CAPÍTULO 12

Um sonho de mulher

NA SEXTA-FEIRA, 26 DE AGOSTO DE 1977, peguei um avião para Nova York a fim de participar do Torneio de Tênis de Celebridades Robert F. Kennedy. A festa pré-torneio foi no Rainbow Room, no último andar do prédio da NBC no Rockefeller Center. Quando entrei, dei de cara com Tom Brokaw segurando um drinque. Já o conhecia de Los Angeles, onde ele fora âncora do noticiário noturno da NBC antes de ser transferido para cobrir a Casa Branca. Era amigo da família Kennedy e estava se tornando uma figura importante no jornalismo televisivo.

– Oi, Arnold – disse ele. – Tudo bem? Venha cá, deixe que lhe apresente Ethel. Ela é nossa anfitriã hoje.

Ethel Kennedy me abriu um enorme sorriso.

– Que prazer ter você aqui! Li tanta coisa a seu respeito... Obrigada por nos ajudar. Estamos levantando dinheiro para... – E ela começou a discorrer sobre o lado beneficente do torneio. Então completou: – Venha conhecer Teddy.

Teddy Kennedy, senador por Massachusetts, também estava por perto tomando um drinque. Aproximou-se e me cumprimentou com um aperto de mão. Então Tom perguntou:

– Você veio sozinho?

– Vim.

– Bom, então tenho a garota certa para você. Você precisa conhecer a Maria. Onde ela está? Pessoal, mandem chamar a Maria!

Então Maria Shriver apareceu. Estava usando uma roupa bonita, ao mesmo tempo elegante e casual. Parecia totalmente à vontade. Era engraçada e divertida. Pouco depois, também fui apresentado a sua mãe, Eunice Kennedy Shriver. As primeiras palavras que saíram da minha boca foram:

– Sua filha tem uma bela bunda.

Eu adorava dizer barbaridades para as pessoas, mas Eunice sequer pestanejou.

– Que gentileza a sua – respondeu.

Maria me convidou para jantar na sua mesa. Quando terminamos, fomos dançar. “Nossa”, pensei, “essa garota faz totalmente o meu tipo.” Não que eu tenha me apaixonado, pois não a conhecia. Mas pude ver que ela era uma moça alegre, tinha ótima personalidade e uma linda cabeleira negra, além de ser uma bomba de energia positiva que eu queria ter por perto.

Na manhã seguinte, recebemos as seguintes instruções: “Deixem seus pertences e objetos de valor no quarto. Vistam seus uniformes de tenistas e desçam para o saguão do hotel às nove horas.” Um ônibus nos levou até o clube de tênis de West Side, em Forest Hills. Ali ficamos aguardando na área que servia como sala de espera, onde nos divertimos, batendo papo e comendo. Fui apresentado a todo mundo, inclusive ao vice-presidente Walter Mondale, ao humorista Bill Cosby, aos cantores Diana Ross e Andy Williams, a estrelas do tênis como Ilie Nastase e Renée Richards e ao ex-apresentador do Tonight Show Jack Paar. Também reencontrei o brasileiro Pelé. Enquanto isso, as partidas de tênis eram disputadas nas duas quadras principais do clube. Não era um torneio de verdade: os jogos simplesmente se sucediam e, quando você era chamado, ia lá e jogava, pois na verdade o importante era arrecadar dinheiro, não tentar vencer. Caroline Kennedy e Maria passaram o tempo inteiro circulando, cada qual com uma câmera, fotografando todo mundo e tirando várias fotos minhas.

Não sei quem escolheu as duplas, mas essa pessoa com certeza tinha senso de humor. Meu parceiro foi o ex-astro do futebol americano Rosey Grier, de 1,96 metro e 136 quilos. Felizmente, ele sabia jogar só um pouco melhor que eu. Nossos adversários eram dois meninos de 10 anos. Conseguimos bater bola com eles e, sempre que Rosey e eu perdíamos um ponto, arrancávamos a camisa e ameaçávamos nossos adversários – o público achava graça, e era isso que Ethel queria. As pessoas estavam doando uma boa quantia para passar o dia inteiro ali assistindo às partidas, então mereciam um bom espetáculo. Em determinado momento, apresentei Pelé para receber um prêmio, ele apresentou a mim e Bobby Kennedy Jr. subiu ao palco para elogiar todos os participantes e entregar mais prêmios. Quando o torneio já estava terminando, no final da tarde, Caroline e Maria foram me procurar atrás do palco e perguntaram:

– O que você vai fazer depois daqui?

– Não sei. Voltar para Los Angeles.

– Não quer ir a Hyannis Port?

Eu sabia que aquilo ficava em algum lugar ao norte de Nova York, mas não exatamente onde.

– Como é que se chega lá?

– De avião.

– Quantas horas de voo?

– Uma hora e meia, por aí. Mas nós temos nosso próprio avião, então não precisa se preocupar.

Encerrado o torneio, fomos jantar em um restaurante, e a pressão de Caroline e Maria continuou.

– Você tem que ir a Hyannis Port com a gente.

