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21h45m

Linc Bartlett viu Orlanda antes que ela o visse, e ela o deixou sem fôlego. Não pôde evitar compará-la com Casey, que estava ao seu lado, conversando com Andrew Gavallan. Orlanda usava um vestido longo de seda branca, de frente única, decotadíssimo nas costas, que, de um modo discreto, parecia oferecer seu corpo dourado. Casey usava o vestido verde que ele já vira diversas vezes, a cabeleira fulva cascateante.

— Vocês dois gostariam de vir à festa de Shi-teh, logo mais à noite? — perguntara Orlanda de manhã. — Poderia ser importante para você e a sua Casey estarem presentes.

— Por quê?

— Porque quase todos os negócios importantes em Hong Kong são tratados nesses acontecimentos sociais, Sr. Bartlett. Poderia ser muito importante para vocês envolverem-se com pessoas como Shi-teh... e com o Turf Club, o Cricket Club, até mesmo o Clube, embora isso seja impossível.

— Porque sou americano?

— Porque alguém tem que morrer para abrir uma vaga... um inglês ou um escocês. — Ela dera uma risada. — A lista de espera é do tamanho da Queen's Road! É exclusivo para homens, muito formal, velhas poltronas de couro, homens idosos fazendo a sesta depois de um almoço de três horas e dez doses de gim, The Times, e todo o resto!

— Pombas, parece excitante!

Ela rira outra vez. Tinha os dentes brancos, e ele não via imperfeições nela. Conversaram enquanto tomavam o café da manhã, e ele achara um prazer falar com ela. E estar com ela. Seu perfume era tentador. Casey raramente usava perfume — dizia que ele apenas distraía ainda mais os empresários com quem tinha que tratar. Com Orlanda, comera ovos com bacon bem frito, torradas e tomara café. Um desjejum à moda americana, num hotel novo em folha que ela sugerira, chamado O

Mandarim. Casey não tomava desjejum. Apenas café e torrada, às vezes, ou croissants.

A entrevista transcorrera com facilidade, e o tempo passara depressa demais. Jamais estivera na companhia de uma mulher com uma feminilidade tão franca e confiante. Casey era sempre forte, eficiente, serena, e pouco feminina. "Por escolha, escolha dela e concordância minha", lembrou a si mesmo.

— Aquela é Orlanda?

Casey olhava para ele com uma das sobrancelhas arqueada.

— É — replicou, tentando sem êxito saber o que ela estava pensando. — O que você acha?

— Acho que ela é dinamite.

— De que maneira?

Casey achou graça. Virou-se para Gavallan, que estava tentando concentrar-se e ser polido, mas cujos pensamentos estavam voltados para Kathy. Depois que Kathy lhe contara, à noitinha, não quisera sair de junto dela, mas ela insistira, dizendo que era importante para ele estar presente.

— Você a conhece, Andrew?

— Quem?

— A moça de branco.

— Onde? Ah, sim, mas só de reputação.

— É boa ou ruim?

— Bem, isso depende do ponto de vista, Casey. Ela é portuguesa, eurasiana, é claro. Orlanda foi amiga de Gornt durante vários anos.

— Quer dizer sua amante?

— É, suponho que seja a palavra certa — disse, educadamente, detestando intensamente a franqueza de Casey. — Mas foi tudo muito discreto.

— Gornt tem bom gosto. Sabia que ela foi amiguinha dele, Linc?

— Ela me disse, hoje de manhã. Eu a conheci no escritório de Gornt, faz dois dias. Ele me disse que ainda são amigos.

— Não se pode confiar em Gornt — disse Gavallan. Casey falou:

— Há muita gente forte apoiando-o, dentro e fora de Hong Kong, segundo me disseram. Ao que me consta, não está em dificuldades no momento, como vocês. Deve ter ouvido dizer que quer que fechemos negócio com ele, não com vocês.

— Não estamos em dificuldades — retrucou Gavallan. Olhou para Bartlett. — O nosso negócio está valendo?

— Assinamos na terça-feira. Se vocês estiverem prontos — falou Bartlett.

— Estamos prontos agora.

— O Ian quer que a gente fique na moita até sábado. Pra nós, tudo bem — disse Casey. — Não é, Linc?

— Certo.

Bartlett lançou um olhar para Orlanda. Casey acompanhou o movimento dos seus olhos.

Notara a moça no primeiro momento em que ela hesitara, à entrada da sala.

— Com quem ela está conversando, Andrew?

O homem tinha um ar interessante, era esbelto, elegante, na casa dos cinqüenta anos.

