CAPÍTULO 26
A volta por cima
NO FINAL DE 2005, FIQUEI FELIZ EM DEIXAR Sacramento para trás e embarcar em um avião para uma missão comercial na China, planejada tempos antes. Eu liderava uma delegação de 75 empresários do estado da Califórnia – entre eles empreendedores do ramo da tecnologia, plantadores de morangos, engenheiros da construção civil e comerciantes –, e passamos seis dias viajando pela economia de crescimento mais veloz do mundo para promover os pontos fortes de nosso estado. Para mim foi uma viagem importante, não apenas por me proporcionar uma mudança de cenário bem-vinda após a derrota no pleito especial, mas também porque observar a China transformando a si mesma me ajudou a ver a situação com mais clareza. A escala de construção dos chineses era enorme. Tive a sensação de estar testemunhando uma potência moderna tomar forma diante dos meus olhos e pude sentir o desafio e a oportunidade que isso representava para os americanos. Além disso, é claro, para um vendedor como eu, era uma alegria estar de volta à ativa vendendo produtos californianos na Ásia. Essa missão comercial proporcionou ao estado um belo sucesso simbólico. Pela primeira vez, pudemos exportar legalmente morangos californianos para Pequim, bem a tempo dos Jogos Olímpicos de 2008 na cidade.
Quando voltei à Califórnia, meus problemas de gabinete assumiram o primeiro plano. Era uma época difícil para se fazer mudanças importantes, pois faltava menos de um ano para a eleição de governador. Mesmo assim, era preciso operá-las. Eu agora entendia bem mais sobre a política estadual e conhecia mais gente importante. Não precisava apenas de pessoas inteligentes e com experiência; precisava também de uma equipe coesa. Depois do pleito especial, segundo as pesquisas de opinião, apenas 27% dos eleitores achavam que a Califórnia estava indo na direção certa, e meu índice de aprovação era de apenas 38%. Eu também precisava de gente corajosa, que não fosse ficar paralisada por causa desses números e que conseguisse até ver certo humor negro no fato de minha popularidade estar quase tão baixa quanto a do legislativo.
Já sabia quem eu queria como nova chefe de gabinete: Susan P. Kennedy. Como a imprensa logo passou a descrevê-la, Susan era gay, baixinha, durona, loura e fumante de charutos – a escolha menos convencional que eu poderia ter feito. Tinha sido democrata a vida inteira, era ex-ativista a favor do direito ao aborto e fora secretária e vice-chefe de gabinete do governador Gray Davis. O desgosto com a falta de ação no Capitólio Estadual a levara a sair do emprego.
Foi durante o seu período como uma das responsáveis pela Comissão de Serviços Públicos do estado que Susan conquistou o meu respeito. Apesar de ser democrata, ela sempre defendia a supressão de regulamentos que impedissem o crescimento econômico. De vez em quando, fazia circular memorandos com comentários diretos e bem claros sobre os desafios que meu governo precisava enfrentar. Ela estava frustrada, pois achava que corríamos o risco de desperdiçar uma oportunidade histórica de mudança.
Tivemos algumas reuniões preliminares e ofereci o cargo a ela. Antes de aceitar, ela foi falar com Maria e comigo em nossa casa, assim que voltei da China. A conversa abordou vários assuntos, até mesmo as questões que ela teria que enfrentar para conviver com os republicanos do gabinete.
– Farei tudo o que puder para evitar um banho de sangue, pois isso só nos atrasaria e prejudicaria ainda mais a sua imagem – afirmou ela. – Mas você tem que me dar permissão para recomendar toda e qualquer mudança que precise ser feita. E, se houver uma disputa, você terá que me dar seu completo apoio.
– Farei isso. Vamos trabalhar juntos – prometi.
Por fim, fiz a ela a pergunta que sempre se faz ao final de qualquer entrevista de emprego:
– Você tem alguma dúvida?
– Tenho, sim – respondeu ela. – Que legado você quer deixar como governador?
Passei alguns segundos encarando-a antes de responder. Um governador ouve essa dúvida o tempo todo. Além disso, eu sabia que Susan já estava a par das conquistas do meu governo e do que estávamos tentando fazer. Mas achei que aquela mulher pequenina e enérgica talvez quisesse mesmo saber o que mais me importava.
– Eu quero construir – respondi. – Quero ver guindastes por toda parte.
A população de nosso estado estava chegando aos 50 milhões, e ainda não tínhamos as estradas, pontes, escolas, canalizações, os sistemas de comunicação, ferrovias e projetos de geração de energia necessários.
Fiquei bastante animado falando sobre construção, e Susan se deixou contagiar. Quando vimos, estávamos ambos discorrendo exaltados sobre guindastes, trens, rodovias e aço.