Quando penso nisso hoje em dia, acho que sei o que aconteceu. Maria e Caroline decidiram: “Não seria engraçado convidar Arnold para ir a Hyannis Port?” O senso de humor delas era assim. “Hércules em Hyannis Port! Seria demais.” Caroline já me conhecia de minha visita a Harvard, no ano anterior, e não sei quanto instigou Maria, mas as duas com certeza já tinham falado sobre o plano com os primos. Portanto, aquilo agora era uma missão.

Não sabia se deveria ir. Parecia complicado demais. Além disso, eu não levara dinheiro algum, e só tinha meu uniforme de tênis e a raquete ganha no torneio.

– Não se preocupe com suas roupas que ficaram no hotel – disse Maria. – De qualquer maneira, o quarto já está pago pela fundação até amanhã à noite. A essa hora você já terá voltado, então pode pegar suas coisas e ir para casa. Enquanto isso, venha conosco. O que vamos fazer lá, só para você saber... Você gosta de esqui aquático?

– Gosto, eu sei esquiar. Não consigo ficar em pé em um esqui só, mas em dois eu consigo.

– Sabe nadar?

– Sei, sim. Gosto muito de nadar.

– Ótimo, porque nós gostamos de sair de barco e de nos revezar para sermos rebocados pelo veleiro, e vamos até Egg Island. É muito divertido! Só fazemos coisas no mar, então você não precisa levar nada. Já está de short, mesmo, e meu irmão Bobby pode lhe emprestar outro, ou uma camisa, ou o que você precisar.

– Estou sem nenhum dinheiro, não tenho absolutamente nada.

– Você vai ficar na nossa casa! Não precisa de dinheiro.

Primeiro, uma leva de “adultos” embarcou: Ethel, Teddy e outros da mesma geração. Então, às nove da noite, entrei no avião com os primos. Lembro-me de ter aterrissado às dez e meia ou algo assim. Agora estávamos no casarão de Hyannis Port e Maria não parava de se exibir.

– Vamos nadar! – disse ela.

– Como assim, nadar?

– Está uma noite linda! Vamos nadar um pouco.

Então fomos. Nadamos até um barco bem distante do píer. Maria era um verdadeiro peixinho.

Tudo isso fazia parte do teste. Os primos viviam levando convidados à casa dos Kennedy para testá-los e fazer brincadeiras com eles. É claro que eu não sabia disso.

Finalmente, fomos dormir. Bobby me cedeu seu quarto, bem ao lado do de Maria. Na manhã seguinte, quando acordei, a casa estava em polvorosa. “Todo mundo pronto! Todo mundo pronto! Vamos nos encontrar na igreja! Vovó vai à igreja hoje! A missa é para ela!” Todos corriam para lá e para cá, pegando as roupas uns dos outros.

De repente, ocorreu-me que eu só tinha uma roupa de tênis.

– Não tenho nada para vestir – falei.

– Bom, tome aqui, vista uma camisa do Bobby – disse um dos primos.

Aquilo não parecia muito promissor: Bobby pesava 77 quilos e eu, 104. A camisa ficou toda apertada, com os botões a ponto de arrebentar. Eu não tinha roupa nenhuma, e estávamos a caminho da igreja onde Rose Kennedy iria nos encontrar. Bobby ainda tentou me emprestar uma calça, mas ficou pequena demais. Não consegui sequer fazê-la passar pelas coxas. Então tive que ir à igreja de short, feito um menininho. Foi muito constrangedor – o que, naturalmente, era o objetivo. Os primos todos se esbaldaram de rir. “Hilário! Olhem a calça dele! Olhem a camisa dele!”

Voltamos para tomar o café da manhã na casa. Tive uma pequena oportunidade para me recompor. A propriedade dos Kennedy consistia em um grupo de casas de dois andares no meio de amplos gramados à beira-mar, bem pitoresca. Rose tinha sua própria casa, assim como cada um dos filhos. Eu estava hospedado na propriedade dos Shriver, porque Maria e Caroline tinham decidido que eu seria um convidado principalmente de Maria.

Ao longo do dia, os adultos se reuniam numa casa ou em outra para tomar café, almoçar, tomar um drinque e assim por diante. A informação de que eu não iria precisar de roupas elegantes era uma mentira deslavada, pois todos os homens se encontravam para os drinques de calça e blazer branco – e eu ali, de short. Fiz o melhor que pude, porém, e Maria e Caroline me apresentaram aos outros.

Rose apareceu para me conhecer. Tinha ficado muito curiosa em relação àquele rapaz do mundo dos músculos e começou a me fazer perguntas sobre exercícios. “As crianças da nossa família não se exercitam o suficiente e isso me preocupa. Pode nos mostrar uns exercícios agora? Preciso fazer alguns para minha barriga.” Rose tinha quase 90 anos na época. Em pouco tempo, as crianças pequenas e até mesmo alguns dos pais estavam fazendo vários tipos de abdominais. Foi engraçadíssimo.

Mas ainda havia muito a entender ali. Por que aquela propriedade familiar coletiva? Por que todas aquelas casas juntas? Era fascinante ver como os Kennedy circulavam pelas propriedades uns dos outros: “Hoje vamos tomar um drinque na casa de Teddy, depois jantar na de Pat, e amanhã vamos tomar café com Eunice e Sarge”, e assim por diante.