— Aquele é Lando Mata. Também é português, de Macau.

Gavallan se perguntava, angustiado, se Dunross conseguiria persuadir Mata a vir salvá-lo com todos os seus milhões. "O que eu faria se fosse tai-pan?", perguntou-se, cansado. "Compraria amanhã, ou fecharia o negócio com Mata e Pão-Duro, hoje. Com o dinheiro deles, a Casa Nobre ficaria a salvo por gerações, embora fora do nosso controle. Não há por que se preocupar agora. Espere até ser tai-pan." Então viu Mata sorrir para Orlanda, e ambos olharam para aquele lado, e começaram a abrir caminho entre os convidados, em sua direção. Os olhos dele fitavam os seios firmes dela, livres sob a seda. Mamilos duros. "Santo Deus", pensou, assombrado, "nem mesmo Vênus Poon ousaria tanto!" Ao chegarem até eles, Gavallan fez as apresentações e postou-se de lado para observá-los.

— Alô — Orlanda cumprimentou Casey, carinhosamente. — Linc me falou muito a seu respeito, e de como é importante para ele.

— Também me falou a seu respeito — disse Casey, no mesmo tom. — Mas não o bastante. — "Você é muito mais linda do que Linc deixou transparecer", pensou. "Muitíssimo mais. Com que então é Orlanda Ramos? Bonita, de fala macia, feminina, e uma piranha safada que está de olho no meu Linc. Meu Deus, o que faço agora?"

Ouviu a si mesma conversando fiado, mas sua mente ainda estava pesando e analisando Orlanda Ramos. "Por um lado seria bom para o Linc ter um caso. Faria com que esfriasse um pouco. Ontem à noite foi tão horrível para ele quanto para mim. Ele tinha razão sobre eu me mudar de quarto. Mas, se a magia dessa aí o envolver, será que conseguirei arrancá-lo dela? Será apenas uma garota como as outras, que nada significaram para mim e que, depois de uma semana, também nada significaram para ele?

"Essa não", concluiu Casey, decisivamente. "Tenho duas escolhas. Ou mantenho as treze semanas e quatro dias e entro na luta, ou não mantenho e entro na luta."

Sorriu.

— Orlanda, seu vestido é espetacular.

— Obrigada. Posso chamá-la de Casey?

As duas mulheres sabiam que a guerra tinha começado.

Bartlett ficou encantado ao ver que Casey simpatizara obviamente com Orlanda. Gavallan observava, fascinado pelos quatro. Havia um calor estranho entre todos. Especialmente entre Bartlett e Orlanda.

Voltou sua atenção para Mata e Casey. Mata era gentil, cheio de charme do Velho Mundo, concentrando-se em Casey, procurando fasciná-la. "Até onde ele conseguirá chegar com ela?", pensou. "É curioso que Casey não pareça se importar absolutamente com Orlanda. Será que não notou que o namorado está enrabichado? Pode ser que não. Ou pode ser que esteja se lixando, e que ela e Bartlett sejam apenas sócios comerciais e nada mais. Talvez ela não passe de um sapatão. Ou talvez seja apenas frígida, como tantas. Que pena!"

— O que está achando de Hong Kong, srta. Casey? — perguntou Mata, imaginando como ela seria na cama.

— Infelizmente ainda não vi muita coisa, embora tenha ido aos Novos Territórios, na excursão do hotel, dar uma espiada na China.

— Gostaria de ir? Quero dizer, ir mesmo para a China? Entrar lá, digamos, em Cantão? Posso dar um jeito para que a senhorita seja convidada.

Ela ficou chocada.

— Mas somos proibidos de entrar na China... nossos passaportes não são válidos.

— Ah, não teria que usar o seu passaporte. A RPC não liga para passaportes. Tão poucos quai loh entram na China que não há problema. Eles lhe dão um visto por escrito, e carimbam-no.

— Mas o nosso Departamento de Estado... acho que não iria me arriscar agora.

Bartlett concordou.

— Não devemos nem entrar na loja comunista aqui. A loja de departamentos.

— É, o seu governo é mesmo muito estranho — disse Mata. — Como se entrar numa loja fosse subversivo! Ouviu falar sobre o Hilton?

— Falar o quê?

— Dizem que compraram uma coleção maravilhosa de antigüidades chinesas para o novo hotel. — Mata sorriu. — Parece que agora os Estados Unidos decidiram que eles não poderão usar nada daquilo, nem mesmo aqui em Hong Kong. Está tudo no depósito. Pelo menos, é o que dizem.

