CAPÍTULO 22


O pequeno cortejo que rodeava as duas liteiras seguiu lenta mente através do labirinto do castelo e através dos sucessivos pontos de controle. De cada vez houve reverências formais, documentos foram meticulosamente examinados, um novo capitão e grupo de escolta cinzentos rendeu os que os acompanhavam, e eles foram liberados. A cada parada Blackthorne observava com apreensão sempre crescente o capitão da guarda se aproximar para inspecionar as cortinas cerradas da liteira de Kiritsubo. A cada vez o homem se curvava polidamente para a figura indistinta; ouvindo os soluços abafados, e acenava-lhes que prosseguissem.

Quem mais sabe? perguntava-se Blackthorne desesperadamente. As criadas devem saber - isso explicaria por que estão tão assustadas. Hiromatsu com certeza sabia, e evidentemente a Senhora Sazuko, do engodo. Mariko? Acho que não. Yabu? Toranaga confiaria nele? Esse maníaco sem pescoço do Buntaro? Provavelmente não.

Obviamente isto é uma tentativa de fuga altamente secreta.

Mas por que Toranaga arriscaria a vida fora do castelo? Lá dentro não estava mais seguro? Por que o sigilo? De quem está fugindo? De Ishido? Dos assassinos? Ou de alguma outra pessoa no castelo? Provavelmente de todos eles, pensou Blackthorne, desejando que estivessem a salvo na galera e ao mar. Se Toranaga for descoberto, vai chover bosta. A luta vai ser de morte. Estou desarmado e mesmo que tivesse um par de pistolas ou um morteiro de vinte polegadas e cem rapazes bons de briga, os cinzentos nos arrasariam. Não tenho para onde fugir nem onde me esconder.

- Está se cansando, Anjin-san? - perguntou Mariko delicadamente. - Se quiser, eu caminho e o senhor sobe na liteira.

- Obrigado - replicou ele acidamente, sentindo falta das botas, ainda desajeitado com as sandálias de correias. - Minhas pernas estão excelentes. Só queria que estivéssemos a salvo no mar.

- O mar é sempre seguro?

- As vezes, senhora. Nem sempre. - Blackthorne mal a ouvia. Estava pensando. Por Jesus, espero não entregar Toranaga. Isso seria terrível! Seria tão mais simples se eu não o tivesse visto. Foi apenas má sorte, um daqueles acidentes que podem pôr a perder um esquema perfeitamente planejado e executado. A velha, Kiritsubo, é uma excelente atriz, e a jovem também. Foi só porque não compreendi o que ela gritou que não caí no logro. Puro azar eu ter visto Toranaga claramente - de peruca, quimono, manto, maquiado, exatamente como Kiritsubo, mas sempre Toranaga.

Na parada seguinte, o novo capitão de cinzentos aproximou-se da liteira mais do que todos antes, as criadas em pranto curvando-se e erguendo-se no caminho, querendo não dar a impressão de estarem erguendo-se no caminho. O capitão olhou para Blackthorne e se aproximou. Após um exame incrédulo, falou com Mariko, que meneou a cabeça e respondeu-lhe. O homem grunhiu e dirigiu-se de volta a Yabu; devolveu os documentos e acenou ao cortejo que fosse em frente.

- Que foi que ele disse? - perguntou Blackthorne.

- Quis saber de onde o senhor era... onde era a sua casa.

- Mas a senhora balançou a cabeça. Como é que isso serviu de resposta?

- Oh, desculpe, ele disse. .. ele perguntou se os ancestrais remotos do seu povo tinham relação com o kami, o espírito, que vive ao norte, nos confins da China. Até bem pouco tempo atrás, pensávamos que a China fosse o único outro lugar civilizado na Terra. Além do Japão, neh? A China é tão vasta que é como o, próprio mundo - disse ela, e encerrou o assunto. O capitão na realidade perguntara se ela pensava que aquele bárbaro descendia de Harimwakairi, o kami que velava pelos gatos, acrescentando que aquele certamente fedia como um tourão no cio, conforme se supunha que o kami cheirasse.

Ela retrucara que não pensava assim, intimamente envergonhada pela rudeza do capitão, pois o Anjin-san não cheirava mal como o Tsukku-san ou o padre-lnspetor, ou os bárbaros habituais.

Seu aroma era quase imperceptível agora.