Supercompetitivos entre si, os primos quiseram me testar para ver se eu tinha espírito esportivo. Entre outras coisas, amarraram-me a uma corda e me arrastaram atrás do veleiro, por exemplo. No entanto, sob a liderança do mais velho, Joe Kennedy II, eles eram também encantadores. Quando estavam todos se preparando para a habitual partida de touch football, uma variante do futebol americano, no gramado da avó, Joe me perguntou:

– Você joga?

– Nunca toquei numa bola de futebol americano – respondi.

– Reparei ontem que você apresentou Pelé como se o conhecesse muito bem, então imagino que tenha mais familiaridade com o futebol de campo.

– É.

Então, nesse dia, Joe fez todos jogarem futebol. Foi um daqueles pequenos gestos que nunca se esquece. Primogênito de Robert F. Kennedy, Joe tinha a reputação de ser um rapaz difícil, dado a acessos de raiva e gritarias. Nesse dia, porém, vi quanto ele era classudo e compreensivo. Quis saber o que eu fazia, em que consistia meu treino, e perguntou sobre o lugar de onde eu vinha, a Áustria. O fato de ele ser mais ou menos da minha idade também ajudou – tinha cinco anos a menos que eu –, e Joe se identificou mais comigo do que os outros. Quando uma pessoa me trata com esse tipo de consideração, eu faço tudo o que puder por ela pelo resto da vida.

Mais ou menos na hora do pôr do sol, Maria e eu acompanhamos a avó dela em um passeio. Rose fez perguntas de gramática para a neta, como para se certificar de que os estudos universitários dela estavam indo bem: “Qual é o certo, para eu fazer ou para mim fazer?” Então começou a usar o alemão comigo e explicou que quando criança havia frequentado uma escola de freiras na Holanda, onde aprendeu aquele idioma como língua estrangeira. Rose falou com desenvoltura sobre Beethoven, Bach e Mozart. Contou-nos que adorava óperas e sinfonias e que tocava piano desde pequena. Foi muito interessante estar assim tão próximo da matriarca dos Kennedy – e da história sobre a qual eu tanto ouvira falar.

Mais tarde nesse dia, tive que ir embora. Maria me acompanhou ao aeroporto, e estávamos conversando perto dos guichês quando lembrei que não tinha dinheiro algum. Ela teve que fazer um cheque para pagar minha passagem. Ter que pedir dinheiro emprestado a uma garota de 20 anos me fez ficar vermelho igual a um tomate, tamanho meu constrangimento. Sempre quis ganhar meu próprio dinheiro justamente para nunca ter que pedir doações ou empréstimos. A primeira coisa que fiz ao chegar a Los Angeles foi falar com Ronda: “Faça um cheque agora mesmo e o mande para Maria, porque ela me emprestou 60 dólares. Tenho que devolver o dinheiro o mais rápido possível.” Mandei o cheque junto com um cartão agradecendo a gentileza dela.

Maria e eu não tornamos a nos falar até perto do Dia das Bruxas. Eu agora estava fazendo uma turnê promocional do meu novo livro, Arnold: The Education of a Bodybuilder (Arnold – A educação de um fisiculturista), misto de relato pessoal e introdução à musculação que assinei junto com um escritor e fotógrafo chamado Douglas Kent Hall depois que me aposentei das competições. O editor – Dan Green, da Simon & Schuster – era fascinado por fisiculturismo, e a ideia do projeto tinha sido sua. Quando me reuni com ele para discutir o plano de marketing do livro, ele se mostrou muito animado.

– Esse livro vai ser um sucesso – falou. – Vai vender tanto quanto Pumping Iron.

– Não se mantivermos a mesma estratégia de publicidade – falei.

A proposta que ele estava me apresentando só previa visitas a meia dúzia das maiores cidades do país.

– As pessoas só vão comprar o livro se souberem que ele existe – comentei. – Se não mostrarmos isso a elas, como vão saber? Se quiser que o livro venda, não me mande só para seis cidades. Temos que ir a 30 cidades, e temos que fazer isso em 30 dias.

– Trinta cidades em 30 dias?! Que loucura!

– Você devia ficar feliz – continuei. – Nós vamos visitar cidades às quais as celebridades nunca vão e assim poderemos conseguir mais espaço nos noticiários matinais.

– É, isso é verdade – concordou ele.

Lembrei-lhe que Pumping Iron fora bem-sucedido porque na época tínhamos feito uma promoção mais abrangente que o habitual e vendido em lugares não convencionais, como lojas de artigos esportivos.

