Ninguém entendeu a mensagem formada pela primeira letra de cada linha, então uma sugestão foi passada discretamente a alguns jornalistas: “Têm certeza de que leram a mensagem de veto do governador do jeito certo? Talvez devam lê-la na vertical.” Então todos compreenderam e houve uma grande confusão pública:
Alguns jornalistas perguntaram a meu assessor de imprensa se o recado “foda-se” tinha sido proposital, ao que ele respondeu: “Não, não tínhamos a menor ideia. Deve ter sido um acidente.”
Na minha coletiva de imprensa seguinte, porém, outro repórter levantou a mão e disse:
– Pedimos que um matemático lesse a carta. Segundo ele, existe menos de uma chance em 2 bilhões de a mensagem ter sido acidental.
– Tudo bem – respondi. – Por que vocês não vão lá e perguntam ao mesmo especialista quais eram as chances de um menino da zona rural da Áustria vir para os Estados Unidos e virar o maior campeão de fisiculturismo de todos os tempos, entrar para o cinema, casar-se com uma Kennedy e depois ser eleito governador do maior estado do país? Na próxima coletiva, venham me contar a resposta dele.
Todos os jornalistas riram. Enquanto isso, a seguinte frase foi atribuída a Tom Ammiano: “Fui um idiota, então ele tem o direito de ser um idiota também.” A brincadeira acabou com a tensão. (Um ano mais tarde, depois de sancionar mais uma lei defendida por ele, divulguei um comunicado a respeito que, lido na vertical, dizia “d-e-n-a-d-a”.)
5. O DIA TEM 24 HORAS. Certa vez, dei uma palestra na Universidade da Califórnia. Ao final, um aluno levantou a mão e reclamou:
– Governador, desde a crise do orçamento minha anuidade aumentou duas vezes. Agora está alta demais. Preciso de mais auxílio financeiro.
– Entendo, é difícil mesmo – falei. – Mas como assim, alta demais?
– Agora tenho que trabalhar em meio período.
– E qual é o problema disso?
– Preciso estudar!
Então falei:
– Vamos fazer as contas. Quantas horas de aula você tem?
– Duas horas um dia por semana e três horas em outro.
– E quantas horas precisa estudar?
– Três horas em cada um desses dias.
– Certo. Até agora, pelas minhas contas, são seis horas em um dia e sete em outro, contando com o transporte. O que você faz no restante do tempo?
– Como assim?
– Bom, o dia tem 24 horas. Já pensou em trabalhar mais, ou pegar mais disciplinas, em vez de ficar vendo a vida passar?
A turma inteira ficou chocada ao me ouvir dizer isso.
– Eu não estou vendo a vida passar! – respondeu o aluno.
– Está, sim. Você falou em seis horas por dia. O dia tem 24 horas, então sobram 18. Digamos que você precise dormir seis horas por noite. Então, se o seu trabalho em meio período ocupa quatro horas, mesmo assim ainda sobra tempo para namorar, dançar, beber e sair. Está reclamando de quê?
Disse aos alunos que, quando era estudante, treinava cinco horas por dia, fazia quatro horas de aulas de interpretação, trabalhava na construção civil várias horas por dia, ia à faculdade e fazia os deveres de casa. E eu não era o único. Nas minhas turmas do Santa Monica College e dos cursos de extensão da UCLA havia outros alunos que trabalhavam em tempo integral. É natural esperar que alguém venha pagar sua conta. E o governo deve estar presente para ajudar em caso de necessidade real e para fornecer educação. No entanto, se o governo não estiver obtendo receita suficiente por causa de uma desaceleração da economia, todo mundo precisa contribuir e se sacrificar.
6. REPETIR, REPETIR, REPETIR. Quando entrávamos no Sindicato Atlético de Graz, academia onde eu fazia musculação na adolescência, havia à esquerda uma parede comprida de compensado toda coberta de marcas de giz. Era lá que anotávamos nosso programa de treino para cada dia. Cada um tinha seu pedacinho de parede e antes de trocar de roupa fazia uma lista:
LEVANTAMENTO TERRA:
5 SÉRIES DE 6 REPETIÇÕES
/ / / / /
ARREMESSO:
6 SÉRIES DE 4 A 6 REPETIÇÕES
/ / / / / /
DESENVOLVIMENTO DE OMBROS:
5 SÉRIES DE 15 REPETIÇÕES
/ / / / /
SUPINO:
5 SÉRIES DE 10 REPETIÇÕES
/ / / / /
CRUCIFIXO RETO:
5 SÉRIES DE 10 REPETIÇÕES
/ / / / /
E assim por diante, num total de cerca de 60 séries. Mesmo sem saber como estaria sua disposição no dia, as pessoas anotavam também a carga. Depois de cada linha havia uma sequência de risquinhos, um para cada série planejada. Se você tivesse previsto cinco séries de supino, fazia cinco risquinhos na parede.
