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20h10m

Roger Crosse saltou do elevador no quinto andar, o rosto tenso, e entrou pela porta aberta no apartamento das Propriedades Asiáticas. O salão estava lotado e barulhento. Ficou parado à porta, os olhos percorrendo os convivas, à procura de Plumm ou Dunross. Notou prontamente que havia pouca felicidade ali, um ar de depressão na maioria dos convidados, o que aumentou sua inquietação. Havia poucas mulheres presentes... as poucas que ali estavam agrupavam-se constrangidas no canto oposto da sala. Por toda parte a conversa se concentrava acaloradamente no problema da débâcle da Bolsa e da corrida aos bancos.

— Ora, qual é, pela madrugada! Fica muito bonito para o Victoria anunciar uma compra de controle multimilionária do Ho-Pak, mas cadê o dinheiro para nos manter a todos à tona?

— Foi uma fusão, não uma compra de controle, Dunstan — começou Richard Kwang —, o Ho-Pak não...

Barre ficou subitamente colérico.

— Puta que o pariu, Richard! Somos todos amigos aqui, e todos sabemos que a coisa é mais do que uma simples operação de salvamento, pelo amor de Deus! Somos Iá crianças? O que quero deixar claro — disse Barre, aumentando o tom de voz para abafar as de Richard Kwang e Johnjohn —, o que quero deixar claro, meu velho, é que, com ou sem fusão, nós, os empresários de Hong Kong, não podemos nos manter à tona se todos os malditos bancos de vocês, por pura burrice, ficarem sem grana. Certo?

— Não é culpa nossa, pelo amor de Deus! — falou Johnjohn, irritado. — É apenas uma perda temporária de confiança.

— Uma droga de uma má administração, se querem saber a minha opinião — replicou Barre com azedume, ante a concordância total. Então notou Crosse tentando passar. — Oh, oh, alô, Roger! — disse, com um sorriso amarelo.

Roger Crosse notou a cautela imediata, que era normal sempre que ele pegava alguém com a guarda aberta.

— O Ian está aqui?

— Não, ainda não chegou — falou Johnjohn, e Crosse soltou a respiração, molhado de alívio.

— Tem certeza?

— Tenho, sim. Tão logo ele chegue, vou embora — disse Dunstan, com azedume. — Malditos bancos! Se não fosse por...

Johnjohn interrompeu.

— E quanto aos malditos Lobisomens, Roger?

A descoberta dos dois corpos fora o assunto principal da Rádio Hong Kong e de todos os jornais chineses... já que não havia jornais ingleses vespertinos aos domingos.

— Não sei mais do que vocês — falou Crosse. — Ainda estamos tentando identificar as vítimas. — Seus olhos se concentraram em Richard Kwang, que ficou intimidado. — Não sabe de nenhum filho ou sobrinho que tenha desaparecido ou sido seqüestrado, sabe, Richard?

— Não, infelizmente, não sei, Roger.

— Se me dá licença, tenho que ir falar com o nosso anfitrião. — Crosse foi abrindo caminho entre as pessoas. — Alô, Christian — disse, passando pelo editor alto e magro do Guardian. Viu a desolação que o outro homem tentava desesperadamente esconder. — Sinto muito por sua mulher.

— Joss — falou Christian Toxe, tentando aparentar calma, e barrou o seu caminho. — Joss, Roger. Ela, bem, ela... a vida tem que continuar, não é? — O sorriso forçado dele era quase grotesco. — O Guardian tem que fazer o seu trabalho, não é mesmo?

— É.

— Posso dar uma palavrinha com você depois?

— Claro, mas confidencialmente, como sempre?

— Naturalmente.

Continuou o seu caminho, passando por Pugmire e Sir Luís, conversando entretidíssimos sobre a compra de controle da General Stores pela Struan, e notou Casey no centro de um grupo no varandão que dava para o porto, De Ville entre eles, Gornt também no grupo, com ar benévolo, o que Crosse estranhou.

— Alô, Jason — cumprimentou, aproximando-se de Plumm, que conversava com Joseph Stern e Phillip Chen. — Obrigado pelo convite.

— Oh, alô, Roger, que bom ter vindo!