As turnês promocionais de livros sobre esportes em geral não passavam por Washington. Mas eu havia promovido Pumping Iron na capital, de modo que fazia sentido voltar lá e falar com os mesmos jornalistas. Como Maria morava na cidade, pareceu-me natural entrar em contato com ela. Liguei antes de ir e ela se ofereceu para me mostrar a cidade, toda animada. Só cheguei bem tarde, às oito ou nove horas da noite do Dia das Bruxas. Maria foi me buscar fantasiada de cigana e me levou para conhecer os bares e restaurantes em que havia trabalhado quando estava na faculdade – ela acabara de se formar na Universidade de Georgetown. A fantasia estava perfeita: vestido colorido, várias pulseiras, brincos enormes e aquela linda e farta cabeleira negra. Nós nos divertimos bastante até mais ou menos uma da madrugada, quando ela voltou para casa. Na manhã seguinte, tive meus encontros com a imprensa e segui viagem.

Uma semana depois, mandei-lhe flores no seu aniversário, 6 de novembro, coisa que nunca tinha feito antes com nenhuma garota. Eu tinha uma queda por Maria e descobrira recentemente que era possível encomendar flores pelo telefone – era uma nova forma de mostrar interesse, assim como o costume americano de mandar cartões de agradecimento. Ela adorou.

Então viajei para a Europa e, ao retornar, continuei a turnê do livro. Tive que ir a Detroit fazer uma apresentação em um shopping. Liguei para Maria e disse: “Se quiser ir me encontrar, tenho uns amigos ótimos em Detroit, e podemos sair todos juntos.” Meus amigos, os Zurkowski, eram sócios da Health & Tennis Corporation, maior rede de academias dos Estados Unidos, com mais de 100 estabelecimentos espalhados pelo país. Ela concordou em ir me ver, e reunimos todo mundo. Para mim, foi uma indicação clara de que ela estava interessada em começar um relacionamento. Na época, Maria namorava um cara da faculdade, mas a relação parecia estar esfriando e pensei que ela estivesse pronta para passar para outra.

Quanto a mim, não sei o que me passou pela cabeça quando liguei para ela. Tínhamos nos divertido tanto no Dia das Bruxas que quis vê-la de novo. Ela morava na Costa Leste, e pensei que Detroit ficava perto de lá. Eu não queria um namoro sério, principalmente com alguém daquela parte distante do país, já que eu morava na Costa Oeste. Maria estava falando em fazer um curso de produção de TV em Filadélfia e imaginei: “Nem pensar. Filadélfia–Los Angeles seria dureza.”

No entanto, foi exatamente isso que aconteceu: um namoro que nos fazia cruzar o país. Não conversamos para definir se era um relacionamento firme ou se poderíamos sair com outras pessoas. Foi mais uma coisa do tipo “Vamos nos ver quando der”. Mas eu gostava do fato de ela ser ambiciosa e querer se tornar uma figura importante do jornalismo televisivo. Também lhe falei sobre as minhas metas: “Um dia vão me pagar um milhão de dólares para fazer um filme.” Eu disse isso porque era essa quantia que ganhavam os atores mais bem remunerados de Hollywood, como Charles Bronson, Warren Beatty e Marlon Brando. Eu tinha que ser um deles. Contei a ela que meu objetivo era ser protagonista e obter tanto sucesso no cinema quanto no fisiculturismo.

Depois de O guarda-costas, O homem dos músculos de aço e The Streets of San Francisco, a comunidade de Hollywood estava bastante consciente da minha existência. Apesar disso, ninguém sabia o que fazer comigo. Os executivos dos estúdios vivem soterrados de projetos, e nenhum deles iria dizer: “Puxa, e este cara aqui? Ele tem o corpo e o visual certos. Tem personalidade. Sabe atuar. Só que ele não cabe em nenhum papel comum. Então o que podemos fazer?”

Eu precisava conhecer algum produtor independente. Por sorte, fui procurado por um: Ed Pressman, que fizera Terra de ninguém com o roteirista e diretor Terrence Malick e estava trabalhando em A taberna do inferno com Stallone. Ele era um nova-iorquino baixinho, de ar professoral, elegante e muito bem-vestido, cujo pai havia fundado uma fábrica de brinquedos e que havia se formado em filosofia pela Universidade de Stanford. O projeto dos sonhos de Ed era levar às telas um guerreiro bárbaro da pulp fiction dos anos 1930 chamado Conan. Ele e o sócio passaram uns dois anos negociando os direitos de filmagem e tinham acabado de fechar o negócio quando viram um copião de O homem dos músculos de aço. Na mesma hora decidiram que eu seria perfeito para o papel principal.

Ed não tinha sequer um roteiro. Enquanto eu não me decidia, deu-me uma pilha de revistas em quadrinhos para ler. Eu nunca ouvira falar em Conan, mas descobri que ele era cultuado por vários jovens. Desde os anos 1960, vinha havendo um grande revival seu, com a publicação de livros de bolso, e a Marvel Comics também tinha se interessado pelo personagem. Para mim, isso significava que haveria uma grande quantidade de fãs já prontos se Conan um dia fosse parar nas telas de cinema.