– Vi você na TV falando sobre isso quando estava na China! – exclamou ela. – Você disse que deveríamos estar pensando em uma emissão de títulos de 50 a 100 bilhões de dólares... coisa séria. Aí o seu gabinete tentou reduzir esse valor. Bom, eles estavam errados. Quem tinha toda a razão era você!
Foi nessa hora que eu soube que nos daríamos bem. Quando eu começava a discorrer sobre infraestrutura, muitas pessoas reviravam os olhos, mas Susan, não. Ela também achava que o estado não previra estradas, pontes, represas, diques e ferrovias suficientes para acompanhar o crescimento da população e ainda vivia dos investimentos visionários dos governadores das décadas de 1950 e 1960, que haviam construído rodovias e projetos de abastecimento de água e ajudaram a impulsionar a economia do estado. Consequentemente, tínhamos um sistema planejado para uma população de 18 milhões de pessoas, não de 50, que era a projeção populacional para a Califórnia em 2025. Susan não deixaria de investir em projetos que só seriam concluídos muitos anos depois de sairmos do poder.
Em vez de encerrar a reunião, reacendi meu charuto.
– A Califórnia não pode mais continuar assim – comentou Susan.
– Temos que reconstruir em grande escala – falei.
– Mas ninguém pensa assim em Sacramento.
Era verdade. Eu havia aprendido que, para os políticos, tudo era gradativo. Em Sacramento a regra era que não se podia ter uma emissão de títulos públicos superior a 10 bilhões de dólares, porque o eleitorado jamais aprovaria números de dois dígitos. Era por isso que os democratas estavam falando em pedir 9,9 bilhões para aquele ano. Eles então dividiriam o dinheiro entre os diversos grupos de interesse e diriam: “Dois bilhões de dólares para as escolas, dois para as rodovias, dois para as prisões” e assim por diante. O fato de não se poder construir nada com essa quantia não vinha ao caso!
Susan disse que ficava incomodada por ver minha própria equipe minando minhas declarações quando eu mencionava planos grandiosos. Na China, um de meus assessores dissera aos jornalistas: “Não, o governador na realidade não quis dizer 50 ou 100 bilhões. Ele só estava pensando em voz alta.”
Ela acabara de pôr o dedo em uma ferida que vinha me corroendo: quando eu falava sobre o estado que imaginava, muitas vezes sentia que as pessoas reagiam de forma condescendente. Não ser levado a sério era um grave problema. Eu dizia “Quero 1 milhão de telhados solares” e o gabinete reagia como se eu estivesse exagerando para impressionar – como se quisesse dizer apenas 100. Mas era 1 milhão mesmo que eu queria! A Califórnia é um estado gigantesco e eu tinha todos os motivos do mundo para querer 1 milhão de telhados solares.
Minhas ideias eram quase sempre recebidas com comentários de que eu estava exagerando na dose, além de estar tomando a decisão política errada. Até a chegada de Susan, eu não tinha ninguém com quem discutir essas ideias de modo profissional, ninguém para me ajudar a dar forma a elas e aprimorá-las, em vez de simplesmente reduzir seu escopo. Susan gosta de dizer que me considera o maior motor do mundo e que seu trabalho é construir um chassi que suporte o motor operando em velocidade máxima. Finalmente eu tinha uma parceira.
Antes de contratá-la, dei telefonemas suficientes para descobrir qual seria a repercussão de sua chegada. Vi que nada boa. Minha escolha pegou muita gente de surpresa, sobretudo entre meus colegas republicanos. Todos eles sabiam que ela era democrata e ex-ativista. Só não sabiam que era uma democrata fula da vida, ávida por mudanças.
Quando eu informava ter escolhido Susan, a reação costumava ser “Mas você não pode fazer isso!”, ao que eu retrucava: “Posso, sim. É claro que posso. Não só posso como vou.” Tive que explicar algumas vezes que, embora seu sobrenome fosse Kennedy, ela não era membro do clã, e Teddy na realidade não estava assumindo o controle do estado. Algumas pessoas chegaram a falar em convocar o ator Mel Gibson, cujo controverso filme A paixão de Cristo tivera enorme sucesso entre os conservadores religiosos, para desafiar minha candidatura na primária republicana de 2006.
Os dirigentes do Partido Republicano da Califórnia solicitaram uma reunião fechada comigo no hotel Hyatt Regency, situado em frente ao Capitólio do estado, do outro lado da rua, e nela exigiram que eu reconsiderasse minha escolha. Um dos líderes do partido insistiu que os republicanos não iriam trabalhar comigo a menos que eu escolhesse outra pessoa. O recado foi: “Não confiamos em Susan Kennedy e não vamos deixá-la assistir a nossas reuniões estratégicas. Ou seja, você vai ficar totalmente isolado.”
Respondi que, assim como ele precisava tomar decisões como líder do partido, eu também tinha que fazer isso como governador. A escolha do gabinete cabia a mim, não a eles. Além do mais, afirmei estar certo de que os membros republicanos do legislativo iriam cooperar com Susan, porque ela era incrível.
