CAPÍTULO 18

Em ritmo de comédia

EU ADORAVA SER UM HERÓI DE AÇÃO. Com meu físico e meu histórico, interpretar esse tipo de papel era natural para mim. Mas não se pode passar a vida inteira correndo de um lado para outro e explodindo coisas à sua volta. Havia muitos anos que eu já sonhava em fazer comédias.

Sempre acreditei que tudo na vida tem seu lado cômico. Era engraçado posar na frente de uma plateia todo besuntado de óleo e usando uma sunga minúscula para tentar ser eleito o homem mais musculoso do mundo. Era engraçado receber um cachê de milhões de dólares para combater um predador extraterrestre. Era engraçado fazer aulas de parto sem dor pelo método Lamaze tentando fingir que a gravidez é um trabalho de equipe. Eu via muita graça no fato de Maria e eu termos origens totalmente opostas. Achava graça do meu próprio sotaque e adorava a imitação que os personagens de Saturday Night Live faziam de mim. Eu sempre tinha sido um alvo perfeito para piadas – o material para se trabalhar era farto. Ser austríaco, ter me casado com Maria, ser republicano, ter aquele sotaque: com todos esses fatores, é preciso ter senso de humor para poder também rir da piada.

Em 1985, um ano depois de O exterminador do futuro se tornar um grande sucesso, eu estava jantando em Denver na noite anterior ao Carousel Ball, célebre e sofisticado baile de caridade promovido por Marvin e Barbara Davis. Marvin, na época proprietário dos estúdios Fox – onde eu estava filmando Comando para matar –, era conhecido pelo senso de humor. Ele e a mulher estavam em uma mesa com vários humoristas que iriam se apresentar no evento, entre os quais Lucille Ball e o marido, Gary Morton. Eu ocupava a mesa ao lado junto com John Davis, filho dos anfitriões, e o pessoal mais jovem. Na mesa de Marvin e Barbara só se ouviam piadas e muitas risadas. De repente, Marvin me chamou:

– Ei, Arnold, venha cá um instante. Por que não conta uma piada para a gente?

Mais tarde fiquei sabendo que isso era típico dele. Na hora, porém, fiquei sem ação. Não tinha preparado nenhuma piada. Sequer sabia que tipo de piada devia contar em um evento como aquele.

Tudo o que consegui dizer foi:

– Preciso de um tempinho para me aquecer. Quem sabe amanhã? – Ou algo desse tipo.

Foi então que Lucille Ball interveio:

– Ele é muito engraçado. Não precisam se preocupar com ele. Já trabalhamos juntos.

Depois que ela me salvou, Gary Morton nos interrompeu com uma piada e então Milton Berle deu início a um esquete sobre como Gary Morton não seria ninguém sem Lucille Ball. Fui salvo pelo gongo, mas a situação foi um exemplo perfeito de como é importante estar preparado para momentos assim.

Eu havia sido apresentado a Milton Berle na festa de meu noivado com Maria na Costa Oeste, em 1985. Ruth, sua esposa, e Maria se conheciam por causa do Share Girls, grupo de caridade para o qual Maria entrara ao seu mudar para Los Angeles. A organização contava também com as esposas de Johnny Carson, Dean Martin e Sammy Davis Jr., entre outras, de modo que costumávamos chamar o grupo de “fundação das ricaças”. Os Berle e os Kennedy tinham um belo passado em comum, porque Milton fora um grande fã de John Kennedy. Os dois eram bastante próximos, e Milton dera de presente a JFK uma caixa para conservação de charutos que posteriormente fora vendida para Marvin Shanken, proprietário e editor da revista Cigar Aficionado, num leilão dos Kennedy, por 520 mil dólares. Milton só deu três caixas dessas de presente na vida, e uma foi para mim.

Maria e Ruth, portanto, tornaram-se boas amigas, e Ruth levou Milton à nossa festa de noivado. A primeira coisa que ele fez foi cumprimentar com um aperto de mão um cara que eu nem sabia quem era.

– Que prazer estar aqui hoje, nesta festa de noivado – disse ele. – Maria vai se casar com Arnold Schwarzenegger. Arnold, que maravilha, muito obrigado por me convidar.

Caí totalmente na brincadeira.

– Mas eu estou aqui! – exclamei.

Foi uma brincadeira idiota, mas todo mundo riu. O gelo foi quebrado e Milton embarcou em um esquete cômico.

– Esta é Ruthie, minha esposa – falou. – Olhe só para a boca dela. A última vez que vi uma boca assim, estava atravessada por um anzol.

Ruth, sentada ao lado de Maria, comentou:

– Ai, ai, acho que já ouvi essa piada umas mil vezes...

Depois disso, Berle sentou-se conosco e nos divertimos muito. No final, ele disse:

– Vamos marcar alguma coisa qualquer dia desses.

– Claro! – respondi.

Então, um dia, combinamos ir ao Caffé Roma, em Beverly Hills, e o lugar se tornou nosso ponto de encontro. Eu sempre almoçava lá com ele e com amigos seus como Sid Caesar e Rodney Dangerfield, além de Milt Rosen, que escrevia muitas de suas piadas. Ou então ia à sua casa, onde fumávamos charutos enquanto eu lhe fazia mil perguntas sobre comédia.

Berle era presidente do Friars Club de Beverly Hills, fundado por ele em 1947 junto com outros humoristas como Jimmy Durante e George Jessel. O clube ficava em uma rua entre os bulevares Wilshire e Santa Monica, em um prédio branco que visto de fora parecia um bunker, mas que tinha restaurante e boate privativos lá dentro. Eu ia ao lugar a cada um ou dois meses para almoçar ou jantar, ou então por causa de algum evento. O clube promovia boas lutas de boxe e era famoso pelos eventos conhecidos como roasts, em que alguma celebridade era posta na berlinda para ser alvo de piadas e brincadeiras. Milton, porém, já tinha quase 80 anos, e era fácil ver que o clube estava ultrapassado.

Ele e os amigos mantinham o lugar tão protegido que novos humoristas não entravam. Gente como Eddie Murphy, Steve Martin, Danny DeVito e Robin Williams frequentava o Friars como visitante, e dava para ver a frustração em seus rostos. Eles deviam pensar: “Que velhotes sem graça são esses? As minhas piadas fazem todo mundo rolar no chão de tanto rir.”

Porém, como eu não era humorista, não fazia parte desse grupo. Além do mais, fui educado em uma cultura que respeita os mais velhos. Para mim, um profissional como Berle tinha que ser honrado, elogiado e incentivado, porque talvez sua carreira já não estivesse indo tão bem. Devia ser esquisito para ele, depois de ter entrado para a história como o “Mr. Television” e de ter sido um grande astro em Las Vegas e na Broadway, de repente ter o Friars Club como sua única identidade. Onde quer que estivesse, Milton tentava roubar a cena, pois ainda tinha aquela necessidade de atenção que o levara a se tornar humorista.