Blackthorne sabia que ela não estava dizendo a verdade. Como gostaria de saber falar a algaravia deles, pensou. E gostaria ainda mais de poder sumir desta ilha maldita, estar de volta a bordo do Erasmus, com a tripulação em ordem, muita comida, grogue, pólvora e munição, nossas mercadorias comerciadas e nós todos a caminho de casa. Quando será isso? Toranaga disse que seria logo. Será que se pode confiar nele? Como terá levado o navio a Yedo? Rebocado? Os portugueses o pilotaram? Gostaria de saber como está Rodrigues. Será que sua perna apodreceu? Nesta altura ele já deve saber se vai viver com as duas pernas ou só com uma - se a amputação não o matar -, ou se vai morrer. Jesus Deus do paraíso, proteja-me dos ferimentos e de todos os médicos. E dos padres.

Outro posto de controle. Blackthorne não conseguia entender como é que todos permaneciam tão polidos e pacientes, sempre se curvando, entregando os documentos e recebendo-os de volta, sempre sorrindo, sem nenhum sinal de irritação em ambas as partes. São tão diferentes de nós.

Olhou para o rosto de Mariko, parcialmente obscurecido pelo véu e o largo chapéu. Achou-a muito bonita e ficou contente por ter esclarecido o engano dela. Pelo menos não terei que agüentar mais aquele absurdo, disse a si mesmo. Bastardos esquisitos, são todos bastardos. Nojentos!

Depois que lhe aceitara o pedido de desculpas naquela manhã, ele começara a .perguntar sobre Yedo, sobre costumes japoneses, sobre Ishido e sobre o castelo. Evitara o tópico "sexo". Ela respondera pormenorizadamente, mas evitara quaisquer explicações políticas, e suas réplicas foram informativas mas inócuas. Em seguida ela e as criadas deixaram a sala para se prepararem para a partida e ele ficara sozinho com os guardas samurais.

Viver rodeado de gente o tempo todo estava deixando-o irritado. Há sempre alguém por perto, pensou ele. Há gente demais. São como formigas. Gostaria da tranqüilidade de uma porta de carvalho trancada para variar, com o ferrolho do meu lado, não do deles. Mal posso esperar para me ver a bordo de novo, ao ar livre, ao mar. Nem que seja naquela gorda galera sacolejante.

Agora, enquanto atravessava o Castela de Osaka, percebia que teria Toranaga dentro do seu próprio elemento, no mar, onde ele era rei.

Teremos bastante tempo para conversar. Mariko traduzirá e eu arranjarei tudo. Acordos de comércio, o navio, a devolução da nossa prata, e pagamento se ele quiser fazer negócio com os mosquetes e a pólvora. Combinarei para voltar no próximo ano com uma carga completa de seda. Terrível o que aconteceu com Frei Domingo, mas farei bom uso das informações dele. Vou pegar o Erasmus, navegar rio Pérola acima até Cantão, e romperei o bloqueio dos portugueses e dos chineses. Devolvam-me o meu navio e estou rico. Mais rico do que Drake! Quando chegar em casa, convoco todos os marujos de Plymouth ao Zuider Zee e controlaremos o comércio da Ásia toda. Onde Drake chamuscou a barba de Filipe eu vou lhe arrancar os testículos. Sem seda, Macau morre, sem Macau, Malaca morre, depois Goa! Podemos enrolar o império português como a um tapete. "Deseja o comércio com a Índia, Majestade? África? Ásia? Japão? Eis como consegui-lo dentro de cinco anos!"

"Levante-se, Sir John!"

Sim, estava ao seu alcance tornar-se cavaleiro, e facilmente afinal. E talvez mais. Capitães e navegadores tornam-se almirantes, cavaleiros, lordes, até condes. O único caminho de um inglês plebeu para a segurança, a verdadeira segurança de posição dentro do reino, era através do favor da rainha. E o caminho para o seu favor era levar-lhe riqueza, ajudá-la a pagar a guerra contra a Espanha fedorenta, e contra aquele papa bastardo.

Três anos me darão três viagens, regozijava-se. Oh, sei dos ventos, monções e das grandes tempestades, mas o Erasmus estará cochado e transportaremos cargas menores. Espere um minuto! Por que não fazer o serviço adequadamente e esquecer as pequenas cargas? Por que não capturar o Navio Negro deste ano? Depois você terá tudo!

Como?