— Não é de admirar. Quem não tem êxito, nos Estados Unidos, entra para o governo — disse Bartlett, com azedume.

— Casey, decida por si mesma — falou Mata. — Visite a loja. Chama-se China Arts and Crafts, e fica na Queen's Road. Os preços são bem razoáveis, e os comunistas não têm chifres e rabos pontudos.

— É bem diferente do que eu esperava — disse Bartlett. — Casey, você ia ficar fascinada com algumas das coisas.

— Você esteve lá? — indagou, surpresa.

— Claro.

— Levei o Sr. Bartlett lá hoje de manhã — explicou Orlanda. — íamos passando e entramos. Terei prazer em ir fazer compras com você, se quiser.

— Obrigada, gostaria muito — replicou Casey, igualmente simpática, consciente de todos os sinais de perigo. — Mas disseram-nos, em Los Angeles, que a CIA vigia os americanos que entram e saem, porque tem certeza de que é um ponto de encontro comunista.

— Para mim pareceu uma loja comum, Casey — falou Bartlett. — Só o que vi de diferente foram uns cartazes de Mao. Mas não se pode pechinchar. Todos os preços estão marcados. Coisas baratíssimas. Uma pena que não possamos levá-las para casa.

Nos Estados Unidos havia um embargo total a todas as mercadorias de origem chinesa, até mesmo antigüidades que estavam em Hong Kong há cem anos.

— Isso não é problema — falou Mata prontamente, imaginando o quanto ganharia como intermediário. — Se houver algo que deseje, terei prazer em comprar.

— Mas, ainda assim, não poderemos levar nada para os Estados Unidos, Sr. Mata — disse Casey.

— Ah, isso também é fácil. Faço-o para amigos americanos o tempo todo. Envio as compras deles para uma companhia que tenho em Cingapura ou em Manila. Por uma pequena taxa, eles as enviam para os Estados Unidos com um certificado de origem: Malásia ou Filipinas, o que preferirem.

— Mas isso é trapaça. Contrabando.

Mata, Gavallan e Orlanda riram abertamente, e Gavallan disse:

— O comércio é a graxa do mundo. Mercadorias embargadas dos Estados Unidos ou Formosa chegam à República

Popular da China, mercadorias da RPC vão para Formosa e Estados Unidos... se há procura. Claro que sim!

— Eu sei — disse Casey —, mas não acho que esteja certo.

— A Rússia soviética dedica-se à sua destruição, mas ainda assim comerciam com ela — disse Gavallan para Bartlett.

— Nós, não — retrucou Casey. — Não a Par-Con, embora nos tenham procurado para vender computadores. Gostamos muito de lucros, mas, nesse caso, negativo. O governo comercia, mas com mercadorias controladas com muito cuidado. Trigo, coisas assim.

— Onde houver um comprador disposto a comprar alguma coisa, sempre haverá um vendedor — disse Gavallan, irritado com ela. Olhou pelas janelas e desejou estar de volta a Xangai. — Vejam por exemplo o Vietnam, a sua Argélia.

— Como? — perguntou Casey. Gavallan voltou a olhar para ela.

— Quero dizer que o Vietnam sangrará a sua economia até a morte, como fez com a França, e como a Argélia fez com a França.

— Jamais entraremos no Vietnam — disse Bartlett, confiante. — Por que entraríamos? Não tem nada a ver conosco.

— Concordo — disse Mata —, mas, apesar disso, os Estados Unidos estão tendo um envolvimento crescente. Na verdade, Sr. Bartlett, acho que estão sendo sugados para o abismo.

— De que maneira?

— Acho que os soviéticos os atraíram deliberadamente para o Vietnam. Vocês enviarão tropas, mas eles, não. Vocês lutarão contra os vietnamitas e a selva, e os soviéticos serão os vencedores. A CIA já está lá com força total. Tem uma linha aérea funcionando. Já estão sendo construídos campos de pouso com dinheiro americano, armas americanas estão vindo aos borbotões. Já há soldados lutando lá.

— Não acredito — disse Casey.

— Pode acreditar. São chamadas de Forças Especiais, às vezes Força Delta. Desculpe, mas o Vietnam vai ser um grande problema para o seu governo, a não ser que ele seja muito esperto.

Bartlett falou, confiante:

— Graças a Deus, é. Kennedy cuidou de Cuba. Cuidará do Vietnam também. Fez o Grande K recuar em Cuba, e o fará de novo. Ganhamos, daquela vez. Os soviéticos retiraram seus mísseis.

Gavallan estava sombriamente divertido.

