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20h25m
Na ruidosa sala de estar do fim do corredor, Casey terminou sua bebida e pousou o copo. Estava se sentindo inquieta e muito estranha. Parte dela estava feliz por Dunross ter-se safado, e a outra parte estava triste porque agora Gornt estava enrascado. Era bem evidente para ela que, com todas as transações que estavam ocorrendo à sua volta, o preço inicial das ações da Struan no pregão seria bem alto. "Pobre Quillan", pensou. "Se ele não cobrir a sua posição, vai estar atolado na merda... e, falemos francamente, fui eu que o pus ali. Não foi?
"Claro, mas eu tinha que livrar a cara do Dunross, porque, sem ele, o Gornt nos teria espremido até o bagaço... e talvez a todos os outros também. É, é bom não esquecer, não fui eu que dei início à incursão na Struan. Essa incursão foi do Linc, não minha. O Linc não disse sempre que não se deve misturar negócios e prazer? Não concordamos com isso?"
Linc. Sempre de volta ao Linc.
Casey não o vira o dia todo, nem tivera notícias dele. Deveriam ter se encontrado para tomar café juntos, mas havia um "favor não incomodar" na porta dele, e um "favor não incomodar" no telefone dele. Portanto, ela o deixara em paz e afastara a idéia de Orlanda do pensamento... "Será que Orlanda também estava Iá?" E, naquela noite, depois que voltara do passeio de barco, havia um recado: "Oi, divirta-se". Então, tomara banho, vestira-se, reprimira sua impaciência e viera para o coquetel. Não fora divertido no começo, todo mundo deprimido e apreensivo, e depois das novidades e da saída violenta de Gornt, também continuara a não ser divertido. Logo depois da saída de Gornt, Dunross abrira caminho até onde ela estava e lhe agradecera de novo, mas quase imediatamente fora cercado por homens entusiasmados discutindo negócios e oportunidades. Ela os observava, sentindo-se muito sozinha. "Talvez o Linc já tenha voltado ao hotel agora", pensou. "Gostaria que... deixe para Iá, está na hora de ir para casa," Ninguém notou quando ela saiu discretamente.
Roger Crosse estava junto ao elevador. Segurou a porta para ela, depois apertou o botão de descida.
— Obrigada. Bela festa, não? — disse ela.
— É, foi, sim — replicou ele, distraidamente.
No térreo, Crosse deixou que ela passasse primeiro, e depois saiu, em largas passadas, pela porta da frente e colina abaixo. "Por que tanta pressa?", perguntou-se ela, dirigindo-se para o grupo que esperava pelos táxis, feliz por não estar chovendo de novo. Parou bruscamente. Orlanda Ramos, com os braços cheios de embrulhos, vinha entrando no saguão. Avistaram-se ao mesmo tempo. Orlanda foi a primeira a se recuperar.
— Boa noite, Casey — disse, com seu melhor sorriso. — Como você está bonita!
— Você também — replicou Casey. E era verdade. Sua inimiga usava uma saia azul-clara e uma blusa que combinava perfeitamente com ela.
Orlanda derramou uma torrente de cantonense impaciente sobre o zelador amarfanhado que estava ali por perto. Prontamente, ele se aproximou e pegou os pacotes das mãos dela, resmungando.
— Desculpe, Casey — disse ela, cortesmente, uma ponta de nervosismo na voz —, mas houve um pequeno desabamento logo ali abaixo, e tive que deixar meu carro Iá. Veio fazer alguma visita?
— Já estou de saída. Você mora aqui?
— Moro, sim.
Novo silêncio entre elas, ambas se preparando. Então Casey deu um boa-noite educado e dispôs-se a ir embora.
— Talvez devêssemos conversar — disse Orlanda, e Casey parou.
— Claro, Orlanda, quando você quiser.
— Tem tempo agora?
— Acho que sim.
— Quer me acompanhar até o meu carro? Tenho que ir apanhar o resto dos embrulhos. Você não vai conseguir um táxi aqui, Iá embaixo será mais fácil.
— Está bem.
As duas mulheres saíram. A noite estava fresca, mas Casey ardia, e Orlanda também, cada uma delas sabendo o que vinha pela frente, uma temendo a outra. Foram andando com cuidado pela rua, molhada da água que escorria morro abaixo. Havia um prenuncio de mais chuva para breve, o que se podia perceber pela cerração baixa e escura. Mais adiante, a uns cinqüenta metros, Casey podia ver onde o aterro cedera, parcialmente, jogando um monte de terra, pedras, vegetação e detritos no meio da rua. Não havia calçada. Do outro lado do deslizamento, uma fila de carros se detivera, e manobrava impacien-temente para dar meia-volta. Alguns pedestres passavam com dificuldade por cima do aterro.
— Mora há muito tempo no Rose Court? — perguntou Casey.
— Há alguns anos. É muito agradável. Acho... Ah! Você estava na festa do Jason Plumm, na festa das Propriedades Asiáticas?
— Estava. — Casey viu o alívio no rosto de Orlanda, e aquilo a deixou com raiva, mas controlou-a e disse suavemente: — Orlanda, na verdade não temos nada a conversar, temos? Vamos nos dizer boa-noite.
Orlanda ergueu os olhos para ela.
— Linc está comigo. Está comigo no meu apartamento. Neste momento.
— Foi o que imaginei.
— Isso não a incomoda?