— Boa noite — cumprimentou os outros. — Jason, cadê o seu convidado de honra?

— Ian telefonou dizendo que se atrasara um pouco, mas que já vinha. Não demora estará aqui. — A tensão de Plumm era evidente. — O... champanha está pronto, e o meu pequeno discurso também. Está tudo pronto — falou, olhando para ele.

— Vamos, Roger, deixe-me pegar uma bebida para você. É Perrier, não é? Botei no gelo para você.

Crosse o acompanhou, igualmente satisfeito pela oportunidade de conversarem em particular. Mas, tão logo chegaram à porta da cozinha, fez-se um silêncio repentino. Dunross estava na entrada com Riko, Gavallan ao lado deles. Os três sorriam amplamente.

— Ouça, Jason, eu... — Crosse se interrompeu. Plumm já se virará para o bar, e, se Crosse não o estivesse observando muito atentamente, jamais teria visto a mão esquerda dele quebrar habilmente o frasco minúsculo sobre uma das taças cheias de champanha, depois colocar os fragmentos no bolso, pegar a bandeja com as quatro taças e se dirigir para a porta. Fascinado, observou Plumm aproximar-se de Dunross e oferecer-lhe o champanha.

Dunross deixou Riko pegar uma taça, depois Gavallan. Sem ser aparentemente induzido a isso, ele apanhou a taça que continha a droga. Plumm pegou a última delas, entregando a bandeja a um garçom embaraçado.

— Bem-vindo, Ian, e parabéns pelo golpe! — disse Plumm, com naturalidade, brindando sem estardalhaço. Os que estavam próximos acompanharam-lhe o gesto, polidamente, Naturalmente, Dunross não bebeu o próprio brinde.

— Agora, por que não brinda ao Richard Kwang, ao Johnjohn e à sua fusão? — sugeriu Plumm, a voz soando estranha.

— Por que não? — replicou Dunross com uma risada, e lançou um olhar para Johnjohn, do outro lado da sala. — Bruce!

— chamou, erguendo a taça, e o nível geral do barulho baixou um pouco. — Ao Victoria! — A voz dele tornou-se mais forte, chamando a atenção. Outros olharam para ele e pararam no meio do que diziam. — Talvez todos devam participar do brinde. Acabo de saber que o Banco da China concordou em emprestar ao Vic e aos outros bancos meio bilhão em espécie a tempo para a abertura das portas, na segunda-feira.

Fez-se um silêncio vasto e repentino. Os que estavam na varanda se adiantaram, Gornt à frente.

— O quê?

— Acabo de saber que o Banco da China emprestou a Hong Kong... vai emprestar ao Vic, para emprestar aos ou-

tros bancos... meio bilhão em espécie, e quanto mais for preciso. Todas as corridas aos bancos terminaram! — Dunross ergueu a taça. — Ao Victoria!

Quando o pandemônio começou e todos desandaram a fazer perguntas, Crosse começou a andar, e no exato momento em que Dunross ia tomar o primeiro gole, fingiu tropeçar e colidiu com ele, derrubando-lhe a taça da mão. Ela se estilhaçou ao tocar no chão de parquete.

— Puxa vida, desculpe-me! — falou, sem graça. Plumm fitou-o, abismado.

— Pela madrugada...

— Ah, Jason, mil desculpas — falou Crosse interrompendo-o, e acrescentando depressa, enquanto um garçom catava rapidamente os cacos: — Quem sabe podia pegar outra taça para o Ian.

— Sim, mas...

Atordoado, Plumm já ia obedecer quando Riko falou:

— Ah, tome, tai-pan, por favor, fique com a minha. Então Johnjohn gritou, por sobre a balbúrdia:

— Silêncio, silêncio, um momento! — e foi se aproximando de Dunross. — Ian — perguntou, no silêncio absoluto —, tem certeza quanto ao dinheiro?

— Claro que sim — replicou Dunross serenamente, sorvendo a bebida de Riko, gozando aquele momento. — Tiptop me ligou pessoalmente. Vai sair no noticiário das nove.