— Devia falar com o Ian sobre Cuba, meu velho, ele fica com a corda toda. Ele diz, e eu concordo, que vocês perderam. Os soviéticos sugaram vocês para outra armadilha. Vocês fizeram papel de bobos. Ele acredita que construíram as bases dos mísseis quase abertamente, querendo que vocês os detectassem, o que fizeram, e então houve um bocado de ameaças de lá e de cá, o mundo todo morto de medo, e, em troca da promessa soviética de retirar os mísseis de Cuba, seu presidente rasgou a sua Doutrina Monroe, a pedra angular de todo o seu sistema de segurança.

— Como?

— Claro. Kennedy não deu a Khruchov uma promessa por escrito de não invadir Cuba, de não permitir uma invasão vinda de território americano... ou de qualquer outro lugar no hemisfério ocidental? Por escrito, Santo Deus! Então, agora, uma potência européia inimiga, a Rússia soviética, totalmente contra a sua Doutrina Monroe, está abertamente estabelecida a cento e cinqüenta quilômetros da sua costa, num local cujas fronteiras são protegidas por escrito pelo seu próprio presidente, proteção ratificada pelo seu Congresso. O Grande K aplicou-lhes um golpe colossal, jamais igualado em toda a sua história. E tudo por nada! — A voz de Gavallan ficou mais áspera. — Agora Cuba está segura, e sem dúvida crescerá, expandir-se-á e acabará por contagiar toda a América do Sul. Segura para submarinos, navios, aviões soviéticos... Santo Deus, mas que vitória maravilhosa!

Casey olhou para Bartlett, chocada.

— Mas, Linc, claro que não é assim! Bartlett estava igualmente chocado.

— Acho que... se a gente pensar direito, é, sim. Na verdade, não lhes custou nada.

— Ian está convencido disso — falou Gavallan. — Converse com ele. Quanto ao Vietnam, aqui ninguém acha que o presidente Kennedy vai saber cuidar do assunto, por mais que o admiremos pessoalmente. A Ásia não é como a Europa, ou as Américas. Aqui se pensa diferente, se age diferente, e se tem valores diferentes.

Fez-se um silêncio repentino, rompido por Bartlett.

— Então acha que vai haver guerra? Gavallan lançou-lhe um olhar.

— Não é motivo para você se preocupar. A Par-Con vai se sair muito bem. Vocês têm indústria pesada, computadores, espuma de poliuretano, contratos do governo para equipamentos aeroespaciais, produtos petroquímicos, equipamentos de rádio... Com suas mercadorias e a nossa técnica pericial, se houver uma guerra... bem, o céu é o limite.

— Não acho que gostaria de ter lucro dessa maneira — falou Casey, irritada com ele. — É um modo nojento de se faturar.

Gavallan virou-se para ela, com raiva.

— Muitas coisas neste mundo são nojentas, erradas e injustas... — Já ia sair com quatro pedras na mão, furioso pelo modo como ela interrompia a conversa dele com Bartlett, mas resolveu que ali não era a hora nem o lugar, portanto disse, amavelmente: — Mas, claro, tem razão. Ninguém quer lucrar com a morte. Se me dão licença, tenho que ir andando... Sabem que todos têm lugares marcados? O jantar vai começar a qualquer momento. Uma questão de prestígio.

Afastou-se.

— Acho que ele não gosta nem um pouco de mim — disse Casey.

Eles acharam graça no modo como ela falou.

— O que você disse está certo, Casey — falou Orlanda. — Tem razão. A guerra é terrível.

— Esteve aqui durante a guerra? — perguntou Casey, inocentemente.

— Estive, mas em Macau. Sou portuguesa. Minha mãe me contou que lá não foi muito terrível. Os japoneses não perturbaram Macau porque Portugal era neutro. — Orlanda acrescentou, docemente: — Estou com apenas vinte e cinco anos, portanto mal me lembro da guerra. Ainda não tinha sete anos quando ela acabou. Macau é uma cidade gostosa, Casey. Tão diferente de Hong Kong! Você e Linc talvez queiram ir até lá. Vale a pena. Adoraria ser sua guia.

"Aposto que sim", pensou Casey, sentindo que seus vinte e seis anos pesavam contra os vinte e cinco de Orlanda, que tinha a pele de uma menina de dezessete.

— Seria ótimo. Mas, Lando, o que há com o Andrew? Por que estava tão bronqueado? Porque sou uma mulher vice-presidente e tudo o mais?