Descobri que todas essas lendas da comédia sabiam ter uma conversa normal, mas não sempre. Quando estávamos reunidos no Caffé Roma, falávamos sobre assuntos do dia a dia, mas aí aparecia Robin Williams, ou então Rodney Dangerfield, com sua habitual bermuda, e as coisas ficavam mais animadas. Se você fosse com esses mesmos caras a um evento beneficente no qual houvesse qualquer tipo de plateia, eles não paravam nunca: era piada atrás de piada, provocação atrás de provocação, e ninguém tinha pena de ninguém. O mais engraçado, porém, era que muitos dos humoristas levavam as esposas, que eram donas de casa de aparência normal. As piadas dos maridos as faziam revirar os olhos. Quase dava para ouvir seus pensamentos: “Lá vamos nós outra vez. Deus nos acuda.” Na verdade, às vezes uma delas até dizia em voz alta: “Ah, pelo amor de Deus, quantas vezes você vai contar essa?” Isso era o pior. Os humoristas mais velhos odiavam.

Os caras do Friars Club não me viam como humorista. Eles gostavam de mim e dos meus filmes e achavam que eu tinha certo talento humorístico dentro de determinado limite. Também sabiam que eu os respeitava e admirava seu talento. Eu não achava isso ruim. É preciso saber avaliar o próprio potencial. Então digamos que, em uma escala de um a dez, sendo Milton Berle o dez, eu tinha um potencial de cinco. Em matéria de comédia, o potencial dele era bem maior do que o meu, claro, mas em outras áreas talvez não fosse o caso. É difícil imaginar Milton Berle como herói de filmes de ação, por exemplo.

O truque, porém, é saber como alcançar 100% do seu potencial. Eu estava em um bom momento da carreira para começar a fazer papéis cômicos e diversificar um pouco meus trabalhos. No entanto, sabia também que isso era algo arriscado, principalmente para mim, que, sendo europeu, não tinha um senso de humor americano. Além disso, meu ritmo e minha velocidade de dicção tendiam a ser meio esquisitos. Então, estar em contato com esses caras e poder entrar no seu mundo me deu a oportunidade de entender melhor esse terreno. Descobri que gosto muito de conviver com gente engraçada, que escreve comédia e vive procurando um jeito único de dizer as coisas – embora tenha precisado me acostumar com Milton brincando que meus peitos eram maiores do que os da minha namorada.

Ele se tornou meu mentor de comédia. Costumava me incentivar dizendo: “Ser engraçado é duas vezes mais difícil para você, com esse sotaque, do que para mim. As pessoas já esperam que eu seja engraçado!” Milton me ensinou muito sobre como contar piadas, não exagerar no humor e não enfatizar demais a parte engraçada. Eu lhe perguntava como escolher piadas para suavizar uma situação séria e como inseri-las na conversa de modo natural. Aprendi que, no caso da comédia stand-up, nada precisa estar interligado. Primeiro você faz algumas piadas com assuntos da atualidade, como Jay Leno costuma fazer, por exemplo. Depois escolhe algumas pessoas da plateia e brinca com elas, sem se esquecer de incluir algumas piadas sobre você mesmo para amenizar o fato de estar fazendo graça à custa dos outros.

Milton muitas vezes me dava conselhos sobre o ritmo. “Quando você é um astro, recebe vários prêmios, mas muitos deles são irrelevantes”, dizia ele. “No entanto, mesmo assim é preciso fazer um discurso de agradecimento. Então você deve dizer: ‘Já ganhei muitos prêmios, mas este aqui... para mim...’ E tem que se emocionar nessa parte e fingir que está com a voz embargada: ‘Este aqui, para mim, é o mais... recente!’ Entendeu? Você demonstra emoção para fazer a plateia ir na direção contrária.”

Berle escrevia as próprias piadas – The Milton Berle Show fora o mais importante e duradouro programa dos primeiros tempos da TV –, mas também era famoso por roubar piadas de todos os outros humoristas. Jack Benny certa vez foi acusado de se apropriar de uma piada de Berle e comentou: “Pegar uma piada de Milton Berle não é roubo, é reintegração de posse.”

A maior frustração de Milton comigo era minha mania de exagerar o tempo todo. Um dia, ele estava me ajudando a me preparar para um roast ao qual não poderia comparecer. Quem estaria na berlinda nesse dia seria eu, e Milton estava me ensinando algumas piadas para contar quando chegasse a minha vez de responder aos outros participantes. “Não queime ninguém, só chamusque”, dizia ele, lembrando-me de seu antigo preceito sobre roasts e brincando com o significado da palavra roast em inglês: “assar”. Não lhe dei muita atenção. Uma das piadas que ele me ensinou foi sobre o humorista Henny Youngman: “Henny tem um problema de peso. Mas na verdade não é gordura, é só retenção de líquido. Ele está retendo um lago inteiro.”

Na noite do evento, quando chegou minha vez de falar, fiz um gesto em direção a Henny e disse: “Olhem só esse balofo aqui. Na verdade ele não é balofo. Está só retendo líquidos...”

Os amigos de Friars Club de Milton descobriram que ele estava me dando dicas e no dia seguinte ligaram para ele aos gritos: “Como você pôde dizer para o Arnold chamar o Henny de balofo?” Milton disse que eu deveria ligar para os sócios do clube que tinham se ofendido e me desculpar. “Pensei que ir além do que estava escrito no papel seria mais engraçado”, expliquei a eles. “Mas sei que contrariei as regras e sinto muito por isso.”

Sempre que vejo alguém com grande talento para se apresentar ao vivo, começo a sonhar. Não seria bacana ser um astro do rock como Bruce Springsteen? Não seria legal fazer um discurso e ser aplaudido por 100 mil pessoas como Ronald Reagan? Não seria o máximo fazer um esquete hilário de stand-up de meia hora como Eddie Murphy? Talvez por influência do meu signo, Leão, eu tenha dentro de mim um eterno showman que quer sempre estar no centro dos acontecimentos.

Em relação a Milton Berle, portanto, meu pensamento era: “Talvez eu nunca chegue ao mesmo nível dele, mas se puder aprender só um pouquinho do que ele sabe...” Quantas vezes na vida você precisa fazer um brinde? Quantas vezes precisa discursar em prol de alguma causa nobre, como a boa forma física? Ou participar de uma coletiva de imprensa em algum festival de cinema?

No caso dos filmes de ação, o problema é complexo. Metade dos críticos automaticamente diz: “Detesto filmes de ação. Gosto de histórias de amor, de filmes que possa levar a família para ver. Esse cara não para de matar gente, aí as crianças vão assistir e depois sair pela rua matando gente também.” Começar com algo irresistível e engraçado é um bom jeito de se destacar. Você se torna mais agradável e as pessoas recebem muito melhor as informações a seu respeito.

Sempre que eu assistia a alguma comédia, fosse ela O clube dos cafajestes, Os caça-fantasmas ou Banzé no Oeste, pensava: “Eu poderia ter feito isso!” Só que ninguém iria me contratar para esse tipo de papel, e não fazia sentido bater o pé e insistir: “Meu próximo filme tem que ser uma comédia.” Ainda não havia explorado todo o meu potencial com os filmes de ação. Se quisesse começar a fazer humor em um futuro próximo, precisaria de alguém para me promover.


ESSE PROBLEMA SE RESOLVEU SOZINHO no final de 1986, em um chalé de uma estação de esqui em Snowmass Village, perto de Aspen, Colorado. Certa noite, Maria e eu estávamos em frente à lareira na companhia de Ivan Reitman, Robin Williams e suas respectivas esposas. Robin e eu nos divertíamos contando histórias engraçadas sobre esqui e sobre quem estava dormindo com quem em Aspen. Já Ivan era um mestre: produzira O clube dos cafajestes e fora produtor e diretor de Os caça-fantasmas e Perigosamente juntos. Eu estava louco para trabalhar com ele, de modo que lancei mão de todo o meu arsenal cômico aprendido com Milton Berle. Deu certo. Ao final dessa noite, Ivan me encarou com uma expressão pensativa.

