CAPÍTULO 27


Na manhã seguinte, quando Diane acordou, Kelly estava sentada numa cadeira virada para a parede.

- Bom dia - disse Diane. - Conseguiu dormir alguma coisa?

Não obteve qualquer resposta.

- Temos de pensar no que vamos fazer a seguir. Não podemos ficar aqui para sempre.

Nada de resposta. Exasperada, disse alto:

- Kelly, está-me a ouvir?

Esta girou na cadeira: - Importa-se? Estou a meio de um mantra.

- Oh! Desculpe. Não fazia...

- Esqueça - e Kelly pôs-se de pé. - Já alguma vez lhe disseram que ressona?

Diane sentiu um pequeno choque. Recordou a voz de Richard a dizer-lhe, na primeira noite que dormiram juntos: Querida, sabias que ressonas ? Bom, melhor dizendo. Não é bem ressonar. O teu nariz entoa deliciosas melodias através da noite, quais músicas celestiais. E tomara-a nos braços e...

- Pois ressona - continuou Kelly. Dirigiu-se à televisão e ligou-a.

- Vamos ver o que se passa no mundo. - Começou a fazer zapping através dos vários canais e de repente parou. Um noticiário estava no ar e o apresentador era Ben Roberts.

- É Ben! - exclamou Kelly.

- E quem é Ben? - perguntou Diane com ar indiferente.

- Ben Roberts. É ele que faz os noticiários e as entrevistas. É o único entrevistador de quem realmente gosto. Ele e Mark eram grandes amigos. Um dia...

De repente parou.

Ben Roberts dizia: - ...notícia de última hora, Anthony Altieri, o alegado chefe da Máfia recentemente absolvido no julgamento por assassínio, morreu esta manhã de cancro.

Kelly virou-se para Diane:

- Ouviu aquilo? Altieri morreu.

Diane não sentia nada. Eram notícias de um outro mundo, de uma outra época. Olhou para Kelly e respondeu:

- Acho que será melhor que nos separemos. As duas juntas somos demasiado fáceis de detectar.

- Pois - disse Kelly secamente. - Somos da mesma altura.

- O que eu queria dizer é que...

- Eu sei o que queria dizer. Mas eu podia pintar a minha cara de branco e...

Diane olhava para ela sem perceber.

- O quê?

- Estava a brincar. Separarmo-nos é boa idéia. É quase como se fosse um plano, não é? - Kelly...

- Foi, sem dúvida, interessante conhecê-la, senhora Stevens.

- Vamos mas é sair daqui para fora - respondeu Diane.

O átrio estava apinhado de gente, com um enorme grupo de mulheres a chegarem e outras que partiam. Kelly e Diane aguardaram na fila.


Lá fora a olhar para o átrio, Harry Flint viu-as e escondeu-se. Pegou no celular.

- Chegaram neste momento ao átrio.

- Óptimo. Carballo já aí está?

- Já.

- Façam exactamente como eu vos disse. Cubram a entrada do hotel em ambas as esquinas para que elas fiquem encurraladas de todos os lados. Quero que desapareçam sem deixar rasto.


Kelly e Diane tinham finalmente chegado ao balcão da recepção.

O recepcionista sorriu-lhes:

- Espero que tenham tido uma boa estadia.

- Foi muito agradável, sim - respondeu Diane.

Quando se dirigiam para a saída, Kelly perguntou: - Sabe para onde vai, senhora Stevens?

- Não. Só quero ver-me livre de Manhattan. E você?

Eu só me quero ver livre de si.

- Eu vou voltar para Paris.

As duas puseram o pé na rua e, com atenção, olharam em volta. Havia o trânsito normal de peões e tudo parecia normal.

- Adeus, senhora Stevens - disse Kelly com uma ponta de alívio na voz.

- Adeus, Kelly.

Kelly virou à esquerda e começou a caminhar em direcção à esquina. Diane ficou parada por instantes a olhar para ela e em seguida virou para a direita e começou a andar em sentido contrário. Ainda mal tinham dado doze passos quando Harry Flint e Vince Carballo apareceram em pontas opostas do quarteirão. A expressão no rosto de Carballo era perigosa. Os lábios de Flint estavam virados num meio sorriso.

Os dois homens começaram a aproximar-se das mulheres, esgueirando-se por entre os peões. Diane e Kelly viraram-se uma para a outra em pânico. Tinham caído numa armadilha. Caminharam apressadamente de volta à porta do hotel, mas esta encontrava- se de tal forma apinhada de gente que não tinham possibilidade de entrar. Não tinham para onde ir. Os dois homens aproximavam-se.

Kelly virou-se para Diane e ficou a olhar espantada, pois esta acenara alegremente primeiro a Flint e depois a Carballo.

- Ficou maluca? - perguntou baixinho.

Diane, sempre a sorrir, tirou o celular para fora a e começou a falar rapidamente.

- Neste momento, estamos mesmo em frente do hotel... Oh! Excelente. Já estão na esquina? - E sorriu e acenou vitoriosamente para Kelly e disse em voz alta. - Eles vão chegar dentro de um minuto.

Olhou para Flint e para Carballo e falou para o telefone:

- Não, são só dois. - E ficou a ouvir. Em seguida riu:

- Certo... Já aí estão? Óptimo.

Enquanto Kelly e os dois homens olhavam para ela, Diane desceu do passeio para a rua, a observar os carros que passavam. Começou a fazer sinais a um carro que se aproximava à distância e ia acenando cada vez mais agitada. Flint e Carballo tinham parado, intrigados com o que viam.

Diane apontou para os dois homens:

- Ali! - gritou para o trânsito que passava, continuando a acenar furiosamente. - Ali!

Flint e Carballo olharam um para o outro e tomaram uma decisão. Viraram-se na direcção de onde tinham vindo e desapareceram no meio da multidão.

Kelly olhava fixamente para Diane, o coração aos saltos dentro do peito.

- Eles foram-se embora - disse. - Com quem... com quem falava?

Diane respirou fundo para se recompor.

- Com ninguém. Estou sem bateria.


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