Facilmente: se ele não tiver escolta e nós o apanharmos desprevenido. Mas não tenho homens suficientes. Espere, há homens em Nagasaki! Não é lá que estão todos os portugueses? Domingo não disse que é quase como um porto português? Rodrigues disse o mesmo! Nos navios não há marujos que foram levados à força para bordo, não há sempre alguns que estarão prontos a escapar para conseguir lucro rápido, seja quem for o capitão e qual for a bandeira? Com o Erasmus e a nossa prata eu poderia contratar uma tripulação. Sei que poderia. Não preciso de três anos. Dois serão suficientes. Dois anos com o meu navio e uma tripulação, depois para casa. Serei rico e famoso. E finalmente nos separaremos, o mar e eu. Para sempre.

Toranaga é a chave. Como é que você vai lidar com ele?

Passaram por outro posto de controle e dobraram uma esquina. À frente estava o último rastrilho e o último portão do castelo; além dele, a última ponte levadiça e o último fosso. Uma infinidade de archotes transformava a noite em dia carmesim.

Foi quando Ishido avançou das sombras.

Os marrons o viram quase simultaneamente. A hostilidade os invadiu a todos. Buntaro quase saltou por cima de Blackthorne para chegar mais perto da vanguarda da coluna.

- Esse bastardo está louco por uma luta - disse Blackthorne.

- Senhor? Desculpe, senhor, mas o que disse?

- Apenas... disse que seu marido parece... Ishido parece deixar seu marido muito enfurecido, e muito rapidamente.

Ela não respondeu.

Yabu deteve a coluna. Despreocupado ele estendeu o salvo-conduto ao capitão do portão e dirigiu-se a Ishido.

- Não esperava vê-lo de novo. Seus guardas são muito eficientes.

- Obrigado. - Ishido observava Buntaro e a liteira fechada atrás dele.

- Uma vez seria suficiente para examinar nosso passe - disse Buntaro, as armas chocalhando agourentamente. - Duas vezes, no máximo. O que somos nós? Uma expedição de guerra? É insultante!

- Não há intenção de insulto, Buntaro-san. Por causa do assassino, ordenei que se reforçasse a segurança. - Ishido olhou Blackthorne rapidamente e se perguntou de novo se devia deixá-lo partir ou detê-lo, como queriam Onoshi e Kiyama. Depois olhou novamente para Buntaro. Lixo, pensou. Logo a sua cabeça estará na ponta de um chuço. Como é que um primor como Mariko pôde permanecer casada com um gorila como você?

O novo capitão verificou meticulosamente um por um, certificando-se de que batiam com a lista.

- Está tudo em ordem, Yabu-sama - disse ele ao voltar à vanguarda da coluna. - Não precisam mais do passe. Conservamo-lo aqui.

- Ótimo. - Yabu voltou-se para Ishido. - Logo nos encontraremos.

Ishido tirou um rolo de pergaminho da manga.

- Gostaria de perguntar à Senhora Kiritsubo se ela levaria isto para Yedo. Para a minha sobrinha. É pouco provável que eu vá a Yedo por algum tempo.

- Certamente. - Yabu estendeu a mão.

- Não se incomode, Yabu-san. Eu mesmo perguntarei. - Ishido dirigiu-se para a liteira. As criadas obsequiosamente interceptaram-no. Asa estendeu a mão. - Posso pegar a mensagem, senhor? Minha am...

- Não.

Para surpresa de Ishido e de todos os que estavam perto, as criadas não lhe saíram do caminho.

- Mas minha am...

- Afastem-se! - rosnou Buntaro.

As duas recuaram com humildade, assustadas agora.Ishido curvou-se para a cortina.

- Kiritsubo-san, gostaria de saber se a senhora teria a gentileza de levar esta mensagem minha para Yedo. Para minha sobrinha.

Houve uma ligeira hesitação em meio aos soluços e a figura curvou-se em assentimento.

- Obrigado. - Ishido estendeu o delgado rolo de pergaminho a uma polegada da cortina.

Os soluços pararam. Blackthorne percebeu que Toranaga estava encurralado. A polidez exigia que pegasse o rolo e sua mão o trairia.

Todos esperavam que a mão aparecesse.

- Kiritsubo-san?

Ainda nenhum movimento. Então Ishido rapidamente deu uma passo à frente, abriu as cortinas com um puxão e no mesmo instante Blackthorne soltou um berro e começou a dançar, pulando como um louco. Ishido e os outros volveram-se rapidamente para ele, aturdidos.

Por um instante Toranaga ficou totalmente à vista atrás de Ishido.