Então, assim que concluísse a primeira série, ia até a parede e fazia um segundo risco por cima do primeiro, transformando-o em um X. Todos os cinco risquinhos tinham que virar X antes de você passar para o exercício seguinte.
Essa prática teve forte impacto na minha motivação. Eu sempre dispunha do estímulo visual: “Uau, consegui. Fiz o que disse que faria. Agora vou passar para a próxima série, depois para a outra.” Anotar meus objetivos tornou-se uma coisa natural, bem como a convicção de que não existem atalhos. Foram necessárias centenas, milhares de repetições para que eu aprendesse a fazer uma ótima pose três quartos de costas, contar uma piada, dançar tango em True Lies, pintar um lindo cartão de aniversário e dizer “Eu voltarei” do jeito exato.
Se você der uma olhada no roteiro de meu primeiro discurso na ONU sobre o combate ao aquecimento global, em 2007, eis o que vai ler:
Governador Schwarzenegger
Discurso ONU
24 de setembro de 2007
(Parvin − 10/9/07)
(Prezado governador, falei com Terry e usei as palavras sugeridas por ele nas páginas 5-7, que acho que funcionam. Com essa correção, não acredito que precisemos da frase sobre acordos, de modo que a apaguei. Também corrigi a página 12, como o senhor pediu. Essas mudanças fizeram a paginação do discurso correr. Landon)
Sr. Secretário-Geral, Sra. Sr. Presidente, distintos representantes, senhoras e senhores... Desenvolvi um enorme carinho pelos povos do mundo / porque eles sempre me acolheram muito bem / fosse como fisiculturista, astro de cinema ou cidadão comum.
Ou como governador do grande estado da Califórnia.
Cada risquinho no alto da página representa uma vez que ensaiei o discurso. Não importa se você estiver fazendo uma rosca bíceps em uma academia gelada ou discursando diante de líderes mundiais: não existem atalhos – o importante é repetir, repetir, repetir.
Faça na vida o que você fizer, das duas, uma: precisa acumular repetições ou quilometragem. Se quiser esquiar bem, precisa ir às pistas. Se for enxadrista, tem que jogar dezenas de milhares de partidas. No set de filmagem, o único jeito de acertar a cena é ensaiar. Se você tiver ensaiado, não precisa se preocupar e pode aproveitar o momento em que as câmeras vão rodar. Ao filmar The Tomb em Nova Orleans, pouco tempo atrás, fizemos uma cena de briga na prisão com 75 pessoas. A coreografia era tão complicada, com dezenas de trocas de socos, engalfinhamentos e guardas da prisão aparecendo para bater nos presos com cassetetes, que só os ensaios levaram metade de um dia. Quando começamos a rodar, todo mundo já estava cansado, mas ao mesmo tempo bastante preparado. A tomada foi um sucesso. Os movimentos tinham se tornado naturais para nós, e a sensação transmitida foi a de uma briga de verdade.
7. NÃO CULPE SEUS PAIS. Eles fizeram o melhor possível por você, e, caso tenham lhe causado problemas, essas questões agora são suas, e quem tem que solucioná-las é você. Talvez seus pais tenham sido excessivamente atenciosos e protetores e você agora se sinta carente e vulnerável no mundo, ou então podem ter sido duros demais, mas não importa – não os culpe por isso.
Quando eu era pequeno, amava meu pai e queria ser igual a ele. Admirava seu uniforme, sua arma e sua profissão. Mais tarde, porém, passei a detestar o modo como ele pressionava a mim e meu irmão. “Vocês precisam dar o exemplo no vilarejo, pois são filhos do policial”, dizia. Tínhamos que ser crianças perfeitas, o que evidentemente não éramos.
Meu pai se mostrava exigente − era esse o seu temperamento. Ele às vezes também se mostrava violento, mas não acho que fosse culpa sua. Foi a guerra. Se ele tivesse levado uma vida mais normal, teria sido um homem diferente.