“Sabe de uma coisa?”, falou. “Você tem uma espécie de inocência que nunca vi ser retratada na tela do cinema, e um senso de humor peculiar. Acho que Hollywood está querendo manter você no papel de herói de ação para sempre, mas poderia ser bem interessante vê-lo interpretar um cara fortão com essa inocência.”

Quando voltamos de Aspen, liguei para Ivan e sugeri que fizéssemos algo juntos. Ele topou. Pediu a alguns roteiristas que desenvolvessem cinco ideias para mim e me entregou: cinco memorandos de duas páginas cada um esboçando um personagem e uma ideia. Eliminamos quatro deles bem depressa, mas o quinto parecia ótimo: era sobre dois gêmeos totalmente diferentes, nascidos de um experimento científico destinado a criar o ser humano perfeito. Julius Benedict, meu personagem, fica com todos os genes bons e é praticamente perfeito, apesar de ingênuo. Ele sai à procura do irmão, Vincent, um pequeno contraventor, e os resultados são engraçadíssimos. Concordamos que, por causa da minha origem alemã, o título O experimento não era adequado e rebatizamos o projeto de Irmãos gêmeos. A partir daí, todo mundo se apaixonou pela ideia.

Pensei em chamar Danny DeVito para interpretar Vincent porque eu havia esbarrado por acaso com seu agente e achava que seria muito engraçado se os gêmeos fossem bem diferentes fisicamente. Todos gostaram. Quando falaram com Danny, ele também adorou a ideia, embora desde o início tenha manifestado algumas reservas. “Sim, a piada visual é ótima: Arnold e eu como irmãos gêmeos”, disse ele. “Mas como vamos sustentar isso?” Danny gostava de planejar tudo. E assim nasceu o projeto.

Ivan, Danny e eu formávamos uma equipe interessante. A mãe de Ivan era sobrevivente do campo de concentração de Auschwitz e seu pai lutara na resistência; os dois haviam emigrado da Tchecoslováquia depois da guerra. Como muitos filhos de sobreviventes do Holocausto, Ivan era extremamente determinado e aliava essa qualidade a um incrível talento para dirigir e produzir comédias. Danny, por sua vez, revelou-se um colega de trabalho hilariante. Apesar de seu imenso sucesso na TV e no cinema, ele está longe de ser uma das personalidades excêntricas de Hollywood. Dirige carros normais, tem uma família ótima e leva uma vida igual à de todo mundo. Além disso, é extremamente bem organizado financeiramente.

Como nós três éramos realistas e ponderados em relação aos negócios, pudemos contribuir com um pequeno capítulo para a história de Hollywood. Sabíamos que vender Irmãos gêmeos da maneira convencional seria difícil. Em teoria, os estúdios iriam adorar a ideia: bastava imaginar um cartaz comigo e Danny DeVito lado a lado. Na realidade, porém, o que estávamos propondo era um filme fora do comum com três profissionais caros. Se cada um de nós recebesse o cachê habitual, o orçamento ficaria tão alto que, na nossa opinião, nenhum estúdio iria querer bancar a produção. Ao mesmo tempo, nenhum de nós queria diminuir o valor cobrado, pois trabalhar por menos pode prejudicar seu poder de negociação em contratos futuros.

Assim, quando fomos vender nossa ideia a Tom Pollock, diretor da Universal, nossa proposta foi fazer Irmãos gêmeos sem cachê. De graça.

– Garanto que, graças a Ivan e Danny, o filme vai ser um sucesso – falei. – Mas entendo que você me veja como um cara de ação. Eu nunca fiz comédia e sou um elemento desconhecido. Por que assumir o risco? Então não precisa nos pagar nada até termos provado nosso valor.

Em troca, queríamos uma participação no filme: uma porcentagem do lucro com bilheterias, venda e aluguel de VHS, exibições em aviões e assim por diante. Em Hollywood, isso é conhecido como back end.

Tom estava tão convencido de que o filme seria um sucesso que falou:

– Prefiro pagar o cachê.

A essa altura, porém, Ivan, Danny e eu já estávamos muito apegados à nossa ideia.

– Não queremos receber cachê – falamos. – Nenhum de nós precisa de dinheiro. Vamos dividir os riscos.

O acordo que acabou sendo fechado garantia a nós três 37,5% de todo o lucro do filme. E essa porcentagem era líquida – não estava sujeita aos descontos ou aos truques dissimulados que fazem a fama da contabilidade cinematográfica. Dividimos esses 37,5% proporcionalmente, com base no que cada um de nós tinha ganhado em seu último filme. Como o meu cachê por O sobrevivente fora muito alto, acabei ficando com a parte mais gorda, quase 20%. Assim, a conta era simples: se Irmãos gêmeos fosse um sucesso razoável e arrecadasse, digamos, 50 milhões de dólares, eu embolsaria praticamente 10 milhões.

Tom Pollock sabia muito bem quanto esse contrato poderia ser generoso para nós. No entanto, não queria que procurássemos outro estúdio e recebêssemos uma proposta melhor. Além do mais, se nós ganhássemos dinheiro, a Universal também lucraria bastante. Ele encarou a situação toda com muito bom humor. Depois que fechamos o acordo em sua sala, levantou-se e, com um gesto exagerado, virou do avesso os bolsos da calça:

– Pronto, agora só me falta ficar de quatro – falou. – Vamos lá. Podem levar tudo o que eu tenho e me enrabar! – Essa se tornou uma daquelas frases lendárias dos executivos de Hollywood. Caímos todos na risada. Então ele concluiu: – Acho um bom acordo. Vamos assinar.

Eu nunca tinha pensado que fazer cinema pudesse ser tão divertido quando não se está coberto de lama gelada na selva ou levando uma surra de cobras mecânicas. Irmãos gêmeos foi filmado em Los Angeles, no Novo México e no Oregon durante os primeiros meses de 1988. Pude fazer coisas diante das câmeras que jamais fizera antes. Dancei valsa. Cantei. Encarnei um virgem de 35 anos seduzido por uma linda moça (interpretada por Kelly Preston, esposa de John Travolta, com quem foi ótimo trabalhar). Entrei em contato com o que Ivan chamava de meu “lado inocente”.

Danny DeVito era o Milton Berle da interpretação cômica. Ele nunca tentava inserir frases engraçadas no texto, nunca dependia de uma piada para criar humor – essas coisas não funcionam diante das câmeras. Em vez disso, ele criava situações engraçadas a partir das circunstâncias. Seu modo de usar a voz e os olhos e a forma como ele movia o corpo eram muito inteligentes. Danny sabia exatamente o que funcionava no seu caso, o que as pessoas adoravam nele e o que iria convencer. Sabia muito bem até que ponto podia levar o diálogo, e todos nós vivíamos trocando ideias com os roteiristas o tempo todo a respeito de cenas e falas, em um processo constante de aprimoramento. Além disso, Danny era um ótimo parceiro de set! Fumava charutos. Preparava massa para todo mundo uma vez por semana, às vezes até duas vezes. Fazia um café expresso delicioso e estava sempre pronto para nos oferecer um licor italiano e nos preparar drinques deliciosos depois do almoço ou do jantar.

