disse a sensível.

Com um suspiro: “O que você quer, Janet? Estou com alguns probleminhas aqui”.

“Estou com Victor Wang no telefone, e ele diz que é urgente. Falei-lhe que você havia saído para almoçar, mas ele disse que aguardaria aqui até que retornasse. Acho ele um idiota, se quiser saber minha opinião.”

Quem... liga... pra... porra... da... sua... opinião... Janet? “Bem, coloque-o na linha”, disse, sorrindo para meu próprio reflexo no espelho enfumaçado atrás do bar. Eu nem parecia chapado. Ou talvez não estivesse chapado. Coloquei a mão no bolso e puxei um Quaalude espanhol, examinei-o por um breve instante e então o engoli... a seco.

Aguardei o som da voz tomada pelo pânico do China Depravado. Eu o deixara no esquecimento havia quase uma semana, e a Duke Securities estava até as orelhas com ações. Sim, estavam chovendo ações sobre Victor, e ele estava me procurando pedindo ajuda, o que eu tinha toda intenção de dar... mais ou menos.

De repente, surgiu a voz do China Depravado. Ele me cumprimentou calorosamente e começou a explicar que possuía mais ações de uma certa empresa do que havia ações físicas. Na verdade, havia apenas 1,5 milhão de ações circulando, mas ele no momento estava em posse de 1,6 milhão de ações.

“... e as ações continuam pingando”, disse o Panda Falante, “só não entendo como isso é possível. Sei que Danny me fodeu, mas também ele tem de estar sem ações agora!” O chinês parecia totalmente confuso, sem saber que eu tinha uma conta especial na Bear Stearns que me permitia vender tantas ações quanto meu coraçãozinho desejasse, quer eu as possuísse ou não e quer eu pudesse pegá-las emprestadas ou não. Era um tipo especial de conta chamada conta de corretagem preferencial, o que significava que eu podia realizar minhas negociações através de qualquer firma de corretagem no mundo. Não havia como o China descobrir quem estava vendendo.

“Acalme-se”, falei. “Se você está com problemas de dinheiro, Vic, estou aqui para te ajudar... 100%. Se precisa vender para mim 300 ou 400 mil ações, apenas diga.” Era mais ou menos isso que eu estava a descoberto agora. Mas eu tinha vendido as ações a preços maiores, por isso, se Victor fosse bobo o suficiente para me vender as suas, eu teria um lucro enorme, e então viraria a esquina e abaixaria os preços das ações novamente. Em breve, as ações estariam sendo negociadas a centavos, e o China, trabalhando na rua Mott, enrolando wontons.

“Sim”, respondeu o Panda Falante, “isso realmente ajudaria. Estou com pouco capital, e as ações já estão sendo negociadas a menos de 5 dólares. Não posso permitir que caiam mais.”

“Sem problemas, Vic. Apenas telefone para Kenny Kock na Meyerson; ele irá comprar 50 mil blocos de ações a cada hora.”

Victor me agradeceu, e então desliguei o telefone e disquei imediatamente para Kenny Kock, cuja esposa, Phyllis, fora a ministra do meu casamento. Falei para Kenny: “O China Depravado vai ficar te ligando a cada hora para vender 50 mil blocos de ações de você sabe o quê” – já havia contado meu plano para Kenny, e ele estava bem ciente de que eu estava travando uma guerra secreta contra o China –, “então saia e venda mais 50 mil ações agora, antes que compremos alguma dele. E então continue vendendo 50 mil blocos de ações a cada 90 minutos mais ou menos. Faça as vendas através de contas cegas, para que Victor não saiba de onde estão vindo.”

“Sem problemas”, respondeu Kenny Kock, o gerente de negócios na M. H. Meyerson. Eu acabara de levantar dez milhões de dólares para a sua empresa numa oferta pública inicial, portanto eu tinha autoridade ilimitada para negociar com ele. “Algo mais?”

“Não, só isso”, respondi. “Apenas mantenha as vendas baixas, em blocos de cinco ou dez mil. Quero que ele ache que está vindo de vendedores a descoberto aleatórios.” Ahhh, uma ideia. “Na verdade, sinta-se livre para diminuir quanto quiser da sua própria conta, porque as ações irão chegar a zero!”

Desliguei o telefone e desci para o banheiro para dar uns tirinhos de coca. Com certeza, eu merecia isso depois de minha atuação digna de um Oscar com Victor. Não senti nem uma pitada de culpa por causa da ascensão e queda da Duke Securities. Nos últimos meses, ele cumprira as expectativas de sua reputação de China Depravado. Estivera roubando corretores da Stratton sob o pretexto de eles não quererem mais trabalhar em Long Island; estivera vendendo de volta todas as ações que possuía das novas emissões da Stratton e, logicamente, negando isso; e estivera abertamente difamando Danny, referindo-se a ele como um “bufão espalhafatoso” incapaz de comandar a Stratton.

Então, isso era o troco.

Entrei e saí do banheiro em menos de um minuto, ingerindo um quarto de grama de coca em quatro cheiradas enormes. Enquanto subia de volta as escadas, meu coração batia mais rápido do que o de um coelho e minha pressão sanguínea estava mais alta do que uma vítima de ataque cardíaco, e eu amava isso. Minha mente estava a toda e eu tinha tudo sob controle.

No topo das escadas, dei de cara com o peito inflado de Alfredo Montanha. “O senhor tem mais um telefonema.”

“É mesmo?”, perguntei, tentando manter o queixo no lugar.

“Acho que é sua esposa.”

Putz! A Duquesa! Como ela faz isso? Ela sempre parece saber quando não estou fazendo coisa boa! Contudo, como eu nunca estava fazendo coisa boa, a lei da probabilidade era de ela sempre me telefonar na hora errada.

Cabisbaixo, andei até o bar e peguei o telefone. Eu teria de disfarçar. “Alô?”, falei, preocupado.

“Oi, querido. Você está bem?”

Se eu estava bem? Que pergunta capciosa! Muito malandra essa minha Duquesa. “Sim, estou bem, querida. Estou almoçando com Steve. O que tá pegando?”

A Duquesa deu um suspiro profundo e então falou: “Tenho más notícias. A tia Patricia acabou de morrer”.


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