Então eu muitas vezes me perguntei: e se meu pai tivesse sido mais caloroso e gentil? Será que eu teria saído da Áustria? Provavelmente não. E teria lamentado por isso!
Tornei-me Arnold por causa do que meu pai fez comigo. Resolvi que iria transformar o modo como fui criado em algo positivo, em vez de ficar reclamando. Poderia usá-lo para criar um sonho, estabelecer objetivos, encontrar alegria nas coisas. A severidade dele me afastou de casa. Por causa dela fui para os Estados Unidos e trabalhei duro para ter sucesso – e fico feliz por ter feito isso. Não preciso lamber minhas feridas.
Em Conan, o bárbaro, perto do fim, há um trecho que nunca me saiu da cabeça. A fala não é de Conan, mas de Thulsa Doom, o feiticeiro que o obriga, quando menino, a ver o pai ser devorado por cães e mata a mãe na sua frente. Quando Conan está prestes a matá-lo e vingar os pais, Thulsa Doom diz: “Quem é seu pai, se não eu? Quem lhe deu a força de vontade para viver? Eu sou a fonte da qual você brota.”
Portanto, nem sempre o que você deve celebrar é óbvio. Às vezes é preciso valorizar justamente as pessoas e as circunstâncias que estão na origem do seu trauma. Hoje em dia eu agradeço o rigor do meu pai, minha criação e o fato de eu não ter conseguido nada do que queria na Áustria, pois foram justamente esses fatores que me deram ânsia de viver. Toda vez que ele me batia, toda vez que dizia que meus treinos de musculação eram uma bobagem, que eu deveria fazer algo útil e sair para cortar lenha, toda vez que ele me desaprovava ou constrangia, essas coisas alimentavam o fogo que eu tinha no ventre. Era o que me fazia avançar e me motivava.
8. MUDAR EXIGE CORAGEM. Quando eu estava em missão comercial em Moscou, durante meu último ano como governador, reservei um tempinho para visitar o ex-secretário-geral soviético Mikhail Gorbachev em sua casa. Tínhamos ficado amigos ao longo dos anos, e eu fizera um discurso e me sentara com ele em sua festa de 80 anos em Londres, alguns meses antes. Irina, sua filha, preparou um almoço para nós dois e vários amigos do Instituto Gorbachev. Passamos pelo menos duas horas e meia comendo.
Sempre idolatrei Gorbachev pela coragem que ele teve ao desmantelar o sistema político no qual foi criado. Sim, a União Soviética estava com problemas financeiros. Sim, Reagan havia exaurido o país e os soviéticos estavam acuados em um canto. Mas o fato de Gorbachev ter tido peito para abraçar as mudanças em vez de oprimir ainda mais seu povo ou começar brigas com o Ocidente sempre me impressionou. Perguntei a ele como tinha conseguido. Como fora capaz de mudar o sistema após ter sido doutrinado desde a infância a ver o comunismo como solução para todos os problemas, e depois de alcançar uma posição de liderança no partido na qual era necessário demonstrar paixão pelo sistema o tempo todo? Como conseguira ter a mente tão aberta? “Trabalhei a vida inteira para aperfeiçoar nosso sistema”, disse-me ele. “Mal podia esperar para chegar ao cargo mais poderoso, pois pensava que nesse momento poderia resolver problemas que só o líder pode resolver. Quando cheguei lá, porém, percebi que precisávamos de mudanças revolucionárias. As coisas só eram feitas se você conhecesse alguém ou pagasse a alguém por debaixo dos panos. Que sistema era esse? Estava na hora de acabar com aquilo tudo.” Talvez sejam necessários 50 anos para as pessoas entenderem o que Gorbachev conquistou. Estudiosos debaterão para sempre se ele fez tudo como deveria. Eu não vou debater isso; simplesmente achei incrível o que ele fez. Fico perplexo com a coragem demonstrada por esse homem não em troca de uma gratificação imediata, mas para buscar o melhor rumo para o país em longo prazo.
Para mim, Gorbachev é um herói do mesmo quilate de Nelson Mandela, que superou a raiva e o desespero de 27 anos na prisão. Quando lhes foi dado poder para sacudir o mundo, ambos escolheram não destruir, mas sim construir.