Houve um súbito viva ruidoso, mais perguntas e respostas, e Dunross viu que Gornt o fitava do outro lado do aposento. Seu sorriso tornou-se mais duro, e ele ergueu a sua taça, ignorando a barragem de perguntas.

— À sua saúde, Quillan! — exclamou, zombeteiramente. Rapidamente a conversa cessou de novo, a atenção de todos concentrada neles.

Gornt retribuiu o brinde, igualmente zombeteiro.

— À sua saúde, Ian. É verdade que temos mesmo o dinheiro da China?

— É, e a propósito, acabo de conseguir um novo fundo de cinqüenta milhões de dólares americanos. Agora a Casa Nobre é a hong mais forte da colônia.

— Com que garantia? — perguntou a voz cortante de Gornt, no silêncio abrupto.

— A honra da Casa Nobre! — Com uma displicência que não sentia, Dunross virou-se para Johnjohn. — O empréstimo é do Royal Belgium, uma subsidiária do First Central de Nova York, e bancado por eles. — Deliberadamente evitou olhar para Gornt enquanto repetia a notícia, saboreando o som das palavras: — Cinqüenta milhões de dólares americanos. Ah, a propósito, Bruce, amanhã vou suspender o ^eu empréstimo para os meus dois navios. Não preciso mais do empréstimo do Vic... o Royal Belgium me ofereceu melhores condições. Johnjohn simplesmente o fitou.

— Está brincando!

— Não. Acabo de falar com o Paul. — Momentaneamente, Dunross olhou para Plumm. — Desculpe, Jason, foi por isso que me atrasei. Naturalmente, tinha que ir vê-lo. Bruce, meu velho, Paul já está no banco tomando as providências para a transferência do dinheiro da China a tempo para a abertura do banco... pediu que você fosse para Iá imediatamente.

— Como?

— Imediatamente. Desculpe.

Johnjohn fitou-o, abobalhado, começou a falar, interrompeu-se, depois explodiu num viva que todos acompanharam, e saiu às pressas, ao som de vivas.

— Pombas, tai-pan, mas você...

— O Tiptop? Isso quer dizer que é verdade! Não acha...

— O First Central de Nova York? Não são os cretinos que...

— Porra, e eu andei vendendo a descoberto...

— Eu também! Que merda, vou comprar logo que a Bolsa abrir ou...

— Ou vou ficar a zero e...

Dunross viu que Sir Luís, Joseph Stern e Phillip Chen confabulavam, Gornt ainda a fitá-lo, o rosto imóvel. Então, viu Casey sorrindo para ele, feliz, e ergueu a taça num brinde. Ela retribuiu o gesto. Gornt viu isso e dirigiu-se para ela, e os que estavam perto estremeceram e ficaram calados.

— O First Central é o banco da Par-Con, não é?

— É, sim, Quillan — retrucou ela, sua voz soando pequenina, mas correndo por toda a sala, e novamente eles foram o alvo das atenções.

— Você e o Bartlett, foram vocês que fizeram isso? — perguntou Gornt, do alto da sua estatura.

Dunross apressou-se a dizer:

— Eu providencio os meus empréstimos. Gornt ignorou-o, apenas a fitava.

— Você e Bartlett. Vocês o ajudaram?

Ela lhe devolveu o olhar, o coração batendo forte.

— Não tenho controle sobre aquele banco, Quillan.

— Ah, mas você andou metendo sua colher na história — disse Gornt, friamente. — Não foi?

— Murtagh me perguntou se eu achava que valia a pena arriscar na Struan — disse ela, a voz controlada. — Eu disse que sim, e muitíssimo.

— A Struan está acabada — falou Gornt. Dunross acercou-se deles.

— A questão é que não estamos acabados. A propósito, Quillan, Sir Luís concordou em tirar as ações da Struan do pregão até o meio-dia.

Todos os olhos se voltaram para Sir Luís, que agüentou estoicamente, com Phillip Chen ao lado, depois retornaram para Dunross e Gornt.

— Por quê?

— Para dar ao mercado tempo para se adaptar à alta.

— Que alta?

— A alta que todos merecemos, a alta que o Velho Cego Tung previu. — Uma onda de eletricidade percorreu a todos, até mesmo Casey. — E também para se adaptar ao valor das nossas ações — falou Dunross, a voz áspera. — Abrimos a 30.

