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11h30m

O carro de polícia do superintendente Armstrong abriu caminho entre as multidões iradas que lotavam a rua diante do Ho-Pak, transbordando das calçadas, dirigindo-se para a delegacia de Aberdeen Leste. Outras turbas congestionavam as ruas diante de todos os outros bancos da área, pequenos ou grandes (até mesmo o Victoria, que ficava do outro lado da rua, em frente ao Ho-Pak), todo mundo esperando impaciente para sacar seu dinheiro.

Por toda parte a atmosfera estava volátil e perigosa, com a chuva torrencial aumentando a tensão. As barricadas erguidas para controlar a entrada e a saída das pessoas nos bancos eram guarnecidas por policiais igualmente irritados e ansiosos — vinte para mil pessoas, desarmados, exceto pelos cassetetes.

— Graças a Deus pela chuva — resmungou Armstrong.

— Senhor? — perguntou o motorista, o barulho irritante dos limpadores de pára-brisa mal adaptados abafando a sua voz.

Armstrong repetiu em voz mais alta, e acrescentou:

— Se estivesse quente e úmido, toda esta porra de lugar estaria pegando em armas. A chuva é uma dádiva dos céus.

— Sim, senhor. É, sim.

Dali a pouco o carro parou diante da delegacia. Ele entrou, apressado. O inspetor-chefe Donald C. C. Smyth estava à sua espera, com o braço esquerdo na tipóia.

— Desculpe ter demorado tanto — disse Armstrong. — O maldito tráfego está com um engarrafamento de quilômetros.

— Não faz mal. Desculpe, mas estou com pouca gente, meu velho. Aberdeen Oeste está colaborando, e a Central também, mas também têm lá os seus problemas. Merda de bancos! Teremos que nos contentar com um tira nos fundos — já está em posição, para o caso de algum dos bandidos querer levantar vôo — e nós na frente, com Wu Óculos.

Smyth contou seu plano a Armstrong.

— Ótimo.

— Vamos indo? Não quero ficar afastado muito tempo.

— Claro. A barra está pesada, aí fora.

— Espero que a porra da chuva dure até que a porra dos bancos cerrem as portas ou paguem até o último tostão. Você sacou o que tinha?

— Está brincando! A mixaria que tenho não faz diferença! — Armstrong esticou-se, com as costas doendo. — Ah Tam está no apartamento?

— Ao que nos consta. A família para a qual trabalha chama-se Ch'ung. Ele é lixeiro. Um dos bandidos também pode estar lá, portanto teremos que entrar rapidamente. Tenho a permissão do comissário para levar um revólver. Quer um, também?

— Não. Não, obrigado. Vamos indo, então?

Smyth era mais baixo do que Armstrong, mas forte, e a farda caía-lhe bem. Desajeitadamente, por causa do braço, pegou a capa de chuva e começou a sair na frente, depois se deteve.

— Pombas, esqueci! Desculpe, o sei... Brian Kwok telefonou, pediu que ligasse para ele. Quer usar a minha sala?

— Obrigado. Tem café por aí? Bem que eu gostaria de uma xícara.

— Num instante.

A sala era arrumada, eficiente e simples, embora Armstrong notasse as cadeiras, a mesa, o rádio e atavios dispendiosos.

— Presentes de fregueses agradecidos — disse Smyth, despreocupadamente. — Vou deixá-lo a sós por uns dois minutos.

Armstrong sacudiu a cabeça e começou a discar.

— Sim, Brian?

— Oh, alô, Robert! Como vão as coisas? O Velho mandou que a trouxessem para o QG e não a interrogassem em Aberdeen Leste.

— Está certo. Estamos de saída. Qg, hem? Qual o motivo?

— Não me contou, mas está de bom humor, hoje. Parece que temos um 16/2, logo mais à noite.

O interesse de Armstrong aumentou. Um 16/2, em termos de sei, queria dizer que haviam descoberto um aparelho inimigo e iam prender o espião ou espiões.

— Algo a ver com o nosso problema? — perguntou cautelosamente, referindo-se à Sevrin.

— Talvez. — Fez-se uma pausa. — Lembra-se do que lhe falei sobre o nosso toupeira? Estou mais convencido do que nunca de que estou certo.

Brian Kwok começou a falar em cantonense, usando frases de duplo sentido e alusões indiretas, para o caso de estar sendo ouvido. Armstrong escutava com crescente preocupação, enquanto seu melhor amigo lhe contava o que acontecera no hipódromo, a conversa longa e particular entre Crosse e Suslev.

— Mas isso não quer dizer nada. Crosse conhece o sacana. Eu mesmo já bebi com ele uma ou duas vezes, sondando-o.

— Talvez. Mas se Crosse é o nosso homem, seria bem típico dele ter um encontro em público. Heya?

Armstrong sentiu-se doente de apreensão.

— Agora não é hora, amigão — falou. — Logo que eu chegar ao QG, bateremos um papo. Quem sabe almoçamos juntos e conversamos.

Outra pausa.

— O Velho quer que se apresente a ele logo que trouxer a amah.

— Está bem. Até logo.

Armstrong desligou o aparelho. Smyth veio voltando. Pensativo, passou-lhe a xícara de café.

— Más notícias?

— Nada exceto encrenca — disse Armstrong, com azedume. — Sempre uma porra de encrenca. — Sorveu o seu café. A xícara era de excelente porcelana, e o café, fresco, caro e delicioso. — Mas que café bom! Muito bom. Crosse quer que eu a leve diretamente para o QG, não a traga para cá.

As sobrancelhas de Smyth ergueram-se bem alto.

— Pombas, o que há de tão importante sobre uma bruxa amah? — perguntou, bruscamente. — Está na minha jurisdi...

— Porra, e eu lá sei! Estou me cagan... — O homem maior interrompeu a sua explosão. — Desculpe, quase não tenho dormido nos últimos dias. Não sou eu quem dá as ordens. Crosse mandou levá-la para o QG. Sem explicação. Ele pode passar por cima de qualquer um. O sei passa por cima de qualquer um, sabe como é!

— Filho da mãe arrogante! — Smyth acabou o seu café. — Graças a Deus não sou do sei. Detestaria ter que lidar com aquele sacana todos os dias.

— Não sou do sei, e mesmo assim ele me cria problemas.

— Foi sobre o nosso toupeira? Armstrong ergueu os olhos para ele.

— Que toupeira? Smyth soltou uma risada.

— Ora, qual é! Corre um boato entre os Dragões de que nossos intrépidos líderes foram aconselhados a descobrir o sacana bem depressinha. Parece que o ministro está caindo na pele até do governador! Londres está tão puta da vida que está mandando para cá o chefe da MI-6... imagino que saiba que o Sinders chega amanhã no vôo da boac. Armstrong soltou um suspiro.

— Que diabo, onde conseguem todas essas informações?

— Telefonistas, amahs, varredores de rua... que importa! Mas pode apostar, meu velho, que pelo menos um deles sabe tudo. Conhece o Sinders?

— Não, nunca o vi. — Armstrong sorvia o seu café, saboreando a qualidade, o gosto forte que o revigorava. — Se eles sabem tudo, quem é o toupeira?

Depois de uma pausa, Smyth falou:

— Esse tipo de informação sai caro. Quer que pergunte o preço?