Desde o início, a química entre nós dois funcionou muito bem. No papel do dissimulado Vincent, ele vivia tentando me enrolar. Já havia enganado muita gente e agora estava tentando passar a perna em mim. Como Julius, eu era um alvo fácil, mas ao mesmo tempo tinha inteligência suficiente para entender a situação e fazer algo a respeito. Bastava interpretar meu personagem exatamente da forma como ele fora escrito: ingênuo, forte, inteligente, culto, sensível, poliglota.

Em comparação com ser um herói de ação, ser um astro da comédia era bem mais fácil. Os ensaios se concentraram em modificar o ritmo do meu comportamento. Tive que me livrar dos olhares severos, das frases duras, do linguajar autoritário e robótico. O tom monocórdico e lento do Exterminador não servia mais. Tive que jogar fora tudo o que aprendera nos filmes de ação para transmitir liderança e comando. Agora era preciso abrandar tudo isso. Precisava pronunciar as palavras com mais suavidade, fazê-las se encaixarem umas nas outras e combiná-las com expressões mais suaves e movimentos de cabeça mais sutis. Logo no início do filme, há uma cena em que um malvado de motocicleta surge por trás de Julius e tenta lhe arrancar a mala da mão. Só que Julius não solta a mala e o cara acaba caindo da moto. Tive que fazer essa cena sem demonstrar nenhuma raiva ou esforço – para Julius, não largar a mala é uma ação lógica, e ele nasceu com uma força tão descomunal que isso não requer o menor esforço de sua parte. Não é minha intenção fazer o cara ter um acidente. Na verdade, eu fico preocupado que ele tenha se machucado e tento ajudá-lo!

A comédia deu certo. Sabíamos que tínhamos um sucesso nas mãos. A ideia de gêmeos totalmente opostos funcionou à perfeição, e as pessoas no set não paravam de dar risadas. Todas as noites, na hora de assistir ao copião, o elenco e a equipe que tinham nos visto fazer quatro, cinco ou até seis tomadas de uma mesma cena tornavam a rir ao vê-la na tela. Filmamos primeiro em Los Angeles, depois nos transferimos para o deserto perto de Santa Fé, no Novo México.

Aonde quer que fôssemos, apareciam pessoas para nos visitar, pois todos ouviam dizer que aquele era um set feliz. Clint Eastwood passou lá no dia em que filmamos a cena em que eu canto. Julius está dentro de um avião, escutando rock em fones de ouvido pela primeira vez na vida. Ele começa a cantar um hit dos The Coasters da década de 1950, “Yakety Yak”, sem perceber que todos os outros passageiros estão ouvindo. Foi a primeira vez que cantei no cinema, e, para se ter uma ideia de como foi, basta dizer que não sou nenhum Frank Sinatra. Depois da cena, Clint comentou com ironia: “Não sabia que você tinha tanto talento.” Na vida real, a única hora que abro a boca para cantar é no final de uma festa, se quiser enxotar os convidados.


UMA DAS PIADAS CONSTANTES NO SET ERA: “Nunca fale sobre política com Arnold.” Não que isso me chateasse, mas, se alguém me perguntasse alguma coisa, eu fazia uma verdadeira preleção para tentar vender a candidatura do vice-presidente George H. W. Bush. Era época das primárias presidenciais, e Bush concorria à vaga de candidato republicano à sucessão de Ronald Reagan contra o senador Bob Dole, do Kansas, e o pastor evangélico Pat Robertson. Os outros integrantes do elenco de Irmãos gêmeos eram todos democratas, e a brincadeira era que, se eu começasse a falar, eles ficariam chateados comigo, o que prejudicaria o astral do set.

De fato, aconteceu algo durante as filmagens que estragou meu astral, embora não tenha tido nada a ver com o filme nem com a política dos Estados Unidos. Em fevereiro, o tabloide londrino News of the World publicou uma matéria de capa a meu respeito intitulada “Segredo nazista do astro de Hollywood”.

A história atacava a mim, mas o foco era meu pai. O jornal alegava que ele tinha sido nazista e membro da SS e que perseguira e mandara para campos de concentração homossexuais e judeus. A matéria me chamava de “admirador secreto” de Hitler e afirmava que eu era integrante do movimento neonazista e tinha “fervorosas opiniões nazistas e antissemitas”.

Em geral eu simplesmente ignorava as críticas, mas nunca fora acusado de algo tão sério. Sabia que teria que reagir. Depois de conversar com meus advogados e relações-públicas, minha primeira providência foi ligar para Rupert Murdoch, dono do tabloide, que eu já conhecia de Aspen. Expliquei que a história era mentira e ele me ouviu.

– Gostaria que você não publicasse essa matéria nos Estados Unidos – falei. – E gostaria também que o jornal publicasse um pedido de desculpas e dissesse que a matéria foi um erro, que vocês receberam informações equivocadas. Aí podemos esquecer essa história. Erros acontecem.

– Bom – respondeu Murdoch –, o meu pessoal lá de Londres disse que fez uma investigação muito minuciosa. Se a história for verdade, não acho que ninguém precise se desculpar. De toda forma, posso prometer não publicar a matéria nos Estados Unidos.

– Não estou culpando você por cada matéria publicada em todos os seus jornais e outros veículos – enfatizei. – Mas quero chamar sua atenção para o fato de que essa reportagem é uma injustiça. Por favor, apure os fatos.

Rupert cumpriu o prometido: não publicou a matéria em veículos americanos nem a transmitiu em seu novo canal de televisão, a Fox TV. Nada mais aconteceu, porém. Enquanto meus advogados enviavam uma carta formal exigindo uma retratação do tabloide e se preparavam para processá-lo, outros jornalistas começaram a tentar me entrevistar.

Fiquei em uma posição muito desconfortável. Sabia que as informações da matéria sobre mim eram falsas, mas e as acusações contra meu pai? Achava que estavam erradas, mas como podia ter certeza? Nós falávamos tão pouco sobre a Segunda Guerra Mundial em casa... Eu realmente não tinha a menor ideia.

Sendo assim, resolvi ligar para Marvin Hier, meu amigo rabino do Simon Wiesenthal Center.

– Preciso da sua ajuda – falei. – Sei que você tem um sistema para rastrear crimes de guerra. Será que poderia verificar o histórico do meu pai durante o conflito? Quero saber se ele algum dia foi nazista. Em segundo lugar, se integrou a SS. Qual era sua responsabilidade durante a guerra? Ele cometeu algum crime de guerra, ativo ou passivo? Fez alguma dessas coisas que estão dizendo?

– Vou ter todas essas informações daqui a uma ou duas semanas, Arnold, porque temos acesso a todos os documentos – respondeu Hier.

Ele telefonou para seus contatos na Alemanha e talvez tenha ligado até para Viena e falado pessoalmente com o grande caçador de nazistas Simon Wiesenthal, que eu viria a conhecer mais tarde. Três ou quatro semanas depois, tornou a me procurar com as informações:

– Seu pai teve carteira de membro do Partido Nazista – falou –, mas não há provas de que tenha cometido nenhum assassinato ou crime de guerra, seja contra homossexuais, judeus ou qualquer outro indivíduo. Ele era sargento, então não tinha autoridade para ordenar esse tipo de ação sem o aval de um oficial. Não há qualquer indicação de que uma ordem assim tenha alguma vez sido dada.

