LOUISE
Claro que me odeiam. Como poderiam não me odiar?
É certo que sou agora a mulher mais odiada de Inglaterra. Agora que os rapazes ingleses estão novamente a morrer com as balas dos mosquetes holandeses no peito, a afogarem-se com os canhões holandeses a ecoarem-lhes nos ouvidos. Agora que Hortense Mancini, cansada das atenções e também das hesitações de Carlos, partiu para a Europa com o príncipe do Mónaco, levando consigo todos os presentes do rei.
Consta que Thomas Osborne, lorde Danby, partilha os meus afectos com o rei. Não é verdade – ele tem uma esposa de mau génio e pareceu-me um bom passo político deixá-lo encantado – mas muitas pessoas acreditam nisso, incluindo o rei.
Danby e eu temos algo muito mais interessante em comum. Dividimos entre nós a venda dos cargos de Estado menores. Ninguém está muito interessado em saber se é este ou aquele fidalgo que é nomeado xerife do Hampshire ou Guardador dos Patos Reais, portanto decidimos de acordo com os emolumentos que nos são oferecidos. Quem pode colocar objecções a isso? Todos os membros do parlamento recebem subornos. Se algum deles causar problemas, peço simplesmente à embaixada francesa que me faculte os recibos.
Contudo, a ironia é que toda esta corrupção acabou por se revelar um desperdício do ouro de França. As guerras contra a Holanda, que quase a levaram à bancarrota, não foram vencidas – e os poucos territórios que França conseguiu conquistar pertenciam à Espanha, não aos Holandeses. Foram os Ingleses que acabaram por conseguir o maior prémio: Nova Amesterdão, agora chamada Nova Iorque.
Foi também a guerra holandesa que alertou os Ingleses para as extraordinárias capacidades do sobrinho de Carlos, Guilherme de Orange. Se ele consegue defender a Holanda contra os Franceses, pensam as pessoas, não poderia fazer o mesmo pela Inglaterra? Assim, Danby arranjou um casamento secreto entre Guilherme e Anne, a filha mais velha do duque de Iorque, um noivado do qual estou a par há muito tempo mas que – pelas minhas próprias razões – não levei à atenção dos meus mestres em França.
Estou a dar uma no cravo e outra na ferradura, compreendem.
Porém, nem mesmo essa aliança trouxe paz. Buckingham e Arlington podem estar acabados, mas lorde Shaftesbury ainda continua a maquinar no lugar deles. Os seus Whigs estão a fomentar conspirações fantásticas: já perdi a conta aos livros, baladas, sátiras e panfletos que me foram colocados debaixo da porta, as gravuras pornográficas que afirmam mostrar a Meretriz da Bretanha a divertir-se com o seu regimento de amantes papistas.
Nell Gwynne gosta de contar a história de como foi atacada por uma multidão enquanto ia pelas ruas na sua carruagem. Ao perceber, pelos gritos, que as pessoas tinham confundido a carruagem dela com a minha, debruçou-se na janela e gritou:
– Não, boa gente… eu sou a puta protestante! – Ao que o povo lhe deu três vivas e a escoltou até casa.
Se tivesse sido eu, como ela observa presumidamente, ao fim desse dia podia ter havido menos um católico em Inglaterra.
Contudo, se me odeiam, façam a vós próprios esta pergunta: que outra coisa poderia eu ter feito?
Podia ter casado com um nobre menor e produzido uma série de herdeiros. Podia ter ido para um convento e chegar – suponho – a Madre Superiora. Podia ter sido a companhia de alguma grande dama, ajudando-a com a sua costura e as contas do lar.
Podia ter casado com um fazedor de gelados a quem não amava, e vivido uma vida burguesa confortável à sombra de uma corte, rodeada pelos nossos filhos.
Assim, existem rainhas que não possuem tanta influência como eu, e ministros que não têm o meu alcance. Aconteça o que acontecer neste pequeno estranho e bárbaro país – sejam quais forem as alianças que estalem e se desfaçam sob os meus pés – continuarei a avançar e a prosperar.