— Sim, por favor. — O grandalhão pousou a xícara na mesa. — O toupeira não o incomoda, não é?

— Não, nem um pouco. Estou fazendo o meu trabalho, muito obrigado, e não faz parte do meu trabalho me preocupar com agentes infiltrados ou tentar pegá-los. No momento em que vocês pegarem o sacana e o tirarem de circulação, haverá outro sacana subornado no lugar dele, e nós faremos o mesmo com eles, sejam eles quem forem. Nesse meio tempo, se não fosse por essa maldita confusão do Ho-Pak, esta delegacia ainda seria a mais bem dirigida, e minha área de Aberdeen Leste a mais tranqüila da colônia, e é só isso o que me interessa. — Smyth ofereceu um cigarro de uma cara cigarreira de ouro. — Fuma?

— Não, obrigado. Parei.

— Muito bem. Não, contanto que me deixem em paz até me aposentar, daqui a quatro anos, tudo vai bem no mundo. — Acendeu o cigarro com um isqueiro de ouro, e Armstrong odiou-o ainda mais um pouco. — A propósito, acho que é bobagem sua não aceitar o envelope deixado na sua mesa, mensalmente.

— Não diga! — falou Armstrong, a fisionomia endurecendo.

— Digo. Não precisa fazer nada para ganhá-lo. Nada mesmo. Garantido.

— Mas depois que a gente aceita um deles, fica no mato sem cachorro.

— Não. Aqui é a China, e não é a mesma coisa. — Os olhos azuis de Smyth também se tornaram mais duros. — Mas, afinal, você sabe disso melhor do que eu,

— Um dos seus "amigos" lhe pediu para me dar o recado?

Smyth deu de ombros.

— Ouvi outro boato. Sua parte da recompensa do Dragão por ter encontrado John Chen será de quarenta mil HK e...

— Não o encontrei! — exclamou Armstrong, com a voz áspera.

— Mesmo assim, estará num envelope na sua mesa, logo mais à noite. Foi o que ouvi dizer. Boatos, é claro.

A mente de Armstrong digeria a informação. Os quarenta mil HK cobririam exata e lindamente a sua dívida mais premente, e de há muito vencida, que ele tinha que saldar até segunda-feira, referente a perdas na Bolsa. Tinham-lhe dito: "Sabe como é, meu velho, precisa mesmo pagar. Já faz mais de um ano e temos as nossas regras. Embora não o esteja pressionando, preciso sem falta resolver esse assunto... "

"Smyth tem razão de novo", pensou com amargura, "os filhos da mãe sabem de tudo, e seria tão fácil saber quais as minhas dívidas. Como é, vou aceitar ou não?"

— Só quarenta? — perguntou, com um sorriso retorcido.

— Imagino que seja o bastante para cobrir o seu problema mais premente — disse Smyth, com o mesmo olhar duro. — Não é?

Armstrong não estava zangado porque o Cobra sabia tanto sobre sua vida particular. "Sei igualmente muito sobre a dele, embora não saiba quanto tem, ou onde está guardado. Mas seria fácil descobrir, seria fácil dobrá-lo, se eu quisesse. Muito fácil. "

— Obrigado pelo café. É o melhor que já tomei em muitos anos. Vamos indo?

Desajeitadamente, Smyth vestiu a capa de chuva do uniforme sobre a farda bem-cortada, ajeitou o braço na tipóia, pôs o quepe no ângulo atrevido de costume e saiu na frente. Enquanto estavam a caminho, Armstrong fez Wu repetir o que tinha acontecido, o que fora dito pelo jovem que afirmava ser um dos Lobisomens, e depois pela velha amah.

— Muito bem, Wu — disse Armstrong, quando o rapaz acabou. — Um excelente trabalho de vigilância e investigação. Excelente. O inspetor-chefe Smyth me falou que você quer entrar para o sei.

— Sim, senhor.

— Por quê?

— É importante, um setor importante do Departamento Especial, senhor. Sempre me interessei pela segurança, por manter nossos inimigos longe e a colônia, segura, e acho que seria muito interessante e importante. Gostaria de ajudar, se pudesse, senhor.

Momentaneamente, ficaram de ouvido atento ao gemido distante dos carros de bombeiro que vinha da colina acima.

— Algum filho da mãe cretino derrubou mais um fogareiro — comentou Smyth, com azedume. — Pombas, graças a Deus pela chuva!

— É — concordou Armstrong, depois virou-se para Wu. — Se os fatos confirmarem o que você relatou, indicarei o seu nome para a de ou para o sei.

Wu Óculos não pôde conter o amplo sorriso.

— Sim, senhor. Obrigado, senhor. Ah Tam é mesmo da minha aldeia. É sim, senhor.

Dobraram num beco. Multidões de fregueses, barraqueiros e lojistas debaixo de guarda-chuvas ou toldos de lona observaram-nos sombria e desconfiadamente, pois Smyth era o quai loh mais conhecido e temido em Aberdeen.

— É ali, senhor — sussurrou Wu.

Conforme o combinado, Smyth parou casualmente na barraca, do lado de fora da porta de entrada, olhando ostensivamente os legumes, o que deixou o proprietário imediatamente em choque. Armstrong e Wu passaram pela entrada, depois viraram-se abruptamente, e os três convergiram para o mesmo ponto. Subiram as escadas rapidamente, enquanto os dois policiais fardados que os seguiam a uma distância segura se aproximaram para cobrir a porta da entrada. Logo que a passagem estreita ficou segura, um deles subiu depressa um beco ainda menor, e deu a volta para se certificar de que o detetive à paisana ainda estava em posição, vigiando a única saída existente. Depois voltou correndo para reforçar as barricadas pouco guarnecidas diante do Victoria.

Por dentro o cortiço era tão esquálido e sujo quanto por fora, com entulho e lixo em cada patamar. Smyth ia na frente. Parou no terceiro patamar, desabotoou o coldre do revólver e se afastou para o lado. Sem hesitar, Armstrong jogou o corpo contra a porta frágil, arrombou-a e entrou rapidamente. Smyth seguiu-o de imediato, e Wu Óculos ficou de guarda na porta, nervoso. A sala era suja, com sofás e poltronas velhos, cortinas velhas e encardidas, o cheiro adocicado e rançoso de ópio e óleo de cozinha no ar. Uma matrona corpulenta de meia-idade fitou-os, boquiaberta, e largou o jornal. Os dois homens se dirigiram para as portas internas. Smyth abriu uma delas e deparou com um quarto de dormir desmazelado, a outra revelou um banheiro e uma privada sujos, a terceira outro quarto atulhado com catres para quatro pessoas, ainda por arrumar. Armstrong abriu a última porta, que dava para uma cozinha minúscula, atulhada, nojenta, onde Ah Tam se debruçava sobre uma pilha de louça suja na pia encardida. Ela o fitou, assustada. Às suas costas, outra porta. Imediatamente, ele se dirigiu para ela e a escancarou. Também estava vazio. Era mais um armário do que um quarto, sem janelas, com um respiradouro aberto na parede e espaço suficiente apenas para encaixar o pequeno catre de cordas, sem colchão, e uma cômoda desconjuntada.