O Simon Wiesenthal Center me enviou essas informações oficialmente, para que pudessem ser usadas na justiça.

Quanto às alegações do News of the World contra mim, o próprio Simon escreveu uma carta para o tribunal afirmando não haver prova nenhuma que sustentasse tais afirmações. Esses documentos, somados à incapacidade do tabloide de produzir fatos que corroborassem a matéria, deixaram bem claro que a fonte das informações não era fidedigna. Foi necessário um processo de muitos meses, mas o tabloide acabou publicando uma retratação integral e me pagando uma indenização significativa por danos morais em um acordo fora dos tribunais. O dinheiro foi doado à Special Olympics da Grã-Bretanha.

As filmagens de Irmãos gêmeos foram concluídas logo antes da Páscoa de 1988, no meio das primárias presidenciais. O vice-presidente Bush vinha enfrentando uma árdua batalha. Embora tivesse o apoio de Reagan, perdera algumas das primárias iniciais para Bob Dole. Isso porque muita gente considerava Bush uma sombra de Reagan – os austríacos o teriam qualificado como Waschlappen, ou pano de prato. Eu conhecia o vice-presidente das visitas que fizera à Casa Branca. Ele sempre havia se mostrado muito educado, um homem realmente íntegro, e tinha experiência graças aos cargos importantes que já ocupara, como o de embaixador na ONU e diretor da CIA. Ao contrário do retrato que os democratas pintavam dele, Bush tinha um caráter forte e uma enorme força de vontade. Como todos sabem, porém, campanhas políticas são injustas. O que se faz é procurar as vulnerabilidades do oponente, alguma falha que se possa vender aos eleitores. Os democratas sabiam muito bem que Bush estava cumprindo as obrigações de seu cargo de vice-presidente exatamente como mandava a Constituição: apoiando o presidente e se mantendo à disposição para substituí-lo se fosse preciso. No entanto, eles ganharam terreno no início da campanha tachando-o de fraco. Bush revidou e, quando terminamos de filmar, ele se saíra bem na Superterça – quando um grande número de estados realiza eleições primárias e é eleita a maioria dos delegados – e estava com a candidatura garantida.

Acompanhei a campanha presidencial desse ano com grande interesse e fiquei feliz ao ser convidado para participar, em agosto, da Convenção Nacional Republicana, em Nova Orleans. Minha missão era contribuir com meu poder de celebridade em um dos grupos “Caucus” – um dos dois mecanismos, dentro de cada partido, para escolher os candidatos à presidência que o representarão na eleição – compostos por membros do governo Reagan e partidários de Bush, cuja tarefa era agradar às delegações estaduais e convencê-las a aprovar sua posição em relação a questões importantes.

Eu já havia participado de convenções republicanas, mas essa seria a primeira vez desde que me casara com uma Shriver. Maria e eu achávamos que deveríamos continuar a fazer o que sempre tínhamos feito: ela participaria da convenção democrata e de reuniões em prol de todas as causas nas quais acreditasse, além de cobrir os republicanos como jornalista, enquanto eu tomaria parte na convenção republicana. No entanto, tínhamos que tomar cuidado para evitar controvérsias desnecessárias. Tudo correu bem em Nova Orleans até meu amigo e companheiro de tiro esportivo Tony Makris, guru de relações públicas da National Rifle Association (Associação Nacional de Rifles), comentar que a organização ofereceria um brunch em homenagem ao senador texano Phil Gramm. Será que eu por acaso gostaria de dar uma passadinha lá? Na época, já conhecia Gramm bastante bem. Quando cheguei ao evento, na manhã seguinte, outras celebridades também estavam presentes, mas foi à minha volta que os jornalistas se reuniram. Após dois trágicos assassinatos políticos, os Kennedy eram ferrenhos opositores das armas de fogo – o que eu estava fazendo em um evento da NRA? Tal fato jamais me ocorrera. Caso contrário, eu teria tido a sensibilidade de não comparecer. Os repórteres também perguntaram se, como membro da família Kennedy por casamento, eu apoiava a NRA. Qual era minha posição em relação às armas automáticas? E às armas pessoais de baixo custo? E aos fuzis de precisão? E às balas que matavam policiais? Eu não soube como reagir. Era membro da NRA porque acreditava no direito constitucional de portar armas, mas nunca tinha pensado em todas essas questões e em todos esses detalhes. Questionaram até o próprio fato de eu participar da Convenção Nacional Republicana de 1988: seria algum tipo de atitude para desafiar os Kennedy? A verdade era que nenhum dos membros da família ligava para aquilo, em especial Sargent e Eunice, que dependiam do apoio de ambos os partidos para sustentar seus programas e que costumavam convidar formuladores de políticas do Partido Republicano para frequentar sua casa. Percebi, porém, que a NRA era uma questão mais espinhosa, então fui embora do brunch antes mesmo de os oradores começarem a falar. Estava só dando uma passadinha e não queria que minha presença ali se transformasse no assunto principal. Estava na convenção para apoiar George Bush, e era sobre isso que desejava que escrevessem, não sobre armas.

Tive que reavaliar minha posição. A onda de atenção e publicidade relacionada à família de Maria ainda era algo com que estava me acostumando. Aquela fora a primeira vez em que realmente me sentira atingido. Aquilo era ao mesmo tempo uma bênção e um transtorno, algo muito mais intenso que a exposição que em geral acompanha o estrelato. Continuei participando da convenção republicana, mas não fui às reuniões do meu grupo Caucus com as delegações individuais de cada estado.

No outono, a disputa entre George Bush e o candidato democrata, Michael Dukakis, governador de Massachusetts, acabou se resumindo à questão sobre se os americanos aprovavam ou não o caminho seguido por Reagan. Logo antes do pleito, o próprio vice-presidente me convidou para fazer campanha com ele e apresentá-lo em alguns comícios. Nas pesquisas, Bush tinha agora uma vantagem decisiva sobre Dukakis – cerca de 55% contra 38%, com 4% de indecisos –, de modo que meu trabalho seria apenas ajudar a atrair mais gente e manter essa tendência. Mesmo assim, agarrei a oportunidade – não iria recusar uma viagem no avião do vice-presidente!

Visitamos Ohio, Illinois e Nova Jersey alguns dias antes da eleição. Peggy Noonan, a brilhante redatora responsável por vários dos discursos de Reagan, estava no avião para ajudar na reta final da campanha. Ela também era autora do eloquente discurso de agradecimento feito por Bush em Nova Orleans. Adorei o trecho em que Bush falava sobre quem deveria suceder o presidente Reagan: “Em 1940, quando eu não era mais que um menino, Franklin Roosevelt disse que não se deve trocar de cavalo no meio da travessia. Amigos, o mundo hoje se move ainda mais depressa, e agora, após dois grandes mandatos, uma mudança se aproxima. Quando é preciso trocar de cavalo no meio da travessia, não é melhor escolher um que esteja indo na mesma direção do anterior?” Foi também nesse discurso que Bush disse aos eleitores: “Prestem atenção ao que vou dizer. Não vai haver novos impostos.” Essa promessa viria a prejudicá-lo mais tarde, mas foram palavras fortes mesmo assim. Um dia depois desse discurso, ele disparou nas pesquisas. Havia demonstrado poder de liderança e parecia determinado. Ficou claro nos Estados Unidos que aquele seria nosso próximo presidente.