Começamos a trabalhar extraoficialmente pouco antes do Dia de Ação de Graças de 2005. A primeira medida de Susan foi muito astuta. Em vez de iniciar fazendo grandes mudanças no quadro de assistentes, ela se concentrou no objetivo maior: reconstruir o estado. Reuniu os membros seniores da equipe e pediu que coletassem todas as informações que conseguissem encontrar em relação à expansão de rodovias, rede de água tratada, habitação, prisões e sistema de ensino. Perguntou que tipo de Califórnia nós imaginávamos para dali a 20 anos. E quanto esse estado custaria? Alguns acharam a ideia objetiva demais e se opuseram, mas Susan disse apenas: “Entendo seu ponto de vista. Mas vamos suspender a incredulidade e simplesmente fazer planos.”
As respostas chegaram e a conta fechou em 500 bilhões de dólares. Era esse montante que os governos federal, estadual e locais, as parcerias público-privadas e a iniciativa privada precisariam desembolsar para construir a Califórnia de 2025. Meio trilhão de dólares – uma cifra tão estarrecedora, até mesmo para nós, que não podíamos trabalhar com ela. Assim, reduzimos o prazo para 10 anos e pedimos ao gabinete que repetisse o exercício. O número caiu para 222 bilhões, dos quais 68 bilhões em recursos do estado sob a forma de títulos do governo. Mesmo assim, ainda eram números altíssimos. Se a Califórnia tentasse pedir esse dinheiro emprestado para a construção, seria de longe a maior aposta em si mesma que já teria feito. No entanto, bolamos um plano para espaçar o empréstimo ao longo dos 10 anos, transformando-o em uma quantia possível de administrar. Os líderes californianos haviam aberto mão da responsabilidade de planejar investimentos de grande porte, deixando os enormes projetos de infraestrutura aos caprichos de um punhado de grupos de interesse especiais que recolhiam assinaturas e “vendiam” potes de dinheiro em forma de títulos públicos para quem se dispusesse a financiar a campanha em prol de uma votação popular para aprovar as obras. O resultado foi que, ao longo dos anos, os eleitores aprovaram a emissão de dezenas de bilhões de dólares em títulos do governo cuja maior parte foi gasta em projetos de interesse especial, e nada de valor foi construído.
Sou bastante mão-fechada quando se trata de gastar dinheiro dos contribuintes, mas também acredito muito em investir para o futuro. Tive que instruir o legislativo nesse quesito, sobretudo os membros republicanos, que achavam que construção e gastos eram a mesma coisa. Quando você gasta, o dinheiro some. É como escolher entre construir uma casa e comprar um sofá novo. Quando você constrói uma casa, seu investimento rende. Por outro lado, quando compra um sofá, a peça perde valor no minuto em que é retirada da loja. É por isso que sempre digo: casa é investimento; móvel é despesa.
Na verdade, as obras de infraestrutura são uma das três formas de garantir retorno do investimento 100 anos depois. A primeira é construir bens públicos que durem esse tempo. A segunda é utilizar o dinheiro para inventar algo que continuará a ser usado daqui a um século. E a terceira é educar seus filhos e netos para que saibam valorizar o mérito do conhecimento, de modo que eles eduquem seus próprios filhos e netos, e assim por diante. Se tiver sucesso em uma dessas três medidas, você terá investido bem o seu dinheiro. Poderá até ser lembrado por isso.
Imaginar todas as escolas, estradas, os sistemas de transporte, pontes, portos, redes de energia, comunicação e água que 68 bilhões de dólares poderiam viabilizar era o paraíso para mim. Pedi a Susan e aos demais membros do gabinete que desenvolvessem um plano formal. Eu acreditava que os californianos adorariam a ideia de construir para as futuras gerações e sabia que conseguiria vendê-la.
A DECISÃO DE NOS CONCENTRAR IMEDIATAMENTE em um projeto importante dissipou os temores da equipe e ajudou bastante a melhorar o moral. As pessoas mostraram interesse e voltaram ao trabalho. Na realidade, acabamos constatando que sequer era preciso substituir tanta gente quanto pensáramos no início, e no fim das contas contratamos apenas seis novos assistentes seniores. Para meu porta-voz, contratei Adam Mendelsohn, republicano brilhante e criativo que já havia trabalhado com Matt Fong, ex-secretário de Fazenda do estado. Para o cargo de secretário executivo, posto-chave para o dia a dia do gabinete, convidei Dan Dunmoyer, republicano conservador e executivo da área de seguros com larga experiência na esfera estadual. Também contratamos alguns assessores que já tinham trabalhado bem com Susan, e entre eles o mais importante foi Daniel Zingale, democrata especialista em sistemas de saúde e ex-consultor de Gray Davis. A equipe brilhou quase na mesma hora em que foi criada e se tornou a única administração genuinamente bipartidária da história da Califórnia. E todos os seus integrantes tinham uma mesma visão: a minha.