Ele voltou para a sala, Ah Tam atrás dele, arrastando os pés. A respiração dele era normal, e seu coração estava se acalmando. A busca levara apenas alguns segundos. Smyth pegou os papéis e disse, meigamente:

— Lamento interromper, madame, mas temos um mandado de busca.

— Wat?

— Traduza para nós, Wu — ordenou Smyth, e imediatamente o jovem policial repetiu o que fora dito, e, como fora previamente combinado, começou a agir como se fosse o intérprete de dois policiais quai loh ignorantes que não sabiam falar cantonense.

A mulher ficou de queixo caído.

— De busca? — esganiçou-se. — Para revistar o quê? Nós aqui obedecemos a lei! Meu marido trabalha para o governo e tem amigos importantes, e se vocês estão procurando a escola de jogatina, não temos nada a ver com ela, e fica no quarto andar, nos fundos, e também não sabemos nada das piranhas fedorentas que se instalaram no 16 e que trabalham até altas horas, fazendo com que o resto de nós, gente civi...

— Chega! — falou Wu, bruscamente. — Somos policiais tratando de assuntos importantes! Esses senhores da polícia são importantes! Você é a mulher de Ch'ung, o lixeiro?

— Sou — respondeu, carrancuda. — O que quer da gente? Não fizemos na...

— Chega! — interrompeu Armstrong, em inglês, com arrogância deliberada. — Aquela é Ah Tam?

— Você! É Ah Tam?

— Quem, eu? Wat? — disse a velha amah, puxando nervosa o avental, sem reconhecer Wu.

— Então é Ah Tam! Está presa.

Ah Tam ficou branca, e a mulher de meia-idade soltou um palavrão e disse, atropeladamente:

— Ah! Então estão atrás de você! Hum, não sabemos nada sobre ela, exceto que a tiramos das ruas há alguns meses e lhe demos casa e um sala...

— Wu, diga a ela para calar a boca!

Ele disse, com maus modos. Ela obedeceu, ainda mais carrancuda.

— Esses senhores querem saber se tem mais alguém aqui.

— Claro que não. São cegos? Não violaram a minha casa, como assassinos, e viram com seus próprios olhos? — disse a megera, com truculência. — Não sei nada de nada.

— Ah Tam! Esses senhores querem saber onde fica o seu quarto.

A amah conseguiu falar, e começou a atropelar as palavras:

— O que quer comigo, Honorável Policial? Não fiz nada, não entrei ilegalmente, tenho meus documentos desde o ano passado. Não fiz nada. Sou uma pessoa civilizada, cumpridora das leis, que trabalhou a vida to...

— Onde fica o seu quarto? A mulher mais moça apontou.

— Ali — disse, na sua voz esganiçada e irritante —, onde mais poderia ficar? Claro que fica ali, depois da cozinha! Esses demônios estrangeiros não têm juízo? Em que outro lugar morariam as criadas? E você, seu verme velho! Metendo gente honesta em encrenca! O que foi que ela fez? Se roubou legumes, não tenho nada a ver com isso!

— Quieta, ou a levaremos para o nosso quartel-general, e na certa o juiz vai querer mantê-la sob custódia! Quieta!

A mulher ia começar a xingar, mas se conteve.

— Bem, agora... — começou a dizer Armstrong. Então, notou que vários chineses curiosos espiavam do patamar para dentro da sala. Ele os fitou, deu um passo repentino na direção deles, e eles sumiram. Fechou a porta, disfarçando o seu divertimento. — Agora, pergunte às duas o que sabem sobre os Lobisomens.

A mulher fitou Wu, boquiaberta. Ah Tam ficou ainda mais cinzenta.

— Quem, eu? Lobisomens? Nada! Por que iria saber sobre aqueles seqüestradores nojentos? O que têm a ver comiGo? Nada, absolutamente nada!

— E quanto a você, Ah Tam?

— Eu? Absolutamente nada — disse, em tom queixoso. — Sou uma amah respeitável, que faz o seu serviço, e nada mais!

Wu traduziu as respostas delas. Os dois homens notaram que a tradução era precisa, rápida e fácil. Os dois eram pacientes, e continuaram a fazer o joguinho que já tinham feito tantas vezes antes.

— Diga a ela que é melhor falar a verdade, e depressa

— falou Armstrong, olhando para ela de cara fechada. Não tinha raiva dela, e nem Smyth tinha. Só queriam a verdade. A verdade poderia levar à identidade dos Lobisomens, e quanto mais cedo os bandidos fossem enforcados por assassinato, mais fácil seria controlar Hong Kong, e mais cedo os cidadãos cumpridores da lei, incluindo eles próprios, poderiam ir tratar da sua vida, ou dos seus passatempos — ganhar dinheiro, andar com mulheres, apostar nas corridas. "É", pensou Armstrong, com pena da velha. "Vinte dólares contra um grampo quebrado como a megera não sabe de nada, mas Ah Tam sabe mais do que jamais nos contará. " — Quero a verdade. Diga-lhe isso!

— Verdade? Que verdade, Honorável Senhor? Como poderia esta pobre coitada ser...

Armstrong ergueu a mão dramaticamente.

— Chega!

Esse era outro sinal combinado. Imediatamente Wu Óculos começou a falar no dialeto de Ning-tok, que sabia que os outros dois não compreendiam.

— Irmã Mais Velha, sugiro que fale rápida e claramente. Já sabemos de tudo!

Ah Tam fitava-o, boquiaberta. Possuía apenas dois dentes tortos na arcada inferior.

— Hem, Irmão Mais Moço? — replicou no mesmo dialeto, desprevenida. — O que quer de mim?

— A verdade! Sei tudo a seu respeito! Ela olhou para ele, sem reconhecê-lo.

— Que verdade? Nunca o vi mais gordo!

— Não se lembra de mim? No mercado de aves? Você me ajudou a comprar uma galinha, e depois tomamos chá juntos. Ontem. Não se lembra? Contou-me sobre os Lobisomens, disse que iam dar-lhe uma enorme recompensa...

Os três viram o lampejo momentâneo nos olhos dela.

— Lobisomens? — começou, em tom de queixume. — Impossível! Foi outra pessoa. Você me acusa falsamente. Diga aos Nobres Senhores que nunca o vi...

— Cale a boca, seu bagulho velho! — disse Wu, bruscamente, e soltou um monte de palavrões. — Você trabalhava para Wu Ting-top, e sua patroa se chamava Fang-ling. Ela morreu há três anos, e eles eram donos da farmácia da encruzilhada! Eu mesmo conheço bem o local!

— Mentiras... mentiras...

— Diz que é tudo mentira, senhor.

— Ótimo. Diga-lhe que vamos levá-la para a delegacia. Lá, ela falará.

Ah Tam começou a tremer.

— Tortura? Vão torturar uma velha? Ai, ai, ai...

— Quando é que esse Lobisomem vai voltar? À tarde?

— Ai, ai, ai... não sei... disse que viria me ver, mas o ladrão não voltou mais. Emprestei-lhe cinco dólares para ir para casa e...

— Onde era a casa dele?

— Hem? Quem? Oh, ele... falou que era parente de um parente e... não me lembro. Acho que falou em North Point... não me lembro de nada.