A primeira parada de nossa viagem foi em Columbus, onde meu amigo e sócio Jim Lorimer organizou um comício de 5 mil pessoas na grande esplanada vizinha à sede de sua seguradora, a Nationwide Insurance. Era um dia perfeito para discursos, ensolarado e fresco, e a empresa liberou os funcionários para garantir que a esplanada ficasse lotada. Além da fala do vice-presidente, Peggy Noonan também havia escrito a minha. Dava para ver que ela se divertira usando minha imagem de herói de ação. Apresentei Bush como “o verdadeiro herói americano”. “Eu sou um patriota americano”, falei para o público. “Vi Ronald Reagan e George Bush pegarem uma economia pequena e franzina e a transformarem em um super-herói.” Então acabei com o governador Dukakis usando uma frase que todos os veículos de comunicação repetiram depois: “Eu só sou o Exterminador nos meus filmes. Mas vou dizer uma coisa: em relação ao futuro dos Estados Unidos, o verdadeiro exterminador será Michael Dukakis.” Bush adorou o discurso e me batizou de Conan, o republicano.

Durante as viagens de uma cidade a outra a bordo do avião vice-presidencial, relaxamos e descansamos um pouco. Falamos sobre suas estratégias para a eleição, os discursos de Bush, se alguma vez ele já tinha esquecido para que cidade estava indo e se gostava de fazer campanha. Bush tinha uma atitude bem tranquila em relação ao caminho a ser percorrido – nem tudo precisava estar perfeitamente organizado.

Nossa conversa também abordou um interesse específico meu. Em 1980, no início do governo Reagan, eu recusara um convite para participar do President’s Council on Physical Fitness and Sports (Conselho Presidencial de Boa Forma Física e Esportes). Tratava-se de um grupo consultivo de 24 membros que, apesar do título pomposo, não fazia mais parte da Casa Branca. Sua origem tinha sido uma iniciativa do presidente Eisenhower para promover a boa forma física que fora bastante importante no auge da Guerra Fria – tanto ele quanto seu sucessor, John Kennedy, defendiam que os americanos deveriam estar em boas condições físicas para que pudessem proteger os Estados Unidos da ameaça soviética. Eu gostava especialmente das histórias sobre o que Kennedy tinha feito para incentivar o preparo físico e os esportes. Como presidente eleito, ele começara publicando um ensaio na revista Sports Illustrated intitulado “O americano flácido”, que havia chamado bastante atenção. Já na Casa Branca, desencavara um decreto de Teddy Roosevelt que incitava os fuzileiros navais americanos a completarem uma caminhada de 80 quilômetros em 24 horas. JFK, então, fez a mesma proposta à sua equipe da Casa Branca. Competitivo como todo Kennedy, Bobby aceitou o desafio e atraiu a atenção nacional ao percorrer essa distância calçado com seus sapatos Oxford de couro. O feito inaugurou uma febre nacional de caminhadas de 80 quilômetros e ajudou a lançar vários programas estaduais e locais em prol da boa forma – muitas vezes promovidos e coordenados pelo President’s Council.

Durante o conflito no Vietnã, porém, o assunto saiu de cena. O conselho tornou-se um apêndice da burocracia do Departamento de Saúde, Educação e Bem-Estar e assim permaneceu por duas décadas. Manteve certo prestígio – foi presidido durante um bom tempo pelo astronauta Jim Lovell, bem como por George Allen, lendário treinador da Liga Nacional de Futebol Americano –, mas nunca chegou a realizar muita coisa. Quando o presidente do país convidava a delegação olímpica americana ou os campeões do World Series de beisebol para ir à Casa Branca, por exemplo, o President’s Council não era sequer notificado. Foi por isso que recusei o convite em 1980: não queria fazer parte de uma organização moribunda. Então, quase 10 anos depois, senti que talvez fosse possível reverter a situação.

“É uma grande oportunidade”, falei para Bush.

Expliquei como seria ótimo para a Casa Branca reafirmar sua liderança no campo da saúde e da boa forma, tornando a insistir sobretudo na ideia de que o bom preparo físico é importante para toda a população, não apenas para os atletas.

– E os outros 99,9% de pessoas que nunca saem de casa para praticar esportes? – assinalei. – Quem está prestando atenção nas crianças acima do peso? Esses meninos e meninas jamais serão selecionados para uma partida de futebol americano, uma equipe de tênis, natação, vôlei ou polo aquático. E o garoto magrelo de óculos fundo de garrafa? Quem está prestando atenção nele? Várias escolas têm ótimos programas de esportes, mas nenhum programa de boa forma – prossegui. – O que podemos fazer pela maioria das crianças que nunca se interessaram por esportes? E pelos adultos que estão fora de forma, ou que talvez nunca estiveram em forma? Foi bom JFK ter dado ênfase aos esportes competitivos para inspirar as pessoas. Foi ótimo Lyndon Johnson ter criado o President’s Council on Physical Fitness and Sports. Agora, porém, precisamos tirar o foco das modalidades competitivas, direcioná-lo para a boa forma física acessível a todos e garantir que a população inteira participe.

Eu sabia que George Bush gostava de esportes e que cuidava bastante do corpo.

– É uma ideia brilhante, se você tiver tempo para dedicar ao assunto – disse ele. – Não vai ser algo do dia para a noite. Se for para fazer alguma coisa, é melhor fazer direito.

De Columbus fomos para Chicago, onde o vice-presidente fez um comício em uma escola de ensino médio. Na volta para o aeroporto, ele reparou em um estabelecimento chamado Three Brothers Coffee Shop e disse: “Veja só, um restaurante grego. Vamos parar.” Então todos os carros da comitiva encostaram e entramos. Bush se comportou de forma bem casual: entrou no restaurante, experimentou todos os pratos, conversou com clientes, garçons e funcionários da cozinha – achei aquilo maravilhoso. Ao recordar o ocorrido mais tarde foi que me dei conta: “Arnold, sua besta, ele está concorrendo com um cara chamado Dukakis. É claro que iria querer parar em um restaurante grego!”

Foi um privilégio poder observar tão de perto uma campanha presidencial, sobretudo apenas 15 dias antes da eleição. Eu nunca havia participado sequer de uma eleição para prefeito, mas agora estava vendo o que o candidato a presidente fazia no avião, quanto tempo dormia, como se preparava para os discursos, como estudava cada questão, como se comunicava e como fazia tudo isso parecer tão natural. Fiquei impressionado ao ver como Bush tinha facilidade para se relacionar, como posava para fotos, conversava com todo mundo e sempre sabia a coisa certa a dizer. E também como conseguia estar sempre bem-disposto para tudo isso. No avião, ele invariavelmente tirava um cochilo de 45 minutos. Como Jimmy Carter certa vez comentou, políticos são especialistas em cochilos. Depois era preciso acordar e se inteirar com rapidez das próximas atividades. A equipe o preparava para que ele tivesse algumas informações sobre o local. Doro, sua filha, sempre o acompanhava para lhe dar apoio moral.

A intensidade era totalmente diferente da de um set de cinema, porque os meios de comunicação estão presentes aonde quer que se vá. Não há espaço para erros. Cada palavra equivocada, cada gesto minimamente estranho são vistos e ampliados até se transformarem em algo imenso. Bush lidava com tudo isso de forma natural.