Como a eleição para governador estava próxima, eu também precisava de consultores políticos. Então pedi ajuda a Maria. Encontrar pessoas talentosas é um de seus grandes dons, qualidade herdada do pai. Embora não conhecesse tão bem os grandes destaques da ala republicana, ela trabalhou nos bastidores para recrutar membros influentes que se sentissem à vontade com minhas opiniões muitas vezes não convencionais. Contratamos Steve Schmidt, que ajudara a formular a campanha do segundo mandato de George W. Bush, bem como Matthew Dowd, ex-estrategista-chefe de campanha de George W. Bush. Schmidt mostrou-se bastante insensível em relação às minhas poucas chances de reeleição. Em uma das primeiras reuniões que fizemos para discutir o tema com os membros seniores do gabinete e Maria, ele me disse que as pesquisas mostravam que os eleitores estavam bravos. Não pensavam ter escolhido um governador radical e com certeza não achavam que devessem tomar as decisões no meu lugar. Sua mensagem, porém, tinha um lado bom: as pessoas gostavam de mim. Seu conselho foi:
– Seja humilde, Arnold. Peça desculpas por ter errado e pare de fazer espetáculos políticos como aquele com a bola de demolição.
Quando ele terminou de falar, dei algumas baforadas no meu charuto. Sempre penso em imagens, e precisei de apenas 30 segundos para visualizar quem seria aquele governador. Por fim, disse a ele:
– Sou perfeitamente capaz de interpretar esse papel.
Em 5 de janeiro de 2006, quando subi ao pódio do plenário da Assembleia Legislativa da Califórnia para fazer meu discurso “O estado do estado”, resumindo o ano anterior, era um governador melhor. Eu deixara de ser um conservador agressivo e beligerante, como fora retratado no pleito especial. Posicionei-me como um homem pragmático, enérgico, que queria fazer as coisas avançarem.
Fazia sentido começar com um pedido de desculpas: “Pensei muito no ano passado, nos erros que cometi e nas lições que aprendi – falei. – Fui apressado demais e não escutei a maioria dos californianos quando eles disseram não querer a votação especial. Agora assimilei minha derrota e aprendi minha lição. E a mensagem da população, que sempre tem a última palavra, foi clara: chega de guerra, chega de retórica, encontrem um denominador comum e resolvam os problemas juntos. Assim, posso agora dizer a meus conterrâneos da Califórnia: compreendi a mensagem.”
Brinquei com meu índice de aprovação, que àquela altura havia despencado mais ainda, ficando abaixo dos 30%, e com o fato de as pessoas terem começado a perguntar: “Você não gostaria de voltar a fazer cinema?” No entanto, respondi que ainda achava aquele o melhor emprego que já tivera, e que estava ali, diante da Assembleia Legislativa e do Senado Estadual, feliz, esperançoso... e mais sábio.
Eu me gabei de coisas pelas quais todos merecíamos crédito, desde equilibrar o orçamento sem aumentar os impostos a proibir refrigerantes e comida pouco nutritiva nas escolas. Recordei nossas importantes conquistas: a reforma do sistema de seguros e indenizações trabalhistas, o financiamento das pesquisas com células-tronco, o refinanciamento da dívida estadual, as novas leis que tornavam o governo mais transparente e acessível.
Então revelei os números impressionantes: as centenas de bilhões de dólares em investimentos de que precisaríamos para sustentar o crescimento futuro da Califórnia. Meu primeiro passo foi apresentar o plano de 10 anos que meu gabinete se esfalfara para aperfeiçoar, batizado de Plano de Crescimento Estratégico. E pedi ao legislativo que submetesse aos eleitores a emissão dos 68 bilhões de dólares em títulos públicos que seriam necessários para implementar o projeto.
No dia seguinte, as manchetes dos jornais foram perfeitas: o governador dizendo “Vamos construir”. Ao propor algo tão neutro politicamente e tão grandioso, eu havia pegado muitos membros do legislativo de surpresa. Naturalmente, houve ceticismo de parte a parte. Os democratas, de modo geral, disseram “Certo, parece ótimo, mas quero só ver”, ao passo que os republicanos reagiram com “Como ele vai pagar por isso?”. Apesar de tudo, tantos integrantes de ambos os partidos e sindicalistas me procuraram para dizer “Muito bem, vamos começar de novo” que eu soube que estava no caminho certo.
Com a eleição para governador cada vez mais próxima, havia três mensagens que queríamos transmitir aos eleitores: Arnold é um servidor público, não marionete de um partido; ele não tem medo de enfrentar problemas grandes; vocês hoje estão mais bem servidos que com Gray Davis. Transmitimos essas mensagens usando uma mesma estratégia: toda vez que conseguíamos aprovar alguma medida no legislativo, íamos a público declarar vitória.