O que Ed tinha em mente não era apenas um filme, mas toda uma franquia de Conan, nos moldes de Tarzã ou James Bond, com um novo filme a cada dois anos. Não me lembro exatamente de como Ed formulou a questão, pois ele era bastante reservado, mas foi muito convincente. Para obter o apoio de algum estúdio, explicou, precisava que eu dissesse sim. Eu não poderia aceitar mais nenhum papel de fortão – como, por exemplo, outro Hércules – e tinha que me comprometer a estar disponível para as continuações. Bastou-me ver os livros de bolso para saber que aceitaria o papel. As capas traziam ilustrações fantásticas de Frank Frazetta: Conan triunfante, com o machado de batalha erguido no ar, parado sobre uma pilha de inimigos mortos com uma linda princesa a seus pés, ou então montado em um cavalo de guerra e avançando para cima de um exército de inimigos aterrorizados. No outono de 1977, acertamos que eu estrelaria Conan, o bárbaro e mais quatro sequências. Os valores foram todos estipulados: 250 mil dólares pelo primeiro filme, 1 milhão pelo segundo, 2 milhões pelo terceiro e assim por diante, além de 5% dos lucros. Os cinco filmes me renderiam um total de 10 milhões de dólares ao longo de 10 anos. Pensei: “Sensacional! Isso vai muito além do meu objetivo.”

A novidade do acordo se espalhou depressa por Hollywood. A imprensa especializada deu a notícia, então quando eu passava a pé pela Rodeo Drive os donos das lojas começavam a sair à rua e me convidar para entrar. Embora ainda houvesse vários detalhes por acertar, assinar esse contrato me deu a segurança de que eu agora fazia parte do time de 1 milhão de dólares no cinema. Assim, quando disse a Maria que esse era meu sonho, sabia que se tornaria realidade.

O que não pensei foi que ainda levaria muitos anos, mas eu não estava com pressa. Agora, depois de conseguir os direitos e o ator principal, Ed precisava achar um diretor e o dinheiro para fazer o primeiro filme. John Milius queria dirigir o projeto, pois adorava a mistura de virilidade e mitologia dos livros de Conan. No entanto, ele estava ocupado rodando Amargo reencontro, um filme com Gary Busey sobre a passagem para a idade adulta de um surfista. Então Ed continuou procurando um diretor. Teve mais sorte com o financiamento. A Paramount Pictures concordou em adiantar 2,5 milhões de dólares para o desenvolvimento inicial, contanto que Ed conseguisse vincular um roteirista renomado ao projeto.

Foi assim que meu caminho cruzou o de Oliver Stone. Na época, ele era conhecido como uma estrela em ascensão e acabara de escrever o roteiro de Expresso da meia-noite, baseado na história real de um jovem americano que foi detido ao tentar sair da Turquia com haxixe e condenado à prisão perpétua em um presídio turco brutal. O roteiro renderia a Oliver seu primeiro Oscar. Conan o interessou por ser um filme épico, mítico, e por ter um potencial para originar várias continuações – e também porque a Paramount estava disposta a bancá-lo.

Ao longo do ano seguinte, quando Oliver ia a Los Angeles, muitas vezes nos encontrávamos. Ele era um cara louco, muito inteligente e divertido. Considerava-se um grande escritor, e me agradava o fato de ser tão confiante, como eu. Nós saíamos juntos e nos respeitávamos, embora na esfera política ele fosse de esquerda e eu, de direita. Ele havia se alistado no exército e lutado no Vietnã e agora era um forte opositor do establishment, sempre vociferando contra o governo, Hollywood e a guerra.

Oliver me fez ler várias revistas em quadrinhos e romances de fantasia em voz alta, para ter uma noção de como eu me saía com os diálogos e do que soava bem ou não na minha voz. Sentado no sofá, ele fechava os olhos para me ouvir dizer trechos como “E eis que surge então Conan, o cimério, de cabelos negros, olhar duro e espada na mão, ladrão, saqueador, assassino, dono de imensa tristeza e imensa alegria, para pisotear com suas sandálias os tronos cravejados de joias da Terra”.

Ed havia incentivado Oliver a pensar grande – estava prevendo um orçamento de até 15 milhões de dólares para o filme, quase o dobro do custo habitual de um filme – e ele obedeceu, transformando a história no que Milius mais tarde descreveria como “o sonho febril de uma viagem de ácido”. Oliver trocou a ambientação do passado remoto para um futuro posterior à derrocada da civilização. Imaginou uma saga com quatro horas de duração na qual as forças da escuridão ameaçam a Terra e Conan tem que reunir um exército para reerguer o reino de uma princesa em uma batalha épica contra 10 mil mutantes. Criou imagens extraordinárias como as da Árvore Maldita, planta predatória que captura os companheiros de Conan durante a luta e os aprisiona em um mundo inferior – o inferno da árvore. O roteiro também pedia um cão de várias cabeças, uma harpia, pequenas criaturas parecidas com morcegos e muito mais.

No verão seguinte, porém, quando o roteiro começou a circular, ainda não estava claro se o projeto poderia deslanchar. O mundo imaginado por Oliver custaria uma fortuna para ser filmado: não 15 milhões, mas 70 milhões. Embora Guerra nas estrelas, de 1977, batesse recordes de bilheteria e os estúdios estivessem à procura de épicos, era uma quantia exorbitante, e a Paramount recuou. Fazia quatro anos que Ed estava desenvolvendo Conan, e agora ele e o sócio estavam endividados.