Já perto do Dia de Ação de Graças, enquanto os republicanos saboreavam a vitória de Bush, nós nos preparávamos para lançar Irmãos gêmeos. Eu nunca vira um diretor refinar os detalhes de um filme de maneira tão metódica quanto Ivan Reitman. Ele assistia a sessões de teste, conversava com a plateia e decidia mudar a música-tema ou encurtar determinada cena e exibia o filme outra vez. Então a nota crucial “desejo de assistir” subia dois pontos. Depois ele fazia outra alteração e o número aumentava mais um ponto. Conseguimos fazer a nota do filme subir de 88 para 93, o que, segundo Ivan, era mais alto até do que Os caça-fantasmas.

A estreia foi uma convergência muito mais feliz de todos os meus mundos do que a convenção republicana tinha sido. Eunice e Sarge organizaram um grande evento beneficente no John F. Kennedy Center for the Performing Arts, em Washington, centro de artes onde a exibição de Irmãos gêmeos iria coroar um festival para promover a Special Olympics. O presidente recém-eleito Bush compareceu com a esposa, Barbara, e também estiveram presentes Teddy Kennedy, o deputado de Massachusetts Joe Kennedy II e outros integrantes dos clãs Kennedy e Shriver. A jornalista e apresentadora de TV Barbara Walters e a âncora de TV Connie Chung marcaram presença, bem como os magnatas Armand Hammer e Donald Trump. Um congestionamento de limusines se formou em frente ao centro, acompanhado por dezenas de equipes de filmagem e centenas de fãs.

Uma demonstração de ginástica e levantamento de peso de atletas da Special Olympics abriu o evento. Bush então subiu ao palco e elogiou os atletas por sua determinação antes de se virar para mim. “Há vários tipos de coragem”, afirmou. “Existe a coragem de meu amigo Arnold Schwarzenegger, que mais de uma vez me acompanhou em campanha por este país... depois voltou para casa e aguentou as broncas da família da própria esposa.” A plateia riu.

Na verdade, Eunice e Sarge sempre assistiam aos meus filmes e me ligavam no dia seguinte para dizer o que tinham achado. Por causa das armas e da violência, contudo, nem todos na família Kennedy demonstravam o mesmo entusiasmo. Portanto, Eunice não estava de todo brincando ao dizer: “Finalmente a família inteira pode ir assistir a um dos seus filmes.” Irmãos gêmeos foi a comédia de maior sucesso da temporada, o que naturalmente me deixou muito feliz, já que era meu primeiro lançamento de Natal e superara todas as expectativas. O fim de semana de estreia, em meados de dezembro, foi ótimo, e daí em diante o sucesso continuou. Em todos os dias entre o Natal e o ano-novo nossa bilheteria chegou a 3 milhões de dólares – ou seja, mais de meio milhão de ingressos eram vendidos por dia. Foi um final feliz para todos os que haviam se arriscado no projeto. Ivan continuou a produzir e dirigir comédias de sucesso, incluindo Um tira no jardim de infância e Júnior, estrelados por mim. Danny DeVito seguiu expandindo seu talento excepcional: dirigiu filmes como A guerra dos Roses e produziu outros, como Pulp Fiction e O nome do jogo. Para a Universal, Irmãos gêmeos fechou com chave de ouro um ano de cinco ou seis sucessos – e Tom Pollock, depois que se aposentou, tornou-se o principal executivo da produtora de Ivan Reitman.

Hollywood é a meca das imitações. Bastou que eu trabalhasse em uma comédia para todos começarem a me mandar roteiros desse tipo, além dos habituais projetos de filme de ação. Mais importante ainda: graças ao nosso contrato inédito com a Universal, acabei ganhando mais dinheiro com Irmãos gêmeos do que com qualquer de meus filmes da série O exterminador do futuro. Os estúdios não demoraram muito a impor limites. Hoje em dia, ninguém consegue sequer chegar perto de um acordo tão aberto quanto o que tivemos em Irmãos gêmeos.

Contando as vendas internacionais, os direitos para VHS etc., o filme já rendeu mais de 35 milhões de dólares só para mim – e continua rendendo, porque os DVDs ainda vendem e o filme continua a ser exibido na TV. Há 25 anos venho tentando convencer a Universal a fazer uma continuação. O projeto se chamaria Triplets (Trigêmeos), e Eddie Murphy, uma pessoa que eu adoro e admiro, interpretaria nosso desconhecido irmão mais velho. Recentemente, no Polo Lounge do hotel Beverly Hills, concordamos em acelerar as negociações e Triplets está agora encaminhado.


CONFORME MEU SUCESSO AUMENTAVA, Sarge me instigava a fazer mais pelo bem público. “Arnold”, dizia ele, “seus filmes e sua carreira de ator são ótimos. Mas me diga uma coisa: quantas vezes mais você quer fazer perseguições de carro?” Ele não sabia nada sobre o ramo do entretenimento. Em 1978, na estreia de Superman: O Filme, Sarge e Eunice organizaram um evento beneficente para a Special Olympics em uma grande tenda montada em sua casa. Sentado à mesa ao lado de Sarge estava ninguém menos que o Superman em pessoa, Christopher Reeve.

– O que você faz? – perguntou-lhe Sarge.

– Estou no filme. Interpreto o Superman.

– Que fantástico! O Superman! – exclamou meu sogro. – Mas sabe de uma coisa? Acho que ter super-homens na vida real é mais interessante.

Parte dele queria ser diplomático e respeitoso, mas outra parte não conseguia entender como alguém era capaz de gastar tantas horas usando fantasia e maquiagem. Sarge nunca lia o caderno de entretenimento dos jornais.

“Quantas pessoas você ajuda quando aparece bonito em um set?”, perguntava-me ele. Ficava implicando comigo sobre como eu ficara impressionado com James Earl Jones durante as filmagens de Conan. “Você me disse que Jones estava no meio de um monólogo e esqueceu a fala, e contou como ele foi profissional, como manteve a pose e disse: ‘A fala, pessoal, sopre a fala para mim.’ E a fala seguinte era: ‘Eu sou a fonte da qual você brota’, e então ele disse: ‘Ah, sim... Eu sou a fonte da qual você brota.’”

E continuou: “O que é importante para você, afinal? Ser capaz de ficar paralisado no meio de uma cena e esperar que alguém lhe diga a próxima fala? Não seria muito melhor viajar pela África e ensinar as pessoas a cavar poços e cultivar vegetais, ou inspirá-las a plantar?”

Eram dois mundos em colisão, mas eu não discordava totalmente dele. Atuar tinha suas limitações em matéria de realização genuína. Mesmo assim, eu sentia que Sarge estava jogando sujo. Eu estava apenas tentando explicar por que admirava James Earl Jones. Um ano depois, pude dar o troco. Após voltar a exercer a advocacia, meu sogro estava me contando sobre uma viagem com Armand Hammer para fechar negócios no ramo petrolífero na Rússia. Falou de uma noite em que havia saído com especialistas locais.

– Você não imagina como a vodca deles é boa – disse Sarge.

– É isso que você admira de verdade? – indaguei. – É isso que importa na sua vida? Beber a melhor vodca?

– Não, não, não! Nós fechamos um negócio importantíssimo!

– Estou só brincando. Você se lembra da vez em que me perguntou, referindo-se à carreira de ator, se o que importava para mim era ser capaz de ficar totalmente imóvel no meio de uma cena e esperar que alguém me dissesse a próxima fala?

– Está bem, entendi – admitiu Sarge.