Nos bastidores, também precisávamos consertar inúmeras relações. Tínhamos que recair nas graças dos grupos importantes que minha votação especial conseguira desagradar e que haviam acabado de gastar 160 milhões de dólares para me derrotar. Em sua sala, Susan afixou um quadro com uma lista de todos esses grupos, que Schmidt batizou de “Coalizão dos Furiosos”. A listagem, é claro, incluía todos os grupos de funcionários públicos – sindicatos de professores, bombeiros, enfermeiras, guardas de prisão –, bem como todas as principais tribos indígenas que exploravam jogos de azar – o rol era interminável. Na relação também tinham sido incluídos grupos geralmente favoráveis aos republicanos, como delegados de polícia, xerifes, associações de fabricantes e associações de pequenas empresas.
Na verdade, com a única exceção da Câmara de Comércio da Califórnia, todos os grupos de interesse político importantes do estado planejavam ou não me apoiar, ou então se empenhar ativamente para me fazer perder a eleição. E, como eu havia aprendido da maneira mais dolorosa, eles de fato tinham poder para bloquear projetos e impedir mudanças. Se quiséssemos realizar alguma coisa, precisávamos escolher nossas batalhas e nossos oponentes.
Junto com nossos aliados, metemos mãos à obra para neutralizar cada um dos opositores. O fato de a economia da Califórnia estar crescendo novamente ajudou muito: significava que bilhões de dólares de impostos tinham enchido de repente os cofres do estado. Pusemos fim a uma antiga contenda judicial com os professores e tivemos vários encontros com chefes de bombeiros, delegados de polícia e xerifes para tranquilizá-los em relação a suas aposentadorias. Em alguns casos, reconstruir a relação levou meses. Sindicatos importantes tinham contratos que estavam para vencer, de modo que nos demoramos nas negociações, sabendo que eles veriam minha força junto à opinião pública aumentar e decidiriam que havia uma boa chance de eu ser reeleito e de talvez terem que lidar comigo por mais quatro anos.
Como sempre, o maior desafio de todos foi conseguir a cooperação da maioria democrata na Assembleia Legislativa estadual. Fizemos isso abraçando questões às quais os democratas não podiam se opor, como investimentos em infraestrutura e meio ambiente. Essa abordagem lhes deu uma escolha muito clara: eles podiam me combater e ser considerados obstrucionistas, enquanto eu estava tentando fazer o estado avançar. Ou então poderiam se juntar aos meus esforços e progredir em questões caras aos corações de seus eleitores. Os democratas entenderam que o fato de um governador republicano assumir o comando de questões desse porte era uma oportunidade de reconciliação política que não podiam se dar ao luxo de ignorar, comparável à visita de Nixon à China de Mao Tsé-Tung em 1972.
Após meses de duras negociações, os democratas escolheram o caminho da cooperação. Em maio, conseguimos a maioria de dois terços necessária para aprovar o pacote de emissão de títulos públicos. Depois de reformulada e redimensionada, minha proposta de 68 bilhões de dólares passou para 42 bilhões. Levamos mais dois anos para negociar recursos para as propostas relacionadas a prisões e redes de água, mas acabamos conseguindo tudo. Foi, de longe, o pacote de infraestrutura mais ambicioso desse tipo em toda a trajetória da Califórnia. A imprensa o qualificou de “histórico”. Agora o pacote precisava passar pelo crivo dos eleitores, em novembro, mas a simples aprovação no legislativo – o fato de a Califórnia ter conseguido se unir para tomar uma atitude em relação a uma questão fundamental com a qual todos os estados se viam confrontados – ganhou o noticiário em âmbito nacional.
Eu sabia exatamente como vender ao eleitorado algo que soa tão maçante quanto “infraestrutura”. Nós apresentamos a questão de maneira pessoal. Não ficamos simplesmente insistindo nesse termo e no montante dos títulos públicos. Em vez disso, percorri o estado conversando com eleitores sobre como era irritante viver preso em engarrafamentos, e como eles viviam perdendo a partida de futebol dos filhos ou o jantar com a família. Conversei sobre a sua frustração com as salas de aula lotadas e temporárias que muitos de seus filhos frequentavam.
Depois do furacão Katrina, em 2005, foi mais fácil fazer as pessoas entenderem como os antigos diques da Califórnia eram vulneráveis. Na era pré-histórica, toda a parte central do estado era um imenso mar interno, e o terreno agora era um pouco parecido com o da Holanda. Se não fossem os diques e o controle de enchentes, as águas poderiam voltar a subir e nos transformar na Louisiana da Costa Oeste. Um único terremoto grave poderia destruir o sistema e inundar todo o vale interior do estado, eliminando as fontes de água potável de dezenas de milhões de pessoas na parte sul.