Decidi adotar uma atitude zen. Eu tinha o meu contrato e sabia que grandes produções podem levar muito tempo para se desenvolver. Disse a mim mesmo que não estava com pressa. Aqueles atrasos eram o destino. Só queria me certificar de que usaria meu tempo de forma sensata, para estar pronto quando as filmagens começassem.

Enquanto isso, Ed foi arrumando projetos para me dar mais experiência em frente às câmeras. Fiz um papel de coadjuvante em Cactus Jack, o vilão, faroeste estrelado por Kirk Douglas e Ann-Margret. Meu personagem se chamava Belo Forasteiro, e o resto do filme era igualmente ruim. Quando estreou, em 1979, foi um fracasso de bilheteria, e a melhor coisa que posso dizer é que, graças a ele, aprendi a montar melhor a cavalo. Também coestrelei com Loni Anderson The Jayne Mansfield Story (A história de Jayne Mansfield), filme feito para a televisão, no qual interpretava o segundo marido da personagem principal, o campeão de fisiculturismo dos anos 1950 Mickey Hargitay. Não eram papéis de protagonista nem envolviam muita pressão, mas ajudaram a me preparar para o verdadeiro desafio: Conan, a grande produção internacional que seria promovida mundialmente e teria um orçamento de 20 milhões de dólares.

Ao mesmo tempo, eu cuidava dos meus negócios. Continuava administrando as empresas de fisiculturismo e coproduzindo o campeonato Mister Olympia em Columbus, Ohio. Ano após ano, Jim Lorimer e eu conseguíamos arrecadar o prêmio em dinheiro, e o evento foi ficando mais popular e prestigioso. Enquanto isso, surgiam oportunidades imobiliárias boas demais para deixar passar. No sul da Califórnia, os imóveis se valorizavam a uma taxa que era quase o dobro da inflação. Você podia dar uma entrada de 100 mil dólares em um imóvel de 1 milhão que no ano seguinte ele valeria 1,2 milhão, fazendo seu investimento render 200%. Uma loucura. Al Ehringer e eu vendemos nosso prédio da Main Street e compramos um quarteirão inteiro para revitalizar em Santa Monica e outro em Denver. Troquei meu prédio de 12 apartamentos por outro de 30. Em 1981, quando Ronald Reagan assumiu a presidência e a economia desacelerou, eu já havia conquistado mais um pedaço do sonho de qualquer imigrante: conseguira ganhar meu primeiro milhão.


CONAN, O BÁRBARO, PODERIA ESTAR ATÉ HOJE confinado às páginas dos quadrinhos se John Milius não tivesse tornado a embarcar no projeto em 1979. Ele pegou o roteiro de Oliver Stone, cortou-o pela metade e o reescreveu para reduzir drasticamente os custos. Mesmo assim, a produção continuaria custando 17 milhões. Melhor ainda para Ed Pressman, Milius tinha um caminho que conduzia ao dinheiro. Ele tinha um contrato para produzir seu próximo filme com Dino de Laurentiis, que adorava histórias de fantasia. No final do outono desse ano, Dino e Ed firmaram um acordo no qual Dino, para todos os efeitos, comprava o projeto de Ed. Os contatos de Dino garantiram uma distribuição de primeira categoria, uma vez que a Universal Pictures aceitou distribuir o filme nos Estados Unidos.

De repente – pimba! – o projeto começou de fato a avançar.

O que era bom para o guerreiro Conan, contudo, não era necessariamente bom para mim. Por causa de nosso primeiro encontro, De Laurentiis me detestava. Embora eu ainda estivesse sob contrato, ele quis se livrar de mim.

– Não gosto de Schwarzenegger – comentou com Milius. – Ele é um nazista.

Por sorte, John já tinha decidido que eu era a escolha perfeita para o papel.

– Não, Dino – respondeu ele. – Nesta equipe só tem um nazista, e sou eu. Eu sou o nazista!

É claro que Milius não era nazista, só adorava chocar Dino e falar barbaridades. Passou o resto da produção frequentando antiquários estranhos para comprar pequenos bonequinhos de chumbo de Mussolini, Hitler, Stalin e Franco, que punha em cima da mesa de Dino.

A cartada seguinte de Dino foi mandar o advogado de sua empresa renegociar comigo. O nome do cara era Sidewater, e meu agente Larry o apelidou de Sidewinder, algo como “soco de lado”. O advogado anunciou:

– Dino não quer lhe dar os 5% do contrato. Não quer lhe pagar porcentagem nenhuma.

– Podem ficar com a porcentagem – falei. – Não estou em condições de negociar.

Ele ficou de queixo caído.

– Todos os 5%?

Ele ficou chocado ao me ouvir dizer aquilo de forma tão serena, pois estava esperando uma briga. Cada um desses numerozinhos pode vir a significar muitos milhares de dólares quando um filme dá certo.

– Todos os 5% – repeti. – Podem ficar, podem ficar com tudo.