— Impossível — falou alguém, com voz abafada, e Gornt rosnou:

— Não pode! Fechou a 9,50, por Deus! Suas ações fecharam a 9,50!

— E daí oferecemos as ações a 30, por Deus! — rosnou Dunross de volta.

Gornt virou-se bruscamente para Sir Luís.

— Vai topar esse assalto a mão armada?

— Não há nenhum, Quillan — disse Sir Luís, calmamente. — Concordei, com a aprovação unânime do comitê, em que é melhor para todos, para a segurança dos investidores, que haja um período de calma... para todos poderem se preparar para a alta. Pareceu-nos justo até o meio-dia.

— Justo, hem? — falou Gornt com aspereza. — Você tem um bocado de ações que vendi a descoberto. Agora vou recomprar tudo. A que preço?

Sir Luís deu de ombros.

— Tratarei do assunto ao meio-dia de amanhã, no próprio edifício da Bolsa.

— Eu tratarei do assunto com você neste momento, Quillan — disse Dunross, asperamente. — Quantas ações vendeu a descoberto? Deixarei que as recompre a 18, se você vender o controle majoritário da AH Ásia Airways a 15.

— A Ail Ásia Airways não está à venda — falou Gornt, furioso, a mente berrando que a 30 ele estaria liquidado.

— A oferta é válida até a abertura da Bolsa, amanhã.

— Dane-se você, amanhã e os seus 30! — Gornt virou-se bruscamente para Joseph Stern. — Compre ações da Struan! Agora, de manhã ou ao meio-dia! É o responsável!

— A... a que preço, sr. Gornt?

— Basta comprar! — Gornt fechou a cara e virou-se para Casey. — Obrigado — disse-lhe, e saiu furioso, batendo a porta atrás de si.

Então, as conversas explodiram, e Dunross viu-se cercado, gente lhe batendo nas costas, assoberbando-o de perguntas. Ela ficou sozinha na porta da varanda, chocada pela violência que presenciara. Distraidamente, confusa, viu Plumm se afastar apressado, com Roger Crosse atrás, mas nem lhes prestou atenção, apenas observava Dunross, com Riko ao lado.

No pequeno dormitório dos fundos, Plumm meteu a mão na gaveta de uma cômoda que ficava perto do grande baú que seria despachado por mar. A porta se escancarou e ele se virou bruscamente; quando viu que era Roger Crosse, sua fisionomia se alterou.

— Que merda andou fazendo? Você deliberadamente... Com uma velocidade felina, Crosse atravessou o quarto e esbofeteou Plumm antes que este se desse conta do que estava acontecendo. Plumm soltou uma exclamação abafada e se preparou para saltar sobre Crosse, quando este o esbofeteou de novo e Plumm tropeçou de encontro à cama, caindo sobre ela.

— Mas que mer...

— Cale a boca e ouça! — sibilou Crosse. — Suslev vai entregar você!

Plumm fitou-o, boquiaberto, as marcas das bofetadas tornando-se escarlates. Sua raiva sumiu de pronto.

— O quê?

— Suslev vai denunciar você ao Sinders, e isso significa todos nós. — Os olhos de Crosse se estreitaram. — Está bem, agora? Puta merda, fale baixo.

— O quê? Sim... sim... Eu... sim.

— Desculpe, Jason, era a única coisa a ser feita.

— Tudo, tudo bem. Que diabo está acontecendo, Roger? Plumm saltou da cama, esfregando o rosto, um filete de sangue no canto da boca, agora totalmente controlado. Lá de fora vinham os ruídos de conversas indistintas.

— Temos que armar um plano — disse Crosse sombriamente, e recapitulou sua conversa com Suslev. — Acho que o convenci, mas aquele sacana é escorregadio, não se pode saber o que fará. Sinders vai entregá-lo, não há dúvida, se Suslev não denunciar o Arthur... e se Sinders o entregar, Suslev não voltará a Hong Kong. Eles o manterão e arrancarão tudo dele. Então o...

— Mas, e quanto ao Dunross? — perguntou Plumm, desalentado. — Sem dúvida o Dunross poderia ter-nos livrado dessa enrascada. Agora o Grigóri não vai deixar de falar. Por que me deteve?