Eu também tinha grandes planos para concluir o sistema de canalizações estadual: abrir um canal para assegurar o fluxo de água do norte, onde ela é abundante, para o sul, onde a maior parte é consumida. No início dos anos 1960, o governador Pat Brown, pai de Jerry, iniciara esse projeto com a ambição de tornar o sistema tão grandioso que nunca mais haveria disputa por água. Ronald Reagan, entretanto, interrompera a construção ao assumir o cargo em 1967, e a questão seguia causando conflitos entre os californianos, como acontecera durante a maior parte da história do estado.
Para vender o pacote aos eleitores, convidei líderes dos dois partidos no legislativo para me acompanharem em uma série de visitas pelo estado. Foi muito estranho ver democratas e republicanos fazendo algo juntos! O fato de membros democratas do legislativo estarem participando de uma campanha com um governador republicano candidato à reeleição tornava ainda mais surpreendente estarmos juntos na estrada. Com tudo isso, meu adversário democrata, Phil Angelides, enlouqueceu. Os legisladores, porém, puderam cantar vitória e constataram como a resposta do público foi positiva. Estavam tão acostumados a ouvir: “Sua aprovação é uma droga, ninguém gosta de vocês. Vivem esbanjando dinheiro, só pensam nos próprios interesses, estão mancomunados com os sindicalistas, estão de conluio com as empresas...” De uma hora para outra, eles passaram a se sentir vencedores. Haviam aprovado os títulos públicos, e a população agora dizia: “Nossa, que incrível, republicanos e democratas unindo esforços... finalmente!”
Assim, chegamos ao fim do impasse. A energia gerada pelo pacote de títulos nos impulsionou para um ano extremamente produtivo. Nesse verão, aprovamos um orçamento de 128 bilhões de dólares para 2006-2007 que incluía um importante aumento de recursos para escolas, mais 2 bilhões para amortização da dívida. A aprovação correu sem os eternos atrasos e brigas, transformando esse orçamento no primeiro a ser aprovado no prazo em anos. Após algumas manobras, negociamos um aumento do salário mínimo, necessário havia tempos. Minha proposta de votação popular “1 milhão de telhado solares” tornou-se lei em setembro, gerando 2,9 bilhões de dólares em incentivos para os californianos equiparem suas casas com energia solar. A ideia era estimular a inovação, criar empregos e fazer com que 3 mil megawatts de energia solar fossem gerados em 10 anos – o bastante para substituir seis usinas a carvão.
Em 2006, demos nosso salto mais ousado em matéria de políticas públicas: a legislação histórica sobre mudanças climáticas, uma das questões mais controversas da política americana moderna. A Lei de Soluções para o Aquecimento Global da Califórnia comprometeu o estado a limitar e em seguida reduzir drasticamente as emissões de carbono ao longo dos 15 anos seguintes: 30% até 2020, 80% até 2050. Foi a primeira legislação desse tipo no país, e líderes políticos e ambientalistas previram que ela geraria desdobramentos mundo afora. O primeiro-ministro britânico, Tony Blair, que ajudara a vender aos democratas o conceito de limites para emissões e comércio de carbono, assistiu à cerimônia de assinatura por conexão via satélite. Membro do Partido Trabalhista do Reino Unido, ele convenceu Fabián e outros democratas de que estabelecer tetos para as emissões e o comércio de carbono era uma boa solução. O Japão nos fez um elogio oficial.
Para que a Califórnia alcançasse objetivos tão agressivos, teríamos que combater os gases de efeito estufa por todos os lados. A lei afetaria não só dezenas de indústrias, mas também nossos carros, casas, rodovias, cidades e estabelecimentos agrícolas. Como assinalou o San Francisco Chronicle, isso poderia ter como consequências um aumento do transporte público, casas construídas mais próximas umas das outras, o plantio de 1 milhão de novas árvores e importantes investimentos em formas de energia alternativa.
A lei do aquecimento global virou notícia não apenas porque a Califórnia era, depois do Texas, o maior emissor de gases de efeito estufa dos Estados Unidos, mas também porque estávamos seguindo um caminho radicalmente diferente dos do Congresso nacional e do presidente Bush. Mesmo antes de eu me tornar governador, Califórnia e Washington já não se entendiam em relação às mudanças climáticas. Gray Davis assinara uma lei obrigando os fabricantes que quisessem vender carros na Califórnia a reduzir as emissões dos veículos de passeio em quase um terço até 2016 e aumentar a eficiência média de combustível de 11,5km/l para quase 15km/l. As emissões dos carros de passeio representavam 40% dos gases de efeito estufa em nosso estado. A Agência de Proteção Ambiental (EPA, na sigla em inglês) do governo Bush, porém, nos impediu de implementar a chamada “lei do cano de descarga”. Os fabricantes de automóveis combateram com tanto vigor nossa visão ambientalista que se juntaram para processar a Califórnia – e a mim! Eles fizeram de tudo para tentar dificultar nosso progresso, mas acabamos vencendo. Quando o presidente Barack Obama tomou posse, em 2009, basicamente adotou o padrão da Califórnia, e a coalizão dos fabricantes de automóveis aceitou um meio-termo que os obrigava a fabricar carros para o país todo com uma eficiência de combustível de 14,88km/l até 2016, uma melhoria de 40% em comparação com os atuais 10,6km/l.