— Duvido. Estou certo de que você está exagerando — replicou Mata. — Acontece que ele não é muito pró-americanos, e fica doido porque o Império Britânico não existe mais. Os Estados Unidos são o árbitro dos destinos do mundo e estão cometendo erros evidentes, acha ele. A maioria do povo britânico concorda com ele, infelizmente! É em parte inveja, claro. Mas sejam pacientes com o Andrew. Afinal, seu governo entregou Hong Kong para Chang em 45... foi a marinha britânica que o impediu. Os americanos ficaram do lado dos russos, contra eles, no caso de Suez, e apoiaram os judeus contra eles na Palestina... há dúzias de exemplos. Também é verdade que aqui muitos de nós acham errada a hostilidade atual dos Estados Unidos contra a China.

— Mas eles são tão comunistas quanto a Rússia. Entraram em guerra conosco quando estávamos apenas tentando proteger a liberdade da Coréia do Sul. Não íamos atacá-los.

— Mas, historicamente, a China sempre cruzou o Yalu quando qualquer invasor estrangeiro se aproximava daquela fronteira. Sempre. O seu MacArthur tinha fama de ser historiador — disse Mata pacientemente, imaginando se ela seria assim tão ingênua na cama —, devia ter sabido. Ele... ou o seu presidente... forçou a China a tomar um caminho que não queria tomar. Tenho certeza absoluta disso.

— Mas não fomos invasores. Foi a Coréia do Norte que invadiu a do Sul. Nós só estávamos querendo ajudar um povo a ser livre. Não tínhamos nada a ganhar com a Coréia do Sul. Gastamos bilhões tentando ajudar o povo a continuar livre. Veja o que a China fez ao Tibete... e à índia, no ano passado. Parece que sempre somos o bode expiatório, e só o que queremos é proteger a liberdade. — Interrompeu-se quando um murmúrio de alívio correu a sala e as pessoas começaram a se dirigir para as suas mesas. Garçons carregando travessas com tampos de prata entravam em grande número no aposento. — Graças a Deus! Estou morta de fome!

— Eu também — disse Bartlett.

— Até que o Shitee está adiantado, hoje — disse Mata, com uma risada. — Orlanda, devia tê-los avisado de que é um velho costume fazer sempre uma boquinha antes dos banquetes de Shitee.

Orlanda apenas dirigiu-lhes seu lindo sorriso, enquanto Casey dizia:

— Orlanda avisou o Linc, que me avisou, mas achei que dava para agüentar.

Olhou para a sua inimiga, que era quase meia cabeça mais baixa do que ela, com cerca de um metro e sessenta. Pela primeira vez na vida sentiu-se grande e desajeitada. "Seja sincera", falou com seus botões, "desde que saiu do hotel para as ruas e viu todas as moças e mulheres chinesas com mãos, pés e corpos minúsculos, tão pequeninas, de olhos e cabelos escuros, sentiu-se imensa e estranha. É. Agora posso entender por que nos fitam tanto, de boca aberta. E quanto ao turista comum, barulhento, gordo, balançando as banhas...

"Mesmo assim, Orlanda Ramos, embora seja bonita e pense que é esperta, não é a garota certa para Linc Bartlett. Portanto, vá esfregar o rabo nas ostras!"

— Da próxima vez, Orlanda — falou, amavelmente —, vou dar mais atenção às suas recomendações.

— Recomendo que a gente vá comer, Casey. Também estou com fome.

Mata falou:

— Acredito que estejamos todos à mesma mesa. Devo confessar que mexi meus pauzinhos.

Satisfeito, foi mostrando o caminho, mais excitado do que nunca com o desafio de levar Casey para a cama. No momento em que pusera os olhos nela, tinha decidido isso. Em parte por causa de sua beleza, altura e lindos seios, um contraste tão agradável com a miudeza e monotonia da moça asiática normal. Em parte por causa das pistas que Orlanda lhe dera. Mas principalmente por causa de sua idéia repentina de que, rompendo a ligação Bartlett-Casey, poderia destruir a investida da Par-Con na Ásia. "É muito melhor manter os americanos, com a sua moralidade hipócrita e nada prática, e a sua intromissão, fora da nossa área o máximo possível", falou com seus botões. "E se Dunross não tiver fechado o negócio com a Par-Con, terá que me vender o controle que desejo. Então, finalmente, eu serei o tai-pan da Casa Nobre, independente de todos os Dunrosses e Struans.

"Minha Nossa Senhora, a vida é mesmo boa! Curioso que esta mulher possa ser a chave para a melhor fechadura da Ásia", pensou. A seguir, acrescentou, satisfeito: "É evidente que pode ser comprada. É apenas uma questão de preço".


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