Armstrong e Smyth esperaram, sondaram, e logo ficou evidente que a velha pouco sabia, embora se esquivasse às sondagens, enfeitando cada vez mais as mentiras.

— Vamos levá-la, de qualquer modo — disse Armstrong. Smyth concordou.

— Dá para você segurar as pontas até que eu mande uns dois homens? Acho que já está na hora de eu voltar.

— Claro. Obrigado.

Ele se retirou. Armstrong mandou Wu ordenar às duas mulheres que ficassem sentadas e caladas, enquanto ele fazia a revista. Elas obedeceram, assustadas. Ele entrou na cozinha e fechou a porta. Imediatamente, Ah Tam começou a puxar a sua longa trança suja.

— Jovem Irmão — sussurrou astutamente, sabendo que a patroa não entendia o dialeto de Ning-tok —, não sou culpada de nada. Só conheci o jovem demônio, como conheci você. Não fiz nada. As pessoas da mesma aldeia devem se manter unidas, heya? Um homem bonitão como você precisa de dinheiro... para as garotas, ou para a mulher. É casado, Honorável Irmão Mais Moço?

— Não, Irmã Mais Velha — disse Wu cortesmente, dando-lhe corda, como mandaram que desse.

Armstrong estava na porta do quartinho de Ah Tam, perguntando-se pela milionésima vez por que os chineses tratavam seus criados tão mal, por que os criados aceitavam trabalhar em condições tão miseráveis e nojentas, por que dormiam, moravam e prestavam serviços leais durante uma vida inteira, em troca de uma ninharia, pouco respeito e nenhum amor.

Lembrava-se de ter perguntado isso ao pai. O velho policial dissera:

— Não sei, meu rapaz, mas acho que é porque eles se tornam parte da família. Geralmente, é um serviço vitalício. Geralmente, a família deles também faz parte do trato. O criado se integra, e o how chew, ou seja, os aspectos positivos, é considerável. Não é preciso dizer que todos os criados se apossam de uma parte do dinheiro das despesas da casa, da comida, das bebidas, do material de limpeza, de tudo o que houver, não importa que seja de valor ou não, naturalmente com o conhecimento e aprovação integrais dos patrões, desde que isso seja mantido ao nível costumeiro... caso contrário, como poderiam pagar-lhes tão pouco, se eles não pudessem ganhar por fora?

"Talvez seja essa a resposta", pensou Armstrong. "É verdade que antes de um chinês aceitar um emprego, qualquer emprego, terá considerado o how chew do emprego com muito cuidado, e o valor do how chew é sempre o fator decisivo. "

O quarto fedia, e ele tentou ignorar o cheiro. Borrifos de água da chuva entravam pelo respiradouro, o barulho da chuva ainda forte, a parede inteira mofada e manchada por mil temporais. Ele fez uma revista metódica e cuidadosa, todos os sentidos aguçados. Havia pouco espaço onde esconder alguma coisa. A cama e os lençóis estavam relativamente limpos, embora houvesse muitos percevejos nos cantos do catre. Nada havia debaixo da cama, salvo um urinol lascado e malcheiroso e uma mala vazia. Umas velhas sacolas e uma bolsa a tiracolo nada revelaram. A cômoda continha umas poucas roupas, algumas jóias baratas, uma pulseira de jade de qualidade inferior. Escondida sob algumas roupas havia uma bolsa bordada de qualidade muito melhor. Dentro dela havia algumas cartas. Um recorte de jornal. E duas fotos.

O coração dele pareceu parar de bater.

Depois de um momento, foi para a cozinha, onde havia luz melhor, e olhou de novo para as fotos, mas não se havia enganado. Leu o recorte, com a cabeça tonta. Havia uma data no recorte e uma data numa das fotos.

No porão de estrutura semelhante a um favo de mel do QG da polícia, Ah Tam sentava-se numa cadeira dura e sem costas no centro de uma grande sala à prova de som, fortemente iluminada e pintada de branco, paredes brancas, teto branco, piso branco e uma única porta branca que parecia fazer parte da parede. Até mesmo a cadeira era branca. Ela estava sozinha, apavorada, e agora falava livremente.

— Bem, e o que sabe sobre o bárbaro que aparece no fundo da foto? — perguntou a voz seca e metálica de Wu, no dialeto de Ning-tok, vinda de um alto-falante oculto.

— Já contei e contei e não há... não sei, senhor — choramingou ela. — Quero ir para casa... já lhe contei, mal vi o demônio estrangeiro... ele só nos visitou essa única vez, ao que eu saiba, senhor... Não me lembro; faz anos, oh, posso ir agora? Já contei tudo, tudo...

Armstrong a espiava pelo falso espelho da sala de observação pouco iluminada, com Wu ao seu lado. Os dois homens estavam constrangidos e sérios. O suor orlava a testa de Wu, embora a sala fosse agradavelmente refrigerada. Um gravador girava, silencioso. Havia microfones e um monte de equipamentos eletrônicos às costas deles.

— Acho que ela já nos contou tudo o que precisamos saber — disse Armstrong, com pena dela.

— Sim, senhor — disse Wu, não deixando o seu nervosismo transparecer na voz. Era a primeira vez que fazia parte de um interrogatório do sei. Estava assustado e excitado, e doía-lhe a cabeça.

— Pergunte-lhe novamente onde arranjou a bolsa.

Wu fez o que ele mandou. Sua voz estava calma e autoritária.

— Mas já lhe contei inúmeras vezes — choramingou a velha. — Por favor, posso ir...

— Conte-nos mais uma vez, e depois poderá ir.

— Está bem... está bem... Vou contar de novo... Pertencia à minha patroa, que a deu para mim no seu leito de morte, ela me deu, juro e...

— Na última vez você falou que ela a deu na véspera de morrer. Bem, qual é a verdade?

Ansiosa, Ah Tam ficou puxando a trança suja.

— Eu... não me lembro, senhor. Estava com ela... quando morreu... não me lembro. — A velha ficou mexendo a boca, sem emitir som, depois falou aos borbotões, em tom queixoso: — Eu a peguei e escondi, depois que ela morreu, e havia aquelas velhas fotos... não tenho nenhum retrato da minha patroa, portanto peguei-as, e havia um tael de prata, também, que pagou parte da minha viagem para Hong Kong, durante a grande fome. Eu a peguei porque nenhum dos filhos, filhas ou família nojentos dela, que a odiavam e me odiavam, me teriam dado coisa alguma. Portanto, eu a peguei quando ninguém estava... ela me deu antes de morrer, e eu a escondi, é minha, ela me deu...

Ficaram ouvindo a velha falar e falar, até cansar. O relógio de parede marcava uma e quarenta e cinco. Há meia hora que a interrogavam.

— Por ora, chega, Wu. Vamos repetir tudo daqui a três horas, por precaução, mas acho que nos contou tudo. — Cansadamente, Armstrong pegou um telefone e discou. — Armstrong... pode levá-la agora de volta à cela — falou. — Certifiquem-se de que esteja confortável e seja bem tratada, e mandem o médico examiná-la outra vez.

Era procedimento normal do sei examinar os prisioneiros antes e depois de cada interrogatório. O médico dissera que Ah Tam tinha o coração e a pressão de uma moça de vinte anos.