E pensei: “Podem pegar e enfiar no rabo, porque não é por isso que estou fazendo o filme.” Eu entendia a realidade. Havia um desequilíbrio na negociação. Dino tinha o dinheiro, mas quem precisava da carreira era eu, então não fazia sentido brigar. Era uma simples questão de oferta e demanda. Mas pensei também que haveria de chegar o dia em que o jogo iria virar e Dino teria que pagar.

Conforme John Millius e eu íamos nos tornando amigos, aprendi que com ele tudo virava um drama. O cara parecia um urso, vivia fumando charutos e tinha uma Harley-Davidson. Seus cabelos pretos eram encaracolados e ele usava barba. Era obcecado por história, sobretudo pelas de guerra, e possuía um conhecimento enciclopédico sobre batalhas e armas da época dos egípcios, dos gregos e dos romanos até a atualidade. John era capaz de discorrer com autoridade sobre vikings, mongóis, piratas de qualquer período, samurais, cavaleiros e arqueiros medievais. Conhecia cada calibre de bala usado na Segunda Guerra Mundial e sabia que tipo de pistola Hitler carregava. Não precisava sequer pesquisar: já estava tudo na sua cabeça.

John gostava de se autodenominar zen-fascista e se gabava de ser tão de direita que nem podia ser chamado de republicano. Em Los Angeles, havia quem o considerasse um doente. Mas era um roteirista tão fantástico que até mesmo os liberais o chamavam para ajudar em seus trabalhos, como Warren Beatty em Reds. Ninguém escrevia diálogos de machão melhor do que ele. Um grande exemplo de seu trabalho é o hipnotizante monólogo de Tubarão em que o personagem de Robert Shaw, o capitão Quint, relembra o naufrágio do USS Indianapolis durante a Segunda Guerra Mundial, depois que o navio entregou a bomba atômica que seria lançada sobre Hiroshima. O resgate demorou cinco dias para chegar, e a maioria da tripulação não sobreviveu. A fala de Quint termina assim: “Então 1.100 homens acabaram no mar. Trezentos e dezesseis se salvaram, e os tubarões ficaram com o resto. Dia 29 de junho de 1945. Enfim, pelo menos eles entregaram a bomba.”

Milius também escreveu a fala antológica de Robert Duvall em Apocalypse Now: “Adoro o cheiro de napalm pela manhã... me lembra a vitória.” E, naturalmente, criou também a fala que já era a minha preferida em Conan, quando perguntam ao bárbaro “Qual é a melhor coisa da vida?” e ele responde: “Esmagar seus inimigos, vê-los aos seus pés e ouvir os lamentos das mulheres deles.”

Era divertido conviver com um cara tão comprometido com a fantasia do machão, com o ideal de Teddy Roosevelt. Eu gostava de encarnar e desencarnar esse papel a todo momento. Uma hora eu podia ser ator, no momento seguinte vagabundo de praia, em seguida homem de negócios, logo depois campeão de fisiculturismo, e então Romeu – podia ser qualquer coisa –, mas Milius estava preso a um personagem só. Isso fazia parte do seu charme. Sua sala vivia cheia de armas, espadas e facas sobre a mesa. Ele gostava de exibir suas espingardas Purdey, armas britânicas feitas sob medida e com gravação especial, cada uma das quais levava meses para ser fabricada e custava dezenas de milhares de dólares. Ele dava a si mesmo uma de presente a cada filme que fazia. A espingarda era sempre parte do acordo. Se conseguisse produzir o filme no prazo combinado, John automaticamente comprava uma Purdey.

Ele sabia muito sobre o mundo e adorava compartilhar seus conhecimentos com todos que estivessem por perto. Pegava uma espada e dizia: “Sinta só esta espada. Sinta o peso que ela tem. É essa a diferença entre a espada britânica e a francesa. A francesa sempre foi mais leve...” E por aí ia. Ou então via uma atriz e dizia: “Sim, ela é linda, mas não é sensual para a época de Conan. Não acho que as mulheres daquele tempo tivessem seios tão grandes. E está vendo como os olhos dela são afastados? E o formato do nariz e da boca? Não é uma boca egípcia.”

Milius logo me fez começar a assistir a filmes que julgava importantes para minha preparação. Punha o clássico japonês de 1954 Os sete samurais para passar e dizia: “Você tem que observar Toshiro Mifune. Repare no modo como ele limpa a boca, sua forma de falar, como ele agarra as mulheres. Tudo tem estilo, tudo é um pouco exagerado e feito intencionalmente. Conan é assim.” Ele também me fez prestar atenção no manejo das espadas, porque o kenjutsu – a arte marcial japonesa clássica do combate com esse tipo de arma – fazia parte de uma gama de estilos de luta que Milius estava incluindo no universo de Conan; o roteiro demandava uma quantidade infinita de espadas, machados de batalha, lanças, facas e armaduras de vários períodos da história.