Blackthorne pensou que Toranaga talvez pudesse passar por Kiritsubo a vinte passos, mas aqui, a cinco, era impossível, apesar do véu que lhe cobria o rosto. E no interminável segundo que antecedeu o gesto de Toranaga cerrando as cortinas com força, Blackthorne percebeu que Yabu o reconhecera, Mariko com certeza, Buntaro provavelmente, e alguns samurais também provavelmente. Ele deu um bote e agarrou o rolo de pergaminho, atirou-o por uma fenda nas cortinas e voltou-se, falando de modo ininteligível:

- É má sorte, no meu país, um príncipe entregar uma mensagem pessoalmente, como um bastardo comum... má sorte...

Tudo acontecera tão inesperadamente e tão depressa, que a espada de Ishido não deixou a bainha até Blackthorne estar ajoelhado e delirando diante dele como um insano boneco de mola, quando os reflexos do regente agiram e arremessaram a espada com ímpeto contra a garganta do inglês.

Os olhos desesperados de Blackthorne encontraram Mariko.

- Pelo amor de Cristo, ajude... má sorte... má sorte!

Ela gritou. A lâmina parou a um fio de cabelo do pescoço dele. Mariko, aflita, deu uma explicação do que Blackthorne dissera. Ishido baixou a espada, ouviu um instante, arrasou-a com um palavrório furioso, depois gritou com veemência crescente e esbofeteou Blackthorne com as costas da mão.

Blackthorne ficou fora dê si. Cerrou as manoplas e se atirou contra Ishido.

Se Yabu não tivesse sido rápido o bastante para agarrar o braço de Ishido que levantava a espada, a cabeça de Blackthorne teria rolado sobre o pó. Buntaro, uma fração de segundo depois, agarrou Blackthorne, que já estava com as mãos em torno do pescoço de Ishido. Foram necessários quatro marrons para arrancá-lo de cima de Ishido, depois Buntaro atingiu-o na nuca, deixando-o atordoado. Alguns cinzentos acorreram em defesa do amo, mas os marrons rodearam Blackthorne e a liteiras e por um momento a situação se equilibrou, com Mariko e as criadas deliberadamente gemendo e gritando, ajudando a criar mais caos e a desviar as atenções.

Yabu começou a aplacar a fúria de Ishido, Mariko, em lágrimas, repetia interminavelmente numa forçada semi-histeria que o bárbaro enlouquecido acreditava estar apenas salvando Ishido, o grande comandante - que ele pensou que fosse um príncipe - de um mau kami. - E tocar-lhes o rosto é o pior dos insultos, exatamente como conosco, foi isso o que o deixou momentaneamente louco. Ele é um bárbaro insensato, mas é um daimio em sua terra, e só estava tentando ajudá-lo, senhor!

Ishido cobriu Blackthorne de imprecações e deu-lhe um pontapé. Blackthorne estava voltando a si e ouvia o tumulto com grande tranqüilidade. Aos poucos seus olhos se desanuviaram. Havia cinzentos à sua volta, vinte para um, espadas desembainhadas, mas por enquanto ninguém estava morto e todos esperavam disciplinadamente.

Blackthorne viu que todas as atenções se concentravam nele. Mas agora sabia que tinha aliados.

Ishido virou-se para ele de novo e chegou mais perto, gritando. Ele sentiu o aperto dos marrons se intensificar e soube que o golpe estava vindo, mas desta vez, ao invés de tentar se libertar, coisa que os samurais estavam esperando, começou a se deixar cair, depois imediatamente a se endireitar e tombar outra vez, rindo insanamente, para em seguida se pôr a dançar uma hornpipe corcoveante. Frei Domingo lhe dissera que todo mundo no Japão acreditava que a única causa da loucura era um kami, por isso os loucos, assim como todas as crianças bem novas e os homens muito velhos, não eram responsáveis e tinham privilégios especiais, às vezes. Então saltava em delírio, cantando no ritmo para Mariko:

- Ajude... preciso de ajuda, pelo amor de Deus... não vou agüentar isto muito tempo mais... ajude... - desesperadamente se comportando como um lunático, sabendo que era a única coisa que poderia salvá-los.

- Ele está louco... está possesso - gritou Mariko, imediatamente entendendo o ardil de Blackthorne.

- Sim - disse Yabu, ainda tentando se recuperar do choque de ter visto Toranaga, sem saber ainda se o Anjin-san estava fingindo ou se realmente enlouquecera.

Mariko estava fora de si. Não sabia o que fazer. O Anjin-san salvou a vida do Senhor Toranaga, mas como é que sabia? - não parava de repetir para si mesma, irracionalmente.