9. CUIDE DE SEU CORPO E DE SUA MENTE. Um dos primeiros conselhos que permaneceram na minha mente foi o de Fredi Gerstl, inspirado em Platão. “Os gregos criaram as Olimpíadas, mas também nos deram os grandes filósofos”, dizia ele. “É preciso construir a mais refinada máquina física possível, mas também a mais aguçada máquina mental.” Concentrar-me no corpo nunca foi um problema para mim, e mais tarde me tornei realmente curioso em relação ao desenvolvimento da mente. Entendi que ela é um músculo que também deve ser exercitado. Assim, decidi treinar meu cérebro e ficar inteligente. Tornei-me uma verdadeira esponja e passei a absorver tudo à minha volta. O mundo se tornou minha universidade, e desenvolvi uma grande necessidade de aprender, ler e acumular conhecimento.
Para quem se destaca pela inteligência, o contrário se aplica. Essas pessoas precisam exercitar o corpo diariamente. Clint Eastwood pratica exercícios físicos mesmo quando está dirigindo e atuando em um filme. Dmitri Medvedev trabalhava horas a fio quando era presidente da Rússia, mas tinha uma academia em casa e malhava duas horas por dia. Se os líderes mundiais têm tempo para isso, você também tem.
Muitos anos depois de Fredi Gerstl, o papa me falou sobre a mesma ideia de equilíbrio. Fui visitar o Vaticano com Maria e os pais dela em 1983, e tivemos uma audiência particular com João Paulo II. Sarge falou sobre espiritualidade, porque era especialista nisso. Eunice perguntou ao religioso o que as crianças deveriam fazer para se tornar pessoas melhores, e ele respondeu: “Rezar. Só isso.”
Eu conversei com ele sobre sua rotina de exercícios. Logo antes de viajarmos, eu tinha lido um artigo em uma revista que contava como o papa era atlético e elogiava sua excelente forma física. Para ele, além da religião, a vida consistia em cuidar tanto da mente quanto do corpo, então ele começou a falar sobre isso. Era conhecido por acordar às cinco da manhã, ler jornais em seis idiomas e fazer 200 flexões e 300 abdominais, tudo antes do café da manhã e do início de seu dia de trabalho. Ele também era esquiador e continuou a praticar esse esporte mesmo depois que virou papa.
Na época, João Paulo II já estava com mais de 60 anos, 27 a mais do que eu. Pensei: “Se esse cara consegue, vou ter que acordar ainda mais cedo!”
10. SEJA ÁVIDO. Tenha fome de sucesso, faça questão de deixar sua marca, deseje intensamente ser visto e ouvido, e por ter influência. À medida que for avançando e alcançar o sucesso, não se esqueça também de ser ávido por ajudar os outros.
Não fique se vangloriando pelo que já realizou. Muitos ex-atletas passam a vida falando sobre como eram incríveis 20 anos antes. Alguém como Ted Turner, porém, passa de administrador da empresa de anúncios em outdoors do pai a fundador da CNN, organizador dos Jogos da Amizade, criador de bisões, fornecedor de carne de bisão e detentor de 47 títulos universitários honoríficos. É isso que chamo de ser ávido. Bono Vox começou como músico, depois comprou músicas de terceiros, em seguida trabalhou no combate à aids e na criação de empregos. Anthony Quinn não ficou satisfeito sendo apenas um astro de cinema. Ele quis fazer mais: tornou-se um pintor cujas telas foram vendidas por centenas de milhares de dólares. Donald Trump transformou a herança que recebeu em uma fortuna 10 vezes maior, depois se tornou apresentador de TV em rede nacional. Sarge viajou o mundo até o fim da vida, sempre ansioso por novos projetos.
Muitas pessoas talentosas simplesmente se acomodam. Ficam desejando ainda ser alguém, e não apenas falar sobre o passado. A vida é muito mais do que ser o melhor em algum quesito. Aprendemos muita coisa quando somos bem-sucedidos, então por que não usar o que você já aprendeu, lançar mão de seus contatos e fazer mais coisas com eles?
Meu pai sempre me dizia: “Seja útil. Faça alguma coisa.” Ele tinha razão. Se você tiver um talento ou uma habilidade que o deixem feliz, use-os para melhorar seu bairro. Se ainda sentir vontade de fazer mais, vá em frente – terá tempo de sobra para descansar quando estiver no túmulo. Viva uma vida de riscos, uma vida ousada, e, como disse Eleanor Roosevelt, faça diariamente algo que lhe dê medo.
Deveríamos todos nos manter sempre ávidos!