Nunca fiz segredo sobre minha impaciência com o atraso intencional do presidente Bush na questão das mudanças climáticas, e já tínhamos conversado abertamente sobre a questão. Texano, ele se considerava um grande ambientalista por ter criado reservas florestais e marítimas gigantescas. No entanto, embora seu governo propusesse maneiras de reduzir as emissões de gás de efeito estufa, o administrador da EPA que ele nomeou tentou sabotar nossos esforços a cada etapa do caminho. Para mim, agir significava convencer mais pessoas e fazê-las participar do movimento. Vários ambientalistas que falam sobre aquecimento global estão interessados apenas em expor os problemas. É uma boa forma de fazer as pessoas se sentirem culpadas e impotentes – sentimentos que não agradam a ninguém. Além disso, é difícil se identificar com um urso polar em cima de uma banquisa quando se está desempregado, preocupado com o plano de saúde ou a educação dos filhos. Eu promovia a Lei de Soluções para o Aquecimento Global da Califórnia como benéfica para as empresas – não apenas as grandes e estabelecidas, mas também os novos empreendimentos. Na realidade, nosso intuito era criar uma indústria totalmente nova e limpa que gerasse empregos, desenvolvesse tecnologias de ponta e se tornasse um modelo para o restante do país e do mundo.
No entanto, foi muito difícil chegar a um consenso, e a Lei do Aquecimento Global estava longe de ser perfeita. Houve graves desavenças internas, bem como contendas com legisladores e grupos de interesse, mas lidamos com esses conflitos escutando uns aos outros e debatendo os méritos da lei. Conversamos com líderes ativistas e acadêmicos de prestígio, com fabricantes de automóveis, gigantes do setor de energia, fornecedores de serviços públicos, agricultores, empresas de transporte. Enquanto trabalhávamos na lei sobre mudanças climáticas, fui falar com os presidentes da Chevron, da Occidental e da British Petroleum, pois queria lhes garantir que aquilo não era um ataque direto a elas. Era uma maneira de combater um problema que não tinha sido previsto 100 anos antes, quando o mundo industrializado fizera a transição para o petróleo e o gás.
Eu queria que essas instituições apoiassem nossa ideia e comparecessem à assinatura da lei, e queria que passassem a trabalhar para alcançar o objetivo de reduzir os gases de efeito estufa em 25% até 2020. Eu dizia: “Para isso, é preciso começar a investir em biocombustíveis, energia solar e outras formas de energia não poluentes e sem efeitos colaterais.”
Também fiz um enorme esforço para convencer os membros do meu próprio partido. Não há contradição em ser ao mesmo tempo republicano e ambientalista. Afinal de contas, foi Teddy Roosevelt quem criou os parques nacionais, e a EPA deve sua existência a Richard Nixon, que também defendeu a Lei do Ar Puro. Reagan assinou leis ambientalistas tanto como governador quanto como presidente, incluindo o histórico Protocolo de Montreal, para proteger a camada de ozônio da Terra. E o presidente George Bush pai implementou um pioneiro sistema de limitação de emissões e comércio de carbono para controlar a chuva ácida. Portanto, estávamos dando continuidade a essa tradição.
NOSSA ATENÇÃO ESTAVA TÃO FOCADA na Lei do Aquecimento Global da Califórnia e em outras grandes mudanças que mal houve tempo para fazer a campanha de reeleição da forma habitual. Mas isso não teve importância. Promover avanços reais em questões importantes, valorizadas tanto por democratas quanto por republicanos, foi mais eficaz que qualquer slogan ou anúncio de campanha – e isso representou uma parte considerável da nossa estratégia de reeleição.
Meu comitê de reeleição já estava formado desde 2005, e por um motivo bem simples: as pessoas que apoiavam minhas iniciativas queriam ter certeza de que não estavam gastando seu dinheiro ou seu tempo com alguém que não fosse permanecer no cargo. Elas perguntavam: “Por que eu deveria investir em Arnold se ele for embora no ano que vem e um democrata assumir o governo e me punir?” Eunice me mandou 23.600 dólares, o máximo com que seu domicílio podia contribuir por lei. No bilhete que enviou junto com o cheque, ela escreveu: “Por favor, não comente sobre isso com Teddy. Nunca dei a ele tanto dinheiro assim, nem mesmo quando ele se candidatou a presidente.”