— Incomoda-me muitíssimo. Mas isso é problema do Linc. Não somos casados, como sabe, nem mesmo noivos, como sabe... você tem o seu jeito, eu tenho o meu, portanto...
— O que quer dizer com isso? — indagou Orlanda.
— Que conheço o Linc há sete anos, você não o conhece nem há sete dias.
— Isso não importa — falou Orlanda, desafiadoramente. — Eu o amo, e ele me ama.
— Isso ainda pre... — Casey foi quase empurrada para o lado por alguns chineses que passavam apressados, tagarelando ruidosamente. Outros vinham subindo a colina. Então alguns dos convidados da festa as rodearam, descendo o morro. Uma das mulheres era Lady Joanna, que olhou para elas com curiosidade, mas seguiu o seu caminho. Quando estavam sozinhas de novo, Casey terminou: — Isso ainda precisa ser provado. Boa noite, Orlanda — falou, com vontade de berrar para ela: "Você ganha o seu dinheiro deitada de costas, eu ganho o meu com meu trabalho, e todo esse amor de que você fala soletra-se dinheiro. Os homens são um bando de cretinos".
— É curioso, mas não culpo o Linc — continuou, murmurando em voz alta, vendo a linha firme do queixo, os olhos faiscantes e determinados, o corpo perfeito, voluptuoso mas esbelto. — Boa noite.
Seguiu o seu caminho. "Agora meu plano tem que mudar", pensava, todo o seu ser concentrado. "Esta noite eu ia fazer amor com o Linc, mas agora tudo vai ter que mudar. Se ele está na cama dela, está enfeitiçado por ela. Meu Deus, ainda bem que descobri. Santo Deus, se eu tivesse me oferecido, ele teria que dizer não, e então... Agora posso... o que devo fazer?
"As Orlandas do mundo que vão à merda! É tão fácil para elas, têm o plano do jogo feito desde o primeiro dia. Mas, e quanto ao resto de nós?
"O que faço? Agüento firme até 25 de novembro e torço para que até Iá ele já esteja de saco cheio da Orlanda?
"Não dessa fulana. Ela é dinamite, e sabe que Linc é o seu passaporte para a eternidade."
O coração dela bateu mais depressa. "Eu sou páreo para ela", disse consigo mesma, confiante. "Talvez não na cama ou na cozinha, mas posso aprender."
Subiu numa pedra e desceu dela, xingando a lama que estragava os seus sapatos, e pulou para o outro lado da barreira de terra. O Rolls de Dunross, com o seu chofer, estava no começo da fila.
— Com licença, senhorita, o tai-pan ainda está Iá?
— Está, sim.
— Ah, obrigado.
O chofer trancou o carro e subiu rapidamente a colina, passando pela barricada na estrada. Casey virou-se e ficou olhando para ele. Seus olhos se fixaram em Orlanda, que se aproximava, e ficou com vontade de empurrá-la na lama. A idéia a divertiu, e ficou parada ali, vendo a inimiga se aproximar, deixando que ficasse imaginando o que Casey faria. Viu os olhos dela ficarem mais duros, e não havia medo no rosto de Orlanda, apenas um meio sorriso muito confiante. Orlanda passou por ela, sem medo, e um tremor de apreensão percorreu Casey, um tremor que ela conseguiu dominar. "Talvez você tenha tanto medo de mim e do meu poder quanto eu do seu", pensou, os olhos agora fitos no Rose Court, uma torre brilhante de luz, imaginando qual a luz que cercaria Linc, ou qual janela escurecida...
Quando Orlanda avistara Casey no saguão, imediatamente chegara à conclusão de que ela fora ao seu apartamento e confrontara Bartlett... "É o que eu teria feito", disse com seus botões. E mesmo sabendo agora onde Casey estivera, o medo a percorreu de novo, à vista da sua rival. "Será que ela tem poder sobre ele através da Par-Con?", perguntou-se, trêmula.
"Será que pode controlar o Linc através das ações? Se a primeira mulher de Linc quase o destruiu financeiramente, e Casey o salvou tantas vezes quanto ele contou, aposto que ela o tem bem amarrado. Eu o faria, se fosse ela, claro que faria."
Involuntariamente, Orlanda olhou para trás. Casey ainda estava observando o Rose Court. Atrás dela, Dunross e outros (Riko, Toxe, Phillip e Dianne Chen entre eles) saíram do saguão e começaram a descer o morro. Ela os ignorou, e a tudo o mais, exceto a questão de como lidar com Linc quando voltasse. Devia contar-lhe sobre o encontro com Casey ou não? Atordoada, pegou os outros embrulhos de dentro do carro. "De uma coisa eu sei", repetiu para si mesma, inúmeras vezes. "O Linc é meu, e com ou sem Casey, vou me casar com ele, custe o que custar."
Casey tinha visto Dunross sair do saguão e ficou olhando para ele, apreciando a sua aparência, alto, elegante, dez anos mais jovem do que quando o conhecera, e ficou muito satisfeita por ter podido ajudá-lo. Então, quando já ia se virando, ouviu que ele a chamava:
— Casey, Casey, espere um momento! — Ela olhou para trás. — Que tal ir jantar conosco? — convidou.
Ela fez que não com a cabeça, sem a menor disposição, e respondeu:
— Obrigada, mas tenho um encontro! Até amanhã... Naquele momento, a terra desabou.