Dali a um momento viram a porta branca, quase escondida, se abrir. Uma policial fardada do sei fez sinal para Ah Tam, bondosamente. Ela foi saindo, andando com dificuldade. Armstrong baixou as luzes, ligou o gravador para voltar atrás a fita. Wu enxugou a testa.

— Saiu-se muito bem, Wu. Aprende depressa.

— Obrigado, senhor.

O gemido estridente do gravador aumentou. Armstrong olhava para ele em silêncio, ainda em choque. O barulho cessou, e o grandalhão tirou a fita da máquina.

— Sempre marcamos a data, a hora exata e a duração exata do interrogatório, e usamos um codinome para o suspeito. Para segurança e sigilo. — Procurou um número num livro, marcou a fita, depois começou a preencher um formulário. — Fazemos a verificação comparando com este formulário. Nós o assinamos, como interrogadores, e colocamos aqui o código de Ah Tam — V-11-3. É altamente secreto, e arquivado no cofre. — Os olhos dele tornaram-se muito duros. Wu quase se encolheu. — Repito: É melhor você acreditar que em boca fechada não entra mosca, e que tudo no sei, tudo aquilo de que você participou hoje, é altamente secreto.

— Sim, senhor. Sim, pode contar comigo, senhor.

— É melhor também lembrar que o sei só obedece às próprias leis, ao governador e ao ministro em Londres. Somente. As boas leis inglesas, o jogo limpo e os códigos normais da polícia não se aplicam ao de ou ao sei... habeas-corpus, julgamentos públicos e apelações. Num caso do sei, não há julgamento, nem apelação, apenas uma ordem de deportação para a RPC ou Formosa, o que for pior. Entendeu?

— Sim, senhor. Quero ser parte do sei, senhor. Portanto, pode crer em mim. Não sou de saciar a sede com veneno — assegurou-lhe Wu, doente de esperança.

— Ótimo. Durante os próximos dias, está confinado a este QG.

Wu ficou de queixo caído.

— Mas, senhor, meu... sim, senhor.

Armstrong saiu na frente, e depois fechou a porta atrás de si. Entregou a chave e o formulário a um agente do sei que estava de guarda na recepção.

— Vou guardar a fita, por enquanto. Já assinei o recibo.

— Sim, senhor.

— Quer cuidar do guarda Wu? Vai ser nosso hóspede por alguns dias. Comece a anotar os dados dele... tem sido muito, muito, muito prestimoso. Vou recomendá-lo para o sei.

— Sim, senhor.

Deixou-os, foi para o elevador e saltou no seu andar, com um gosto nauseante e adocicado de apreensão na boca. Os interrogatórios do sei eram um anátema para ele. Odiava-os, embora fossem rápidos, eficientes e sempre apresentassem resultados. Preferia a batalha de intelectos à moda antiga, o uso da paciência, e não esses instrumentos psicológicos novos e modernos.

— É tudo danado de perigoso, se querem a minha opinião — resmungou, cruzando o corredor, o leve cheiro mofado do quartel-general nas narinas, odiando Crosse, o sei e tudo o que representavam, odiando os fatos que descobrira. Sua porta estava aberta.

— Ah, alô, Brian — disse, fechando a porta, a fisionomia sombria. Brian Kwok estava com os pés sobre a mesa, lendo pachorrentamente um dos matutinos comunistas chineses, com as vidraças molhadas de chuva às costas. — O que há de novo?

— Um artigo bem grande sobre o Irã — disse o amigo, entretido com o que lia. — Diz: "Os senhores supremos capitalistas da CIA, em conjunção com o xá tirano, acabaram com uma revolução popular no Azerbaijão. Milhares foram mortos", etc. Não acredito em tudo isso, mas parece que a CIA e a 92a Divisão de Pára-Quedistas apagaram o estopim naquela área, e os ianques agiram certo, pelo menos uma vez.

— Não vai adiantar porra nenhuma!

Brian Kwok ergueu os olhos. Seu sorriso desapareceu.

— O que foi?

— Estou me sentindo um lixo. — Armstrong hesitou. — Mandei buscar duas cervejas, depois almoçaremos. Que tal um curry? Está bem?

— Está, mas se está se sentindo um lixo, vamos deixar o almoço para outro dia.

— Não, não é a esse tipo de "lixo", que estou me referindo. É... é que detesto fazer interrogatórios brancos... isso me dá nos nervos.

Brian Kwok fitou-o.

— Interrogaram a velha amah ali? Porra, mas por quê?

— Ordens de Crosse. É um filho da mãe. Brian Kwok largou o jornal.

— É, sim, e estou certo de que tenho razão quanto a ele — falou, suavemente.

— Agora não, Brian. Quem sabe durante o almoço, mas agora não. Deus meu, mas como preciso de um drinque! Maldito Crosse e maldito sei! Não sou do sei, e no entanto ele age como se eu fosse um dos seus.

— É? Mas você vem junto no 16/2 desta noite. Pensei que tinha sido convocado.

— Ele não mencionou nada. O que é?

— Se ele não mencionou, é melhor eu ficar calado.

— Claro. — Era um procedimento normal do sei, para fins de segurança, minimizar a divulgação de informações, para que nem mesmo os agentes da mais alta confiança trabalhando no mesmo caso soubessem de todos os fatos. — Não vou ser convocado porra nenhuma — falou Armstrong, de cara feia, sabendo que, se Crosse ordenasse, não havia nada que ele pudesse fazer. — A batida tem algo a ver com a Sevrin?

— Não sei. Espero que sim. — Brian Kwok olhou atentamente para ele, depois sorriu. — Anime-se, Robert, tenho boas novas para você — disse, e Armstrong notou mais uma vez como o amigo era bonitão, dentes brancos e fortes, pele dourada, linhas do queixo firmes, olhos vivos e um ar de confiança atrevida.

— Você é um sacana bonitão — falou. — Quais são as boas novas? Deu um aperto no amigo Um Pé Só do Restaurante Para, e ele lhe contou quais os quatro primeiros lugares para sábado?

— Sonhador! Não, é sobre aquelas pastas que você apanhou ontem no escritório de Lo Dentuço, e passou para a Anticorrupção. Está lembrado? Do Ng Fotógrafo?

— Hem? Ah, sim.

— Parece que o nosso simpático convidado sino-americano, Thomas K. K. Lim, que está "em algum lugar do Brasil", é uma figura e tanto. As pastas dele são de ouro. De ouro mesmo! E em inglês, sendo assim o nosso pessoal da Anticorrupção não teve trabalho para lê-las. Você descobriu um tesouro!

— Ele tem ligações com Tsu-yan? — perguntou Armstrong, com a atenção imediatamente desviada.

— Tem. E com muitas outras pessoas. Pessoas muito importantes, mui...

— Banastasio? Brian Kwok sorriu.

— O próprio. Isso engloba direitinho John Chen, as armas, Tsu-yan, Banastasio e a teoria de Peter Marlowe.

— Bartlett?

— Ainda não. Mas Marlowe conhece alguém que sabe muita coisa que não sabemos. Acho que devemos investigá-lo. Você o fará?

— Claro! O que mais havia nos papéis?