O rosto de Blackthorne estava exangue exceto no vergão escarlate deixado pela bofetada. Não parava de dançar, esperando freneticamente a ajuda que não vinha. Então silenciosamente amaldiçoou Yabu e Buntaro como covardes sem mãe, e Mariko, pela cadela estúpida que era. Parou repentinamente de dançar, curvou-se para Ishido como um fantoche convulsivo e, meio caminhando, meio bailando, dirigiu-se para o portão.

- Sigam-me, sigam-me! - gritou, a voz quase estrangulada, tentando indicar o caminho como um Pied Pipe{3}.

Os cinzentos barraram-lhe o caminho. Ele berrou com raiva fingida e imperiosamente ordenou-lhes que saíssem da frente, para logo em seguida cair numa gargalhada histérica.

Ishido agarrou um arco e uma flecha. Os cinzentos se afastaram. Blackthorne estava quase atravessando o portão. Voltou-se sabendo que não adiantava nada correr, que estava encurralado. Desamparado, recomeçou a dança furiosa.

- Ele é louco, um cachorro louco! Cachorros loucos têm que ser controlados! - A voz de Ishido soou áspera. Armou o arco e fez pontaria.

Imediatamente Mariko deu um pulo da sua posição protetora perto da liteira de Toranaga e começou a caminhar na direção de Blackthorne.

- Não se preocupe, Senhor Ishido - gritou.

- Não há por que se preocupar... é uma loucura momentãnea... peço permissão... - Aproximando-se ela pôde ver a exaustão de Blackthorne, o sorriso rígido de louco, e teve medo, malgrado seu. - Posso ajudar agora, Anjin-san - disse precipitadamente. - Temos que tentar s... sair daqui. Eu o seguirei. Não se preocupe, ele não vai atirar. Por favor, pare de dançar agora.

Blackthorne parou imediatamente, voltou-se e caminhou tranqüilamente para a ponte. Ela o seguiu, um passo atrás conforme o costume, esperando as setas, de ouvidos atentos.

Mil olhos observavam o gigante enlouquecido e a minúscula mulher sobre a ponte, que se afastavam.

Yabu recobrou-se.

- Se o quer morto, deixe-me fazê-lo, Ishido-sama. É inconveniente para o senhor tomar-lhe a vida. Um general não mata com as próprias mãos. Os outros devem fazer isso por ele. - Chegou bem perto e baixou a voz. - Deixe-o viver. A loucura foi conseqüência do seu tapa. Ele é um daimio em sua terra e o tapa... foi como Mariko-san disse, neh? Confie em mim, ele é valioso para nós vivo.

- O quê?

- Ele é mais valioso vivo. Confie em mim. O senhor pode matá-lo a qualquer momento. Precisamos dele vivo. Ishido leu desespero no rosto de Yabu, e verdade. Baixou o arco.

- Muito bem. Mas um dia eu vou querê-lo vivo. Vou pendurá-lo pelos calcanhares sobre o abismo.

Yabu engoliu em seco e fez meia mesura. Nervosamente fez um gesto para que o cortejo prosseguisse, receoso de que Ishido se lembrasse da liteira e de "Kiritsubo".

Buntaro, fingindo deferência, tomou a iniciativa e pos os marrons em marcha. Não questionou o fato de Toranaga ter magicamente aparecido como um kami no meio deles, apenas que o amo estava em perigo e quase indefeso. Viu que Ishido não tirava os olhos de Mariko e do Anjin-san, mas ainda assim se curvou polidamente para ele e se postou atrás da liteira de Toranaga para proteger o amo das flechas, caso a luta começasse ali.

A coluna aproximava-se do portão agora. Yabu tomou posição como solitária defesa de retaguarda. Esperava que o cortejo fosse detido a qualquer momento. Com certeza alguns cinzentos deviam ter visto Toranaga, pensou ele. Quanto tempo vai levar até que contem a Ishido?

Ele não vai pensar que eu fazia parte da tentativa de fuga? E isso não vai me arruinar para sempre?

A meio caminho sobre a ponte, Mariko olhou para trás um instante. - Eles vêm vindo, Anjin-san, as duas liteiras estão atravessando o portão, estão na ponte agora!

Blackthorne não respondeu nem se voltou. Permanecer ereto exigia-lhe toda a força de vontade remanescente. Perdera as sandálias, o rosto queimava do tapa, e a cabeça martelava de dor. Os últimos guardas deixaram-no atravessar o rastrilho. Também deixaram Mariko passar sem detê-la. E depois as liteiras.

Blackthorne liderou a marcha descendo a suave colina, passando pelo pátio aberto, cruzando a última ponte. Foi só quando se viu na área coberta de mato, totalmente fora da vista do castelo, que desfaleceu.


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