CARLO

Um gelo, devidamente guardado, aguentará um mês sem se estragar.

O Livro dos Gelos


O esforço estava a custar-lhe, eu estava bem consciente disso. Nos bailes e bailados e jantares ela sorria e gracejava e ninguém pensaria que havia alguma coisa errada – a menos que a vissem depois de todas as carruagens terem partido e de o riso ter abandonado os seus olhos, tão abruptamente como uma vela a ser apagada.

– O que tenho de fazer para recuperar a boa vontade dele? – perguntou-me uma noite, fatigada, enquanto eu recolhia as taças do seu apartamento.

– Absolutamente nada.

– Pensa que é impossível?

– Pelo contrário… quero apenas dizer que o melhor que tem a fazer é não fazer nada. Creio que Carlos está dividido. Há uma parte dele que gostaria de parar de a desejar. Mas outra parte sabe que não conseguirá. Por isso está zangado, não consigo por ser virtuosa, mas com ele próprio, por se importar tanto. – Evitei os olhos dela enquanto falava. – Mais cedo ou mais tarde, essa batalha terminará e ele saberá então aquilo que sente.

A voz dela, quando falou, era suave.

– E o que é, Carlo? O que sentirá ele? Irá o rei amar-me, ou odiar-me?

Abanei a cabeça.

– Não a odiará.

– Como gostava que não fosse uma coisa nem outra – murmurou. – Oh, como queria um mundo sem todo este amor.

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