— Thomas K. K. Lim é católico, um sino-americano de terceira geração que é uma verdadeira pega. Coleciona todo tipo de correspondência comprometedora, cartas, bilhetes, memorandos, etc. — Brian Kwok sorriu de novo o seu sorriso sem humor. — Nossos amigos ianques são piores do que pensávamos.

— Por exemplo?

— Por exemplo: uma certa família da Nova Inglaterra, muito conhecida e bem relacionada, está envolvida com certos generais, americanos e vietnamitas, na construção de diversas bases da força aérea americana, muito grandes e muito desnecessárias, em termos muito lucrativos para eles.

— Aleluia! Nomes?

— Nomes, postos e números. Se os principais envolvidos soubessem que o amigo Thomas tem tudo documentado, um estremecimento de horror percorreria os Augustos Corredores da Fama, o Pentágono, e diversos salões caros e cheios de fumaça.

Armstrong resmungou.

— Ele é o intermediário?

— Organizador, é como chama a si mesmo. Ah, está em excelentes termos com muita gente notável. Americanos, italianos, vietnamitas, chineses, os dois lados da cerca. Os papéis documentam toda a fraude. Outro plano é o de canalizar milhões de fundos dos Estados Unidos em mais um programa falso de ajuda ao Vietnam. Oito milhões, para ser preciso. Um milhão já foi até pago. O amigo Lim até mesmo discutiu como o h'eung yau de um milhão vai ser desviado para a Suíça.

— Podemos fazer com que tudo isso cole?

— Oh, sim, se pegarmos Thomas K. K. Lim, e se quisermos fazer com que cole. Perguntei ao Crosse, mas ele apenas deu de ombros e disse que não era da nossa conta. Que se os ianques quiserem roubar o governo deles, problema deles. — Brian Kwok sorriu, mas seus olhos, não. — É uma informação valiosa, Robert. Se até mesmo parte dela tornar-se conhecida, criará uma zorra dos diabos, até bem lá em cima.

— Ele vai passar a informação adiante, ao Rosemont? Deixar "vazar"?

— Não sei. Acho que não. Numa coisa ele está certo. Não tem nada a ver conosco. Que burrice incrível anotar tudo isso! Uma burrice. Merecem se ferrar. Quando tiver um minuto leia os papéis, são uma parada!

— Alguma ligação entre Lim e os outros bandidos? Lo Dentuço e o outro homem? Estão roubando os fundos da CARE?

— Oh, sim, devem estar, mas todas as pastas deles estão em chinês, portanto vai demorar mais para meter-lhes a mão. — Brian Kwok acrescentou, de modo estranho: — Curioso o Crosse ter farejado isso, quase como se soubesse que haveria uma ligação. — Baixou a voz. — Sei que estou certo a respeito dele.

O silêncio tornou-se mais pesado. A boca de Armstrong estava ressecada, com um gosto ruim. Desviou os olhos da chuva e olhou para Brian Kwok.

— O que é que sabe?

— Sabe o tal vice-cônsul americano, o bicha, aquele que está vendendo os vistos?

— O que é que tem?

— No mês passado Crosse jantou com ele. No apartamento dele.

Armstrong esfregou o rosto, nervosamente.

— Isso não prova nada. Ouça, amanhã pegamos as pastas. Amanhã o Sind...

— Talvez nós não as possamos ler.

— Pessoalmente, estou me cagando. Isso é assunto do sei, e eu sou do DIC, e é por isso...

Uma batida o interrompeu. A porta se abriu. Um garçom chinês entrou com uma bandeja e dois canecões de cerveja gelada, e abriu um sorriso cheio de dentes.

— Boa tarde, senhor — cumprimentou, oferecendo um deles para Brian Kwok. Entregou o outro a Armstrong, e se retirou.

— Boa sorte — falou Armstrong, odiando-se. Bebeu avidamente, depois foi trancar a fita no seu cofre.

Brian Kwok olhou-o atentamente.

— Tem certeza de que está bem, amigão?

— Claro que sim.

— O que foi que a velha falou?

— No começo, contou um monte de mentiras, um monte. E depois, a verdade. Inteirinha. Conto para você durante o almoço, Brian. Sabe como é... a gente acaba descobrindo as mentiras, se for paciente. Estou cheio de mentiras. — Armstrong terminou a sua cerveja. — Pombas, mas estava precisando disso.

— Quer a minha, também? Tome.

— Não, não, obrigado, vou tomar um uísque com soda antes do curry, e quem sabe mais outro. Acabe logo e vamos nos mandar.

Brian Kwok largou o canecão pela metade.

— Para mim já chega. — Acendeu um cigarro. — Como vai indo com a sua decisão de não fumar mais?

— Está duro. — Armstrong ficou vendo-o tragar profundamente. — Alguma coisa sobre o Voranski? Ou os assassinos dele?

— Sumiram em pleno ar. Temos as fotos deles. Portanto, nós os pegaremos, a não ser que estejam do outro lado da fronteira.

— Ou em Formosa.

Depois de uma pausa, Brian Kwok balançou a cabeça.

— Ou em Macau, ou na Coréia do Norte, ou no Vietnam, ou seja lá onde for. O ministro está uma arara com o Crosse por causa do Voranski, a MI-6 também, e a CIA também. O primeiro escalão da CIA em Londres está criando o maior rebu com o ministro, e ele está passando a bronca adiante para nós. É melhor que a gente agarre aqueles sacanas antes do Rosemont, senão vamos ficar desmoralizados. O Rosemont também está sendo superpressionado para entregar a cabeça deles. Ouvi dizer que ele pôs todos os seus homens atrás deles, achando que têm algo a ver com a Sevrin, e o porta-aviões. Ele está apavorado de que haja um incidente envolvendo o porta-aviões nuclear. — Brian Kwok acrescentou, com a voz mais dura: — Uma cretinice dos diabos ofender a RPC, trazendo-o para cá. Aquele monstro é um convite declarado para todos os agentes na Ásia.

— Se eu fosse soviético, estaria tentando infiltrá-lo. O sei está provavelmente tentando fazer o mesmo, agora. Crosse adoraria ter um agente a bordo. Por que não? — O grandalhão ficou olhando a fumaça em espiral. — Se eu fosse nacionalista, talvez colocasse algumas minas nele, para depois culpar a RPC... ou, vice-versa, para depois culpar Chang Kai-chek.

— É o que a CIA faria para deixar todo mundo puto da vida com a China.

— Corta essa, Brian!

Brian Kwok tomou um último gole, depois se levantou.

— Para mim chega. Vamos indo.

— Um momentinho. — Armstrong foi discar. — Aqui fala Armstrong, preparem outra sessão às dezessete para V-11-3. Vou querer...

Parou, vendo os olhos do amigo piscarem, depois ficarem vidrados, e segurou-o com facilidade quando ele caiu, deixando-o largado na cadeira. Fora de si, quase como se estivesse observando a si mesmo, repôs o fone no gancho. Agora, nada havia a fazer, senão esperar.

"Fiz o meu trabalho", pensou.

A porta se abriu e Crosse entrou, seguido de três agentes do sei à paisana, todos britânicos, todos graduados, todos tensos e sérios. Rapidamente, um dos homens colocou um capuz grosso e negro na cabeça de Brian Kwok, levantou-o com facilidade e saiu, seguido pelos outros.