O trabalho social era parte importante da conversa na casa de meus sogros. “Arnold, você tem uma personalidade tão incrível”, comentavam eles. “Imagine usar tudo o que Deus lhe deu para estender a mão e incentivar os outros: atletas da Special Olympics, sem-teto, pessoas doentes, veteranos das Forças Armadas... Não faz a menor diferença a causa que você escolher. Com sua energia e sua fama, poderia dar um imenso destaque a qualquer coisa.”

Eu já havia embarcado em uma cruzada mundo afora para promover a saúde e a boa forma física entre os jovens. Eu me engajara ainda mais com a Special Olympics: agora era o treinador nacional de musculação dos Estados Unidos, dando seminários e fazendo aparições frequentes por todo o país. Com minha popularidade crescente de astro de cinema, estava pronto para assumir outros compromissos.

“O que mais posso fazer?”, perguntei a meus sogros. Eles tiveram várias ideias. Eunice era uma fonte constante de inspiração. A meu ver, as realizações dela eram mais importantes que o trabalho da maioria dos prefeitos, governadores, senadores, até mesmo presidentes. Ela não apenas expandira a Special Olympics para mais de 175 nações como também conseguira mudar o pensamento das pessoas no mundo inteiro. Muitos países consideravam os deficientes mentais um estorvo para a sociedade ou um perigo para si mesmos, indivíduos que deviam ser tratados como párias ou que precisavam ser isolados em instituições especializadas. Eunice usou seu sobrenome e sua influência para libertar esses indivíduos, permitindo-lhes ter vidas normais e os mesmos benefícios sociais dos outros cidadãos. O desafio fora grande, pois os governantes não gostavam de ouvir que estavam fazendo algo errado. Ficavam constrangidos quando Eunice Kennedy Shriver aparecia para colocar em evidência as organizações onde os deficientes mentais ficavam trancafiados. Um a um, porém, os países foram mudando de opinião – até mesmo a China, que em 2007 acabou superando séculos de preconceito social e sediando os Jogos Mundiais Olímpicos Especiais. Foi a maior edição da história do movimento. Oitenta mil pessoas lotaram o estádio na cerimônia de abertura e até o presidente chinês compareceu. Também participei do evento como chefe da delegação americana.

Após a eleição de 1988, eu mandara um recado para o presidente Bush reiterando meu interesse no President’s Council on Physical Fitness and Sports. Disse que esperava que ele considerasse o meu nome quando pensasse em outros cargos após montar sua equipe ministerial. Se precisasse de opiniões em relação ao conselho de boa forma, seria um prazer poder compartilhar minha visão. Naturalmente, a equipe de Bush conhecia minha paixão por promover a saúde e a boa forma entre os jovens. Eunice mandou uma carta me recomendando para o cargo e assinalando que eu era “o astro número um” dos Estados Unidos. O presidente respondeu agradecendo por ela ter “recomendado nosso Conan”.

Por ora, contudo, minha sogra estava bem mais concentrada na produção de netos. Eunice ficou muito preocupada quando Maria e eu decidimos não ter filhos imediatamente. Já estávamos casados havia mais de três anos e ela vivia perguntando à filha: “Por que vocês não têm filhos?” Maria sempre respondia: “Eu tenho meu trabalho, ainda não é o momento. E Arnold está ocupado demais. Ele passa o tempo todo no set”, e outras coisas do tipo. Esses obstáculos eram reais. Maria havia se tornado uma das principais personalidades da NBC News. Além de ser âncora do Sunday Today e do Main Street, premiado programa mensal para jovens, ela também apresentava o noticiário do fim de semana e era substituta regular de Tom Brokaw no NBC Nightly News e em outros telejornais. Todos esses programas tinham sede em Nova York. No verão de 1988, Maria recebera um Emmy como coâncora pela cobertura da NBC dos Jogos Olímpicos de Seul, na Coreia. Ganhava bem mais de 1 milhão de dólares por ano e viajava o tempo todo – essas não eram exatamente as circunstâncias ideais para que se tornasse mãe.

Eunice, porém, pensava: “Não, deve haver outro motivo. Talvez eles estejam com dificuldade para engravidar.” Então começou a pesquisar sobre os efeitos dos esteroides anabolizantes na reprodução masculina. Jamais comentou comigo a respeito, mas mandou para Maria um relatório científico de cinco páginas assinado por um dos médicos ligados à Special Olympics. Pude imaginar exatamente como isso acontecera. Eunice havia feito o que sempre fazia, que era chegar ao escritório e dizer: “Arrumem um especialista para me ajudar com essa questão”, ou “Arrumem alguém para escrever este discurso”, ou ainda “Liguem para a Casa Branca e passem para mim”.

Era um relatório bem completo, escrito especialmente para Maria. O texto explicava que, se você tem uma vida sexual ativa e está tentando engravidar mas não consegue, há muitas razões possíveis, e uma delas pode ser o fato de seu marido ter usado ou abusado de anabolizantes. Seguia-se uma explicação médica dos fatos.

Vi o documento em cima da mesa de Maria por acaso, li e quase morri de tanto rir.

– Sua mãe está fora de controle – comentei.

– É, eu sei – respondeu Maria. Ela também estava rindo. – Dá para acreditar num troço desses? Preciso acalmá-la.

Era típico de Eunice tentar se intrometer na situação. Eu costumava brincar que ela queria ter dormido na cama entre nós dois durante a lua de mel para supervisionar os acontecimentos. Na família Kennedy, isso não era exatamente um exagero: segundo a lenda, quando Eunice e Sarge foram para a França em viagem de núpcias, chegaram ao hotel e depararam com Teddy no saguão. Joe o mandara até lá para lhes servir de acompanhante.

Tirando isso tudo, porém, Maria estava de fato ouvindo o chamado do relógio biológico. Acabara de completar 33 anos, um ano a mais que Eunice quando ela e Sarge tinham tido seu primeiro filho. Em 1989, portanto, decidimos nos apressar e Maria engravidou de Katherine.

Nessa primavera, eu estava outra vez vivendo um herói de ação nas filmagens de O vingador do futuro, mas a paternidade nunca me saía por completo da cabeça. Certo dia, quando estava folheando roteiros no trailer, encontrei uma versão preliminar de Um tira no jardim de infância. Não consegui largar o texto – a ideia de um policial durão obrigado a se fazer passar por um professor de jardim de infância me fez morrer de rir. Em Hollywood, as pessoas sempre diziam: “Nunca trabalhe com crianças ou com animais. É muito difícil atuar com eles, e costumam ser tão fofos na tela que acabam roubando a cena.” Eu já tivera a experiência com animais no papel de Conan e correra tudo bem. Mas fazia muitos anos que estava interessado em fazer um filme com crianças, e a perspectiva de ser pai me inspirou. Pensei: “Ótimo! Que as crianças roubem a cena! O importante é o produto final fazer sucesso.” Liguei para me certificar de que o roteiro estava mesmo disponível. Então perguntei a Ivan Reitman se ele aceitaria tornar a me dirigir. Ambos quisemos fazer mudanças no texto para dar mais ênfase ao aspecto social: eu queria acrescentar o tema da boa forma física e ele queria falar sobre lares desfeitos, abuso de menores e vida em família. Mas nós dois concordamos em tocar o projeto. Como Ivan já estava preparando Os caça-fantasmas II para o final de 1989, começamos a planejar Um tira no jardim de infância para o Natal de 1990.

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