Entretanto, nem todo mundo na minha família ficou feliz com minha decisão de tentar a reeleição. Mais uma vez, Maria soube pelos jornais e ficou chateada. No entanto, com seu senso de humor ferino, ela deu um jeito de passar seu recado: me mandou uma linda fotografia sua emoldurada, com a seguinte pergunta escrita à mão: “Por que se candidatar de novo quando você pode voltar para casa e encontrar isto?” Ela conhecia a política americana bem de perto e acreditava piamente em sua capacidade de destruir relacionamentos. Estava pensando: “Ele sentiu o gostinho do poder e foi fisgado. Quem garante que daqui a pouco não vai se candidatar ao Senado?” Sorri ao receber a foto, mas eu queria terminar o que havia começado. Meu plano original era cumprir um mandato, resolver os problemas e ir embora. Porém tinha me dado conta de que é impossível fazer isso em três anos.
Por sorte, tive a vantagem de enfrentar um adversário fraco. Para concorrer comigo, os democratas escolheram Phil Angelides, diretor da controladoria fiscal do estado. Apesar de muito inteligente e funcionário público dedicado, ele não era um candidato forte. Sua única plataforma de campanha era o aumento de impostos. O fato abriu caminho para minha melhor improvisação durante um debate televisivo: “Pela alegria visível nos seus olhos quando fala em impostos, estou vendo que o senhor adora um aumento de tributos. Olhe ali para a plateia agora e diga: ‘Adoro aumentar os impostos.’” Ele ficou sem palavras, a mesma reação de quando lhe perguntei, durante o mesmo debate, qual fora o momento mais divertido da campanha até então.
Quando se é candidato a governador, a improvisação pode sair pela culatra. Eu me encrenquei ao me referir a minha amiga Bonnie Garcia, membro do legislativo. Ela é de origem latina, e eu disse que Bonnie era “quentíssima” por causa de seu “sangue negro e latino”. Falei isso durante uma conversa informal de duas horas com meu gabinete que acabou parando na internet – sem edição. Estávamos fazendo um brainstorming em preparação para um discurso importante e o redator do texto gravou a conversa para não perder nenhuma frase lapidar. Assim como eu, Bonnie pode ser arrebatada e incisiva ao defender uma causa. Afirmei que essa paixão tinha um componente genético. “Cubanos, porto-riquenhos, todos eles têm o sangue quentíssimo”, falei. Ela me lembrava Sergio Oliva, o cubano campeão de fisiculturismo com quem eu disputara o título de Mister Olympia nos anos 1970. Ele era um competidor feroz e de sangue quente, um apaixonado.
Adam, meu diretor de comunicação, estava acostumado a me ouvir falar barbaridades. Dessa vez, porém, seus funcionários gravaram por acidente a transcrição não editada no servidor em que ficavam armazenados nossos releases de imprensa. É claro que o pessoal de Phil Angelides não demorou muito para encontrá-la e transmitir o trecho politicamente incorreto para o Los Angeles Times.
Minha equipe de campanha cortou um dobrado para gerenciar a repercussão. Foram procurar Bonnie, que não apenas foi elegante e prestativa, como também muito divertida ao aceitar minhas desculpas. Posteriormente os jornais citaram a seguinte brincadeira que ela fez: “Eu não o expulsaria da minha cama.” Liguei para todos os líderes latinos e negros que conhecia, a começar por Fabián Núñez e Alice Huffman, presidente da Associação Nacional para o Progresso das Pessoas de Cor (NAACP, na sigla em inglês) da Califórnia, e ambos consideraram os comentários apenas uma atitude tipicamente minha e nem um pouco ofensivos. Em vez de deixar Angelides liberar pedacinho por pedacinho da conversa, para manter o fluxo de matérias negativas nos jornais, Adam simplesmente disponibilizou ao público as duas horas completas da transcrição não editada. No fim das contas, a imprensa nos elogiou por ter administrado a crise do “Fitagate” de forma muito eficiente, e assim voltamos a nos concentrar na campanha.
A meu ver, Angelides era excessivamente negativo. Apesar de me criticar, ele nunca propôs uma visão alternativa clara de qual deveria ser o futuro da Califórnia. Sem isso, simplesmente não conseguiu conquistar os eleitores. Eu, por outro lado, não tinha dificuldade em falar de forma convincente sobre o futuro: tudo o que eu precisava fazer era apontar para nossas conquistas desde que assumira o governo.
Em 7 de novembro de 2006, fui eleito governador da Califórnia por maioria esmagadora: a margem de vitória foi de 17 pontos percentuais. Além disso, todas as propostas de emissão de títulos públicos também foram aprovadas nas urnas – o Plano de Crescimento Estratégico proporcionou 42 bilhões de dólares que pudemos usar para começar a construir o Estado de Ouro do século XXI.