Agora que tudo acabara, Robert Armstrong não sentia nada, nem remorso, nem choque, nem raiva. Nada. Sua mente lhe dizia que não havia nenhum engano, embora lhe dissesse igualmente que seu amigo de quase vinte anos não podia ser um agente comunista infiltrado. Mas era. As provas eram irrefutáveis. As provas que descobrira demonstravam conclusivamente que Brian Kwok era o filho de Fang-ling Wu, a antiga patroa de Ah Tam, quando, segundo sua certidão de nascimento e registros pessoais, sua mãe e seu pai tinham o sobrenome Kwok e haviam sido assassinados pelos comunistas em Cantão, em 43. Uma das fotografias mostrava Brian Kwok de pé ao lado de uma senhora chinesa miudinha, diante de uma farmácia numa encruzilhada de uma aldeia. A qualidade da foto era má, porém boa o suficiente para que se pudessem ler os caracteres do cartaz da loja e para que se reconhecesse um rosto, o rosto dele. Ao fundo, via-se um carro antigo. Por trás dele havia um europeu, com o rosto meio desviado. Wu Óculos identificara a loja como a farmácia da encruzilhada em Ning-tok, propriedade da família Tok-ling Wu. Ah Tam identificara a mulher como sua patroa.

— E o homem? Quem é o homem ao lado dela?

— Ah, é o filho dela, senhor. Já lhe contei. É o Segundo Filho Chu-toy. Agora, vive com os demônios estrangeiros do outro lado do mar, no norte, o norte da Terra das Montanhas Douradas — choramingara a mulher, lá no Quarto Branco.

— Está mentindo outra vez.

— Ah, não, senhor, é o filho dela, Chu-toy. É o seu Segundo Filho, nasceu em Ning-tok, e ajudei no parto dele com estas mãos. Era o Filho Número Dois da Mãe, que foi embora quando era pequeno...

— Foi embora? Para onde?

— Para... o País da Chuva, depois para a Montanha Dourada. Agora tem um restaurante e dois filhos... É comerciante lá, e veio para ver o Pai... O Pai estava morrendo, e ele veio como um filho obediente deve vir, mas depois foi embora, e a Mãe chorou e chorou...

— Com que freqüência visitava os pais?

— Ah, foi só essa vez, senhor, só essa vez. Agora mora longe, num lugar tão afastado, tão afastado... mas veio como deve vir um filho obediente, e depois foi embora. Foi por puro acaso que eu o vi, senhor. À Mãe me mandara ir visitar uns parentes na aldeia vizinha, mas eu me senti só, e voltei cedo e o vi... Foi pouco antes de ele ir embora. O Jovem Patrão foi embora num carro dos demônios estrangeiros...

— Onde ele arranjou o carro? Era dele?

— Não sei, senhor. Não havia carro em Ning-tok. Até mesmo o comitê da aldeia não tinha carro, nem mesmo o Pai, que era o farmacêutico da aldeia. O pobre Pai, que morreu sofrendo tanto! Ele era membro do comitê... Eles nos deixavam em paz, os homens do presidente Mao, os Estranhos... É, agiam assim porque, embora o Pai fosse um intelectual e um farmacêutico, sempre fora um seguidor secreto de Mao, embora eu jamais soubesse, senhor, juro que jamais soube. O pessoal do presidente Mao nos deixava em paz, senhor.

— Como se chamava o filho da sua Patroa? O homem do retrato? — repetira ele, tentando abalá-la.

— Chu-toy Wu, senhor, era o segundo filho dela... lembro quando foi mandado de Ning-tok para... este lugar horrível, este Porto Fragrante. Tinha cinco ou seis anos e foi mandado para um tio aqui e...

— Como se chamava o tio?

— Não sei, senhor, nunca me contaram, só me lembro da Mãe chorando e chorando quando o Pai o mandou estudar fora... Posso ir para casa agora? Por favor, estou cansada, por favor...

— Quando você nos disser o que queremos saber. Se nos contar a verdade.

— Ah, eu conto a verdade, qualquer coisa, qualquer coisa...

— Mandaram-no estudar em Hong Kong? Onde?

— Não sei, senhor. Minha Patroa nunca falou, só que foi estudar, e depois ela o tirou do pensamento, e eu também, oh, sim, era melhor, porque ele tinha ido embora para sempre. Sabe que sempre os segundos filhos têm que ir embora...

— Quando Chu-toy Wu voltou para Ning-tok?

— Foi há alguns anos, quando o Pai estava morrendo. Só voltou aquela vez, foi só uma vez, senhor, não se lembra de eu ter lhe dito? Eu me lembro de ter dito isso. É, foi só a vez da foto. A Mãe insistiu na foto, e chorou e suplicou que ele tirasse uma foto com ela... Ela devia estar sentindo a mão da morte, agora que o Pai se fora, e ela estava verdadeiramente só... Oh, ela chorou e chorou, e então Chu-toy fez a vontade dela, como compete a um filho obediente, e minha Patroa ficou tão contente...

— E o bárbaro da foto, quem é?

O homem estava meio virado de costas, ao fundo, não era fácil reconhecê-lo, de pé ao lado do carro estacionado junto da farmácia. Era um homem alto, europeu, as roupas amassadas e comuns.

— Não sei, senhor. Era o motorista, e foi ele que levou Chu-toy embora, mas o comitê da aldeia e o próprio Chu-toy curvaram-se diante dele muitas vezes, e comentou-se que era muito importante. Foi o primeiro demônio estrangeiro que vi na vida, senhor...

— E as pessoas do outro retrato? Quem são?

O retrato era antiqüíssimo, quase sépia, e mostrava um casal constrangido, em roupas de casamento malfeitas, fitando desanimadamente a câmera.

— Ah, mas é claro que são o Pai e a Mãe, senhor. Não lembra que já lhe disse? Disse muitas vezes. São a Mãe e o Pai. O nome dele era Ting-top Wu, e a sua tai-tai, a minha Patroa, era Fang-ling...

— E o recorte?

— Não sei, senhor, estava colado ao retrato, então deixei-o lá mesmo. A Mãe o havia colado ali, então não mexi nele. O que eu ia querer com essa bobagem de escrita dos demônios estrangeiros...

Robert Armstrong soltou um suspiro. O recorte amarelado era de um jornal chinês de Hong Kong, datado de 16 de julho de 1937, que falava de três jovens chineses que tinham se saído tão bem nos exames finais, que o governo de Hong Kong lhes concedera bolsas para irem estudar num colégio da Inglaterra. Kar-shun Kwok era o primeiro nome citado. Kar-shun era o nome chinês formal de Brian Kwok.

— Saiu-se muito bem, Robert — disse Crosse, fitando-o.

— Foi? — replicou, em meio à névoa do seu sofrimento.

— Foi, muito bem. Trouxe-me as provas diretamente, seguiu as instruções ao pé da letra, e agora o nosso toupeira está dormindo direitinho. — Crosse acendeu um cigarro e sentou-se à mesa. — Felizmente você tomou a cerveja certa. Ele suspeitou de alguma coisa?

— Não, Acho que não. — Armstrong tentou controlar-se. — Quer me dar licença, senhor, por favor? Sinto-me imundo. Tenho... tenho que tomar um banho. Desculpe.