— Tive que fazê-lo. Não houve tempo de lhe contar. Ouça, depois que deixei o Suslev, entrei em contato com o QG. Eles me contaram que Tiptop ajudara aqueles filhos da mãe a se safarem da armadilha com o dinheiro da China. Antes, eu soubera que o Ian tinha arranjado o seu empréstimo — mentiu Crosse. — Portanto, a corrida aos bancos acabou, o mercado vai ficar em alta, com ou sem Dunross. Mas, o que é pior, Jason, soube, por um informante da Divisão Especial, que Sinders triplicou a segurança em Kai Tak, a mesma coisa no cais do Ivánov, e que, neste momento, estão abrindo todo e qualquer caixote, toda e qualquer sacola, revistando todo equipamento, todo cule que sobe a bordo. Se eles tivessem interceptado Dunross, e o fariam, o pessoal do sei é vivo demais, estaríamos fritos.

O nervosismo de Plumm aumentou. Um estremecimento o percorreu.

— Mas, e quanto... E se entregarmos o Grigóri ao Sinders? — perguntou. — E se der...

— Fale baixo. Não está pensando direito, pelo amor de Deus! Grigóri nos conhece a todos. Sinders o meteria num regime de dormir-acordar-dormir, o enfiaria no Quarto Vermelho, e ele contaria tudo! Isso nos destruiria, destruiria a Sevrin, e atrasaria os soviéticos dez anos na Ásia.

Plumm sentiu um arrepio, e enxugou o rosto.

— Então, o que vamos fazer?

— Deixar o Grigóri embarcar e zarpar de Hong Kong, e torcer para que convença os seus patrões. Mesmo que ele deixe "vazar" seu nome para o Sinders, acho que estamos infiltrados tão fundo que poderemos nos safar. Você é britânico, não um estrangeiro. Graças a Deus temos leis para nos proteger... mesmo sob a Lei dos Segredos Oficiais. Não se preocupe, nada vai acontecer sem que eu saiba, e se algo acontecer, saberei imediatamente. Sempre haverá tempo para o Plano Três.

O Plano Três era uma fuga que Plumm arquitetara para tal eventualidade... com passaportes falsos, passagens aéreas válidas, malas preparadas, roupas, disfarces e coberturas, incluindo uma chave mestra para as áreas de espera dos aviões, sem ter que passar pela Imigração... o plano tinha noventa e cinco por cento de possibilidades de êxito, se fosse acionado com uma hora de antecedência.

— Meu Deus! — Plumm olhou para a mala que estivera à espera. — Meu Deus! — repetiu, depois foi até o espelho olhar para o seu rosto. A vermelhidão estava sumindo. Molhou um pouco o rosto.

Crosse o observava, imaginando se estaria convencido. Era o melhor que tinha podido fazer, dadas as circunstâncias. Detestava a improvisação, mas nesse caso não tivera opção. "Que vida levamos! Só eu próprio sou imprescindível, os demais, não: Suslev, Plumm, Sinders, Kwok, Armstrong, até o governador."

— O que foi? — perguntou Plumm, olhando para ele pelo espelho.

— Só estava pensando que estamos num ramo de negócio duro.

— A causa o torna válido. É a única coisa que conta. Crosse ocultou o seu desprezo. "Acho mesmo que você já deu o que tinha que dar, Jason, meu velho", pensou, depois dirigiu-se ao telefone. Não havia extensões naquela linha, e ele sabia que o aparelho não estava censurado. Discou.

— Pronto?

Reconheceu a voz de Suslev e deu a tossezinha seca do Arthur.

— O sr. Lop-sing, por favor. — Continuando o código numa imitação perfeita da voz de Plumm, falou com urgência: — Deu zebra. O alvo não apareceu. Cuidado nas docas. A vigilância foi triplicada. Não podemos entregar a mala. Boa sorte.

Desligou. O silêncio pesou.

— É o dobre de finados para ele, não é? — comentou Plumm, tristemente.

Crosse hesitou. Deu um débil sorriso.

— Antes a morte dele do que a sua, não é?


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