Ele começou a mandar especialistas para me treinar: mestres de artes marciais, armeiros, dublês especializados em montaria. Durante três meses, fiz duas horas de aula de espada por dia. Ao contrário da espada samurai, muito leve e afiada – projetada para decepar cabeças e membros e cortar corpos ao meio –, a espada medieval europeia é imensa e tem lâmina dupla. Foi projetada para desferir golpes fortes, que atravessem armaduras e carne. Tive que aprender quais são as partes do corpo vulneráveis aos ataques e como se deve manejar a espada, sem falar no que acontece quando você erra o golpe. A aceleração de uma espada de 5 quilos pode desequilibrar um lutador da mesma forma que uma arma de fogo com um coice forte, então é preciso antecipar e canalizar a energia de modo a poder voltar à posição de combate e desferir imediatamente outro golpe.

Em seguida tive um instrutor de kenjutsu, depois treinei com um especialista em um estilo de combate que combinava golpes e luta livre, com todo tipo de quedas, cotoveladas e pancadas. Um dublê me instruiu sobre técnicas de escalada, ensinou-me como cair e rolar o corpo e a pular de uma altura de 5 metros para cima de um colchão. Apesar de ocupado com a pós-produção de Amargo reencontro, Milius sempre reservava um tempinho para ver como eu estava evoluindo e me filmar.

O treinamento era tão intenso e exigia tanto tempo quanto a preparação para uma competição de fisiculturismo, e mergulhei nele de cabeça. Tinha a sensação de que minha carreira de ator de repente passara a ser o centro da minha vida. O sonho sempre existira, mas estivera embaçado: eu nunca sabia que direção ele iria tomar ou como conseguiria minha grande chance. Mas ser escolhido para fazer Conan foi como conquistar meu primeiro título de fisiculturismo internacional. Até o momento daquela conquista, podia ver meu progresso no espelho, ver os músculos crescerem devagar, mas na verdade nunca sabia em que ponto realmente estava. Então, depois de ganhar o Mister Universo, pensei: “Meu Deus, aqueles eram jurados internacionais, eu estava competindo com caras que vejo nas revistas, e ganhei. Eu vou alcançar o sucesso.”

Alguns dos nomes mais importantes de Hollywood passaram a se interessar pela minha carreira. Dino estava me dando a oportunidade de provar meu valor no cinema, mais ou menos como Joe Weider fizera no fisiculturismo. E eu tinha um vínculo com a Universal Pictures, estúdio internacional de primeira linha responsável por grandes sucessos como O franco-atirador e Tubarão. A Universal estava produzindo um filme chamado E.T., sobre um adorável extraterrestre que vem parar na Terra por engano. Os principais executivos do estúdio, Lew Wasserman e Sid Sheinberg, eram figuras lendárias, homens que fabricavam astros.

Meu instrutor dublê, um veterano de Hollywood que era um astuto observador do mundo do cinema, logo me disse isso. “Cara, você tem uma baita sorte. Por acaso percebe que agora faz parte da máquina de Hollywood? Sabe quanto dinheiro vão gastar com você? Só com você? Vinte milhões no filme... 20 milhões! E você vai fazer o protagonista. Toda essa máquina vai funcionar em seu benefício. Você vai estourar.”

Pensei nas pessoas que tinham ido para Hollywood e davam duro para pagar as contas, trabalhando como garçons e garçonetes enquanto faziam testes para papéis. Eu conhecera algumas delas nas aulas de interpretação e as ouvira dizer coisas como: “Fui reprovado de novo, não sei mais o que fazer.” As rejeições em Hollywood costumam ser frequentes, e o custo psicológico pode ser muito alto. Você vai para casa envergonhado depois de não ser escolhido mais uma vez. É por isso que tantos atores e atrizes recorrem às drogas. Eu conseguira evitar esse tipo de desespero e agora estava tendo uma chance. Fora escolhido. É claro que precisava fazer jus à oportunidade, mas não estava preocupado com isso. Faria o que fosse preciso para alcançar meu objetivo. Não compartilhei essa sensação de orgulho com mais ninguém. Meu estilo era seguir em frente e não pensar muito. Mas a sensação era incrível.

De longe, o instrutor mais excêntrico que Milius me arranjou era um fanático por Conan que morava no meio do mato, nas montanhas. Gostava tanto das histórias do herói que queria viver como ele e se tornara especialista em dormir na neve, subir em árvores e sobreviver do que conseguia obter na natureza. Chegava a chamar a si mesmo de Conan. A sujeira e o frio intenso não pareciam incomodá-lo: fui esquiar com ele em Aspen, no Colorado, e ele foi de short. Fiquei imaginando se ele tinha ficado chateado por eu ter sido escolhido para interpretar o personagem mítico em seu lugar, mas pelo contrário: ele adorou. A notícia que se espalhara entre os fãs era que eu estava treinando pesado e que iria montar a cavalo e lutar com espadas sem dublê. Portanto, os admiradores inveterados do personagem concluíram que eu era uma ótima escolha, principalmente porque meu corpo se parecia muito com o do Conan das revistas em quadrinhos. Fiquei feliz por ser aceito, e isso foi um sinal promissor para a produção, porque o público que veria e reveria o filme, e que o recomendaria para todos os amigos, supostamente era formado por caras como aqueles. Como recompensa pelo tempo que passou me ajudando, levamos o instrutor para participar das filmagens na Europa. Ele fez o papel de um guerreiro inimigo em uma cena de luta na qual foi esquartejado – por mim.

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