— Sente-se um minuto, por favor. É, deve estar muito cansado. Muito cansativas, essas coisas.

"Deus!", Armstrong sentia vontade de gritar, angustiado, "é impossível! Impossível o Brian ser um agente secreto infiltrado, mas tudo se encaixa. Por que outro motivo teria um nome completamente diferente, uma certidão de nascimento diferente? Por que outro motivo teria uma cobertura tão cuidadosamente construída — que os pais dele foram mortos em Cantão durante a guerra, assassinados pelos comunistas? Por que outro motivo teria se arriscado a voltar secretamente para Ning-tok, arriscando tudo aquilo que construíra tão cuidadosamente ao longo de trinta anos, a não ser que o seu próprio pai estivesse mesmo morrendo? E se todos esses fatos são reais, então os outros automaticamente se sucedem: que devia estar em contato permanente com o continente, para saber que o pai estava à morte, que como superintendente da polícia de Hong Kong teria que ser persona-grata à RPC, para que lhe fosse permitido entrar e sair secretamente. E se era persona-grata, então tinha que ser um deles, preparado ao longo dos anos, estimulado ao longo dos anos. "

— Meu Deus! — murmurou —, teria facilmente se tornado comissário assistente, quem sabe até comissário...

— O que sugere agora, Robert? — perguntou Crosse, a voz suave.

Armstrong forçou a mente a voltar ao presente, o treinamento superando a angústia.

— Verifique o passado dele. Vamos encontrar o elo. É, o pai dele era uma minúscula engrenagem comunista, mas uma engrenagem de Ning-tok, apesar de tudo. Portanto, o parente de Hong Kong a quem foi enviado também deveria ser de lá. Devem ter mantido o Brian sob rédea curta na Inglaterra, no Canadá, aqui, em qualquer lugar... tão fácil fazer isso, tão fácil alimentar o ódio pelos quai loh, tão fácil para um chinês esconder esse ódio... Não é o povo mais paciente e reservado do mundo? É, vá investigar o passado e acabará por encontrar o elo e encontrar a verdade.

— Robert, tem razão de novo. Mas, primeiro, deve-se começar o interrogatório dele.

Armstrong sentiu uma onda gélida de horror invadir seu estômago.

— É — falou.

— Estou encantado em participar-lhe que essa honra será sua.

— Não.

— Você supervisionará o interrogatório. Nenhum chinês tomará parte nele, apenas agentes britânicos graduados. Exceto o Wu, Wu Óculos. É, será útil... apenas ele. É bom aquele rapaz.

— Não posso... não vou.

Crosse soltou um suspiro e abriu o grande envelope pardo que trouxera consigo

— O que acha disso?

Com mãos trêmulas, Armstrong pegou a foto. Era uma ampliação de 20 X 25 de um pedacinho da foto de Ning-tok, a cabeça do europeu que aparecia no último plano, ao lado do carro. O rosto do homem estava meio virado e indistinto, o granulado da ampliação denso.

— Eu... diria que ele viu a câmera e se virou, para evitar ser fotografado.

— Foi o que também pensei. Você o reconhece? Armstrong espiou o rosto, tentando desanuviar a cabeça.

— Não.

— Voranski? O nosso amigo soviético morto?

— Talvez. Não, acho que não.

— E quanto ao Dunross, o Ian Dunross?

Mais abalado, Armstrong levou a foto para junto da luz.

— É possível... mas improvável. Se... se for Dunross, então... acha que ele é o agente infiltrado da Sevrin? Impossível.

— Improvável, não impossível. É amigo do peito de Brian. — Crosse pegou de novo a foto e examinou-a. — Seja quem for, é familiar o que se consegue ver dele, mas não consigo identificar o homem, ou onde o vi. Ainda. Bem, não faz mal. Brian se lembrará. É. — A voz dele tornou-se sedosa. — Ah, não se preocupe, Robert, vou preparar o Brian para você, mas caberá a você dar o golpe de misericórdia. Quero saber quem é esse sujeito bem ligeiro. Na verdade, quero saber tudo o que o Brian sabe, bem, bem ligeiro.

— Não. Arranje outro...

— Ora, Robert, não seja tão chato! Chu-toy Wu, aliás Brian Kar-shun Kwok, é um agente inimigo que nos tapeou durante anos, só isso. — A voz de Crosse parecia penetrar em Armstrong. — A propósito, você vai participar do 16/2 logo mais às seis e meia, e também foi convocado para o sei. Já falei com o comissário.

— Não, e não posso interro...

— Ora, meu caro, pode e vai. É o único que pode. Brian é esperto demais para ser pego como um amador. Claro que estou tão espantado ao saber que era o toupeira quanto você, quanto o governador!

— Por favor. Não...

— Ele traiu Fong-fong, outro amigo seu, não foi? Deve ter "vazado" os documentos de A. M. Grant. Deve ser ele a pessoa que tem fornecido todos os nossos dossiês para o inimigo, e todas as outras informações. Sabe Deus a quanta coisa teve acesso no curso do estado-maior e em todos os outros cursos! — Crosse fumava o seu cigarro, a fisionomia normal.

— No sei ele tinha autorização para saber de quase tudo ligado à segurança, e certamente concordo que estava sendo preparado para um altíssimo cargo... eu ia fazer dele o meu número 2! Portanto, é melhor sabermos bem ligeiro tudo a seu respeito. Curioso, estávamos procurando um agente soviético infiltrado, e não é que encontramos um da República Popular da China!

— Apagou o cigarro. — Já mandei que começassem a fazer com ele um interrogatório classificação 1.

A cor fugiu do rosto de Armstrong, e ele fitou Crosse, odiando-o abertamente.

— Você é um filho da mãe, um filho da mãe nojento e sacana.

Crosse riu suavemente.

— É verdade.

— É bicha, também?

— Talvez. Talvez apenas ocasionalmente, e apenas quando me agrada. Talvez. — Crosse fitava-o calmamente. — Ora, vamos, Robert, acha mesmo que posso ser chantageado? Eu? Chantageado? Francamente, Robert, não compreende a vida? Parece que o homossexualismo é bastante normal, mesmo nas altas esferas.

— É?

— Hoje em dia é bastante normal, quase "na moda", para alguns. Ah, é, sim, meu caro, e é praticado, de tempos em tempos, por um grupo muito católico de vips em toda parte. Até em Moscou. — Crosse acendeu outro cigarro. — É claro, é preciso ser discreto, seletivo, e de preferência não assumir compromisso, mas uma queda para o exótico podia dar todo tipo de vantagens na nossa profissão. Não é?

— Quer dizer que você justifica qualquer tipo de maldade, qualquer tipo de merda, assassinato, trapaça, mentira, em nome do maldito sei... é isso?

— Robert, não justifico nada. Sei que você está muito perturbado, mas acho que já chega.

— Você não pode me forçar a me meter no sei. Pedirei demissão.

Crosse soltou uma risada de deboche.

— Mas, meu caro, e quanto a todas as suas dívidas? E quanto aos quarenta mil até segunda-feira? — Levantou-se, os olhos duros como granito. Sua voz mal se alterara, mas agora havia nela uma nota de maldade. — Somos ambos maiores de idade, Robert. Dobre-o, e faça-o bem depressa.


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